APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000683-77.2013.4.04.7200/SC
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSÉ FRANCISCO DA SILVA |
ADVOGADO | : | VALDOR ÂNGELO MONTAGNA |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. PESCADOR ARTESANAL. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE E FRENTISA. SEGURADO MARITIMO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. INDEFERIMENTO. REVISÃO DA APOSENTADORIA POR IDADE. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. TUTELA ESPECIFICA.
1. Considerando que o prazo decadencial, segundo o Supremo Tribunal Federal, diz respeito especificamente à graduação econômica do benefício concedido, não há falar em decadência quando o pedido tiver sido indeferido pela Autarquia Previdenciária. Nestes casos, o segurado poderá postular a concessão a qualquer tempo, incidindo apenas eventual prescrição quinquenal sobre as prestações vencidas. Vale dizer, o segurado não tem prazo para renovar pedido de benefício previdenciário que foi indeferido pela Administração. A expressão "decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo", contida no art. 103 da lei 8.213/91 deve ser lida no contexto em que inserida. A parte inicial do dispositivo fala em decadência do direito à revisão do ato de concessão do benefício. Assim, o indeferimento a que alude o art. 103 é do pedido de revisão do ato de concessão e não do pedido de implantação de benefício. Incide tão-somente a prescrição qüinqüenal das parcelas/diferenças vencidas.
2.É devido o reconhecimento do tempo de serviço como pescador artesanal, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas. No entanto, inexistindo elementos de prova consistentes do labor como pescador artesanal realizado pelo autor ou o grupo familiar, tendo desempenhado de atividades formais e nos intervalos o de pescador artesanal, não se deve considerar caracterizada a condição de segurado especial.
3.Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
4.A atividade de frentista em posto de combustíveis deve ser considerada especial devido à periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis, hipótese em que é ínsito o risco potencial de acidente.
5.Em relação à atividade de vigilante, a jurisprudência do STJ e da 3ª Seção desta Corte firmou entendimento no sentido de que, até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, tida por perigosa (código 2.5.7 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64), independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral (REsp º 541377/SC, 5ª Turma, Min. Arnaldo Esteves Lima, DJU 24/04/2006; EIAC n.º 1999.04.01.082520-0, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 10-04-2002, Seção 2, pp. 425-427). Após, necessária a comprovação de porte de arma, mediante apresentação de qualquer meio de prova, até 05/03/1997, e, a partir de então, por meio de laudo técnico ou perícia judicial.
6Possível o enquadramento da atividade de marítimo como especial, ante a previsão expressa da função no item 2.4.2 do quadro Anexo I do Decreto n. 53.831.64 e, bem assim, no item 2.4.4 do Anexo I do Decreto n. 83.080.79.
7. Descabe a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição na DER, mas somente a revisão da Aposentadoria por Idade de que é titular, com o pagamento das diferenças decorrentes desde a DER. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador, gerando efeitos financeiros ao segurado que já é beneficiário do RGPS na revisão da Renda Mensal Inicial.
8.Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo, e diante da pendência, nos tribunais superiores, de decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes.
9. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 497, caput, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade,negar provimento ao Apelo do INSS e à remessa oficial, dar parcial provimento ao Apelo da parte autora, e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de novembro de 2016.
Ezio Teixeira
Relator
| Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8641921v3 e, se solicitado, do código CRC 9E86D0EE. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Ezio Teixeira |
| Data e Hora: | 11/11/2016 16:37 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000683-77.2013.4.04.7200/SC
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSÉ FRANCISCO DA SILVA |
ADVOGADO | : | VALDOR ÂNGELO MONTAGNA |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Cuida-se de recursos de Apelação contra a Sentença, que decidiu a causa, no sentido de:
"Em face do que foi dito, julgo parcialmente procedentes os pedidos para reconhecer o tempo de serviço prestado pelo autor sob condições especiais: (a) na atividade de frentista, 4 de janeiro de 1993 a 1º de março de 1993 e 2 de janeiro de 1994 a 31 de agosto de 1994, com o respectivo acréscimo de 40% (quarenta por cento), na forma da fundamentação; e (b) como segurado marítimo (pescador profissional), segundo os períodos indicados no quadro constante da fundamentação, com a respectiva aferição da equivalência entre mar e terra, na forma da legislação.
Sucumbente na maior parte do seu pedido (art. 21, parágrafo único, do Código de Processo Civil), condeno o autor ao pagamento das despesas processuais e de honorários de advogado arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, cuja cobrança permanecerá sobrestada até modificação favorável de sua situação econômica, face ao deferimento do benefício da justiça gratuita.
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, aferida a tempestividade e a regularidade do preparo, recebo-o desde logo nos efeitos devolutivo e suspensivo, determinando a intimação da parte contrária para apresentar contrarrazões; e, após, a remessa dos autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região".
No Apelo da parte autora, sustentou que podem ser reconhecidos como de labor especial as atividades de pescador profissional, servente, vigia, cobrador e frentista e de encanador, ambas com o acréscimo de 40% (quarenta por cento) previsto em Lei. Que, no mesmo sentido, dúvidas não pairam acerca da atividade de pescador artesanal desde os doze anos de idade. Nesse caso, as testemunhas ouvidas corroboraram as alegações do Apelante, pois que confirmaram o exercício dessa atividade.
No Apelo do INSS, alegou preliminarmente a decadência, pois se discute o ato indeferitório de 1998. Fez prequestionamento.
Com contrarrazões, foram remetidos os autos a essa Corte.
É o relatório.
VOTO
O caso dos autos trata de pedido de reconhecimento de período laborado em regime de economia familiar (pesca artesanal) a partir dos 12 (doze) anos de idade, e, bem assim, dos lapsos alternados com atividades urbanas; e, também, (b) a conversão do tempo de serviço prestado em condições especiais, nas atividades de pescador profissional, servente, vigia, cobrador e frentista. Requereu, também, em consequência, a concessão de aposentadoria especial ou, sucessivamente, por tempo de contribuição, integral ou proporcional, a partir da data do requerimento administrativo, formulado em 14 de setembro de 1998 (NB 110.147.328-0).
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
DECADENCIA E PRESCRIÇÃO QUINQUENAL.
O art. 103, caput, da Lei 8.213/91, dispõe que "É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício (...)".
