Apelação Cível Nº 5011391-33.2020.4.04.7204/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: WALMOR PERICO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta em face de sentença proferida em ação de procedimento comum, com o seguinte dispositivo:
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, confirmo a tutela de urgência e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS, extinguindo o feito com resolução de mérito, na forma do art. 487, I, do CPC, para:
(a) declarar a nulidade do contrato nº 453922245, bem como a inexistência da correspondente relação jurídica entre o autor e o réu Banco Santander;
(b) condenar o Banco Santander à restituição do valor indevidamente descontado do benefício previdenciário do autor em decorrência do contrato nº 453922245;
O valor a ser restituído ao autor pelo réu Banco Santander deverá ser: (a) atualizado monetariamente pelo IPCA-E a partir da data de cada desconto indevido; (b) acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês (CC, art. 406; CTN, art. 161, § 1º) desde a citação.
Condeno o Banco Santander ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico, o qual, no caso, equivale ao valor atualizado do contrato anulado, considerando a relativa importância da causa, a necessidade de dilação probatória, a interposição de agravo de instrumento, o zelo e a boa qualidade do trabalho profissional do patrono do autor, atendido o disposto no art. 85, § 2º, do CPC.
Sem remessa necessária (art. 496, § 3º, I, do CPC).
Sentença registrada e publicada eletronicamente. Intimem-se.
Havendo interposição de recurso e observadas as formalidades dos §§1º e 2º do art. 1.010 do CPC, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (art. 1.010, § 3º, do CPC).
Oportunamente, dê-se baixa.
Em suas razões, a parte autora postulou a reforma parcial da sentença para: (1) reconhecer os atos ilícitos praticados pelos apelados e o dever de indenizar o apelante por danos morais no valor de R$ 20.000,00 (vinte mil reais); (2) condenar os apelados a devolver, em dobro, o valor já descontado do seu benefício até o presente momento. Nesses termos, requereu o provimento do recurso.
Com contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Ao apreciar o(s) pedido(s) formulado(s) na inicial, o juízo a quo manifestou-se nos seguintes termos:
I - RELATÓRIO
Trata-se de ação ajuizada por WALMOR PERICO em face do BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. e do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em que formula os seguintes pedidos (evento 1 - INIC1):
e) a concessão da tutela de urgência, determinando-se que o Banco Réu suspenda o desconto do empréstimo consignado do contrato n. 453922245, bem como o INSS bloqueie novos lançamentos de empréstimo nos benefícios, sob pena de fixação de multa diária por descumprimento;
f) a declaração de inexistência do contrato de empréstimo de n 453922245, a ser quitado em 84 (oitenta e quatro parcelas) de R$ 1.075,00 (mil e setenta e cinco reais), a primeira parcela a ser descontado em 09/2020 e a última em 08/2027, chegando ao valor total de R$50.173,16 (cinquenta mil, cento e setenta e três reais e dezesseis centavos), com a imediata exclusão do rol de cadastro de empréstimos consignados no benefício previdenciário do Requerente;
g) o reconhecimento dos atos ilícitos praticados pelas Requeridas e o dever de indenizar a Requerente nos danos morais amargados, com a consequente condenação das mesmas, de forma solidária, ao pagamento de indenização pelos danos morais no valor de R$20.000,00 (vinte mil reais);
h) a condenação do Requerido SANTANDER BANESPA S/A a devolver, em dobro, o valor de R$4.300,00 (quatro mil e trezentos reais) já descontados da pensão até o presente momento, com aplicação de correção monetária e juros de mora até a data do efetivo pagamento;
Para tanto, em síntese, sustenta que seu benefício previdenciário vem sofrendo descontos relativos ao contrato de empréstimo nº 453922245, no valor de R$ 50.173,16, ao qual, porém, não aderiu (evento 1).
O juízo federal da 3ª Vara Federal de Criciúma declinou da competência e remeteu os autos a esta unidade judiciária (evento 7).
Recebida a ação, reconheceu-se a competência, deferiu-se a gratuidade da justiça e determinou-se a citação e intimação dos réus sobre a tutela de urgência pleiteada (evento 3).
O INSS ofereceu manifestação prévia e contestação (eventos 18 e 23). Arguiu sua ilegitimidade passiva e a incompetência da Justiça Federal. Discorreu sobre seus deveres pertinentes ao processamento dos empréstimos consignados e requereu a improcedência dos pedidos.
O autor ofereceu réplica, em que rebateu os argumentos da autarquia e requereu fosse decretada a revelia do Banco Santander (evento 26).
Rejeitou-se o pedido relativo à revelia e postergou-se a apreciação da tutela de urgência para depois da resposta da instituição financeira (evento 29).
O Banco Santander ofereceu resposta (evento 34). Sustentou, em preliminar, que o autor não apresentou comprovante de residência válido. No mérito, defendeu a higidez do contrato de empréstimo e dos respectivos descontos em benefício previdenciário. Esclareceu que houve assinatura do contrato e depósito dos valores em favor do postulante. Requereu, ao final, a improcedência dos pedidos.
Indeferiu-se o pedido liminar e o posterior pedido de reconsideração, oportunizando-se a especificação de provas (eventos 38 e 45).
O autor interpôs agravo de instrumento. O TRF4 deferiu a antecipação da tutela recursal e, posteriormente, deu provimento ao agravo (evento 48).
