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DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MÉDICO. CIRURGIA. RIZOTOMIA DORSAL SELETIVA - RDS. SESSÕES DE FISIOTERAPIA PÓS-CIRÚRGICA. VERBAS INDENIZATÓRIAS...

Data da publicação: 16/12/2021, 07:01:29

EMENTA: DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MÉDICO. CIRURGIA. RIZOTOMIA DORSAL SELETIVA - RDS. SESSÕES DE FISIOTERAPIA PÓS-CIRÚRGICA. VERBAS INDENIZATÓRIAS. 1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 175, expressamente reconheceu e definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde, bem como a demonstração de evidências científicas para justificar o pedido. 2. Considerando todas as normas, que devem ser interpretadas de forma a integrá-las, pode-se concluir que o deferimento do pedido para o atendimento pós-cirúrgico, com a realização das sessões de fisioterapia, não implicam em julgamento genérico, tendo em vista que a prestação buscada tem nítido caráter periódico. 3. Comprovada documentalmente a necessidade dos procedimentos de reabilitação pós-cirúrgica, mantém-se a condenação dos réus no implemento dos referidos procedimentos, inclusive no tocante às sessões de fisioterapia. 4. Os honorários advocatícios não podem ser tratados como "despesa processual" para fins de ressarcimento dos gastos antecipados pela parte vencedora. Assim, a respectiva condenação, a título de parcela indenizatória, não é cabível. (TRF4, AC 5015235-17.2017.4.04.7003, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA, juntado aos autos em 08/12/2021)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015235-17.2017.4.04.7003/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: ANA CRISTINA DE FREITAS (AUTOR)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação da União e do Estado do Paraná contra sentença que julgou procedente a ação em que se buscou a realização de cirurgia de Rizotomia Dorsal Seletiva – RDS por ser a autora portadora de "Paralisia Cerebral com espasticidade refratária ao tratamento clínico", nos seguintes termos (ev. 217 do processo de origem):

3. Dispositivo

Diante do exposto, julgo parcialmente procedente a demanda, declarando extinto o processo, com resolução do mérito (art. 487, I, CPC), no sentido de acolher o pedido para condenar solidariamente os réus Estado do Paraná e União a tomarem as providências necessárias para que a autora realize o procedimento cirúrgico de Rizotomia Dorsal Seletiva - RDS, em Centro de Referência de Alta Complexidade em Neurologia/Neurocirurgia no Estado do Paraná, por médico especializado no assunto, bem como os procedimentos necessários à reabilitação pós-cirúrgica, tais como sessões de fisioterapias.

Mantenho integralmente a decisão que concedeu a tutela provisória de urgência no Evento 80.

Ressalto que, conforme manifestação de Evento 160, a parte autora já foi submetida ao procedimento cirúrgico pleiteado.

Deve a União, posteriormente, ressarcir ao Estado do Paraná o valor por este despendido, já que não consta ele, atualmente, da Portaria/GM/MS n. 1.554, de 30/07/2013.

Custas isentas (art. 4º, I e II, da Lei n.º 9.289/96).

3.1 Honorários de Sucumbência (art. 85 do CPC):

O novo CPC, acompanhando o Estatuto da OAB, transferiu a titularidade os honorários de sucumbência, antiga verba indenizatória do vencedor do processo, para o advogado. A jurisprudência infraconstitucional é pacífica sobre a validade desta transferência. No plano constitucional, entretanto, a questão está aberta, pois ainda pende de julgamento no STF a nova ADI 5055-DF, com pedido de inconstitucionalidade referente a essa transferência.

A questão da titularidade dos honorários de sucumbência não tem sido constitucionalmente debatida nos tribunais infraconstitucionais. Há nítido conflito de interesse entre o advogado e cliente, neste ponto. O jurisdicionado vencedor normalmente fica sem defensor, pois o advogado naturalmente prefere a defesa de seu interesse financeiro. A questão somente poderá ser mudada com eventual procedência da mencionada ADI no STF.

Nesse quadro, após tantas decisões declarando incidentalmente a inconstitucionalidade da referida transferência (seguindo os indicativos da anterior ADI 1.194-4-DF - votos dos Ministros Cezar Peluso, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Joaquim Barbosa) sem qualquer sucesso, resigno-me, com ressalva do antigo entendimento pessoal, passando a acompanhar a jurisprudência infraconstitucional, até eventual pronunciamento de inconstitucionalidade.

