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DIREITO ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO - SFH. PROCESSUAL CIVIL. COBERTURA SECURITÁRIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. DOENÇA PREE...

Data da publicação: 07/07/2020, 03:34:30

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO - SFH. PROCESSUAL CIVIL. COBERTURA SECURITÁRIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. DOENÇA PREEXISTENTE. NÃO OCORRÊNCIA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DE PARCELAS PAGAS INDEVIDAMENTE. INDEFERIMENTO. DANO MORAL INDEVIDO. É entendimento deste Tribunal que o julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa, eis que desnecessária a realização de prova pericial quando os documentos anexados aos autos são suficientes para o deslinde da questão, como no caso dos autos. Não demonstrada inequívocamente a anterioridade à contratação do seguro, da doença que vitimou o mutuário, não há falar em doença preexistente a motivar a recusa de cobertura. Não restou demonstrado má-fé do agente financeiro quanto à exigência das prestações antes do reconhecimento da sua invalidez pela seguradora, razão pela qual indevido o pedido de restituição em dobro. A responsabilidade por indenização de danos morais, seja ela subjetiva ou objetiva, pressupõe a comprovação de efetivo dano moral, ou seja, a efetiva comprovação de abalo moral relevante sofrido pela vítima. Com efeito, cabe ao magistrado, guiando-se pelo princípio da razoabilidade, analisar se houve dano grave e relevante que justifique a indenização buscada. Hipótese em que não configurado dano moral. (TRF4, AC 5000775-33.2019.4.04.7107, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 05/06/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000775-33.2019.4.04.7107/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000775-33.2019.4.04.7107/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: LUCAS TEIXEIRA WEBER DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELANTE: MARIA CELI TEIXEIRA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELANTE: CAIXA SEGURADORA S/A (RÉU)

APELANTE: ALINE TEIXEIRA WEBER DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida em ação de cobrança de indenização securitária, cujo dispositivo foi assim exarado:

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, afasto as preliminares suscitadas e ponho fim à fase cognitiva do procedimento comum, com resolução do mérito (art. 487, inciso I do CPC), julgando procedentes em parte os pedidos veiculados para o fim de:

(a) declarar o direito da parte autora à utilização do seguro compreensivo contratado para quitação do saldo devedor a contar do evento sinistrado (28/06/2018), o que deverá ser implementado pela Caixa Seguradora S/A;

(b) condenar a CEF ao ressarcimento aos autores dos encargos mensais adimplidos desde a data do falecimento (em 28/06/2018) com a incidência de correção monetária com base no IPCA-E e juros de mora no patamar de 1% ao mês, a contar da citação e até o efetivo pagamento;

(c) indeferir a pretensão de condenação da Caixa Seguros S/A em indenização por danos morais

Ante a sucumbência recíproca, condeno cada uma das partes ao pagamento de honorários advocatícios à parte ex adversa, os quais, considerando o disposto no artigo 85, §2º, do CPC, arbitro em 10% sobre o valor da condenação, atualizáveis até a data do efetivo pagamento com base no IPCA-E, na proporção de 70% a favor da parte autora e 30% a favor das rés. A exigibilidade da condenação em face da parte autora resta suspensa em razão do deferimento da gratuidade de justiça.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Interposto(s) recurso(s), caberá à Secretaria abrir vista à parte contrária para contrarrazões, e, na sequência, remeter os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Transitada em julgado, certifique-se e, nada mais sendo requerido, dê-se baixa.

A CEF apresentou recurso de apelação, alegando: i) cerceamento de defesa ao direito de a apelante produzir provas, em razão do julgamento antecipado da lide; ii) a existência de doença preexistente que incide na hipótese de risco não coberto pelo contrato de seguro.

A parte autora interpôs recurso adesivo, propugnando a reforma da sentença para que sejam incluídos os danos morais na condenação, e para que os ressarcimentos dos encargos mensais cumpridos pelos autores a partir da data do falecimento sejam pagos am dobro.

Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

É o relatório.

VOTO

O juízo a quo, ao sentenciar o feito, assim se posicionou quanto à controvérsia:

I - RELATÓRIO

Trata-se de ação ordinária, movida sob procedimento comum por MARIA CELI TEIXEIRA, LUCAS TEIXEIRA WEBER DA SILVA e ALINE TEIXEIRA WEBER DA SILVA em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF e CAIXA SEGURADORA S/A, na qual a parte autora requer, em síntese, a condenação da Caixa Seguradora S/A a quitar o saldo devedor do mútuo habitacional entretido com a CEF (de nº 8.4444.0035.269-0), a condenação das rés a restituir os valores das prestações pagas indevidamente, em dobro, posteriormente ao óbito do mutuário, bem como a condenação da Caixa Seguradora S/A ao pagamento de danos morais no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), acrescido de correção monetária e juros moratórios. Narram os autores que em 27/03/2012 formalizaram com a CEF um contrato de financiamento habitacional, após aquisição de um imóvel, o qual contemplava cláusula com pagamento de seguro cobrindo morte decorrente de causas naturais ou acidentais e invalidez permanente. Assinalaram que no dia 28/06/2018 um dos mutuários, Lelis Weber da Silva, faleceu; os autores, herdeiros do de cujus, comunicaram o falecimento à seguradora, apresentando todos os documentos pertinentes. Contudo, foram surpreendidos com a negativa da cobertura securitária sob a justificativa de que o óbito do mutuário foi decorrente de doença preexistente. Negam a preexistência da doença. Invocaram a aplicação do CDC, bem como a necessária quitação do saldo devedor do mútuo entretido com a CEF. Salientaram que em face da situação sofreram dano moral indenizável. Requereram a concessão da gratuidade de justiça. Juntaram documentos.

