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DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. PENSÃO ESPECIAL. LEI N° 7. 070/82. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LEI Nº 12. 190/10. LAUDO P...

Data da publicação: 08/12/2023, 07:00:59

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. PENSÃO ESPECIAL. LEI N° 7.070/82. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LEI Nº 12.190/10. LAUDO PERICIAL DE GENETICISTA. FOCOMELIA CONFIRMADA. CONCESSÃO. QUANTUM DOS VALORES DEVIDOS. ART. 1º, § 1º, LEI Nº 7.070/82 E ART. 1º, LEI N° 12.190/10. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA. 1. A jurisprudência deste TRF4 é no sentido da imprescindibilidade da realização de perícia para fins de concessão de pensão especial mensal e vitalícia (Lei nº 7.070/82) e de indenização por danos morais (Lei nº 12.190/09) por Síndrome de Talidomida, preferencialmente realizada por geneticista, salvo impossibilidade intransponível. 2. Hipótese em que o laudo pericial, elaborado por geneticista, embora não tenha sido categórico quanto à sindrome, comprovou focomielia, indicando grande probabilidade de uso de talidomida pela genitora. Conjunto probatório favorável. In dubio pro segurado. Direitos concedidos. 3. O valor da pensão especial, reajustável a cada ano posterior à data da concessão segundo o índice de Variação das ORTN, será calculado em função dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física, à razão, cada um, de metade do maior salário mínimo vigente no país (art. 1º, § 1º, da Lei nº 7.070/82). Atualização devida desde a DER, conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal. 4. Comprovado na perícia médica que o autor apresenta grau quatro de dependência, faz jus à indenização por danos morais de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), nos termos do art. 1º da Lei 12.190/2010. 5. O marco inicial dos juros moratórios incidentes sobre o valor da indenização por danos morais devida ao anistiado político, é a partir da vigência da Lei 12.190/2010. 6. Os índices devem obedecer o comando delineado no Tema 905/STJ, item 3.1 (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E). 7. A partir de 09-12-2021 em observância à EC 113/21, a correção monetária e os juros de mora sejam calculados conjuntamente, com aplicação da Taxa SELIC uma única vez, acumulado mensalmente. 8. Apelo provido, inversão do ônus sucumbencial. (TRF4, AC 5000013-63.2014.4.04.7019, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 30/11/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000013-63.2014.4.04.7019/PR

RELATORA: Desembargadora Federal GISELE LEMKE

APELANTE: ADAUTO ALVES BENICIO (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por ADAUTO ALVES BENICIO em face da UNIÃO FEDERAL e do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS no curso de ação em que se pretende concessão de benefício de pensão especial à vítima de talidomida, instituída pela Lei nº 7.070/1982, bem como compensação por danos morais, prevista na Lei nº 12.190/2010.

A sentença recorrida julgou improcedente o pedido e extinguiu o processo com resolução de mérito. Custas e honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa a cargo da parte autora, exigibilidade suspensa em razão da AJG.

A antecipação de tutela, concedida desde anterior julgamento proferido por este Tribunal (evento 9, DOC2), restou mantida até o julgamento da presente apelação.

ADAUTO ALVES BENICIO apela postulando a total procedência do seu pedido de concessão de pensão especial à vítima de talidomida, bem como indenização pelos danos morais suportados pelo autor.

Apresentadas contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

MÉRITO

1. Dos fatos.

Demanda proposta em 13/03/2014, para obtenção de pensão especial por síndrome de talidomida (NB 151.262.745-0, DER 25/08/2011). Foram realizadas duas perícias:

1. Dr. Jose Antonio Rocco, ortopedista, concluiu que o autor não é portador da síndrome, por constatar ausência de focomielia (evento 44, LAUDO11); posteriormente, prestou esclarecimentos acerca da focomielia e uso da talidomida (evento 61, OUT4).

2. Dr. Wagner José Martins Paiva, geneticista do Serviço de Aconselhamento Genético da Universidade Estadual de Londrina, confirmou a focomielia e classificou o quadro, conforme o sistema de pontuação previsto na Lei 7.070/1982 (evento 89, LAUDO1 evento 89, LAUDO2 e evento 89, LAUDO3).