Assim, como determina o art. 85 do CPC, condeno a parte ré vencida a pagar ao advogado da parte autora, a título de honorários de sucumbência, a quantia de R$ 6.000,00 (R$2.000,00 para cada réu).

3.2 Verbas Indenizatórias (§2º do art. 82 e art. 84):

O novo CPC seguiu o princípio da reparação integral, determinando que o vencido pague ao vencedor as despesas que antecipou (§2ºdo art. 82). O art. 84 cita como despesas as custas, indenização de viagem, remuneração do assistente técnico e diária de testemunhas.

Parece óbvio que a lista do art. 84 é simplesmente exemplificativa, pois outras despesas indispensáveis ao processo poderão ocorrer, não devendo ficar sem reparação ou indenização, sob pena de descumprimento do princípio estampado no §2º do art. 82 e ferimento do devido processo legal substantivo.

A lista do art. 84 deixou de fora, por exemplo, a maior despesa que o jurisdicionado tem para realizar seu direito no Judiciário, os honorários pagos ao seu advogado. Esta despesa não pode ficar sem razoável indenização, sob pena do processo ficar defeituoso e o Judiciário injusto.

O STF, em decisão Plenária (RE 384.866 Goiás), explicitando o princípio do acesso ao Judiciário, proclamou que, tendo em vista a garantia constitucional relativa ao acesso ao Judiciário - inciso XXXV do art. 5ª da Carta de 1988 - é conducente assentar-se, vencedora a parte, o direito aos honorários advocatícios.

Não é certo que o jurisdicionado, vindo ao Judiciário para fazer valer seu direito, mesmo tendo seu pleito reconhecido, saia com prejuízo do valor gasto com seu advogado. Também não é razoável e nem mesmo racional que o jurisdicionado vencedor tenha que propor um outro processo para receber despesa do processo anterior.

Lei corporativa (arts. 22 e 23, Lei 8906/94) tomou a verba indenizatória do vencedor do processo (art. 20 do CPC de 1973). A desconformidade foi institucionalizada (art. 85 do CPC). Entretanto, o direito permanece difuso no ordenamento jurídico (arts. 399, 404 e 206, §5º, III, do Código Civil) e habita a casa da justiça, necessitando apenas de pequenos impulsos de esperança para transparecer e realizar-se.

A regra do § 2º do art. 82 do novo CPC, determinando que a sentença condene o vencido a pagar as despesas do processo, é impositiva e dirigida ao Juiz, dispensando a necessidade de pedido de indenização das despesas decorrentes do processo.

Nesse novo quadro, considerando que (1) os honorários de sucumbência foram transferidos (art. 85) para o advogado - além dos honorários contratuais, (2) a regra do § 2º do art. 82 é impositiva e dirigida ao Juiz, dispensando a necessidade de pedido, (3) os arts. 399, 404 e 206, §5º, III, do Código Civil indicam o reembolso de honorários e (4) o sentido da decisão do Plenário do STF acima citada (acesso ao Judiciário - direito do vencedor aos honorários), condeno o vencido a pagar ao vencedor uma indenização de honorários no valor de R$ 6.000,00 (R$2.000,00 para cada réu).

4. Encaminhamento de recurso

Interposta apelação, intime-se a parte contrária para, querendo, apresentar contrarrazões, no prazo legal. Com ou sem elas, remetam-se os autos ao E. TRF da 4ª Região, nos termos do art. 1.010, § 3º, do NCPC.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

O Estado do Paraná recorreu para que seja extinta, sem resolução do mérito, a demanda em relação ao pedido de realização de fisioterapia, assim como seja afastada a condenação genérica de fornecimento de qualquer procedimento necessário à reabilitação pós-cirúrgica, e, também, a condenação ao pagamento de verba indenizatória de sucumbência. Por fim, requereu fosse minorado o montante da verba honorária (ev. 227).

A União, por sua vez, apelou requerendo que o ressarcimento do procedimento cirúrgico realizado seja feito exclusivamente pela via administrativa, segundo os critérios de repartição pro rata, e, ainda, que seja afastada a condenação de indenização para pagamento dos honorários decorrentes de contratos firmados pela parte, vez que se trata de decisão extra-petita, neste aspecto (ev. 237).

