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DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. BENRALIZUMABE. ASMA BRÔNQUICA GRAVE (CID. 10 J 45. 9) FENÓTIPO EOSINFÍLICO. DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDA...

Data da publicação: 12/07/2020, 01:15:39

EMENTA: DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. BENRALIZUMABE. ASMA BRÔNQUICA GRAVE (CID.10 J 45.9) FENÓTIPO EOSINFÍLICO. DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. SOLIDARIEDADE DOS ENTES. DIRECIONAMENTO DA OBRIGAÇÃO PARA A UNIÃO. PRAZO PARA CUMPRIMENTO. 1. A saúde é um direito social fundamental de todo o cidadão, nos termos dos artigos 6º e 196 da Constituição Federal, sendo dever do Estado garantir "acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". 2. O STF, no julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada n. 175, estabeleceu os seguintes critérios que devem ser analisados nas ações que versem sobre prestações na área da saúde: (a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA (só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99) e (d) a não configuração de tratamento experimental. 3. Faz jus ao medicamento custeado pelo Poder Público a parte que demonstrar a necessidade e adequação do tratamento, bem como esgotamento das alternativas prevista no sistema público e a indicação foi corroborada por perícia judicial. 4. Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada no dia 23/05/2019, por maioria, fixou a seguinte tese de repercussão geral (Tema 793): "Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro". 5. Obrigação direcionada à União, tendo em vista que que a incorporação de novas tecnologias ao SUS é matéria atribuída pela Lei nº 8.080/90 ao Ministério da Saúde, nos termos do art. 19-Q do referido diploma legal. 6. Adequação do prazo para de 20 (vinte) dias para cumprimento da tutela antecipatória por mostrar-se mais razoável. (TRF4, AG 5010053-05.2020.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 08/07/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5010053-05.2020.4.04.0000/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: MARLENE CANDIDA MARCHI BARROS

RELATÓRIO

Trata-se de agravo de instrumento no qual a União se insurge contra decisão que deferiu o pedido de antecipação de tutela para fornecimento do medicamento Benralizumabe, para tratamento de asma brônquica grave (CID.10 J 45.9) fenótipo eosinfílico.

Sustenta, em síntese, que há política pública para o tratamento da doença da autora (Portaria nº 603/2014), não buscando a autora tratamento, mas sim o "melhor tratamento". Aduz que há necessidade de se comprovar a hipossuficiência da autora, o que não foi possível de ser verificado, por não terem sido juntados contracheques nem declaração de renda. Defende a necessidade de ampliação do prazo para cumprimento da antecipação de tutela, de redirecionamento da obrigação ao ente pertinente, com a divisão do ônus financeiro "pro rata" e administrativamente. Requer a atribuição de efeito suspensivo e, ao final, a reforma da decisão.

O pedido de atribuição de efeito suspensivo foi parcialmente deferido.

Com contrarrazões, vieram os autos.

É o relatório.

VOTO

Por ocasião da apreciação do pedido de efeito suspensivo, assim me manifestei:

"O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Não se trata de direito absoluto, uma vez que é desarrazoado exigir do Estado custear todo e qualquer tratamento de saúde aos cidadãos, sob pena de instaurar uma desordem administrativa e inviabilizar o funcionamento do SUS.

É certo que a atribuição de formular e implantar políticas públicas na defesa da saúde da população é do Executivo e do Legislativo, entretanto, não pode o Judiciário se furtar de seu múnus público quando chamado para apreciar alegações de desrespeito a direitos fundamentais individuais e sociais, entre eles o direito à saúde do cidadão.

O egrégio Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 17/03/2010, no Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada 175, definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde:

(a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente;

(b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente;

(c) a aprovação do medicamento pela ANVISA; e

(d) a não configuração de tratamento experimental.

Na mesma senda, o egrégio Superior Tribunal de Justiça estabeleceu requisitos para fins de concessão de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (REsp 1657156/RJ, rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, DJe 04/05/2018).