O pedido foi julgado procedente pelo Juízo da 7ª UAA de Ibaiti (evento 101, SENT1). Em sede de apelo, esta Corte anulou a sentença, determinando o retorno dos autos para inclusão da UNIÃO na lide, por litisconsórcio passivo necessário, bem como deferiu antecipação de tutela (evento 9, DOC2). Nesta fase, não foram realizadas novas provas periciais.

Por fim, o juízo da 4ª UAA de Ibaiti, que recebeu o acervo da 7ª UAA, proferiu sentença de improcedência ​(evento 178, SENT1).

Inconformada, a parte autora recorre.

2. Síndrome da talidomida.

A chamada síndrome da talidomida é uma malformação congênita decorrente do uso do medicamento talidomida por gestantes, outrora prescrito para enjoo e ansiedade, que ocasiona focomelia nos fetos, ou seja, o encurtamento ou ausência dos membros ligados o tronco.

A Lei nº 7.070, de 20/12/1982, concedeu pensão especial mensal e vitalícia aos portadores da referida síndrome nos seguintes termos (grifei):

Art 1º - Fica o Poder Executivo autorizado a conceder pensão especial, mensal, vitalícia e intransferível, aos portadores da deficiência física conhecida como "Síndrome da Talidomida" que a requererem, devida a partir da entrada do pedido de pagamento no Instituto Nacional de Previdência Social - INPS.

§ 1º - O valor da pensão especial, reajustável a cada ano posterior à data da concessão segundo o índice de Variação das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional ORTN, será calculado, em função dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física, à razão, cada um, de metade do maior salário mínimo vigente no País.

§ 2º - Quanto à natureza, a dependência compreenderá a incapacidade para o trabalho, para a deambulação, para a higiene pessoal e para a própria alimentação, atribuindo-se a cada uma 1 (um) ou 2 (dois) pontos, respectivamente, conforme seja o seu grau parcial ou total.

Art. 2º A percepção do benefício de que trata esta Lei dependerá unicamente da apresentação de atestado médico comprobatório das condições constantes do artigo anterior, passado por junta médica oficial para esse fim constituída pelo Instituto Nacional de Previdência Social, sem qualquer ônus para os interessados.

Art. 3º A pensão especial de que trata esta Lei, ressalvado o direito de opção, não é acumulável com rendimento ou indenização que, a qualquer título, venha a ser pago pela União a seus beneficiários, salvo a indenização por dano moral concedida por lei específica. (Redação dada pela Lei nº 12.190, de 2010).

A Lei nº 8.686, de 20/07/1993, por seu turno, dispôs que o valor da pensão não poderia ser inferior a um salário mínimo.

Posteriormente, a Lei nº 12.190, de 13/01/2010, determinou a concessão de indenização por dano moral às pessoas com deficiência física decorrente do uso de talidomida, em conformidade com os seguintes parâmetros:

Art. 1º É concedida indenização por dano moral às pessoas com deficiência física decorrente do uso da talidomida, que consistirá no pagamento de valor único igual a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), multiplicado pelo número dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física (§1o do art. 1o da Lei no 7.070, de 20 de dezembro de 1982).

Embora a pensão e a indenização sejam operacionalizadas pelo INSS, as verbas não têm natureza previdenciária, visto que não se amoldam aos requisitos de qualquer das espécies de benefícios previdenciários previstos pela legislação. Os valores requeridos têm eminente caráter indenizatório e, portanto, trata-se de matéria de natureza administrativa e não previdenciária, ou seja, trata-se de competência de Turma Administrativa desta Corte, conforme decisão da Corte Especial deste Tribunal (CC nº 5014285-41-2012.404.0000 - DE de 26-11-2012).

Dito isso, passo à análise das teses recursais.

3. Das razões de apelo.

O magistrado sentenciante entendeu que a parte autora não logrou comprovar suficientemente que sua deficiência física está relacionada ao uso de talidomida, tampouco que a genitora efetivamente fez uso dessa substância durante a gestação (evento 178, SENT1).