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.

O Ministério Público Federal apresentou parecer pelo parcial provimento das apelações, no tocante à exclusão do pagamento das verbas indenizatórias (ev. 4).

É o relatório.

Peço dia para julgamento.

VOTO

Mérito

O direito fundamental à saúde é assegurado nos arts. 6º e 196 da Constituição Federal e compreende a assistência farmacêutica (art. 6º, inc. I, alínea d, da Lei n.º 8.080/90), cuja finalidade é garantir a todos o acesso aos medicamentos necessários para a promoção e tratamento da saúde.

O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 175, expressamente reconheceu e definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde, bem como a demonstração de evidências científicas para justificar o pedido. Assim, devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores:

a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente;

b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente;

c) a aprovação do medicamento pela ANVISA;

d) a não configuração de tratamento experimental.

De fato, tratando-se de adoção de uma política pública de saúde, caberá aos profissionais de saúde, dentro de suas melhores convicções profissionais, tomarem as decisões que espelhem os interesses de toda a Sociedade. Isso importa, necessariamente, na eleição de prioridades, na análise de custo benefício, ponderação dos objetivos alcançáveis pelo tratamento, etc, tudo para que possa o sistema de saúde dar atendimento ao maior número de pacientes, e com a melhor eficiência possível frente as limitações orçamentárias. Desnecessário lembrar que a população, por vezes, carece de tratamentos e medicamentos, e mesmo de atendimento profissional, por questões de falta de recursos, mesmo para alguns tratamentos comprovadamente eficientes ou de urgência.

Estabelecida a política pública de disponibilização de medicamentos, há que se lhe dar credibilidade, pelo menos até que seja seriamente desafiada em sua correção. Isso, não apenas por que se presume a sua seriedade, mas também pois se presume tenha Estado consultado profissionais qualificados para definir sua dispensação de remédios. E ainda, fundamentalmente, por se admitir, de modo razoável, que o conjunto, que a reunião desses profissionais que subsidiaram as políticas públicas substancializa um espectro maior e mais variado de opiniões, cuja soma fornece densidade mais robusta que opiniões isoladas de médicos, muitas vezes pressionados pelos casos à frente.

Aqui uma primeira importante perspectiva, a política de dispensação de medicamentos não pode ser afastada, via de regra, com base em opinião isolada de um determinado médico, mesmo que perito nomeado pelo juiz. Não há qualquer razoabilidade em se admitir a opinião isolada de um único médico, contra o conjunto de informações que subsidiaram a decisão pública. Não bastará a mera opinião, baseada em considerações pessoais, sem que se aponte, com suficiente e racional fundamentação, o erro da política pública.

A crítica, para ser válida e aceitável, deverá ser manifestada em artigos, estudos ou qualquer dado público que confronte as razões que informam a decisão do sistema público em não ofertar, de forma geral e universal, determinado medicamento. Nesse sentido, aliás, não se tem até aqui comprovado que tenha a política pública de dispensação de medicamentos deixado de fora, por longo tempo, algum fármaco de efetiva eficácia para doenças raras. Muito pelo contrário, passado recente envolvendo a Fosfoetanolamina, cujo fornecimento generalizado foi autorizado pelo Poder Judiciário, demonstrou que a negativa do Estado no fornecimento desse preparado químico não tinha por base um erro da política de dispensação de remédios.

Nesse particular, observe-se que a problemática de medicamentos não se limita à questão orçamentária. Igualmente importante é saber sobre a necessidade ou não de determinado medicamento, e de se sua eficácia. Da análise do, por vezes, pouco benefício esperado frente a situações irreversíveis do curso da vida. Haveria ainda problemas periféricos, de certo conhecimento público, do induzimento do fornecimento de determinados medicamentos, ganhos diretos e indiretos relacionados à prescrições médicas, interesses da poderosa indústria farmacêutica, etc. Por outro lado, o fenômeno da judicialização da saúde tem criado um sistema de saúde lateral ao sistema único de saúde, sendo os dois sistemas custeados pelo orçamento público, o que evidencia que a questão fundamental não é orçamentária.