O autor ofereceu réplica e requereu a realização de perícia grafotécnica (eventos 53 e 58).
O Banco Santander requereu o depoimento pessoal do autor e apresentação de extratos pelo banco Bradesco (evento 56).
O INSS e o Banco Santander noticiaram o cumprimento da tutela de urgência (eventos 62 e 63).
Deferiram-se os pedidos de produção de prova pericial grafotécnica, de colheita do depoimento pessoal do autor e de apresentação de extratos pelo Banco Bradesco (evento 68).
Designou-se data para a audiência de instrução (evento 94).
Solicitada a juntada do contrato original pelo perito (evento 93), intimou-se o Banco Santander para que assim o procedesse (evento 106).
O Banco Bradesco juntou documentos bancários (evento 116).
O Banco Santander noticiou que não localizou a via original do contrato (evento 121).
Intimadas as partes e o perito sobre tal fato (evento 127), este informou que não era possível realizar o exame na via digital acostada aos autos (evento 140).
Realizou-se audiência de instrução, com colheita do depoimento pessoal do autor (evento 147).
O Banco Santander reiterou a informação de que não localizou a via original do contrato e requereu o prosseguimento do feito (evento 151).
Os autos vieram conclusos para sentença.
II - FUNDAMENTAÇÃO
2.1 - Preliminarmente
2.1.1 - Ilegitimidade do INSS e incompetência da Justiça Federal
A preliminar levantada pela autarquia não merece prosperar.
Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "as condições da ação são averiguadas de acordo com a teoria da asserção, razão pela qual, para que se reconheça a legitimidade passiva 'ad causam', os argumentos aduzidos na inicial devem possibilitar a inferência, em um exame puramente abstrato, de que o réu pode ser o sujeito responsável pela violação do direito subjetivo do autor" (REsp 1733387/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI,DJe 18/05/2018).
Com efeito, "as condições da ação, entre elas a legitimidade ad causam, devem ser avaliadas in status assertionis, limitando-se ao exame do que está descrito na petição inicial, não cabendo ao Juiz, nesse momento, aprofundar-se em sua análise, sob pena de exercer um juízo de mérito" (REsp 1661482/RJ, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2017, DJe 16/05/2017).
Não bastasse isso, o INSS foi o responsável pela operação de desconto no benefício da autora. Destarte, se houve ou não negligência, é matéria de mérito, a ser apreciada oportunamente. A Corte Regional já pacificou este entendimento:
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. INSS. LEGITIMIDADE PASSIVA. O INSS é parte legítima para figurar no polo passivo de ações em que se discutem descontos indevidos originados de contratos de empréstimo consignado. (TRF4, AC 0007435-03.2010.404.9999, Terceira Turma, Relator Guilherme Beltrami, D.E. 30/09/2010).
Por esses motivos, afasto as prefaciais.
2.1.2 - Comprovante de residência
Rejeito de plano a tese preliminar do banco Santander, uma vez que o autor apresentou fatura de energia elétrica que indica a residência no Município de Siderópolis/SC.
2.2 - Mérito
2.2.1 - Aplicação do Código de Defesa do Consumidor e inversão do ônus da prova
Os contratos bancários em geral submetem-se à disciplina do CDC, conforme dispõe o artigo 3º, § 2º, da Lei nº 8.078/90. Nesse sentido consolidou-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça através da Súmula nº 297, verbis:
O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras.
As regras do CDC, na espécie negocial dos bancos, restaram pacificadas pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal com o julgamento da ADI nº 2.591. Contudo, os benéficos dispositivos do Código Consumerista em matéria contratual encontram limites na vontade das partes e na intenção do legislador, direcionadas a ajustar abusividade de cláusulas.
Não se trata, aqui, de chancelar a inadimplência ou os desvios dos clientes das instituições financeiras, eis que a norma em questão veio a lume para humanizar as relações de consumo, dando igualdade de partes no plano material.
Desse modo, a aplicação das regras de proteção do consumidor aos contratos bancários, por si só, não significa procedência total dos pedidos da parte autora, mas sim que as cláusulas contratuais serão interpretadas favoravelmente ao devedor, sempre que se apresentarem duvidosas, ambíguas ou contraditórias e que impliquem prejuízos ao consumidor.
Nos demais casos, os contratos serão interpretados de acordo com as regras de hermenêutica estabelecidas para a exegese dos demais negócios jurídicos.
A inversão do ônus da prova, como mecanismo de facilitação de defesa, também não é automática e subordina-se ao critério do juiz, quando for verossímil a alegação ou quando o postulante for hipossuficiente (art. 6º, VIII, do CDC). Não se pode admitir a aplicação do instituto da inversão do ônus da prova de forma indiscriminada, para o efeito de atribuir à parte ré toda a iniciativa probatória, o que desvirtuaria por completo o sistema processual civil vigente.
Em regra, incumbe à parte autora, nos termos do art. 373, I, do CPC, instruir o processo com todos os documentos necessários à comprovação de seu direito. A inversão do ônus da prova será admitida apenas "nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário", quando, então, o magistrado poderá distribuir o ônus de modo diverso, nos termos do § 1º do art. 373 do CPC.