Considerando ainda que o prazo decadencial, segundo o Supremo Tribunal Federal, diz respeito especificamente à graduação econômica do benefício concedido, não há falar em decadência quando o pedido tiver sido indeferido pela Autarquia Previdenciária. Nestes casos, o segurado poderá postular a concessão a qualquer tempo, incidindo apenas eventual prescrição quinquenal sobre as prestações vencidas. Vale dizer, o segurado não tem prazo para renovar pedido de benefício previdenciário que foi indeferido pela Administração, como é o caso dos autos.
A expressão "decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo", contida no art. 103 da lei 8.213/91 deve ser lida no contexto em que inserida. A parte inicial do dispositivo fala em decadência do direito à revisão do ato de concessão do benefício. Assim, o indeferimento a que alude o art. 103 é do pedido de revisão do ato de concessão e não do pedido de implantação de benefício.
Nessa direção seguiu o voto do Ministro Luís Roberto Barroso, relator do RE 626.489, ao tratar da imprescritibilidade do fundo de direito do benefício não requerido e da aplicabilidade da Súmula nº 443 do Supremo Tribunal Federal e da Súmula nº 85 do Superior Tribunal de Justiça, ao estabelecer que "não se aplica em matéria previdenciária, entretanto, a conclusão das referidas súmulas quando há pedido administrativo indeferido. Nesse caso, somente perdem a exigibilidade as prestações atingidas pela prescrição, e não o próprio fundo de direito" (nota de rodapé - nº. 7).
Quanto à prescrição, o parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/91 estabelece o prazo prescricional de 05 anos para as parcelas devidas pela Previdência Social, alcançando as diferenças apuradas antes do qüinqüênio precedente ao ajuizamento da causa. No entanto, o fundo de direito em questões previdenciárias é imprescritível, a teor do art. 103 da Lei 8.213/91, assim como também o era na época que a ela antecedeu. A interrupção da prescrição ocorre com a citação, mas retroage à data da propositura da ação (art. 240, § 1º, CPC/2015), e pode ser decretada de oficio, conforme sistemática processual vigente.
No caso dos autos, tendo em vista que a ação em debate foi protocolada no Juizo Federal em 19/01/2013, e o início do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição que a parte autora busca a revisão é de 14/09/1998, subsistem parcelas/diferenças atingidas pela prescrição anteriores a 19/01/2008.
Em tais condições, não há falar em decadência. devendo incidir a prescrição qüinqüenal das parcelas devidas no qüinqüênio anterior ao ajuizamento da ação.
Nego provimento à apelação do INSS no ponto.
DO TEMPO DE SERVIÇO DE PESCADOR ARTESANAL
Para a comprovação do tempo de atividade como pescador artesanal com vista à obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, faz-se necessário início de prova material, não sendo admitida, via de regra, prova exclusivamente testemunhal (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91; Súmula 149 do STJ). A respeito, está pacificado nos Tribunais que não se exige comprovação documental ano a ano do período que se pretende comprovar (TRF - 4ª Região, AC n. 2003.04.01.009616-5, Terceira Seção, Rel. Des. Luís Alberto D"Azevedo Aurvalle, D.E. de 19-11-2009; TRF - 4ª Região, EAC n. 2002.04.01.025744-2, Terceira Seção, Rel. para o Acórdão Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 14-06-2007; TRF - 4ª Região, EAC n. 2000.04.01.031228-6, Terceira Seção, Rel. Des. Federal Celso Kipper, DJU de 09-11-2005), bem como que constituem prova material os documentos civis (STJ, AR n. 1166/SP, Terceira Seção, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 26-02-2007; TRF - 4ª Região, AC n. 2003.71.08.009120-3/RS, Quinta Turma, Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. de 20-05-2008; TRF - 4ª Região, AMS n. 2005.70.01.002060-3, Sexta Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJ de 31-05-2006) - tais como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, dentre outros - em que consta a qualificação como pescador tanto da parte autora como de seu cônjuge ou de seus pais, tal como para o trabalhador rural (Súmula 73 desta Corte). No entanto, não existe consenso sobre o alcance temporal dos documentos, para efeitos probatórios. Para chegar a uma conclusão, parece necessário averiguar a função da prova material na comprovação do tempo de serviço.
A prova material, conforme o caso, pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade como pescador, bastando, para exemplificar, citar a hipótese de registro contemporâneo em CTPS de contrato de trabalho. Em tal situação, não é necessária a inquirição de testemunhas para a comprovação do período registrado.
Na maioria dos casos que vêm a juízo, no entanto, a prova material não é suficiente à comprovação de tempo de trabalho, necessitando ser corroborada por prova testemunhal. Nesses casos, a prova material (ainda que incipiente) tem a função de ancoragem da prova testemunhal, sabido que esta é flutuante, sujeita a esquecimentos, enganos e desvios de perspectiva. A prova material, portanto, serve de base, sustentação, pilar em que se apoia (apesar dos defeitos apontados) a necessária prova testemunhal.
Em razão disso, entendo que, no mais das vezes, não se pode averiguar os efeitos da prova material em relação a si mesma, devendo a análise recair sobre a prova material em relação à prova testemunhal, aos demais elementos dos autos e ao ambiente socioeconômico subjacente; em outras palavras, a análise deve ser conjunta. A consequência dessa premissa é que não se pode afirmar, a priori, que há necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado, ou que a eficácia probatória do documento mais antigo deva retroagir um número limitado de anos. O alcance temporal da prova material dependerá do tipo de documento, da informação nele contida (havendo nuances conforme ela diga respeito à parte autora ou a outrem), da realidade fática presente nos autos ou que deles possa ser extraída e da realidade socioeconômica em que inseridos os fatos sob análise.
Considerando tais premissas e conclusões, passo à análise do caso em questão.
Na situação vertente, aptos a desvelar eventual exercício de pesca artesanal, o autor apresentou, apenas, recibos de contribuições às colônias de pescadores Z-2 e Z-11, nos anos de 1969, 1970, 1974, 1975, 1977, 1978, 1979, 1980, 1982, 1984, 1985, 1986, 1987, 1996, 1997 (evento 1, DSINRURAL12).
Em relação ao suposto exercício da pesca por seu pai, nada comprovou o autor, de modo que deve ser rejeitada, de plano, a arguição de que desde tenra idade auxiliou o seu genitor em regime de economia familiar.