Deferida a gratuidade de justiça e encaminhados os autos ao CEJUSCON para realização de audiência de autocomposição (evento 3).

Audiência realizada sem composição (evento 20).

Citada, a Caixa Seguradora S/A contestou o feito (evento 29). Preliminarmente, invocou a necessidade de comprovação da parte autora como legítima para representar o espólio, aduzindo que na certidão de óbito do de cujus consta outra dependente não integrante do polo ativo da ação. Defendeu a delimitação da lide frente à seguradora, aduzindo não lhe competir a administração do contrato de mútuo. No mérito, salientou que não deve haver cobertura securitária no caso, tendo em vista que a doença que ensejou o falecimento do mutuário (hipertensão arterial sistêmica) preexistia à contratação do seguro, não tendo sido por ele declarada. Assinalou que sua atuação se deu com boa-fé. Invocou o equilíbrio econômico da atividade securitária e a necessidade de interpretação restritiva das cláusulas do contrato de seguro. Negou a existência de danos morais indenizáveis. Requereu o julgamento de improcedência dos pedidos veiculados.

Citada, a CEF também apresentou contestação (evento 32). Invocou a sua ilegitimidade passiva, alegando não ser responsável por operacionalizar o seguro. Defendeu não haver nexo de causalidade para imprimir-lhe qualquer responsabilidade quanto ao ressarcimento de eventuais parcelas pagas a título de mútuo. Negou a existência de dano moral indenizável.

Houve réplica (eventos 40 e 41).

A parte ré foi intimada para se manifestar quanto aos documentos juntados pela autora em réplica (evento 41), quedando-se inerte.

Os autos vieram conclusos para sentença.

É o relatório.

II - FUNDAMENTAÇÃO

II.1. Da legitimidade ativa

Invocou a seguradora a ilegitimidade dos autores para pleitear indenização securitária, aduzindo não ter havido comprovação da condição de inventariante e a inexistência de demais herdeiros.

Não lhe assiste razão. Sequer está demonstrado que foi aberto o inventário. Ao depois, há comprovação pela parte autora de que os herdeiros do de cujus, indicados em sua certidão de óbito (evento 1, CERTOBT10), fazem parte do polo ativo da ação, ressalvando-se a informação de Gisele Teixeira Weber da Silva teve retificada sua paternidade na certidão de nascimento, como comprovado pela parte autora (evento 41, CERTNASC2).

II.2. Da legitimidade passiva da CEF

O contrato de financiamento habitacional e seu respectivo seguro, além de terem sido instituídos por intermédio de instrumento uno, apresentam imbricada relação jurídica que não permite cisão. O pedido de indenização decorrente da ocorrência de sinistro previsto na apólice compreensiva habitacional busca a quitação do saldo devedor da dívida, o que, evidentemente, instituiu o litisconsórcio passivo necessário entre companhia seguradora e agente financeiro. Neste sentido:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO - SFH. COBERTURA SECURITÁRIA. MORTE DO MUTUÁRIO. QUITAÇÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO. CEF. CAIXA SEGUROS S/A. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. RECONHECIMENTO. AUTOS À ORIGEM. PRECEDENTES. Por integrarem a relação jurídica objeto da demanda - quitação de contrato de financiamento imobiliário em razão de sinistro por morte do mutuário - a CEF e a Caixa Seguradora S/A detêm legitimidade passiva para integrar a lide; Apelação provida para anular a sentença e reconhecer o litisconsórcio passivo necessário da CAIXA SEGUROS S/A e da CEF, nos termos do art. 47 do CPC, e fixar a competência da Justiça Federal, determinando o retorno dos autos à origem para intimação do litisconsórcio e novo julgamento. (TRF4, AC – Apelação Cível Processo nº 5017172-42.2015.404.7100/PR, Quarta Turma, Relator Sergio Renato Tejada Garcia, D.E. 25/02/2016).