Do mesmo modo, não há que se falar em análise de ofício de qualquer cláusula contratual, por se constituir em ônus processual da parte a impugnação específica das disposições avençadas que entender ilegítimas. Serão apreciadas apenas as cláusulas expressamente impugnadas (com a devida fundamentação) pela parte autora. Nesse sentido, aliás, a Súmula nº 381 do STJ:
Nos contratos bancários, é vedado ao julgador conhecer, de ofício, da abusividade das cláusulas.
Dessa forma, considero aplicáveis os princípios e regras dispostos no Código Consumerista aos contratos sub judice.
2.2.2 - Fundamentos da responsabilidade civil
A responsabilidade civil pode ser contratual, oriunda de um contrato firmado entre as partes, ou extracontratual (aquiliana), advinda do próprio dever legal de ressarcir os danos causados. A teoria clássica (teoria da culpa ou da responsabilidade subjetiva) pressupõe a culpa como fundamento da responsabilidade civil, o que, em tese, implica na inexistência de responsabilidade no caso da ausência de culpa. A teoria da responsabilidade objetiva (ou legal ou teoria do risco), por sua vez, sustenta que a lei impõe a certas pessoas e em determinadas situações o dever legal de reparar o dano cometido, independentemente de culpa, bastando, para a sua responsabilização, a comprovação do dano e do nexo de causalidade.
A teoria da responsabilidade objetiva foi albergada em nosso ordenamento jurídico, aplicando-se, sobretudo, às pessoas jurídicas de direito público e às de direito privado prestadoras de serviços públicos, que respondem objetivamente pelos danos causados por seus agentes, assegurado o direito de regresso, a teor do que preceitua o § 6º do art. 37 da Constituição Federal, bem como às pessoas sujeitas ao CDC, como as instituições financeiras, nos termos do art. 14 do referido diploma legal.
Portanto, a responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público - como o réu INSS -, das de direito privado prestadoras de serviços públicos e das sujeitas ao CDC - como os bancos réus - tem como pressupostos: (a) a existência de uma ação comissiva ou omissiva qualificada juridicamente; (b) a ocorrência de um dano patrimonial ou moral causado à vítima por ato comissivo ou omissivo do agente ou de terceiro por quem o imputado responde; e (c) o nexo de causalidade entre o dano e a ação. Ausente um desses elementos, não há que se falar em responsabilização civil.
De outro norte, como excludentes da responsabilidade, a jurisprudência e doutrina pátria assinalam como sendo: a inexistência de causalidade entre a conduta do agente e o dano ocorrido, a culpa exclusiva da vítima ou de terceiro, o caso fortuito ou a força maior.
2.2.3 - Dano moral
O dano moral, desde a nova ordem constitucional instaurada com a Constituição Federal de 1988, teve consagração definitiva no nosso ordenamento jurídico. Anteriormente, muitas discussões pairavam sobre a matéria, o que, paulatinamente, foi sendo dirimido pela doutrina e jurisprudência, inclusive através de enunciados sumulares sobre o tema.
A sede constitucional da indenização por dano moral encontra-se no artigo 5º, V e X, previsão essa que constitui cláusula pétrea, visto que inserida dentro do rol dos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos.
O Código Civil, por sua vez, consagrou expressamente a possibilidade de indenização por dano moral em seu art. 186:
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Pela leitura do dispositivo citado, depreende-se que a lei substantiva civil não fez nenhuma distinção entre o dano moral ou patrimonial. Ambos encontram seu fundamento legal nesse mesmo dispositivo legal.
A doutrina de um modo geral caracteriza o dano moral como um abalo aos direitos da personalidade, que trazem um menoscabo à dignidade da pessoa:
I) Direito à integridade física: 1. direito à vida e aos alimentos, 2. direito sobre o próprio corpo, vivo, 3. direito sobre o próprio corpo, morto, 4. direito sobre o corpo alheio, vivo, 5. direito sobre o corpo alheio, morto, 6. direito sobre as partes separadas do corpo, vivo, 7. direito sobre as partes separadas do corpo, morto. II) Direito à integridade intelectual: 1. direito à liberdade de pensamento, 2. direito pessoal do autor científico, 3. direito pessoal do autor artístico, 4. direito pessoal do inventor. III) direito à integridade moral: 1. direito à liberdade civil, política e religiosa, 2. direito à honra. 3. direito à honorificência, 4. direito ao recato, 5. direito ao segredo pessoal, doméstico e profissional, , 6. direito à imagem, 7. direito à identidade pessoal, familiar e social. (FRANÇA, Limongi. Manual de Direito Civil. V. I. p. 411/414).
Segundo Yussef Said Cahali,:
A reputação pessoal integra-se no direito da personalidade, como atributo da honra do ser humano, merecendo, assim, a proteção das normas penais e das leis civis reparatórias. Sob a égide dessa proteção devida, acentuam-se cada vez mais na jurisprudência a condenação daqueles atos que molestam o conceito honrado de pessoa, colocando em dúvida a sua probidade e seu crédito. Definem-se como tais aqueles atos que, de alguma forma, mostram-se hábeis para macular o prestígio moral da pessoa, sua imagem, sua honradez e dignidade, postos como condição não apenas para atividades comerciais, como também para o exercício de qualquer outra atividade lícita. (CAHALI, Yussef Said. Dano moral. 2ª ed. Editora RT: São Paulo, 1998. p. 358/359)
O dano moral é aquele que causa constrangimento ao atingido, atacando sua dignidade e integridade moral diante do grupo em que vive. A jurisprudência já pacificou o entendimento de que o dano moral não deve ser confundido com qualquer dissabor, amargura ou contrariedade da vida cotidiana, somente devendo ser reconhecido ante a violação grave à dignidade da pessoa.