ADAUTO ALVES BENICIO, em sede de apelo (evento 203, APELAÇÃO1), sustenta que não há como afirmar com certeza que a medicação talidomida deixou de ser utilizada livremente no país após a sua proibição em 1965. Destaca que, embora hoje seja medicação de uso controlado, nada comprova esta prática no ano em que nasceu, 1971, tanto que o próprio INSS já deferiu o benefício para nascidos em data posterior a 1965 (comprovantes de benefícios anexados evento 66, OUT3evento 66, OUT3evento 66, OUT4evento 66, OUT5evento 66, OUT6evento 66, OUT7evento 66, OUT8evento 66, OUT9evento 66, OUT10).

Referindo-se ao segundo laudo produzido (evento 70, DESPADEC1), que confirma ser ADAUTO portador de focomelia, e ao manual de uso da talidomida, emitido pelo Ministério da Saúde (evento 190, OUT3), aduz que a focomelia é caracterizadora da Síndrome de Talidomida, reforçando que, uma vez diagnosticada, "é bem sugestiva a presença da síndrome nos pacientes".

​Pois bem.

No caso em tela, verifica-se que ADAUTO deu entrada no pedido de pensão em 25/08/2011, o qual foi indeferido por insuficiência probatória (evento 1, INDEFERIMENTO7). As provas colacionadas no processo administrativo pelo requerente foram atestados de médico cardiologista e ortopedista (evento 1, ATESTMED11 e evento 1, ATESTMED12), exame médico (evento 1, EXMMED26) e as fotografias requisitadas pelo INSS (evento 1, FOTO13 evento 1, FOTO14 evento 1, FOTO15 evento 1, FOTO16 evento 1, FOTO17 evento 1, FOTO18 evento 1, FOTO19 evento 1, FOTO20).

Foram produzidos dois laudos periciais judiciais, da lavra de ortopedista ​(evento 44, LAUDO11)​ e de geneticista ​(evento 89, LAUDO1 evento 89, LAUDO2 e evento 89, LAUDO3). O médico geneticista constatou a presença de focomielia e classificou o nível de dependência em 04 (quatro) pontos, para efeitos do art. 1º, § 1º, da Lei nº 7.070/82.

Diante do conjunto probatório, penso que assiste razão ao apelante.

A jurisprudência deste TRF4 é no sentido da imprescindibilidade da realização de perícia para fins de concessão de pensão especial e de indenização por danos morais por Síndrome de Talidomida, preferencialmente realizada por geneticista, salvo impossibilidade intransponível (grifei):

ADMINISTRATIVO. SÍNDROME DA TALIDOMIDA. INDENIZAÇÃO. LEI Nº 7.070/82. LEI Nº 12.190/10. LAUDO PERICIAL. NECESSIDADE DE ESPECIALISTA EM GENÉTICA. RETORNO DOS AUTOS. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA. 1. Conforme reiterada jurisprudência deste Tribunal, a perícia judicial em ações onde se postula o reconhecimento de pensão especial de portador de Síndrome de Talidomida e indenização por danos morais, deve, salvo impossibilidade intransponível, ser realizada por médico especialista em genética. 2. Determinado o retorno dos autos para realização de perícia médica judicial por especialista na área de genética. (TRF4, AC 5022595-80.2015.4.04.7000, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 21/09/2018)

ADMINISTRATIVO. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. LAUDO PERICIAL. NECESSIDADE DE ESPECIALISTA EM GENÉTICA. RETORNO DOS AUTOS. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA. Conforme reiterado jurisprudência deste Tribunal, a perícia judicial em ações onde se postula o reconhecimento de pensão especial de portador de Síndrome de Talidomida e indenização por danos morais, deve, salvo impossibilidade intransponível, ser realizada por médico especialista em genética. Determinado o retorno dos autos para realização de perícia médica judicial por especialista na área de genética. (TRF4, AC 5002148-12.2013.4.04.7010, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 24/11/2016)