O leading case está assim ementado:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 106. JULGAMENTO SOB O RITO DO ART. 1.036 DO CPC/2015. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO CONSTANTES DOS ATOS NORMATIVOS DO SUS. POSSIBILIDADE. CARÁTER EXCEPCIONAL. REQUISITOS CUMULATIVOS PARA O FORNECIMENTO.
1. Caso dos autos: A ora recorrida, conforme consta do receituário e do laudo médico (fls. 14-15, e-STJ), é portadora de glaucoma crônico bilateral (CID 440.1), necessitando fazer uso contínuo de medicamentos (colírios: azorga 5 ml, glaub 5 ml e optive 15 ml), na forma prescrita por médico em atendimento pelo Sistema Único de Saúde - SUS. A Corte de origem entendeu que foi devidamente demonstrada a necessidade da ora recorrida em receber a medicação pleiteada, bem como a ausência de condições financeiras para aquisição dos medicamentos.
2. Alegações da recorrente: Destacou-se que a assistência farmacêutica estatal apenas pode ser prestada por intermédio da entrega de medicamentos prescritos em conformidade com os Protocolos Clínicos incorporados ao SUS ou, na hipótese de inexistência de protocolo, com o fornecimento de medicamentos constantes em listas editadas pelos entes públicos. Subsidiariamente, pede que seja reconhecida a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado por outros já padronizados e disponibilizados.
3. Tese afetada: Obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (Tema 106).
Trata-se, portanto, exclusivamente do fornecimento de medicamento, previsto no inciso I do art. 19-M da Lei n. 8.080/1990, não se analisando os casos de outras alternativas terapêuticas.
4. TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015 A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
(ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
(iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.
5. Recurso especial do Estado do Rio de Janeiro não provido. Acórdão submetido à sistemática do art. 1.036 do CPC/2015.

Cabe referir que, com a finalidade de criar uma diretriz institucional para a dispensação de medicamentos no âmbito do SUS, em especial diante da necessidade de incorporar novas tecnologias cuja eficácia e adequação fossem comprovadas, de modo a constituirem-se em parte da assistência terapêutica integral fornecida pelo SUS, foi alterada a Lei nº 8.080/90 pela Lei nº 12.401/2011, que criou um procedimento, a cargo do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS - CONITEC.

De especial interesse para a apreciação do caso concreto, os artigos 19-M e 19-Q, fornecem diretrizes para a dispensação medicamentosa que considero relevantes:

Art. 19-M. A assistência terapêutica integral a que se refere a alínea d do inciso I do art. 6o consiste em:

I - dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde, cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art. 19-P;

“Art. 19-P. Na falta de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, a dispensação será realizada:

I - com base nas relações de medicamentos instituídas pelo gestor federal do SUS, observadas as competências estabelecidas nesta Lei, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada na Comissão Intergestores Tripartite;

II - no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de forma suplementar, com base nas relações de medicamentos instituídas pelos gestores estaduais do SUS, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada na Comissão Intergestores Bipartite;

III - no âmbito de cada Município, de forma suplementar, com base nas relações de medicamentos instituídas pelos gestores municipais do SUS, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada no Conselho Municipal de Saúde.”

“Art. 19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.

Observa-se que foi definido legalmente conceito de assistência integral de saúde de forma mais restrita, buscando equilibrar a necessidade do cidadão de um tratamento que seja mais eficaz e os limitados recursos do sistema de saúde para alcançar esta finalidade.

Considero que tais parâmetros encontram-se dentro daquilo que razoavelmente pode ser exigido do Estado pelo cidadão, levando em consideração o princípio da isonomia e os termos do princípio da reserva do possível. Ou seja, na dispensação medicamentosa deve-se levar em consideração o alcance do medicamento a todos os cidadãos em situação similar o que, no caso de medicamentos de alto custo, deve ser não somente possível, mas também sustentável.

Deste modo, a atuação do Judiciário em seara que não é de sua natural ambientação, uma vez que se ingressa no âmbito da discricionariedade administrativa, se qualifica e justifica quando visa assegurar o efetivo fornecimento de medicamentos ou outras prestações de saúde integrados à política de saúde vigente e que não estejam sendo fornecidos ou, excepcionalmente, quando o SUS não fornece tratamento eficaz, não oferece qualquer tratamento ou, ainda, quando, especialmente quando se trata de aumento de sobrevida ou de qualidade de vida, quando o medicamento apresenta eficácia diversa da opção indicada pelo SUS, sendo, de qualquer sorte, de se buscar observar as diretrizes da CONITEC, nos termos do art. 19-Q da Lei nº 8.080/90, naquilo que se revele adequado.

Caso concreto

A decisão agravada é do seguinte teor (Evento 54 - DESPADEC1):

"(...)

Caso concreto.

Narra, a demandante, ser portadora de asma brônquica grave (CID.10 J 45.9) fenótipo eosinfílico, cuja prescrição médica indica a adoção do medicamento Benralizumab, não fornecido pelo sistema público de saúde.

In casu, o laudo médico (EVENTO1-LAUDO8), e demais documentos carreados com a inicial, revelam que:

- O medicamento está registrado na ANVISA;

- a medicação não é disponibilizada pelo SUS;

- já foi submetida a outras terapêuticas, sem resposta;

- não há outras opções terapêuticas no Âmbito do SUS;

- há indicação de urgência na realização do tratamento, com início de tratamento imediato, sob risco de grave piora da função pulmonar, com risco de morte.