Nesse sentido:
CIVIL. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. VENDA CASADA. REPERCUSSÃO EXTERNA INEXISTE. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO 1. O entendimento jurisprudencial assente nesta Corte é no sentido de que, embora a responsabilidade civil da instituição financeira seja objetiva, somente podendo ser afastada pela concorrência da culpa do cliente -consumidor, o dano moral há de ter consequências externas, tais como a inscrição em cadastro restritivo de crédito, não se bastando para isso, a mera notificação quanto a possibilidade do débito ser inscrito em cadastro restritivo, uma vez que não se tornou de conhecimento público, muito menos teve reflexo sobre o crédito do autor. 2. O aborrecimento decorrente do débito em conta do autor quanto ao valor do título de capitalização, objeto contratação em desacordo com o Código de Defesa do Consumidor, por constituir venda casada, por si só não tem o condão de gerar danos morais, por não ter havido qualquer repercussão externa. 3. 'Mero aborrecimento, dissabor, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral' (REsp 689213/RJ, rel. Ministro Jorge Scartezzini, DJ de 11.12.2006). Inexistência de dano moral. 4. No caso dos autos, reconhece-se a ocorrência de sucumbência recíproca, eis que o autor foi vencedor em apenas um dos dois pedidos constantes de sua inicial. 5. Apelação a que se nega provimento.(TRF1, AC 200933070007880, Juiz Federal Marcos Augusto de Sousa (conv.), Sexta Turma, e-DJF1, DATA:22/08/2011 PAGINA:138)
AÇÃO INDENIZATÓRIA. RESSARCIMENTO POR DANOS MORAIS. INEXISTÊNCIA. RESPONSABILIDADE CIVIL. INDENIZAÇÃO. DANO MORAL INEXISTENTE. MERO DISSABOR. (...) 4. O mero dissabor não pode ser alçado ao patamar do dano moral, mas somente aquela agressão que exacerba a naturalidade dos fatos da vida, causando fundadas aflições ou angústias no espírito de quem ela se dirige. recurso especial conhecido e provido. 5. Apelação improvida. (TRF4, AC 5001417-17.2012.404.7118, Terceira Turma, Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, 26/09/2013)
O posicionamento da doutrina também é nesse sentido:
Nessa linha de princípio, só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia-a-dia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos. (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. Ed. Malheiros. 2ª Ed. p. 78)
Concluída essa abordagem inicial, passo à análise do caso concreto.
2.2.4 - Caso concreto
Por ocasião do deferimento do pedido de tutela de urgência no agravo de instrumento nº 5018520-36.2021.4.04.0000, assim restou decidido (evento 3 daqueles autos):
Em que pese ponderáveis os fundamentos que amparam a decisão agravada, é de se acolher a irresignação recursal, em face do implemento dos requisitos legais (artigo 300 do CPC).
O Banco Santander (Brasil) S.A. apresentou cópia do contrato n.º 53922245, no valor de R$ 50.173,16 (cinquenta mil, cento e setenta e três reais e dezesseis centavos), e documento comprobatório do depósito desse montante em conta bancária do autor (n.º 0345-0.000023398-4), junto ao Banco Bradesco - em agência (0345) localizada em Criciúma, próximo de sua residência em Siderópolis, Santa Catarina (OUT2 e OUT3, p. 6, do evento 34 dos autos originários) -, o que, a princípio, é suficiente para demonstrar a perfectibilização do negócio jurídico sub judice.
Não obstante, existem indícios de ocorrência de fraude na contratação do empréstimo, pois há (1) divergência entre a assinatura em seu documento de habilitação e a lançada no contrato (ANEXO4 do evento 1 e OUT2 do evento 34 dos autos originários), e (2) divergência entre o local de sua residência (interior de Santa Catarina) e o da assinatura do contrato (cidade de São Paulo), para crédito em conta bancária vinculada a agência sediada em outra localidade (ANEXO4 do evento 1 e OUT2 do evento 34 dos autos originários), e (3) a existência de duas contas correntes (n.º 0882849-0 e n.º 23398-4), no mesmo banco (Bradesco) e agência (n.º 0345), pertencentes a uma única pessoa física, é algo incomum que deve ser sindicado (art. 375 do CPC) (EXTR3 do evento 43 e OUT2, p. 7, do evento 34 dos autos originários).