ADMINISTRATIVO. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. LAUDO PERICIAL. NECESSIDADE DE ESPECIALISTA EM GENÉTICA. RETORNO DOS AUTOS. REALIZAÇÃO DE NOVA PERÍCIA. 1. Conforme a jurisprudência deste Tribunal, a perícia judicial em ações onde se postula o reconhecimento de pensão especial de portador de Síndrome de Talidomida e indenização por danos morais, deve, salvo impossibilidade intransponível, ser realizada por médico especialista em genética. 2. Determina-se o retorno dos autos para realização de perícia médica judicial por especialista na área de genética. (TRF4 5003910-63.2013.4.04.7010, TERCEIRA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 27/10/2016)

​​Em face do exposto, apreciando a divergência entre laudos periciais, entendo que deva prevalecer aquele elaborado pelo médico geneticista, constante no evento 89.

​Destaco que o geneticista informa que não há comprovação testemunhal acerca do uso do medicamento pela genitora, contudo registra que não era incomum o uso não controlado à época, em especial contra enjoos na gravidez. Assim, deixo de considerar a alegação de impossibilidade de a genitora ter feito uso de talidomida somente pelo fato de o autor ter nascido em 1971.

​Inobstante a perícia administrativa realizada pelo INSS (evento 1, OUT9), e o primeiro laudo judicial, realizado por ortopedista (​evento 44, LAUDO11 e evento 61, OUT4), verifica-se que o laudo emitido por geneticista (evento 89, LAUDO1 evento 89, LAUDO2 e evento 89, LAUDO3), deixa clara a focomelia do autor.

​O laudo foi categórico quanto à presença de focomelia. Consignou o perito ainda que outras três causas genéticas existem, mas são raras, e inclusive afastou a possibilidade de uma delas (síndrome de Roberts). Embora não tenha sido categórico quanto à síndrome de talidomida, em razão de um diagnóstico preciso ser reconhecidamente difícil, a avaliação clínica do geneticista foi diligente e baseou-se no padrão de anomalia física e no exame cromossomial. Se assim não fosse, seria o caso de indeferir o pedido:

DIREITO ADMINISTRATIVO. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. PENSÃO ESPECIAL. DEFICIÊNCIA INCOMPATÍVEL. PERÍCIA JUDICIAL REALIZADA POR GENETICISTA. É indevida a concessão de pensão especial prevista nas Leis n.ºs 7.070/1982 e 12.190/2010 se a prova técnica judicial realizada por médico geneticista atesta, de forma absolutamente clara e precisa, que a anomalia apresentada pela parte não é compatível com o diagnóstico de Síndrome de Talidomida. (TRF4, AC 5016701-74.2020.4.04.9999, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 23/04/2021)

Contudo, sendo muito grande a chance da focomelia derivar de uso de talidomida, não há como negar a verossimilhança entre os fatos e as alegações da parte autora. Entendo que aqui prevalece o princípio in dubio pro segurado. Nesse sentido, vem decidindo esta Corte (grifei):

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO. PENSÃO ESPECIAL. SÍNDROME DA TALIDOMIDA. AUSÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO ENTRE A UNIÃO E O INSS. LEI Nº 7.070/82. PERÍCIA JUDICIAL. RECONHECIMENTO. SEIS PONTOS INDICADORES DA NATUREZA E DO GRAU DE DEPENDÊNCIA. VALOR DO BENEFÍCIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS. [omissis] 2. Concluindo as perícias judiciais pela existência de doença congênita e não se podendo descartar a hipótese de relação entre os defeitos apresentados pelo demandante e a possível ingestão de talidomida por sua genitora, haja vista que a redução de membros superiores é uma das seqüelas comuns dessa droga e essa deformidade não se enquadra em nenhuma síndrome genética descrita até o presente momento, deve ser concedida a pensão especial prevista na Lei nº 7.070/82, uma vez que, na dúvida, deve prevalecer a interpretação pro segurado. [omissis] (TRF-4ª R., 6ª T., Rel. Juiz Sérgio Renato Tejada Garcia, AC nº 200004010897926RS, DJ 22/11/2003)