Outrossim, submetido o caso autoral à elaboração de perícia o diagnóstico e a prescrição medicamentosa (EVENTOS 29 e 52) foram ratificados na hipótese (EVENTO 52), apesar da dúvida inicial da perita (EVENTO 29) conforme considerações que seguem:

" EVENTO 29

...

7.2 diagnósticos clínico e através de exames como a espirometria: cujo laudo é Distúrbio Ventilatório Obstrutivo Grave com redução da Capacidade Vital forçada, leia-se: a capacidade pulmonar dela deveria ser em litros: 2,59 L e ela tem: 0,600 L.

...

7.6 Este caso me gerou algumas dúvidas, gostaria de ter acesso a mais alguns exames, por exemplo: tomografia de seios da face, tomografia de tórax de alta resolução, nasovideolaringoscopia acompanhada de fonoaudiólogo para excluir disfagia, IGE total sequencial dos últimos 2 a 3 anos – para ver se o Omalizumabe, que é mais barato não poderia ser usado, e ainda broncoscopia para excluir algumas hipóteses mais raras como: traqueomalácia que é comum em idosos, e também PHmetria para excluir a hipótese de refluxo gastroesofágico. Enfim as condições não são precisas, e não tenho certeza nem alta carga de probabilidade, apesar da melhora muito importante e do entusiasmo da paciente e familiares.

...

7.12. Nenhum outro esclarecimento
Evidências científicas para o uso do Fasenra (Benralizumabe): Vide estudo SIROCO e CALIMA que evidenciam uma redução da taxa de exacerbações (crise de asma) em torno de 45% e 36 % respectivamente, os mesmos estudos houve aumento do VEF1 (capacidade expiratória) no primeiro ano do estudo de 398 ml e de 330 ml, e melhora do teste de qualidade de vida – Saint Jorge e ACQ6. E ainda, o tratamento, baseado nos estudos atuais após o segundo ano de uso, segundo o estudo BORA, reduz para 26 % as taxas de exacerbações anuais.

...

EVENTO 52

...

A paciente realizou novos exames, conforme minha solicitação após última pericia, os exames excluem a possibilidade do uso de Omalizumabe, pois a Ige sérica da paciente – exame definidor para uso desta droga/medicamento é abaixo do mínimo, e realizou também uma tomografia que constatou a presença de broquiectasias, que é uma doença associada a casos de Asma Grave. Concluo portanto que a paciente realmente tem indicação do uso do medicamento Fasenra, devido a gravidade de sua doença: Asma Grave – Alérgica – de difícil controle já com tratamento no Step 4 – última fase.

..."

A jurisprudência também favorece a parte autora:

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. ASMA GRAVE. BENRALIZUMABE (FASENRA®). MEDICAMENTO AUSENTE DAS LISTAS DE DISPENSAÇÃO DO SUS. REQUISITOS. ESGOTAMENTO DAS OPÇÕES DO SUS. VANTAGEM TERAPÊUTICA EVIDENCIADA. MEDICINA BASEADA EM EVIDÊNCIAS. SOLIDARIEDADE PASSIVA. TEMA 793/STF. MULTA DIÁRIA. 1. A concessão de medicamento que não conste das listas de dispensação do Sistema Único de Saúde (SUS) deve atender aos seguintes requisitos: (a) a inexistência de tratamento ou medicamento, similar ou genérico, oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem resultado prático ao paciente ou sua inviabilidade, em cada caso, devido a particularidades que apresenta; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento para a moléstia especificada; (c) a sua aprovação pela ANVISA; e (d) a não-configuração de tratamento experimental. 2. Demonstrada a imprescindibilidade do medicamento para a sobrevivência do paciente, cuja eficácia encontra-se amplamente respaldada na medicina baseada em evidências, cabível o deferimento judicial do pedido. 3. Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. Orientação firmada no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal. 4. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região pacificou o entendimento de que, ressalvadas situações excepcionais, a astreinte deve ser ordinariamente arbitrada em R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento. (TRF4, AG 5024653-65.2019.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 06/02/2020)