Outrossim, o perigo de dano é inquestionável, considerando que o valor que vem sendo descontado mensalmente (R$ 1.075,00) corresponde a, aproximadamente, 30% (trinta por cento) do benefício previdenciário percebido pelo agravante , que se presume hipossuficiente (R$ 3.821,70 em dezembro de 2020), comprometendo parte substancial de sua aposentadoria (ANEXO3 do evento 1 dos autos originários). Em contrapartida, a instituição financeira não sofrerá impacto relevante, decorrente da suspensão temporária dos descontos em folha de pagamento, os quais poderão ser prontamente restabelecidos na hipótese de improcedência da ação.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EMPRÉSTIMO. CONSIGNAÇÃO. INSS. ALEGAÇÃO DE FRAUDE. TUTELA DE URGÊNCIA. REQUISITOS. - Da documentação apresentada percebe-se que há razoáveis indícios de ocorrência de fraude na contratação do empréstimo, considerando-se a utilização de documento de identidade alterado, o que restou registrado na ocorrência policial trazida aos autos. - O perito de dano, por outro lado, é inquestionável, considerando que o valor a ser descontado corresponde a 35% dos vencimentos do agravante, que, sendo beneficiário do INSS, por presunção é hipossuficiente, correndo o risco de ser despojado de parte substancial da sua aposentadoria. - Ausente perigo reverso, pois a Instituição financeira, não sofrerá abalo maior por conta da suspensão, pois que bastará o restabelecimento dos descontos em hipótese de improcedência do pedido inicial. - Provimento do agravo de instrumento para suspender os descontos. (TRF4, 4ª Turma, AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 5041970-42.2020.4.04.0000, Relator Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 10/12/2020)
Ante o exposto, defiro a antecipação dos efeitos da tutela recursal, para determinar a suspensão de descontos relacionados ao contrato sub judice no benefício previdenciário recebido pelo agravante, até a prolação da sentença.
Além desses fundamentos, deferiu-se a dilação probatória para investigação sobre a tese de falsificação da assinatura constante do contrato nº 53922245 (evento 34 - OUT2). Todavia, como relatado, não foi possível a realização do exame grafotécnico, uma vez que o Banco corréu não apresentou a via original do documento em questão (eventos 121 e 140).
Desse modo, com a omissão no fornecimento do documento, devem ser admitidos como verdadeiros os fatos alegados pelo autor e que seriam objeto da prova pericial. Com efeito, tratando-se de documento comum cuja existência o autor nega, aplica-se a presunção de que trata o artigo 400, I, do CPC, ou seja, a ausência de apresentação leva à conclusão de que o alegado pelo postulante - não ser sua a sua assinatura aposta no documento original - é verdade.
Por isso, acolho a tese de que o autor não aderiu ao contrato de empréstimo nº 453922245 e reconheço a inexistência do débito respectivo.
Nada obstante, não há responsabilidade do réu INSS, pois foi o réu Banco Santander que procedeu à averbação do contrato inexistente e não era possível à autarquia constatar o vício com o simples exame do documento. Por isso, as parcelas indevidamente descontadas do benefício previdenciário do postulante deverão ser restituídas pelo Banco Santander.
Quanto ao pedido de indenização por danos morais, saliento que na hipótese como dos autos, este não é presumido e deve ser minimamente demonstrado. Entretanto, o autor não fez prova de que tenha sofrido prejuízos psíquicos, desgostos, vexames, perda de reputação ou prestígio e, até mesmo, que se socorreu de amigos ou familiares para suprir necessidades básicas.
Seguem precedentes nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRESTAÇÃO DE SERVIÇO BANCÁRIO. SAQUE INDEVIDO. OCORRÊNCIA DE DANOS MATERIAIS. DANO MORAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. ABORRECIMENTO DO COTIDIANO. A ocorrência de fraude que induziu a instituição bancária em erro enseja o ressarcimento do valor compatível aos danos materiais. Transtornos na rotina não são o bastante para dar ensejo à ocorrência de dano moral, o qual demanda, para sua configuração, a existência de fato dotado de gravidade capaz de gerar abalo profundo, no plano social, objetivo, externo, de modo a que se configurem situações de constrangimento, humilhação ou degradação e não apenas dissabor advindo de intercorrências do cotidiano. (TRF4, AC 5005130-81.2013.404.7112, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D' AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 14/07/2016)
AGRAVO. INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO. CONSUMIDOR. DANO MORAL. SAQUE FRAUDULENTO. PIS. ACÓRDÃO PARADIGMA. INEXISTÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICO-JURÍDICA. FGTS E SEGURO-DESEMPREGO. VERBAS DISTINTAS. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. 1. O presente caso versa sobre pedido de indenização por dano moral decorrente de saque indevido realizado por terceiro de valores depositados em conta corrente correspondentes ao abono do PIS, enquanto que os acórdãos apontados pela recorrente como paradigmas, todos originários da 3ª Turma Recursal de SC, apreciaram casos em que o pedido de indenização tinha como fundamento a liberação indevida de verbas de outra natureza: no primeiro, FGTS; e no segundo, parcela de seguro-desemprego. 2. Ao contrário do alegado pelo recorrente, em nenhum dos dois acórdãos prevaleceu tese segundo a qual a privação indevida de qualquer verba de natureza salarial (no que se incluiria o PIS) implicaria na presunção de dano moral. 3. Agravo não provido. (5010428-22.2015.4.04.7003, TURMA REGIONAL DE UNIFORMIZAÇÃO DA 4ª REGIÃO, Relator NICOLAU KONKEL JÚNIOR, juntado aos autos em 20/10/2017)
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. FGTS. SAQUE INDEVIDO. DANO MORAL. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. 1. A ocorrência de saque indevido em conta fundiária não configura hipótese de dano moral in re ipsa, sendo imprescindível para o acolhimento do pleito indenizatório a comprovação de situação concreta capaz de lesar direitos de personalidade da parte autora. 2. Recurso não provido, em razão da inocorrência de demonstração de situação grave capaz de atingir direitos extrapatrimoniais do recorrente. (5007000-02.2019.4.04.7000, Primeira Turma Recursal do PR, Relatora Márcia Vogel Vidal de Oliveira, julgado em 02/07/2020)
Desse modo, sem maiores digressões, improcede o pedido de indenização por danos morais.