ADMINISTRATIVO. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. PENSÃO ESPECIAL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DEFICIÊNCIA COMPROVADA. PROCEDÊNCIA. O conjunto probatório esclareceu que a deficiência apresentada pela parte autora é compatível com a Síndrome da Talidomida, razão por que são devidas a pensão mensal e a indenização por danos morais requeridas, descontando-se os valores já alcançados ao demandante a título de benefício assistencial, o qual resta cancelado. (TRF4 5006200-32.2014.404.7005, TERCEIRA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, 14/03/2017)

Em face do exposto, reputo que as conclusões do laudo pericial elaborado por geneticista são suficientes para caracterizar o caso de síndrome de talidomida no feito em exame.

4. Da pensão especial.

O artigo 1º, § 1º, da Lei nº 7.070/82 assim previu:

"§ 1º - O valor da pensão especial, reajustável a cada ano posterior à data da concessão segundo o índice de Variação das Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional ORTN, será calculado em função dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física, à razão, cada um de metade do maior salário mínimo vigente no país."

O laudo pericial aferiu pontuação 4 ao caso em exame (evento 89, LAUDO3).

Assim, o INSS deve conceder o benefício no valor referente a essa pontuação.

As parcelas vencidas serão apuradas na forma do Manual de Cálculos da Justiça Federal, desde a data do requerimento, observada a prescrição quinquenal.

Possível a compensação com os valores recebidos a título de benefício previdenciário entre DER da pensão especial e sua efetiva implantação, bem como dos valores recebidos em antecipação de tutela.

5. Dos danos morais.

Não há discussão sobre o nexo causal entre a deficiência e o uso de talidomida, questão já pacificada nesta Corte, motivo pelo qual deixo de discorrer sobre a responsabilidade civil da UNIÃO nestes casos.

O valor da indenização por dano moral foi definido legalmente pela Lei n° 12.190, de 13/01/10, a qual é clara ao estabelecer em seus arts. 1º e 4º:

Art. 1o É concedida indenização por dano moral às pessoas com deficiência física decorrente do uso da talidomida, que consistirá no pagamento de valor único igual a R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), multiplicado pelo número dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física (§1o do art. 1o da Lei no 7.070, de 20 de dezembro de 1982).

(...)

Art. 4o As despesas decorrentes do disposto nesta Lei correrão à conta de dotações próprias do orçamento da União.

O pedido trazido na inicial é na ordem de R$ 50.000,00 (cinqüenta mil reais) multiplicados pelo número de pontos relativos ao quadro de incapacidade, pagos com juros e correção monetária a partir de edição da referida lei.

Procede a pretensão da parte autora.

De fato, para estipular o valor da indenização, deve-se aferir o grau de dependência gerado pela deformidade. Como dito, conforme laudo pericial, a pontuação é 4 (evento 89, LAUDO3), motivo pelo qual fixo o valor da indenização por danos morais em R$ 200.000,00 (duzentos mil reais). Cito precedente de minha lavra (grifei):

ADMINISTRATIVO. PENSÃO ESPECIAL. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. VALORES PAGOS A MAIOR. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. DEVOLUÇÃO. DESCABIMENTO. VERBA DE NATUREZA ALIMENTAR. BOA-FÉ. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. PERÍCIA. ESPECIALISTA EM GENÉTICA. FLEXIBILIZAÇÃO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. 1. Os valores a maior recebidos de boa-fé pelo autor a título de pensão especial vitalícia por síndrome de talidomida em virtude de erro da Administração não devem ser restituídos, uma vez que se trata de verba alimentar e não houve comprovação de má-fé. Precedentes. 2. Em regra, a jurisprudência deste TRF4 é no sentido de que a perícia nos casos de pensão especial ou de indenização por danos morais por síndrome de talidomida deve ser realizada por geneticista, salvo impossibilidade intransponível. Precedentes. 3. Hipótese em que não há discussão sobre o nexo causal entre a deficiência e o uso de talidomida, questão já decidida em ação anterior transitada em julgado, restando aferir apenas o grau de dependência (para o trabalho, deambulação, higiene pessoal e alimentação) gerado pela deformidade para estipular o valor da indenização, exame que pode ser realizado por médico do trabalho sem qualquer prejuízo às partes. 4. Comprovado na perícia médica que o autor tem grau três de dependência, faz jus à indenização por danos morais de R$ 150.000,00, nos termos do art. 1º da Lei 12.190/2010. Sentença mantida. 5. Desprovido o apelo, é de serem majorados os honorários advocatícios. (TRF4, AC 5004116-34.2014.4.04.7013, DÉCIMA SEGUNDA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 16/03/2023)