De outro tanto, pode-se admitir que o pescador sujeito às condições sazonais inerentes à pesca, enquanto não esteja embarcado, desenvolva sua profissão nos períodos intermediários de forma artesanal, de modo a garantir o sustento de sua família. Porém, os documentos juntados aos autos não apontam para quaisquer indícios que pudessem, conjuntamente, constituir início de prova material do alegado exercício de atividade pesqueira artesanal. Na verdade, diversas foram as atividades profissionais desempenhadas pelo segurado nos interstícios do embarque, devidamente anotadas em sua carteira de trabalho, que apontam justamente para a integração do trabalhador na economia formal, e não familiar, que caracterizaria a pesca artesanal como a fonte exclusiva do seu sustento.
Não bastasse a ausência de início razoável de prova substancial do referido tempo de serviço - por si só suficiente para a rejeição do pedido -, embora deferida a produção de prova oral, as testemunhas ouvidas quase nada acrescentaram ao esclarecimento da situação fática.
Manoel David da Silva conheceu o autor somente no ano de 1984, quando já trabalhavam como pescadores profissionais. Respondeu, de maneira genérica, que as pessoas na localidade dos Ingleses já desempenhavam atividades de pesca artesanal com seus pais. Quando indagado se o autor voltava a trabalhar em regime de economia familiar, referiu-se a sua própria situação, como se idêntica fosse à do autor: sim, isso a gente fazia direto (...) isso é o hábito de todo mundo ali.
O depoimento de Inácio Martins tampouco foi elucidativo. Disse que conhece o autor há mais ou menos trinta anos, da localidade dos Ingleses. Não soube precisar datas de trabalho na pesca.
Valtair Lopes, de sua parte, seguiu a trilha das testemunhas anteriores. Respondeu conhecer o autor há vinte e cinco anos, mais ou menos, e disse que o autor retornava à pesca artesanal nos intervalos entre os embarques. Esse fato, como já afirmado previamente, é refutado pelo histórico profissional constante da CTPS do autor, em que se registram diversas ocupações urbanas.
Finalmente, a testemunha Sérgio Luiz Boll referiu-se a trabalhos do autor como pescador e frentista, sem precisão alguma da época em que aconteceram.
Assim, como resultado da falta de higidez das provas produzidas, o tempo de serviço laborado em regime de economia familiar não pode ser reconhecido, sendo de se manter a Sentença e seus fundamentos para o indeferimento do pedido da parte autora. Inexistindo elementos de prova consistentes do labor como pescador artesanal do autor ou do grupo familiar, acrescido ao fato de haver desempenhado de atividades formais e nos intervalos de pesador artesanal, não se deve considerar caracterizada a condição de segurado especial.
ATIVIDADE ESPECIAL
O reconhecimento da atividade especial em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado deve observar a legislação vigente à época do desempenho da atividade, com base na qual passa a compor o patrimônio jurídico previdenciário do segurado, como direito adquirido. Significa que a comprovação das condições adversas de trabalho deve observar os parâmetros vigentes na época de prestação, não sendo aplicável retroativamente legislação nova que estabeleça restrições à análise do tempo de serviço especial.
Esse é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial repetitivo 1.115.363/MG, precedente de observância obrigatória, de acordo com o art. 927 do CPC/2015. Ademais, essa orientação é regra expressa no art. 70, § 1º, do Decreto 3.048/99, na redação dada pelo Decreto 4.827/2003.
A partir dessas premissas, associadas à sucessão de leis no tratamento da matéria, é necessário definir qual a legislação em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Nesse prisma, a análise do tema deve observar a seguinte evolução legislativa:
1) Até 28/04/1995, com base na Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original, havia presunção legal da atividade especial, de acordo com o enquadramento por ocupações ou grupos profissionais (ex.: médico, engenheiro, motorista, pintores, soldadores, bombeiros e guardas), ou por agentes nocivos químicos, físicos ou biológicos, demonstrado o desempenho da atividade ou da exposição a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor, para os quais é necessária a mensuração dos níveis de exposição por perícia técnica ou formulário emitido pela empresa;
2) A partir de 29/04/1995, não subsiste a presunção legal de enquadramento por categoria profissional, excepcionadas aquelas referidas na Lei 5.527/68, cujo enquadramento por categoria pode ser feito até 13/10/1996, dia anterior à MP 1.523, que revogou expressamente a Lei 5.527/68. No período compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, diante das alterações que a Lei 9.032/95 realizou no art. 57 da Lei 8.213/91, o enquadramento da atividade especial depende da efetiva exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, sendo suficiente a apresentação de formulário padrão do INSS preenchido pela empresa (SB-40, DSS-8030), sem a exigência de embasamento em laudo técnico, exceto quanto aos agentes nocivos ruído, frio e calor, que dependem da mensuração conforme visto acima;
3) A partir de 06/03/1997, o enquadramento da atividade especial passou a depender da demonstração da efetiva exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, através de formulário padrão (DSS-8030, PPP) baseado em laudo técnico da empresa ou perícia técnica judicial demonstrando as atividades em condições especiais de modo: permanente, não ocasional, nem intermitente, por força da Lei nº 9.528/97, que convalidou a MP nº 1.523/96, modificando o artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91. O Decreto nº 2.172/97 é aplicável de 06/03/1997 a 05/05/1999, sendo substituído pelo Decreto nº 3.048/99, desde 06/05/1999.
4) A partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para análise da atividade especial postulada (art. 148 da IN 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Esse documento substitui os antigos formulário e exime a apresentação de laudo técnico em juízo, desde que adequadamente preenchido, com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica.
O enquadramento das categorias profissionais deve observar os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79 somente até 28/04/1995. A partir dessa data, a Lei 9.032/95 extinguiu o reconhecimento da atividade especial por presunção legal, exceto para as profissões previstas na Lei 5.527/68, que permaneceram até 13/10/1996, por força da MP 1.523.
O enquadramento dos agentes nocivos, por sua vez, deve seguir os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79, até 05/03/1997, e os Decretos 2.172/97 e 3.048/99, a partir de 06/03/1997, com incidência do Decreto 4.882/2003, quanto ao agente nocivo ruído. Ainda, tais hipóteses de enquadramento não afastam a possibilidade de reconhecimento da atividade especial no caso concreto, por meio de perícia técnica, ainda que não prevista a atividade nos Decretos referidos. Esse entendimento encontra amparo na Súmula 198 do TFR, segundo a qual "atendidos os demais requisitos, é devida aposentadoria especial, se a perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento".