Por fim, a repetição em dobro somente é aplicável naquelas hipóteses em que há prova de que o credor agiu com má-fé. Não havendo comprovação da má-fé, ou seja, quando o credor comprovadamente sabe que não tem o direito pretendido, não há como se exigir a devolução em dobro dos valores pagos a maior.
Embora a regra do art. 42, parágrafo único, do CDC, seja diversa da prevista no art. 940 do Código Civil, entende-se que o requisito da má-fé está igualmente presente no dispositivo do Estatuto do Consumidor. De fato, conforme a jurisprudência do STJ, "a aplicação do parágrafo único do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor, que determina a devolução em dobro do indébito, exige, além da cobrança de quantia indevida, a configuração de má-fé do credor, o que não se verifica no caso em apreço" (REsp 1626275/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/12/2018, DJe 07/12/2018).
Consequentemente, não comprovada a má-fé do agente financeiro na exigência do pagamento de valores excessivos, impõe-se afastar a sanção consistente na repetição em dobro de tais valores.
III - DISPOSITIVO
Ante o exposto, confirmo a tutela de urgência e JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS, extinguindo o feito com resolução de mérito, na forma do art. 487, I, do CPC, para:
(a) declarar a nulidade do contrato nº 453922245, bem como a inexistência da correspondente relação jurídica entre o autor e o réu Banco Santander;
(b) condenar o Banco Santander à restituição do valor indevidamente descontado do benefício previdenciário do autor em decorrência do contrato nº 453922245;
O valor a ser restituído ao autor pelo réu Banco Santander deverá ser: (a) atualizado monetariamente pelo IPCA-E a partir da data de cada desconto indevido; (b) acrescido de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês (CC, art. 406; CTN, art. 161, § 1º) desde a citação.
Condeno o Banco Santander ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% (dez por cento) sobre o proveito econômico, o qual, no caso, equivale ao valor atualizado do contrato anulado, considerando a relativa importância da causa, a necessidade de dilação probatória, a interposição de agravo de instrumento, o zelo e a boa qualidade do trabalho profissional do patrono do autor, atendido o disposto no art. 85, § 2º, do CPC.
Sem remessa necessária (art. 496, § 3º, I, do CPC).
Sentença registrada e publicada eletronicamente. Intimem-se.
Havendo interposição de recurso e observadas as formalidades dos §§1º e 2º do art. 1.010 do CPC, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região (art. 1.010, § 3º, do CPC).
Oportunamente, dê-se baixa.
O recurso da parte autora busca a reforma da sentença com relação a dois pontos: (1) o pedido de indenização por danos morais; (2) o pedido de repetição da quantia devida em dobro, nos termos do art. 42 do Código de Defesa do Consumidor.
I - Dos danos morais
Como já reconhecido em julgados deste Tribunal, o INSS e a instituição financeira respondem por sua parcela de culpa no caso de descontos em benefício previdenciário causado por empréstimos consignados fraudulentos, e tais descontos indevidos ensejam reparação em dano moral, considerando a falha na prestação do serviço previdenciário e os transtornos gerados, que não podem ser qualificados como "ocorrências corriqueiras" da vida diária, ou mero incômodo, pois a supressão indevida de proventos de forma repentina afeta a rotina do cidadão médio, provocando estresse de grande monta.
Nesse sentido:
DIREITO ADMINISTRATIVO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. INTERESSE DE AGIR. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. O INSS é parte legítima para figurar no polo passivo de demanda em que os segurados buscam desconstituir contrato de compra e venda de produto que deu origem a descontos nos benefícios previdenciários por meio de consignação em folha de pagamento. Precedentes. Comprovado o evento danoso e o nexo causal, o INSS responde, juntamente com a instituição financeira, pelos descontos indevidos em benefício previdenciário causados por empréstimos consignados fraudulentos. Cabível indenização por danos morais à autora que teve seu benefício previdenciário reduzido em decorrência de fraude praticada por terceiro no âmbito de operações bancárias. (TRF4, AC 5001361-32.2017.4.04.7110, QUARTA TURMA, Relator SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, juntado aos autos em 23/04/2021)
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO FRAUDULENTO. SEGURADO DO INSS. LEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. O INSS é parte legítima em demanda relativa à ilegalidade de descontos no benefício de segurado, nos termos do artigo 6º, § 1º, da Lei nº 10.820/2003. Cabível indenização por dano moral em decorrência de desconto no benefício previdenciário da parte autora, por empréstimo consignado realizado mediante fraude. Recurso do INSS parcialmente provido, apenas no que se refere à correção monetária e juros. Improvido recurso do Banco Santander. (TRF4, AC 5004053-95.2017.4.04.7112, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 27/02/2019)
ADMINISTRATIVO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS. INSS. FALHA NOS SERVIÇOS. RESPONSABILIDADE. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. - Comprovado o evento danoso e o nexo causal, o INSS responde, juntamente com a instituição financeira, pelos descontos indevidos em benefício previdenciário causados por empréstimos consignados fraudulentos. - Há dano moral indenizável decorrente da falha na prestação do serviço previdenciário na hipótese de descontado de valor indevido em benefício previdenciário. (TRF4, AC 5005750-55.2015.404.7005, TERCEIRA TURMA, Relator RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA, juntado aos autos em 14/07/2016)
A ocorrência do dano moral, em casos como o dos autos, é presumível, bastando a comprovação do ato ilícito, que no caso concreto, restou demonstrado.