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. ASMA GRAVE. BENRALIZUMABE (FASENRA®). MEDICAMENTO AUSENTE DAS LISTAS DE DISPENSAÇÃO DO SUS. REQUISITOS. ESGOTAMENTO DAS OPÇÕES DO SUS. VANTAGEM TERAPÊUTICA EVIDENCIADA. MEDICINA BASEADA EM EVIDÊNCIAS. SOLIDARIEDADE PASSIVA. TEMA 793/STF. MULTA DIÁRIA. 1. A concessão de medicamento que não conste das listas de dispensação do Sistema Único de Saúde (SUS) deve atender aos seguintes requisitos: (a) a inexistência de tratamento ou medicamento, similar ou genérico, oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem resultado prático ao paciente ou sua inviabilidade, em cada caso, devido a particularidades que apresenta; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento para a moléstia especificada; (c) a sua aprovação pela ANVISA; e (d) a não-configuração de tratamento experimental. 2. Demonstrada a imprescindibilidade do medicamento para a sobrevivência do paciente, cuja eficácia encontra-se amplamente respaldada na medicina baseada em evidências, cabível o deferimento judicial do pedido. 3. Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro. Orientação firmada no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal. 4. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região pacificou o entendimento de que, ressalvadas situações excepcionais, a astreinte deve ser ordinariamente arbitrada em R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento. (TRF4, AG 5026719-18.2019.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 06/12/2019)

Conclui-se, assim, que há elementos suficientes para sustentar a indicação da medicação no presente caso, em regime de urgência, conforme explicitado acima.

Partindo de tais premissas e considerando a imprescindibilidade do medicamento pleiteado, verifica-se a presença dos requisitos que autorizam a concessão da tutela antecipada.

A terapêutica indicada é por tempo indeterminado, em uso contínuo, da medicação FASENRA (BENRALIZUMABE) na dose de 30 mg, de uso contínuo (01 dose/ampola por mês, nos 3 primeiros meses), totalizando 90 mg. Após esse período a dosagem reduz para 1 dose/ampola de 30m a cada 60 dias (30 mg).

Cabe reconhecer, neste passo, que a medicação exige o dispêndio de valores não suportáveis pela renda familiar da parte requerente, não possuindo outros meios de garantir o fornecimento da medicação necessária.

Reputo, porém, mais adequado deferir parte da medicação neste momento, a fim de possibilitar a verificação de sua eficácia no caso concreto, antes de conferir a totalidade do tratamento requerido. Ademais, antes de ser deferida mais medicação, é imperioso aferir se, de fato, houve efetivo benefício a parte demandante.

Em pesquisa junto ao comércio farmacológico da cidade, o menor valor encontrado para o medicamento FASENRA (BENRALIZUMABE) foi de R$ 14.650,00, a unidade/ampola. Considerando que a Autora necessita de 01 dose/ampola por mês, nos 3 primeiros meses, e, após esse período, 01 dose/ampola de 30m a cada 60 dias (30 mg), para o tratamento de sete meses, são necessárias 05 ampolas, somando o valor total de R$ 73.250,00.

Presente, ainda, o periculum in mora (derivado da própria urgência que envolve o direito à saúde), a autorizar o deferimento da antecipação de tutela, especialmente sobre o risco de óbito da Demandante..

ANTE O EXPOSTO, defiro o pedido de tutela de urgência, determinando, aos Réus, o fornecimento da medicação requerida, nas doses e periodicidade indicadas na prescrição médica, cumprindo-lhes fornecer, em 10 (dez) dias, 05 ampolas o medicamento FASENRA (BENRALIZUMABE), suficiente para sete meses, cujo valor total importa em R$ 73.250,00. A dispensação pode ser parcelada, e continuada, na via administrativa, enquanto houver indicação médica.

(...)"

Da resposta ao quesito 7.5 (Evento 29 - LAUDO1), a autora já esgotou as alternativas disponíveis no SUS.

No Laudo complementar (Evento 52 - LAUDO1), a perita informou, ainda, que não há indicação para o uso de Omalizumabe "pois a Ige sérica da paciente – exame definidor para uso desta droga/medicamento é abaixo do mínimo, e realizou também uma tomografia que constatou a presença de broquiectasias, que é uma doença associada a casos de Asma Grave. Concluo portanto que a paciente realmente tem indicação do uso do medicamento Fasenra, devido a gravidade de sua doença: Asma Grave – Alérgica – de difícil controle já com tratamento no Step 4 – última fase".

Nesse ponto, a decisão recorrida analisou bem a situação, não havendo razão para sua reforma.

No que se refere à hipossuficiência da autora, conforme se extrai dos documentos juntados no Evento 6, a única fonte de renda da autora é proveniente da aposentadoria por tempo de contribuição de seu marido no valor de R$ 2.401,51. resta, portanto, demonstrada a sua hipossuficência para aquisição do medicamento ora requerido.

Quanto ao direcionamento da obrigação, custeio e reembolso das despesas entre os réus, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada no dia 23/05/2019 , por maioria, fixou a seguinte tese de repercussão geral (Tema 793):

“Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.