Para fins de reconhecimento da atividade especial, a caracterização da habitualidade e permanência, nos termos do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não exige que a exposição ocorra durante toda a jornada de trabalho. É suficiente para sua caracterização o contato cujo grau de nocividade ou prejudicialidade à saúde ou integridade física fique evidenciado pelas condições em que desenvolvida a atividade.
É perfeitamente possível o reconhecimento da especialidade da atividade, mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre. Necessário, apenas, restar demonstrado que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde.
A permanência não pode ter aplicação restrita, como exigência de contato com o agente nocivo durante toda a jornada de trabalho do segurado, notadamente quando se trata de nocividade avaliada de forma qualitativa. A exposição permanente depende de constatação do grau e intensidade no contato com o agente, com avaliação dos riscos causados à saúde do trabalhador, embora não seja por todas as horas da jornada de trabalho.
Quanto ao agente nocivo ruído, a sucessão dos decretos regulamentares indica a seguinte situação:
- Até 05.03.97: Anexo do Decreto n.º 53.831/64 (Superior a 80 dB) e Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (Superior a 90 dB).
- De 06.03.97 a 06.05.99: Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 (Superior a 90 dB).
- De 07.05.99 a 18.11.2003 Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, na redação original (Superior a 90 dB).
- A partir de 19.11.2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 (Superior a 85 dB).
Desse modo, até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto 53.831/64. Já a partir de 06/03/1997, deve ser observado o limite de 90 dB até 18/11/2003. O nível de 85 dB somente é aplicável a partir de 19/11/2003, pois o Superior Tribunal de Justiça, em precedente de observância obrigatória (art. 927 do CPC/2015) definiu o entendimento segundo o qual os estritos parâmetros legais relativos ao nível de ruído, vigentes em cada época, devem limitar o reconhecimento da atividade especial (REsp repetitivo 1.398.260/PR), nos seguintes termos:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ." (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Por fim, destaco que os níveis de pressão sonora devem ser aferidos por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Em relação aos agentes químicos, a caracterização da atividade especial não depende da análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, pois são avaliados de forma qualitativa. Os Decretos que regem a matéria não exigem patamares mínimos, para tóxicos orgânicos e inorgânicos, ao contrário do que ocorre com os agentes físicos ruído, calor, frio ou eletricidade. Nesse sentido a exposição habitual, rotineira a agentes de natureza química são suficientes para caracterizar a atividade prejudicial à saúde ou à integridade física, conforme entendimento desta Corte (TRF4, APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10/05/2010).
Quanto aos agentes biológicos a exposição deve ser avaliada de forma qualitativa, não sendo condicionada ao tempo diário de exposição do segurado. O objetivo do reconhecimento da atividade especial é proporcionar ao trabalhador exposto a agentes agressivos a tutela protetiva, em razão dos maiores riscos que o exercício do labor lhe ocasiona, sendo inerente a atividade profissional a sujeição a esses agentes insalubres.
Com relação às perícias por similaridade ou por aferição indireta das condições de trabalho, destaco que esse procedimento tem sido admitido, nos casos em que a coleta de dados in loco se mostrar impossível para a análise da atividade especial. Nesse sentido cito os seguintes precedentes desta Corte:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. [...] A jurisprudência pátria reconhece a validade da perícia técnica por similaridade para fins de comprovação do tempo de serviço especial nos casos de impossibilidade de aferição direta das circunstâncias de trabalho. (TRF4, APELREEX 0009499-10.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 25/08/2016)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. [...] LAUDO EXTEMPORÂNEO. SIMILARIDADE. [...] 5. A perícia técnica deve ser realizada de forma indireta, em empresa similar àquela em que laborou o segurado, quando não há meio de reconstituir as condições físicas do local de trabalho em face do encerramento das suas atividades. (TRF4 5030892-81.2012.404.7000, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 06/07/2016)
No que tange ao uso de equipamentos de proteção individual (EPI), somente a partir de 03/12/1998 é relevante a sua consideração na análise da atividade especial. Nessa data entrou em vigor a MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o art. 58, § 2º, da Lei 8.213/91, estipulando a exigência de o laudo técnico conter informações sobre a existência de tecnologia de proteção individual eficaz para diminuir a intensidade do agente nocivo a limites de tolerância e recomendação do empregador para o uso. Logo, antes dessa data é irrelevante o uso de EPI, sendo adotado esse entendimento pelo próprio INSS (IN 77/2015, art. 268, inciso III).
Ainda, é pacífico o entendimento deste Tribunal e também do Colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 462.858/RS, Relator Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, DJU de 08-05-2003) no sentido de que esses dispositivos não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovados, por meio de perícia técnica especializada, o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho e a sua real efetividade.
Quando se trata de ruído, há precedente de aplicação obrigatória, nos termos do art. 927, do CPC/2015, o qual firmou a tese de que a utilização de EPI não impede a caracterização da atividade especial por exposição ao agente ruído. Trata-se do ARE 664.355 (Tema 555 reconhecido com repercussão geral), no qual o STF firmou a tese de que a utilização de Equipamento de Proteção Individual - EPI não ilide de modo eficaz os efeitos nocivos do agente físico ruído, porquanto não se restringem aos problemas relacionados às funções auditivas, restando assentado que mesmo na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no PPP, no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
No caso de exposição a hidrocarbonetos, "o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais" (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011).
FONTE DE CUSTEIO
Não deve ser acolhida a tese comumente apresentada pelo INSS, a respeito da ausência de fonte de custeio para o reconhecimento da atividade especial, em razão do fornecimento de equipamentos de proteção individual pelo empregador e ausência de indicação do código de recolhimento no campo GFIP do PPP.
De acordo com o art. 195 da Constituição Federal de 1988, a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, com base numa pluralidade de fontes de custeio. Nesse sentido a previsão de fonte de financiamento nas contribuições a cargo da empresa (art. 57, § 6º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 22, II, da Lei 8.212/91) não configura óbice à análise da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum, na medida em que o RGPS é regime de repartição e não de capitalização, no qual a cada contribuinte corresponde um fundo específico de financiamento do seguro social.
Ademais, o benefício de aposentadoria especial foi estipulado pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º, c/c art. 15 da EC 20/98), o que implica a possibilidade de sua concessão independente da identificação da fonte de custeio (STF, AI 553.993). Logo, a regra à específica indicação legislativa da fonte de custeio é dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.