Dessa forma, dá-se provimento à apelação para fixar a indenização por danos morais em R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).

Sobre a indenização incidirão juros e correção monetária, conforme Tema 905/STJ, verbis:

3.1 Condenações judiciais de natureza administrativa em geral.
As condenações judiciais de natureza administrativa em geral, sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E.

Tendo o valor da indenização sido fixado pela Lei nº 12.190/2010, a correção monetária deve incidir a partir da data de sua publicação. Juros de mora a contar da citação.

A partir de 09/12/2021 em observância à EC 113/21, a correção monetária e os juros de mora são calculados conjuntamente, com aplicação da Taxa SELIC.

6. Da prescrição.

A ocorrência de prescrição quinquenal, prevista no artigo 103, parágrafo único, da Lei 8.213/91, atinge as parcelas devidas, anteriores aos cinco anos do ajuizamento da ação.

DIREITO ADMINISTRATIVO. SÍNDROME DA TALIDOMIDA. NÃO COMPROVAÇÃO. PENSÃO VITALÍCIA E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LEIS 7.070/82 E 12.190/2010. PRESCRIÇÃO. DESCABIMENTO. 1. O direito a pensão vitalícia às vítimas da síndrome da talidomida, previsto na Lei 7070/82, deve ser considerado como prestação de trato sucessivo, com incidência da prescrição qüinqüenal apenas em relação às prestações anteriores a cinco anos do ajuizamento da ação. Contudo, no tocante à pretensão de compensação por danos morais, incide a prescrição quinquenal do Decreto 20910/32, de modo que, ajuizada a ação mais de cinco anos depois da edição da lei que originou o direito (Lei 12190/2010), deve ser reconhecida a prescrição. 2. Ausente comprovação de que a deficiência apresentada decorre do uso da talidomida, descabe a concessão da pensão vitalícia e da indenização por danos morais de que tratam as Leis 7070/82 e 12190/2010. (TRF4, AC 5001993-65.2021.4.04.7127, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 01/03/2023)

Sendo assim, proposta a demanda em 18/03/2014, não está prescrito o direito às parcelas devidas desde a DER (25/08/2011).

Honorários advocatícios

Ante o provimento do recurso, há a inversão do ônus sucumbencial.

Fica condenado o INSS em custas, das quais está isento, e honorários advocatícios, os quais fixo em 10% sobre o valor da condenação.

Inaplicável a majoração disposta no art. 85, § 11º, do CPC.

Conclusão

Dado provimento ao recurso do autor para:

- conceder a pensão especial mensal e vitalícia prevista na Lei nº 7.070/82, devida desde a DER, calculada nos termos da referida Lei e atualizada de acordo com o Manual de Cálculo da Justiça Federal, abatidos os valores que já foram pagos em razão da tutela antecipada concedida nos autos.

- concedida indenização por danos morais no valor de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), com atualização monetária conforme Tema 905/STJ, e SELIC a contar de 09/12/2021. O marco inicial da correção monetária é a data da vigência da Lei nº 12.190/2010. Juros de mora a contar da citação.