Tão importante quanto às questões acima, é preciso compreender que medicamentos que não ultrapassaram todas as fases de teste, são, em princípio, medicamentos ainda não definitivamente testados, tanto na comprovação de sua eficácia, quanto na averiguação das questões ligadas a riscos remanescentes de sua administração. Daí porque, não servem, em geral, para serem incorporados definitivamente no fornecimento pelo sistema de saúde. A aprovação de medicamentos em testes na fase III, deve ser seguida de esforços da pesquisa médica, e principalmente dos grandes fabricantes, para fornecimento dos estudos finais e definitivos sobre o fármaco. Do contrário, e especialmente no Brasil, a população estará sujeita a ser a base de testes da indústria farmacêutica, incorrendo a população nos riscos aí envolvidos, e mediante financiamento público.

Por outro lado, imaginar que o Juiz tenha condições de decidir o fornecimento de medicamentos, com base na voz de seu perito, é presumir racionalidade onde não há.

Primeiro, porque o médico perito não raras vezes, não terá maior conhecimento que os profissionais que informam a política pública de medicamentos, e assim, na grande maioria das vezes não indica onde está o erro por determinado medicamento não estar na lista dos disponibilizados. Nessas circunstâncias, o perito oferta ao Juiz mera opinião pessoal, e não uma análise científica, da possibilidade de determinado medicamente vir a ter efeito no paciente. Muitos peritos sequer mencionam experiências pessoais, ou novos estudos, onde teriam prescrito determinado medicamento, o que mostra a natureza meramente opinativa de seus pareceres.

Segundo, porque no processo judicial, não se tendo conhecimento técnico, o Juiz tenderá a fornecer o medicamento, não porque está convencido de que há um erro por parte do Estado, mas porque não desejará assumir o ônus moral de não ter deferido determinando medicamento. A decisão do juiz, nessas circunstâncias, visa o conforto emocional do magistrado e não se baseia em dados científicos e argumentos racionais. Apontados fossem, argumentos reais, a conclusão a se extrair da decisão seria o amplo e geral fornecimento do medicamento, a toda a população necessitada, independentemente do seu custo.

Sobre o ônus moral de decisões dessa natureza, importante observar que a decisão de não fornecer o medicamento já foi tomada pelo Estado. E ela é válida enquanto política universal destinada a atender a toda a população. Portanto, a decisão do Juiz, a se estabelecer, é outra. Ou seja, diz respeito a verificar se foram, ou não, fornecidos dados suficientes para comprovar que, no caso concreto, a política pública está equivocada, ou é insuficiente.

Caso concreto

Extrai-se dos autos que a autora conta com 11 anos de idade e é portadora de "Paralisia Cerebral com espasticidade refratária ao tratamento clínico", tendo ajuizado a presente ação ordinária objetivando a realização de cirurgia de Rizotomia Dorsal Seletiva – RDS, assim como os procedimentos necessários à reabilitação pós-cirúrgica.

Por força da antecipação de tutela concedida em primeiro grau (ev. 80), a demandante já realizou a cirurgia de Rizotomia dorsal seletiva - RDS, conforme confirmado por ela no ev. 160.

Os recursos dos réus limitam-se ao pedido para afastar a condenação genérica de fornecimento de qualquer procedimento necessário à reabilitação pós-cirúrgica, tais como as sessões de fisioterapia, além da impugnação ao pagamento de verbas indenizatórias e pedido de diminuição do valor dos honorários advocatícios.

Primeiramente, evidencia-se que a decisão de primeiro grau não é genérica, tampouco extra petita, eis que o pedido inicial, assim como todas as manifestações, tanto da parte autora, como dos réus e do Ministério Público Federal, sempre foram pontuadas pelo pedido acessório de realização dos procedimentos necessários à reabilitação pós-cirúrgica. Confira-se a petição inicial (ev. 1):

"...