Da mesma forma, se estiver comprovado o trabalho em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, a ausência do código ou indicação equivocada no campo GFIP do PPP não impede o reconhecimento da atividade especial. Isso porque o INSS possui os meios necessários para fiscalizar irregularidades na empresa, não podendo ser o segurado responsabilizado por falha do empregador.
Por fim, o recolhimento das contribuições previstas nos arts. 57, §§ 6º e 7º, da Lei 8.213/91 e art. 22, II, da Lei 8.212/91, compete ao empregador, de acordo com o art. 30, I, da Lei 8.212/91, motivo pelo qual a ausência do recolhimento não pode prejudicar o segurado.
Assim, a tese do INSS não deve ser acolhida.
TEMPO DE ATIVIDADE ESPECIAL NO CASO CONCRETO
Os períodos de atividade especial, controvertidos pelo INSS, correspondem aos períodos laborados como servente, vigia, cobrador e frentista.
Embora não haja especificação das datas e os períodos, busca o autor a caracterização da especialidade de trabalho desempenhados nos seguintes intervalos, em atenção estrita às atividades indicadas com tal qualificação: (a) 22 de janeiro de 1976 a 3 de fevereiro de 1976 (servente); (b) 1º de fevereiro de 1976 a 15 de março de 1976 (servente); (c) 17 de março de 1976 a 21 de abril de 1977 (vigia); (d) 19 de outubro de 1981 a 31 de outubro de 1981 (servente); (e) 24 de setembro de 1987 a 6 de novembro de 1987 (servente); (f) 1º de dezembro de 1987 a 12 de março de 1989 (vigia); (g) 4 de dezembro de 1990 a 15 de junho de 1991 (vigia); (h) 2 de outubro de 1991 a 18 de agosto de 1992 (cobrador); (i) 4 de janeiro de 1993 a 1º de março de 1993 (frentista); (j) 2 de janeiro de 1994 a 31 de agosto de 1994 (frentista); e (k) 1º de abril de 1996 a 31 de maio de 1998 (frentista).
Não há elemento outro de prova, relativo ao exercício de tais atividades, senão a carteira de trabalho e previdência social do autor. Analiso, pois, a possibilidade de enquadramento das atividades desempenhadas como especiais até 28 de abril de 1995. Como referido anteriormente, a partir dessa data, tornou-se necessária a comprovação de trabalho em condições especiais, à conta da extinção do enquadramento por categoria profissional.
Na situação em quadra, em relação à atividade de frentista, deve ser reconhecido o enquadramento da categoria profissional, em razão das condições de trabalho a que se sujeitam os frentistas e demais trabalhadores no ramo, notadamente insalubres e perigosas. Tanto é que, há muito tempo, o Supremo Tribunal Federal sumulou o entendimento de que tem direito ao adicional de serviço perigoso o empregado de posto de revenda de combustível líquido (Súmula 212).
Confira-se, a respeito, a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
EMBARGOS INFRINGENTES. PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. FRENTISTA/ENCARREGADO DE PISTA/ENCARREGADO DE POSTO/GERENTE DE POSTO. EXPOSIÇÃO À ATIVIDADE PERIGOSA E A TÓXICOS ORGÂNICOS, HIDROCARBONETOS, CARVÃO MINERAL E UMIDADE. CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM, INCLUSIVE APÓS 1998. VIABILIDADE. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL.
1. Caso em que a parte embargada acostou aos autos documentos hábeis comprovando que, no período de 01/12/1998 a 19/02/2002, exerceu atividade de frentista, tendo ficado exposta, de modo habitual e permanente, a substâncias nocivas à saúde. Além disso, a atividade de frentista em posto de combustíveis deve ser considerada especial devido à periculosidade decorrente da exposição a substâncias inflamáveis, hipótese em que é ínsito o risco potencial de acidente, devendo, pois, ser reconhecida a especialidade do labor no respectivo período, com direito à conversão do tempo de atividade especial em tempo de atividade comum para fins de aposentadoria.
2. Considerando que o parágrafo 5.º do art. 57 da Lei n. 8.213/91 não foi revogado nem expressa, nem tacitamente pela Lei n. 9.711/98 e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional n. 20, de 15-12-1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1.º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.
3. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades. Na hipótese, não restou comprovado nos autos o efetivo fornecimento, pela empresa, dos referidos dispositivos, sendo, ainda, incontroverso que em relação à umidade, não havia utilização de EPIs para neutralizar a exposição ao referido agente.
(EINF 2005.72.01.052132-3, Rel. Desembargador Federal Celso Kipper, Terceira Seção, unânime, julg. em 6.6.2013, publ. em 13.6.2013).
Assim, em que pese a ausência de formulário específico preenchido pelo empregador, cumpre reconhecer o direito à contagem diferenciada dos seguintes períodos, anteriores a 28 de abril de 1995: nos intervalos de 4 de janeiro de 1993 a 1º de março de 1993 e 2 de janeiro de 1994 a 31 de agosto de 1994.
No tocante aos lapsos de trabalho como vigia, não obstante a inexistência de previsão expressa da especialidade da função de vigilante nas normas de regência, o Decreto n. 53.831/64 prevê o enquadramento como especial da função de guarda, no item 2.5.7 do respectivo Anexo.
Por se tratar de rol meramente exemplificativo, é possível o enquadramento da atividade de vigilante, por analogia, considerando-se a própria similaridade das funções exercidas.
Nesse sentido, extrai-se precedente do Superior Tribunal de Justiça:
RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA. VIGILANTE BANCÁRIO. LEI VIGENTE AO TEMPO DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. ENQUADRAMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL. ROL EXEMPLIFICATIVO. POSSIBILIDADE.
1. A Egrégia 3ª Seção desta Corte Superior de Justiça pacificou já entendimento no sentido de que o tempo de serviço é regido pela lei vigente ao tempo da sua prestação.
2. Desse modo, em respeito ao direito adquirido, se o trabalhador laborou em condições adversas e a lei da época permitia a sua contagem de forma mais vantajosa, o tempo de serviço assim deve ser contado.
3. Recurso não conhecido.
(REsp 441.469/RS, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, 6ª Turma, unânime, julg. em 11.2.2003, publ. em 10.3.2003).
Entretanto, revendo o entendimento do Juízo Monocrático, dou provimento ao Apelo da parte autora, pois no período que antecedeu a Lei n. 9.032/95, não era exigível que o vigilante portasse arma de fogo para o reconhecimento da atividade especial.