Com o provimento do apelo, resta condenado o INSS em custas, das quais está isento, e em honorários advocatícios, fixados sobre o valor da condenação, observados os percentuais mínimos dos incisos do art. 85, § 3º, e o disposto no § 5º da mesma norma do CPC.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004183678v70 e do código CRC d7457152.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 27/11/2023, às 21:8:32


5000013-63.2014.4.04.7019
40004183678.V70


Conferência de autenticidade emitida em 08/12/2023 04:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000013-63.2014.4.04.7019/PR

RELATORA: Desembargadora Federal GISELE LEMKE

APELANTE: ADAUTO ALVES BENICIO (AUTOR)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL. SÍNDROME DE TALIDOMIDA. PENSÃO ESPECIAL. LEI N° 7.070/82. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. LEI Nº 12.190/10. laudo pericial de geneticista. focomelia confirmada. concessão. quantum dos valores devidos. art. 1º, § 1º, Lei nº 7.070/82 E art. 1º, Lei n° 12.190/10. ATUALIZAÇÃO MONETÁRIA.

1. A jurisprudência deste TRF4 é no sentido da imprescindibilidade da realização de perícia para fins de concessão de pensão especial mensal e vitalícia (Lei nº 7.070/82) e de indenização por danos morais (Lei nº 12.190/09) por Síndrome de Talidomida, preferencialmente realizada por geneticista, salvo impossibilidade intransponível.

2. Hipótese em que o laudo pericial, elaborado por geneticista, embora não tenha sido categórico quanto à sindrome, comprovou focomielia, indicando grande probabilidade de uso de talidomida pela genitora. Conjunto probatório favorável. In dubio pro segurado. Direitos concedidos.

3. O valor da pensão especial, reajustável a cada ano posterior à data da concessão segundo o índice de Variação das ORTN, será calculado em função dos pontos indicadores da natureza e do grau da dependência resultante da deformidade física, à razão, cada um, de metade do maior salário mínimo vigente no país (art. 1º, § 1º, da Lei nº 7.070/82). Atualização devida desde a DER, conforme Manual de Cálculos da Justiça Federal.

4. Comprovado na perícia médica que o autor apresenta grau quatro de dependência, faz jus à indenização por danos morais de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais), nos termos do art. 1º da Lei 12.190/2010.

5. O marco inicial dos juros moratórios incidentes sobre o valor da indenização por danos morais devida ao anistiado político, é a partir da vigência da Lei 12.190/2010.

6. Os índices devem obedecer o comando delineado no Tema 905/STJ, item 3.1 (a) até dezembro/2002: juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c) período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança; correção monetária com base no IPCA-E).

7. A partir de 09-12-2021 em observância à EC 113/21, a correção monetária e os juros de mora sejam calculados conjuntamente, com aplicação da Taxa SELIC uma única vez, acumulado mensalmente.

8. Apelo provido, inversão do ônus sucumbencial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 12ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Curitiba, 29 de novembro de 2023.



Documento eletrônico assinado por GISELE LEMKE, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40004183679v16 e do código CRC ac7821f8.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): GISELE LEMKE
Data e Hora: 30/11/2023, às 18:3:58


5000013-63.2014.4.04.7019
40004183679 .V16


Conferência de autenticidade emitida em 08/12/2023 04:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO PRESENCIAL DE 29/11/2023

Apelação Cível Nº 5000013-63.2014.4.04.7019/PR

RELATORA: Desembargadora Federal GISELE LEMKE

PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

PROCURADOR(A): ELTON VENTURI

SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: EDMARA RITA TELLES por ADAUTO ALVES BENICIO

APELANTE: ADAUTO ALVES BENICIO (AUTOR)

ADVOGADO(A): SERGIO COSTA (OAB PR040118)

ADVOGADO(A): EDMARA RITA TELLES (OAB PR069544)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Presencial do dia 29/11/2023, na sequência 364, disponibilizada no DE de 20/11/2023.

Certifico que a 12ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 12ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal GISELE LEMKE

Votante: Desembargadora Federal GISELE LEMKE

Votante: Desembargador Federal JOÃO PEDRO GEBRAN NETO

Votante: Desembargador Federal LUIZ ANTONIO BONAT

HELENA D'ALMEIDA SANTOS SLAPNIG

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 08/12/2023 04:00:58.

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