Nesse sentido:
ADMINISTRATIVO. CIVIL. CEF. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. COBRANÇA INDEVIDA DE TARIFAS EM CONTA INATIVA. INDEVIDA INSCRIÇÃO DO NOME DO AUTOR EM CADASTROS DE INADIMPLENTES. DANO MORAL. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. QUANTIFICAÇÃO. 1. As instituições bancárias respondem objetivamente pelos danos causados por fraudes ou delitos praticados por terceiros - como, por exemplo, abertura de conta-corrente ou recebimento de empréstimos mediante fraude ou utilização de documentos falsos -, porquanto tal responsabilidade decorre do risco do empreendimento, caracterizando-se como fortuito interno (REsp 1199782/PR, julgado pelo rito dos recursos repetitivos). 2. Segundo reiterada jurisprudência, o dano moral decorrente da inscrição indevida em cadastro de inadimplente é considerado in re ipsa, isto é, não se faz necessária a prova do prejuízo, que é presumido e decorre do próprio fato. 3. Na quantificação do dano moral devem ser sopesadas as circunstâncias e peculiaridades do caso, as condições econômicas das partes, a menor ou maior compreensão do ilícito, a repercussão do fato e a eventual participação do ofendido para configuração do evento danoso. A indenização deve ser arbitrada em valor que se revele suficiente a desestimular a prática reiterada da prestação de serviço defeituosa e ainda evitar o enriquecimento sem causa da parte que sofre o dano. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002194-85.2015.404.7121, 4ª Turma, Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 30/08/2017)
No arbitramento do valor da indenização advinda de danos morais, o julgador deve se valer do bom senso e atentar às peculiaridades do caso concreto, não podendo fixar quantum irrisório ou insuficiente para a devida reparação, tampouco vultoso que acarrete enriquecimento sem causa da vítima.
AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DANOS MORAIS. VALOR DA INDENIZAÇÃO. REEXAME DE FATOS E PROVAS. VEDAÇÃO. SÚMULA N. 7/STJ. (...) 2. O valor da indenização sujeita-se ao controle do Superior Tribunal de Justiça, sendo certo que, na sua fixação, recomendável que o arbitramento seja feito com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, ao nível socioeconômico dos autores e, ainda, ao porte econômico dos réus, orientando-se o juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso e atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso.3. In casu, o quantum fixado pelo Tribunal a quo a título de reparação de danos morais mostra-se razoável, limitando-se à compensação do sofrimento advindo do evento danoso.4. Agravo regimental improvido.(AgRg no Ag 884.139/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 18.12.2007, DJ 11.02.2008 p. 1)
Ponderando a natureza e gravidade do dano, as circunstâncias do caso concreto, o princípio da razoabilidade e os parâmetros adotados em casos semelhantes, afigura-se adequado o valor total de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) - R$ 10.000,00 (dez mil reais) a cargo de cada réu -, sobre o qual incidirão juros e correção monetária que o incrementarão substancialmente.
II - Da devolução em dobro
O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078, de 11/9/1990) atribuiu, objetivamente, ao fornecedor de produto ou serviço, a responsabilidade "pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos." (art. 14).
A atividade desenvolvida pelas instituições financeiras está tipificada na expressão "fornecedor" descrita no caput e também na expressão "inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito" do § 2º do artigo 3º:
Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
(...)
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. (g.n.)
E é pacífico na jurisprudência do STJ que o CDC é aplicável às instituições financeiras. Nesse sentido:
AGRAVO INTERNO NO ORECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL (CPC/73). AÇÃO DE COBRANÇA. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535, INCISO II, DO CPC/73. NÃO OCORRÊNCIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICAÇÃO. ENUNCIADO N.º 297 DO STJ. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. COBRANÇA ILEGÍTIMA. PRECEDENTES. 1. Inexistência de ofensa ao art. 535, inciso II, do CPC/73, quando o acórdão recorrido, ainda que de forma sucinta, aprecia com clareza as questões essenciais ao julgamento da lide. 2. O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras - Enunciado n.º 297/STJ. 3. Nos casos de cédula de crédito rural, o STJ possui entendimento firme no sentido do não cabimento da cobrança de comissão de permanência em caso de inadimplência. 4. Não apresentação pela parte agravante de argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada. 5. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. (AgInt no REsp 1496575/PB, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/12/2017, DJe 02/02/2018)
No entanto, a repetição do indébito em dobro somente é aplicável naquelas hipóteses em que há prova de que o credor agiu com má-fé. Não havendo comprovação da má-fé, não há como se exigir a devolução em dobro dos valores pagos a maior.
Embora a regra do art. 42, parágrafo único, do CDC, seja diversa da prevista no art. 940 do Código Civil, entende-se que o requisito da má-fé está igualmente presente no dispositivo do Estatuto do Consumidor:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INADMISSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7/STJ. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE MÁ-FÉ DA AGRAVADA. NÃO INCIDÊNCIA. SÚMULA N. 83/STJ. DECISÃO MANTIDA.