No que pertine à atividade de vigia/vigilante, pode ser considerada como especial por equiparação à categoria profissional de "guarda" até 28/04/1995, e, posteriormente, mediante comprovação da exposição a agentes nocivos à saúde ou a integridade física que advém do porte de arma de fogo. Nesse sentido:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. VIGIA/VIGILANTE. PORTE DE ARMA DE FOGO. PERICULOSIDADE. RECONHECIMENTO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO. JUROS DE MORA. ADEQUAÇÃO. CABIMENTO. 1. Demonstrado o exercício de tarefa sujeita a enquadramento por categoria profissional até 28/04/1995 (vigia/vigilante por analogia a profissão de guarda), o período respectivo deve ser considerado como tempo especial. 2. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida. 3. Até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral. Após essa data, o reconhecimento da especialidade depende da comprovação da efetiva exposição a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, como o uso de arma de fogo, por exemplo. 4. Comprovado o tempo de serviço/contribuição suficiente e implementada a carência mínima, é devida a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a contar da data do requerimento administrativo, nos termos dos artigos 54 e 49, inciso II, da Lei 8.213/91. 5. Não incide a Lei nº 11.960/2009 apenas em relação à correção monetária equivalente à poupança, porque declarada inconstitucional (ADIs 4.357 e 4.425/STF), com efeitos erga omnes e ex tunc. 6. Os juros de mora, contados da citação, são fixados à taxa de 1% ao mês até junho/2009, e, após essa data, pelo índice de juros das cadernetas de poupança, com incidência uma única vez, nos termos da Lei 11.960/2009. 7. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 461 do CPC. (TRF4, APELREEX 5009163-30.2011.404.7001, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio Kipper) Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 13/04/2015) (Grifei)
Em relação à atividade de vigilante, a jurisprudência do STJ e da 3ª Seção desta Corte firmou entendimento no sentido de que, até 28/04/1995, é possível o reconhecimento da especialidade da profissão de vigia ou vigilante por analogia à função de guarda, tida por perigosa (código 2.5.7 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64), independentemente de o segurado portar arma de fogo no exercício de sua jornada laboral (REsp º 541377/SC, 5ª Turma, Min. Arnaldo Esteves Lima, DJU 24/04/2006; EIAC n.º 1999.04.01.082520-0, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, DJU 10-04-2002, Seção 2, pp. 425-427). Após, necessária a comprovação de porte de arma, mediante apresentação de qualquer meio de prova, até 05/03/1997, e, a partir de então, por meio de laudo técnico ou perícia judicial.
Assim, merece ser reconhecida como atividade especial, sendo suficiente o registro desse labor na CTPS os períodos de 17 de março de 1976 a 21 de abril de 1977; de 1º de dezembro de 1987 a 12 de março de 1989; de 4 de dezembro de 1990 a 15 de junho de 1991.
Em relação aos ofícios de cobrador e servente, os registros na CTPS contemporâneos a época da atividade profissional devem ser utilizadas como prova suficiente, ainda mais que não trouxe nada para comprovar as alegações de que ficou exposto, em caráter habitual e permanente, a agentes nocivos a sua saúde ou à integridade física, além de fotocópia da CTPS. Para tais profissões, inexiste previsão de enquadramento automático por categoria profissional na legislação de regência.
Mesmo verificando, o nome fantasia das empresas contratantes da parte autora, nota-se a atuação no ramo de limpeza em geral, seja de construção como de prédios, e além disso a atuação no ramo turístico. Por isso, acolho o entendimento do Juízo, pois o ramo de atividade das empresas, analisando-se a atividade profissional registrada na CTPS, não deixa antever o desempenho de labor em condições especiais.
Desse modo, o autor faz jus somente à conversão do tempo de serviço prestado na função de vigia/vigilante e de frentista, nos intervalos de 17 de março de 1976 a 21 de abril de 1977; de 1º de dezembro de 1987 a 12 de março de 1989; de 4 de dezembro de 1990 a 15 de junho de 1991, de 4 de janeiro de 1993 a 1º de março de 1993 e 2 de janeiro de 1994 a 31 de agosto de 1994.
PERÍODOS LABORADOS COMO SEGURADO MARÍTIMO.
Tomo como razões de decidir o entendimento do Exmo. Juiz Federal Osni Cardoso Filho na Sentença proferida, onde fundamentou ser possível o enquadramento da atividade de marítimo como especial, ante a previsão expressa da função no item 2.4.2 do quadro Anexo I do Decreto n. 53.831.64 e, bem assim, no item 2.4.4 do Anexo I do Decreto n. 83.080.79.
Assegura-se, desde logo, a contagem majorada dos períodos em que o segurado estiver embarcado, de modo que a cada 255 (duzentos e cinquenta e cinco) dias nessa condição, faça jus ao equivalente a um ano de trabalho em terra (art. 54, § 1º, do Decreto n. 83.080.79). É o que impunha, mais recentemente, a redação do art. 57, parágrafo único, do Decreto n. 2.172, de 5 de março de 1997:
Art. 57. Considera-se tempo de serviço o tempo, contado de data a data, desde o início até a data do requerimento ou do desligamento de atividade abrangida pela previdência social, descontados os períodos legalmente estabelecidos como de suspensão de contesto de trabalho, de interrupção de exercício e de desligamento da atividade.
Parágrafo único. No caso de segurado marítimo cada 255 dias de embarque em navios nacionais, contados da data do embarque à do desembarque, equivalem a um ano de atividade em terra, obtida essa equivalência pela proporcionalidade de 255 meses de embarque, no mínimo, para 360 meses em terra, no mínimo.
Todavia, para a utilização da contagem especial do tempo de serviço, é fundamental a comprovação de que houve o embarque do segurado marítimo nos períodos solicitados.