Dos Pedidos

Diante do exposto, requer a autora, liminarmente, que o juízo lhe defira a tutela provisória de urgência, nos termos do art. 300 do NCPC, para o fim de se determinar às rés que viabilizem e custeiem, com a mais absoluta urgência, de preferência já no mês de janeiro/2018, a cirurgia de Rizotomia Dorsal Seletiva – RDS – de que a autora necessita, seja no sistema público de saúde, seja no sistema particular (em todo caso, atendida pelo médico neurocirurgião que lhe atende, Dr. André Kiss, na cidade de Alphaville/SC), e também o pós-cirúrgico, garantindo-lhe o acesso a sessões de fisioterapia, próteses, órteses, tecnologias assistivas, enfim, tudo de que necessita para sua reabilitação, sob pena de multa diária a ser imposta pelo juízo, em valor que, obviamente, desestimule o descumprimento da ordem pelas rés.

No mérito, pede a autora que o juízo julgue procedente a presente ação, ratificando por sentença a tutela de urgência deferida liminarmente, e condenando a União Federal, o Estado do Paraná, e o Município de Sarandi, solidariamente, à obrigação de fazer, consistente na viabilização e custeio integral da cirurgia de Rizotomia Dorsal Seletiva – RDS – de que a autora necessita, a ser realizada na rede pública (SUS) ou particular, em todo caso pelo médico neurocirurgião que atendeu a autora, Dr. André Kiss, na cidade de Alphaville/SC, que melhor conhece seu caso, bem como o pós-cirúrgico a que a autora terá que se submeter, sob pena de multa diária a ser imposta pelo juízo, em valor que desestimule eventual intenção de descumprimento da tutela mandamental pelas rés.

..."

Dessa forma, o juiz decidiu a lide nos limites em que foi proposta, em obediência ao princípio da adstrição, não havendo que se falar em decisão extra petita.

Considerando todas as normas, que devem ser interpretadas de forma a integrá-las, pode-se concluir que o deferimento do pedido para o atendimento pós-cirúrgico, com a realização das sessões de fisioterapia, não implicam em julgamento genérico, tendo em vista que a prestação buscada tem nítido caráter periódico.

Sobre a necessidade dos procedimentos de reabilitação pós-cirúrgica, entendo que a parte autora demonstrou por meio de prova documental a utilidade do referido tratamento, a fim de garantir sucesso na eficiência da cirurgia, assim como na pronta recuperação e qualidade de vida da paciente. Confira-se o relatório fisioterápico colacionado no ev. 38, LAU2:

O Parquet Federal apontou para a manutenção da condenação dos réus à realização das sessões fisioterápicas, conforme trecho do parecer a seguir transcrito:

"...

Quanto ao fornecimento do atendimento pós-operatório, entendo que deverá ser mantida a sentença, uma vez que atende ao pedido feito na inicial pela autora, de fornecimento dos procedimentos necessários para a continuidade do tratamento, conforme orientações dos médicos responsáveis.

Saliente-se que a autora apresentou Relatório Fisioterápico (processo originário, Evento 38 – LAUDO1) onde restou esclarecido que após a cirurgia será necessário dar continuidade ao tratamento de fisioterapia para garantir uma melhor qualidade de vida para a paciente.

Portanto, necessária a manutenção da condenação dos réus para realização dos procedimentos pós-cirúrgicos.

..."

Diante disso, acolho o parecer ministerial e mantenho a sentença de primeiro grau, no tocante à condenação dos réus a implementar os procedimentos necessários à reabilitação pós-cirúrgica, inclusive no que diz respeito às sessões de fisioterapia.

Atribuições, custeio e reembolso das despesas entre os Réus

O Plenário do STF em 22.05.2019 reiterou sua jurisprudência no sentido de que os entes federados têm responsabilidade solidária no fornecimento de medicamentos e tratamentos de saúde, fixando a seguinte tese de repercussão geral (RE 855.178, Tema 793):

Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde e, diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.

Nesse contexto, deve ser reconhecido que a União é a responsável financeira pelo custeio de tratamentos de alto custo, bem como pelo cumprimento da medida, sem prejuízo, em caso de descumprimento, do redirecionamento ao Estado, como responsável solidário.

Cumpre ressaltar, por fim, que eventual ressarcimento que se fizer necessário deverá ocorrer na esfera administrativa.

Verba Indenizatória

Insurgem-se o Estado do Paraná e a União quanto ao tópico da sentença que os condenou ao pagamento de verba indenizatória de honorários advocatícios, além dos próprios honorários de sucumbência.