1. O recurso especial não comporta exame de questões que impliquem revolvimento do contexto fático-probatório dos autos (Súmula n. 7 do STJ).
2. No caso concreto, o Tribunal de origem concluiu que não foi comprovada a má-fé da instituição de ensino, razão pela qual o TJPR deixou de aplicar a devolução em dobro prevista no art. 42 da Lei n. 8.078/1990. Alterar esse entendimento demandaria o reexame das provas produzidas nos autos, o que é vedado em recurso especial.
3. Segundo a jurisprudência desta Corte, "quando comprovada a má-fé da parte que realizou a cobrança indevida, ficará obrigada a devolver em dobro o que cobrou em excesso" (AgInt no AREsp 911.309/MG, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 4/5/2017, DJe 10/5/2017), o que não ocorreu no caso.
4. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no AREsp n. 2.001.171/PR, relator Ministro Antonio Carlos Ferreira, Quarta Turma, julgado em 20/6/2022, DJe de 27/6/2022.)
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CARTÃO DE CRÉDITO. COBRANÇA INDEVIDA. REPETIÇÃO EM DOBRO. MÁ-FÉ. NÃO OCORRÊNCIA. DANO MORAL. VALOR. RAZOÁVEL.
1. A devolução em dobro de valores pagos pelo consumidor pressupõe a existência de pagamento indevido e a má-fé do credor. Precedentes.
2. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite, excepcionalmente, em recurso especial, o reexame do valor fixado a título de danos morais, quando ínfimo ou exagerado. Hipótese, todavia, em que a verba indenizatória, consideradas as circunstâncias de fato da causa, foi estabelecida pela instância ordinária em conformidade com os princípios da proporcionalidade e razoabilidade.
3. Agravo interno a que se nega provimento.
(AgInt no REsp n. 1.951.717/RJ, relatora Ministra Maria Isabel Gallotti, Quarta Turma, julgado em 9/5/2022, DJe de 12/5/2022.)
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. CES. TABELA PRICE. SÚMULAS 5 E 7/STJ. REPETIÇÃO DO INDÉBITO SIMPLES. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE MÁ-FÉ. A questão da capitalização dos juros/Tabela Price encontra óbice nas Súmulas 5 e 7/STJ. É pacífica a jurisprudência deste Tribunal Superior no sentido de que a cobrança do CES - Coeficiente de Equiparação Salarial é válida quando existir expressa previsão contratual. A repetição do indébito em dobro pressupõe cobrança indevida por má-fé do credor, o que não ficou demonstrado nos autos. Agravo interno não provido. (STJ, AgInt nos EDcl no REsp 1488240/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 21/02/2017, DJe 01/03/2017).
Dessa maneira, não comprovada a má-fé do agente financeiro, no caso em tela, incabível a sanção consistente na repetição em dobro dos valores a serem devolvidos.
Assim, acolhe-se parcialmente a apelação para julgar procedente o pedido de condenação ao pagamento de indenização por danos morais, nos termos da fundamentação.
Sucumbente o INSS em relação ao pedido de danos morais, deve arcar com 50% dos honorários advocatícios fixados na sentença, os quais majoro em 1% (um por cento), levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, em obediência ao § 11 do art. 85 do CPC/2015.
Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003397869v14 e do código CRC 758db20f.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5011391-33.2020.4.04.7204/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
APELANTE: WALMOR PERICO (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU)
EMENTA
direito administrativo. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. DESCONTOS INDEVIDOS EM PROVENTOS DE APOSENTADORIA. dano moral. REPETIÇÃO EM DOBRO. ART. 42, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CDC.
Cabível indenização por danos morais à parte autora que teve seu benefício previdenciário reduzido em decorrência de fraude praticada por terceiro no âmbito de operações bancárias.
É firme na jurisprudência o entendimento no sentido de que o art. 42, § único, do CDC, aplica-se tão-somente nas hipóteses em que há prova de que o credor agiu com má-fé, o que não restou demonstrado no caso concreto, tendo agido, a instituição financeira, com desídia ou negligência, sem o intuito de locupletar-se indevidamente às custas do autor.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de agosto de 2022.
Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003397870v5 e do código CRC f25d3a38.Informações adicionais da assinatura:
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Data e Hora: 12/8/2022, às 15:48:24
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 10/08/2022
Apelação Cível Nº 5011391-33.2020.4.04.7204/SC
RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
PRESIDENTE: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
PROCURADOR(A): JOÃO HELIOFAR DE JESUS VILLAR
APELANTE: WALMOR PERICO (AUTOR)
ADVOGADO: LEANDRO LUIS ROSSO (OAB SC055980)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
APELADO: BANCO SANTANDER (BRASIL) S.A. (RÉU)
ADVOGADO: JOAO THOMAZ PRAZERES GONDIM (OAB ES018694)
ADVOGADO: JOAO THOMAZ PRAZERES GONDIM (OAB RJ062192)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 10/08/2022, na sequência 590, disponibilizada no DE de 29/07/2022.
Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Votante: Desembargador Federal VICTOR LUIZ DOS SANTOS LAUS
Votante: Desembargador Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 13/10/2022 16:20:41.