De suas carteiras de pescador expedidas pelo Ministério da Marinha (cf. evento 1, CTPS9, CTPS10 e CTPS11), é possível extrair as seguintes datas de embarque e desembarque:
Insisto que, por manifesta ausência de interesse processual, não foram incluídos na planilha acima os intervalos de: 28/5/1973 a 29/8/73; 17/10/73 a 9/1/1974; 14/3/1974 a 6/10/1974; 11/4/1975 a 23/4/1975; 20/6/1975 a 17/10/1975; 27/6/1977 a 11/8/1977; 26/8/1977 a 9/9/1977; 26/8/1977 a 9/9/1977; 13/9/1977 a 21/12/1977; 31/1/1978 a 22/3/1978; 27/3/1978 a 2/6/1978; 23/6/1978 a 14/9/1978; 20/9/1978 a 11/12/1978; 5/5/1980 a 15/9/1980; 1/10/1980 a 28/11/1980; 23/2/1981 a 14/10/1981; 23/4/1982 a 28/6/1982; 4/5/1983 a 19/8/1983; 30/1/1984 a 13/6/1984; 1/2/1985 a 8/4/1985; 17/4/1985 a 27/9/1985; 28/4/1986 a 22/5/1986; 26/5/1986 a 23/6/1986; 23/9/1986 a 15/12/1986; e 22/5/1989 a 17/10/1989; cuja especialidade já restou reconhecida pela autarquia previdenciária no âmbito administrativo (cf. evento 43, PROCADM1). De outra banda, foram desconsiderados os períodos posteriores à data de entrada do requerimento (14 de setembro de 1998).
Assim, considerando a presunção de veracidade que paira sobre as informações contidas nesses documentos, deve ser reconhecido o direito à conversão do tempo de serviço laborado como segurado marítimo, com a aferição da equivalência entre mar e terra.
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM PARA FINS DE APOSENTADORIA
O demandante busca a conversão de tempo de serviço exercido sob condições especiais em tempo de serviço comum, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O art. 57, § 5º, da Lei 8.213/91 estabelecia a possibilidade de converter o tempo de serviço especial em comum. Por força do art. 28 da MP 1.663-10, de 28/05/1998, o referido parágrafo havia sido revogado, com a finalidade de vedar a possibilidade de conversão de tempo especial em comum, após 28/05/1998. Quando convertida na Lei 9.711/98, contudo, a revogação do art. 57, § 5º, da Lei 8.213/91 não foi mantida. Nesse sentido é o entendimento do STJ, firmado nos temas 422 e 423 dos recursos repetitivos:
"EMENTA [...] PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO. 1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991. [...] 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido." (REsp 1151363 MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)
Esse entendimento é de observância obrigatória, nos termos do art. 927, do CPC.
Ainda, o Decreto nº 4.827, de 03 de setembro de 2003 alterou o art. 70 do Decreto nº 3.048/99, permitindo a conversão do tempo de serviço especial em comum a qualquer tempo. Da mesma forma o INSS assegura o direito de conversão do tempo de serviço especial em comum para qualquer tempo, nos termos do art. 256 da IN 77/2015:
"Art. 256. O tempo de trabalho exercido sob condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, conforme a legislação vigente à época da prestação do serviço será somado após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, qualquer que seja o período trabalhado, aplicando- se para efeito de concessão de qualquer benefício, a tabela de conversão constante no Anexo XXVIII."
Esse dispositivo demonstra que o próprio INSS vem reconhecendo a atividade especial, quando comprovada, em períodos anteriores a 1980. Nesse ponto deve ser rejeitada a tese de ser vedada a possibilidade de conversão, em período anterior a 10/12/1980. Tal vedação resultaria em prejuízo do trabalhador, indo de encontro ao objetivo da Lei 6.887/80, a qual buscou justamente possibilitar ao trabalhador aposentar-se antes da data em que se aposentaria, se simplesmente somasse os tempos de serviço, sem antes convertê-los, reparando, desse modo, os danos causados pelas condições adversas de trabalho. Nessa linha, entendo como perfeitamente possível a conversão de atividade especial em comum antes da Lei nº 6.887/80.
Quanto ao fator de conversão, deve ser utilizado o parâmetro vigente no momento da aposentação, aplicando-se o multiplicador 1,40, para homem, e 1,20, para mulher. Esse critério segue o entendimento firmado pelo STJ nos temas 422 e 423 dos recursos repetitivos:
"Temas 422/423 - Fator de conversão
EMENTA [...] CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. OBSERVÂNCIA DA LEI EM VIGOR POR OCASIÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. DECRETO N. 3.048/1999, ARTIGO 70, §§ 1º E 2º. FATOR DE CONVERSÃO. EXTENSÃO DA REGRA AO TRABALHO DESEMPENHADO EM QUALQUER ÉPOCA. 1. A teor do § 1º do art. 70 do Decreto n. 3.048/99, a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho. 2. O Decreto n. 4.827/2003, ao incluir o § 2º no art. 70 do Decreto n. 3.048/99, estendeu ao trabalho desempenhado em qualquer período a mesma regra de conversão. Assim, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento. 3. A adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático e não de regra previdenciária. 4. Com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/1999, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pela regra da tabela definida no artigo 70 (art. 173 da Instrução Normativa n. 20/2007). 5. Descabe à autarquia utilizar da via judicial para impugnar orientação determinada em seu próprio regulamento, ao qual está vinculada. Nesse compasso, a Terceira Seção desta Corte já decidiu no sentido de dar tratamento isonômico às situações análogas, como na espécie (EREsp n. 412.351/RS). 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp 1151363 MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)"
Com base nesses fundamentos, os segurados do Regime Geral da Previdência Social que trabalhem sob condições especiais podem converter o tempo de serviço especial em tempo de serviço comum, mesmo antes de 10/12/1980 e após 28/05/1998, com a aplicação dos fatores de conversão estabelecidos na legislação vigente no momento da aposentadoria.
DIREITO À APOSENTADORIA E FORMA DE CÁLCULO DO BENEFÍCIO
O direito à aposentadoria antes da Emenda Constitucional nº 20/98 surgia para o segurado homem com 30 anos de serviço e para a mulher com 25 anos, eis que prevista a possibilidade de concessão do benefício de forma proporcional. Com o advento da referida emenda, ocorreram grandes mudanças nas regras de concessão da aposentação. Porém, o art. 3º da inovação constitucional assegurou a concessão de aposentadoria e pensão, a qualquer tempo, aos segurados do RGPS, bem como aos seus dependentes, que, até a data da publicação da Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.