Nesse aspecto, entendo que lhes assiste razão, na medida em que o disposto no artigo 82, § 2º, do CPC, abarca somente os gastos decorrentes do processo, tais como custas, remuneração de peritos, pagamento de diligências de oficiais de justiça, custeio de locomoção de testemunhas, dentre outras, não se entendendo como "despesa processual" os honorários advocatícios contratuais, uma vez que tratados em dispositivos distintos.

Logo, na medida em que os honorários advocatícios não podem ser tratados como "despesa processual" para fins de ressarcimento dos gastos antecipados pela parte vencedora, a respectiva condenação, a título de parcela indenizatória, não é cabível. Nesse sentido, o entendimento deste Tribunal:

MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSUAL CIVIL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESPESAS PROCESSUAIS. APELO PROVIDO. 1. O art. 25 da Lei nº 12.016/2009 veda a condenação ao pagamento de honorários advocatícios no processo de mandado de segurança. 2. Em que pese a denominação de indenização, as despesas referidas na sentença se referem à relação contratual entre cliente e advogado, fora do âmbito judicial, não sendo contempladas pelas hipóteses previstas no art. 84 do CPC. 3. Apelo provido. (TRF4, APELRE 5009073-40.2016.404.7003, 4ª T., Des. Federal Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, 05.04.2017)

APELAÇÃO. PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA AFASTADA. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO PELA PROVA TESTEMUNHAL. BENEFÍCIO CONCEDIDO. TUTELA ESPECÍFICA. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF E STJ. INDENIZAÇÃO EM HONORÁRIOS AFASTADA. (...) 8. Merece reforma a decisão no tocante à condenação do INSS em indenização de honorários ao vencedor, com fundamento no artigo 82, § 2º, do CPC. Isso porque, a meu ver, o referido dispositivo abarca somente os gastos decorrentes do processo, tais como remuneração de peritos, pagamentos de diligências de oficiais de justiça, custeio de locomoção de testemunhas, dentre outras, não se entendendo como "despesa processual" os honorários advocatícios, uma vez que tratados em dispositivos distintos. (TRF4, AC 5010511-38.2015.404.7003, Turma Regional suplementar do Paraná, Des. Federal Fernando Quadros da Silva, 30.05.2018)

Na mesma linha, o entendimento firmado pela Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONTRATUAIS. INCLUSÃO NO VALOR DA INDENIZAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE DANO INDENIZÁVEL. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA REJEITADOS. 1. "A contratação de advogados para defesa judicial de interesses da parte não enseja, por si só, dano material passível de indenização, porque inerente ao exercício regular dos direitos constitucionais de contraditório, ampla defesa e acesso à Justiça" (AgRg no AREsp 516277/SP, QUARTA TURMA, Relator Ministro MARCO BUZZI, DJe de 04/09/2014). 2. No mesmo sentido: EREsp 1155527/MS, SEGUNDA SEÇÃO, Rel. Ministro SIDNEI BENETI, DJe de 28/06/2012; AgRg no REsp 1.229.482/RJ, TERCEIRA TURMA, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, DJe de 23/11/2012; AgRg no AREsp 430399/RS, QUARTA TURMA, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, DJe de 19/12/2014; AgRg no AREsp 477296/RS, QUARTA TURMA, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, DJe de 02/02/2015; e AgRg no REsp 1481534/SP, QUARTA TURMA, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, DJe de 26/08/2015. 3. A Lei n.º 8.906/94 e o Código de Ética e Disciplina da OAB, respectivamente, nos arts. 22 e 35, § 1.º, prevêem as espécies de honorários de advogado: os honorários contratuais/convencionais e os sucumbenciais. 4. Cabe ao perdedor da ação arcar com os honorários de advogado fixados pelo Juízo em decorrência da sucumbência (Código de Processo Civil de 1973, art. 20, e Novo Código de Processo Civil, art. 85), e não os honorários decorrentes de contratos firmados pela parte contrária e seu procurador, em circunstâncias particulares totalmente alheias à vontade do condenado. 5. Embargos de divergência rejeitados. (EREsp 1507864/RS, Rel. Min. Laurita Vaz, Corte Especial, DJe 11/05/2016)

Procedem, portanto, os apelos neste ponto.