Desse modo, tanto a União, como os Estados e os Municípios são parte legítima para ocupar o polo passivo nas ações de medicamento.

No entanto, o cumprimento das decisões judiciais nessa área deve ser direcionado conforme as regras de repartição de competências. Com base nessas mesmas regras, deve ser determinado o ressarcimento daquele ente que suportou o ônus financeiro, acaso não seja ele o responsável pelo cumprimento da prestação nos termos das regras de repartição de competências.

Assim sendo, considerando-se que a incorporação de novas tecnologias ao SUS é matéria atribuída pela Lei nº 8.080/90 ao Ministério da Saúde, nos termos do art. 19-Q do referido diploma legal, é da União a responsabilidade de suportar o ônus financeiro da dispensação de medicamento que ainda não se encontra disponível na rede pública, ressalvado o direito de ressarcimento acaso se pactue em comissão tripartite distribuição diversa de competências, caso em que a compensação deverá se efetuar na esfera administrativa.

Cabe ressalvar, no entanto, que o fato de a União ser responsável pelo custeio do medicamento não desobriga o ERGS de fornecer o apoio logístico necessário para que o medicamento seja entregue à autora.

Quanto ao prazo para cumprimento, tenho que o prazo de 05 dias não se mostra razoável ao cumprimento da medida, tendo em conta os procedimentos necessários à aquisição do medicamento. Assim, concedo o prazo de 20 dias úteis para cumprimento da decisão, nos termos do que vem sendo decidido por esta Corte.

Ante o exposto, defiro em parte o pedido de atribuição de efeito suspensivo ao recurso, para fixar o prazo de 20 dias úteis para a entrega do medicamento em questão, nos termos da fundamentação."

Com efeito, não havendo novos elementos capazes de ensejar a alteração do entendimento acima esboçado, deve ser mantida a decisão, por seus próprios e jurídicos fundamentos.

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo de instrumento, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001845166v2 e do código CRC cb7efa0c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 16/6/2020, às 20:50:21


5010053-05.2020.4.04.0000
40001845166.V2


Conferência de autenticidade emitida em 11/07/2020 22:15:38.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Agravo de Instrumento Nº 5010053-05.2020.4.04.0000/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: MARLENE CANDIDA MARCHI BARROS

EMENTA

Direito à saúde. fornecimento de medicamento. Benralizumabe. asma brônquica grave (CID.10 J 45.9) fenótipo eosinfílico. DEMONSTRAÇÃO DA IMPRESCINDIBILIDADE DO FÁRMACO. SOLIDARIEDADE dos entes. direcionamento da obrigação para a União. prazo para cumprimento.

1. A saúde é um direito social fundamental de todo o cidadão, nos termos dos artigos 6º e 196 da Constituição Federal, sendo dever do Estado garantir "acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação".

2. O STF, no julgamento do Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada n. 175, estabeleceu os seguintes critérios que devem ser analisados nas ações que versem sobre prestações na área da saúde: (a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA (só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99) e (d) a não configuração de tratamento experimental.

3. Faz jus ao medicamento custeado pelo Poder Público a parte que demonstrar a necessidade e adequação do tratamento, bem como esgotamento das alternativas prevista no sistema público e a indicação foi corroborada por perícia judicial.

4. Plenário do Supremo Tribunal Federal, em sessão realizada no dia 23/05/2019, por maioria, fixou a seguinte tese de repercussão geral (Tema 793): “Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro”.

5. Obrigação direcionada à União, tendo em vista que que a incorporação de novas tecnologias ao SUS é matéria atribuída pela Lei nº 8.080/90 ao Ministério da Saúde, nos termos do art. 19-Q do referido diploma legal.

6. Adequação do prazo para de 20 (vinte) dias para cumprimento da tutela antecipatória por mostrar-se mais razoável.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 07 de julho de 2020.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Juíza Federal Convocada, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001845167v3 e do código CRC d6302a1a.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 8/7/2020, às 14:16:24


5010053-05.2020.4.04.0000
40001845167 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 11/07/2020 22:15:38.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 29/06/2020 A 07/07/2020

Agravo de Instrumento Nº 5010053-05.2020.4.04.0000/RS

RELATORA: Juíza Federal GISELE LEMKE

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI

AGRAVANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO

AGRAVADO: MARLENE CANDIDA MARCHI BARROS

ADVOGADO: PATRICIA MICHELON (OAB RS077495)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 29/06/2020, às 00:00, a 07/07/2020, às 14:00, na sequência 408, disponibilizada no DE de 18/06/2020.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 11/07/2020 22:15:38.

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