Da mesma forma, a Lei 9.876/99 que mudou o cálculo do valor do salário-de-benefício, instituindo o fator previdenciário, determinou em seu art. 6° que o segurado que até o dia anterior à data de publicação da Lei tenha cumprido os requisitos para a concessão de benefício teria o cálculo da sua renda mensal inicial segundo as regras até então vigentes. Dessa forma, a aquisição do direito à concessão da aposentadoria possui três marcos aquisitivos, nos quais se verifica a situação do segurado nesses momentos, calculando-se o coeficiente da renda mensal inicial, de acordo com o tempo de serviço do segurado em cada um desses momentos. Significa que o segurado, para ter aplicado à sua aposentadoria a forma de cálculo do salário-de-benefício de acordo com a EC nº 20/98 ou Lei nº 9.876/99, não poderá contar tempo posterior às respectivas datas dessas normas, para o aumento de coeficiente de cálculo.
Nesse diapasão, com base no respeito ao direito adquirido, pode-se resumir a situação dos segurados, conforme o implemento dos requisitos para aposentadoria e o método de cálculo de seus benefícios da seguinte forma:
Situação 1 - Direito adquirido até a EC 20/98
1.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 15/12/1998, de acordo com o art. 202, II da CF/88, antes EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da lei 8.213/91
1.2 Aposentadoria proporcional: 25 anos de serviço (mulheres) / 30 anos de serviço (homens) / 70 % da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 15/12/1998 + 6% a cada ano adicional até essa data, como determina o art. 202, §1º da CF/88, antes da EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da Lei 8.213/91
Situação 2 - Direito adquirido até a Lei 9.876/99
2.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 28/11/1999, conforme o art. 201, § 7º da CF/88, com redação dada pela EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da lei 8.213/91
2.2 Aposentadoria proporcional: para os segurados já vinculados ao RGPS antes de 15/12/1998 (EC 20/98) / 25 anos de serviço e idade de 48 anos (mulheres) / 30 anos de serviço e idade de 53 anos (homens) + 40% do tempo faltante até 15/12/98 (pedágio) / 70% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 28/11/1999, + 5% a cada ano adicional até essa data, com fundamento no art. 9º, § 1º, inc. I e II da EC 20/98 c/c redação original do art. 29 da lei 8.213/91
Situação 3 - Direito adquirido após a Lei 9.876/99
3.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição desde julho de 94 com fator previdenciário, de acordo com o art. 201, § 7º da CF/88, com redação dada pela EC 20/98 c/c art. 29 da lei 8.213/91, redação dada pela lei 9.876/99, e art. 53 da Lei 8.213/91 e art. 39, IV do Decreto 3.048/99
3.2 Aposentadoria Proporcional: para os segurados já vinculados ao RGPS antes de 15/12/1998 (EC 20/98) / 25 anos e idade de 48 anos (mulheres) / 30 anos e idade de 53 anos (homens) + 40% do tempo faltante até 15/12/98 (pedágio) / 70% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição desde julho de 94 com fator previdenciário + 5% a cada ano adicional, conforme o art. 9º, § 1º, inc. I e II da EC 20/98 c/c art. 3º da lei 9.876/99
No caso concreto, tendo em vista que o pedido da parte autora é referente ao pedido administrativo de 14/09/1998 (Evento 43), devem ser aplicadas as normas previdenciárias anteriores a EC 20/98, já citadas.
Na data da simulação promovida pelo Instituto Nacional do Seguro Social (14 de setembro de 1998), o segurado contava com 25 anos, 3 meses e 2 dias de tempo de contribuição (cf. evento 43, PROCADM1, p. 15). Acrescida a fração de 41% (quarenta e um por cento) decorrente da conversão do tempo embarcado (1 ano e 1 dia) - excluído o período posterior à DER -, bem como computados os 40% (quarenta por cento) do tempo especial acolhido, o autor não alcançou 30 anos de tempo de serviço.
Nesse aspecto, não lhe ampara o direito à aposentadoria por tempo de serviço, mesmo proporcional, porquanto até a Emenda Constitucional n. 20, não detinha 30 (trinta) anos de serviço.
Considerando a situação previdenciária atual da parte autora, Aposentado por Idade conforme Evento 10, deverão ser computados os períodos reconhecidos como atividade especial, com o pagamento de diferenças no beneficio previdenciário de Aposentadoria por Idade desde a DIB (28/12/2012)
O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador, gerando efeitos financeiros ao segurado que já é beneficiário do RGPS na revisão da Renda Mensal Inicial
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública passa por situação de grande incerteza quanto aos critérios que devem ser utilizados. Pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810), a partir da vigência da Lei 11.960/09.
O recente art. 491 do CPC/2015, segundo o qual os consectários devem ser definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às peculiaridades do caso concreto. Nesse sentido o seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido.
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a sua definição.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentada a possibilidade de diferir para a fase de execução a análise das teses referentes a juros de mora e à correção monetária (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, restando prejudicada a remessa necessária, no ponto.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Mantenho a verba honorária prevista na Sentença, pois de acordo com o provimento final da demanda, sendo vencido em maior parte a parte autora, e seguindo o entendimento da Corte durante a vigência do CPC/73 em vigor na publicação da Sentença. Reafirmo o comando sentencial:
"Sucumbente na maior parte do seu pedido (art. 21, parágrafo único, do Código de Processo Civil), condeno o autor ao pagamento das despesas processuais e de honorários de advogado arbitrados em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa, cuja cobrança permanecerá sobrestada até modificação favorável de sua situação econômica, face ao deferimento do benefício da justiça gratuita."
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
TUTELA ESPECÍFICA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis. Assim, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação/revisão do benefício da parte autora (NB 1597950502/41), a ser efetivada em 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
CONCLUSÃO
Reformada em parte a Sentença, para reconhecer a atividade especial durante o período em que a parte autora trabalhou como vigia/vigilante e frentista, não preenchendo o tempo de serviço para Aposentadoria por Tempo de Contribuição, sendo devida a averbação do tempo de serviço reconhecido como especial e seu acréscimo, devendo ser promovida a revisão da Aposentadoria por Idade que atualmente é titular, e o pagamento das diferenças desde a DER, prejudicado o exame do critério de aplicação dos juros e correção monetária.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao Apelo do INSS e à remessa oficial, dar parcial provimento ao Apelo da parte autora, e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Ezio Teixeira
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/11/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000683-77.2013.4.04.7200/SC
ORIGEM: SC 50006837720134047200
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | JOSÉ FRANCISCO DA SILVA |
ADVOGADO | : | VALDOR ÂNGELO MONTAGNA |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/11/2016, na seqüência 683, disponibilizada no DE de 24/10/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA, E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8699685v1 e, se solicitado, do código CRC E8BCD117. | |
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