Honorários advocatícios

No que diz respeito ao valor fixado, deve ser observada a regra prevista no § 8º do art. 85 do CPC, que remete ao arbitramento da verba honorária sucumbencial à apreciação equitativa do juiz, considerando que o direito à saúde é de valor inestimável.

Conforme entendimento adotado nesta Turma Suplementar do Paraná, em demandas que tratam da prestação de serviços à saúde, dependendo da complexidade da causa e na repetição do caso, bem como que a parte técnica, primordialmente, é legada aos conhecimentos científicos de profissionais da medicina, os honorários advocatícios devem ser fixados no patamar entre R$ 3.000,00 (três mil reais) e R$ 5.000,00 (cinco mil reais), devidamente corrigidos, dividindo-se pro rata os ônus entre os sucumbentes.

Assim, parcialmente providas as apelações, devem os réus arcar com as custas e honorários advocatícios de R$3.000,00 em favor do procurador da autora, dividindo-se pro rata os ônus entre os sucumbentes.

Prequestionamento

Objetivando possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, considero prequestionadas as matérias constitucionais e/ou legais suscitadas nos autos, conquanto não referidos expressamente os respectivos artigos na fundamentação do voto, nos termos do art. 1.025 do CPC.

Conclusão

- apelação da União e do Estado do Paraná: parcialmente providas para afastar a condenação nas verbas indenizatórias e minorar o montante dos honorários advocatícios.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar parcial provimento aos apelos da União e do Estado do Paraná.



Documento eletrônico assinado por JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002883254v15 e do código CRC 8c3e2b02.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA
Data e Hora: 8/12/2021, às 22:59:11


5015235-17.2017.4.04.7003
40002883254.V15


Conferência de autenticidade emitida em 16/12/2021 04:01:28.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015235-17.2017.4.04.7003/PR

RELATOR: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: ANA CRISTINA DE FREITAS (AUTOR)

EMENTA

direito À saúde. FORNECIMENTO DE TRATAMENTO MÉDICO. cirurgia. Rizotomia Dorsal Seletiva – RDS. sessões de fisioterapia pós-cirúrgica. verbas indenizatórias.

1. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da STA 175, expressamente reconheceu e definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde, bem como a demonstração de evidências científicas para justificar o pedido.

2. Considerando todas as normas, que devem ser interpretadas de forma a integrá-las, pode-se concluir que o deferimento do pedido para o atendimento pós-cirúrgico, com a realização das sessões de fisioterapia, não implicam em julgamento genérico, tendo em vista que a prestação buscada tem nítido caráter periódico.

3. Comprovada documentalmente a necessidade dos procedimentos de reabilitação pós-cirúrgica, mantém-se a condenação dos réus no implemento dos referidos procedimentos, inclusive no tocante às sessões de fisioterapia.

4. Os honorários advocatícios não podem ser tratados como "despesa processual" para fins de ressarcimento dos gastos antecipados pela parte vencedora. Assim, a respectiva condenação, a título de parcela indenizatória, não é cabível.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento aos apelos da União e do Estado do Paraná, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 07 de dezembro de 2021.



Documento eletrônico assinado por JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA, Juiz Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002883255v4 e do código CRC 4afd5a71.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA
Data e Hora: 8/12/2021, às 22:59:13


5015235-17.2017.4.04.7003
40002883255 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 16/12/2021 04:01:28.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 30/11/2021 A 07/12/2021

Apelação Cível Nº 5015235-17.2017.4.04.7003/PR

RELATOR: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA

PRESIDENTE: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELANTE: ESTADO DO PARANÁ (RÉU)

APELADO: ANA CRISTINA DE FREITAS (AUTOR)

ADVOGADO: JANE GLÁUCIA DE ANGELI JUNQUEIRA (OAB PR023230)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 30/11/2021, às 00:00, a 07/12/2021, às 16:00, na sequência 838, disponibilizada no DE de 19/11/2021.

Certifico que a Turma Regional suplementar do Paraná, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PARANÁ DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS APELOS DA UNIÃO E DO ESTADO DO PARANÁ.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA

Votante: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargadora Federal CLAUDIA CRISTINA CRISTOFANI

SUZANA ROESSING

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 16/12/2021 04:01:28.

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