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. SFH. COBERTURA SECURITÁRIA. QUITAÇÃO POR INVALIDEZ. LEGITIMIDADE PASSIVA DO AGENTE FINANCEIRO E DA SEGURADORA. LITISCONSÓRCIO NECESSÁRIO. Nas ações em que se discute a cobertura securitária para quitação contratual de imóvel financiado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação em razão de invalidez do mutuário, há repercussão direta no financiamento, estando legitimados passivamente para a causa tanto o agente financeiro como a seguradora, configurando-se hipótese de litisconsórcio passivo necessário. (TRF4, AC 5022506-29.2012.404.7108, Terceira Turma, Relator Fernando Quadros da Silva, juntado aos autos em 17/12/2015)

Nesses termos, rejeito a preliminar.

II.3. Da Cobertura Securitária

A autora Maria Celi Teixeira e seu marido, Lelis Weber da Silva, firmaram com a CEF em 27/03/2012 contrato de compra e venda de unidade isolada e mútuo com alienação fiduciária e utilização de recursos do FGTS. Referido contrato (evento 1, CONTR5), contemplava, em sua cláusula vigésima, a contratação de seguro, com prêmio a ser pago pelos devedores e acrescido ao valor do mútuo, cobrindo eventos como morte decorrente de causas naturais ou acidentes e invalidez permanente.

Após o falecimento do mutuário em 28/06/2018 (evento 1, CERTOBT10), foi solicitada a cobertura securitária junto à Caixa Seguradora, sobrevindo o indeferimento tendo em vista a preexistência da doença que teria causado a morte do segurado, não informada na Declaração Pessoal de Saúde (DPS) assinada ao firmar o contrato (evento 1, OUT11).

Na certidão de óbito do de cujus (evento 1, CERTOBT10) consta a sua causa mortis como sendo "pneumonia, ventilação mecânica, hipoxemia, infarto agudo do miocárdio, hipertensão arterial sistêmica". Com base em tal certidão, a Caixa Seguradora S/A negou a pretensão de cobertura securitária após a constatação de que o segurado já era portador de hipertensão arterial descompassada desde o ano de 2009, fazendo tratamento com o uso do medicamento malapril (evento 29, OUT4/OUT5).

Assim concluiu o Relatório de Sindicância de vida efetuado pela Caixa Seguros S/A:

Com base nas informações, exames e prontuários médicos não localizamos pré-existência de doença cardíaca antes da contratação do seguro, porém era portador de Hipertensão Arterial descompensada desde 2009 com uso de Malapril (evento 29, OUT4, fls. 18).

Ao contrário da conclusão da Caixa Seguros S/A, do exame das provas anexadas aos autos entendo que a morte do segurado não decorreu de enfermidade preexistente à contratação do seguro.

A hipertensão arterial, como é de sabença geral, é uma doença predisponente a outras, um fator de risco, e não um fator causal de morte. Segundo dados do Ministério da Saúde1, é diagnosticada em 24,7% da população. Portanto, é enfermidade que, juntamente com outros fatores de risco (como sedentarismo, obesidade, etc), pode vir a causar infarto agudo do miocárdio, doença que vitimou o segurado.

O acompanhamento dos fatores de risco secundários (hipertensão, tabagismo e obesidade) sem apresentação de sintomas de doença cardiovascular, dificilmente podem levar à consideração de patologia preexistente.

Tendo tal como premissa, verifica-se que não há no histórico médico do segurado constante nos autos informação de que tinha ele já elevado risco de doença cardiovascular por ocasião da assinatura do seguro adjeto ao contrato de mútuo, em 27/03/2012.

Ao contrário, em avaliação cardiológica efetuada em 21/07/2014 no Hospital Pompéia em Caxias do Sul, concluiu-se que o segurado não tinha outros fatores de risco cardiovasculares, sem cardiopatia conhecida. O paciente, à época, foi classificado como sendo de "baixo risco cardiovascular" (evento 29, OUT4, fls. 40).

O prontuário do segurado no Hospital Universitário de Canoas - onde veio a falecer - registra o primeiro episódio de dor torácica apenas em 16/06/2018 (evento 29, OUT4, fls. 56). Ainda assim, sua internação no nosocômio deu-se a partir de diagnóstico inicial de "infecção bacteriana não especificada" (evento 29, OUT4, fls. 50).

Nesse contexto, presentes múltiplas causas para o falecimento do segurado, tenho como ausentes provas de que detinha doença preexistente, omitida na Declaração Pessoal de Saúde (DPS), que veio a causar seu falecimento.

O Egrégio TRF da 4ª Região possui julgado em situação similar (AC 5083287-70.2014.4.04.7100), no qual foi determinada a liberação do gravame que incidia sobre imóvel financiado pela CEF em caso de falecimento de segurado já detentor de hipertensão arterial na assinatura do contrato que vem a falecer em decorrência de infarto. Tal julgado veio assim ementado:

ADMINISTRATIVO. SFH. SEGURO. QUITAÇÃO. DOENÇA PREEXISTENTE. À autora assiste o direito à liberação do gravame quando resta comprovado que a doença do segurado não é preexistente. (TRF4, AC 5083287-70.2014.4.04.7100, Quarta Turma, Relator Sérgio Renato Tejada Garcia, juntado aos autos em 10/10/2016)

Portanto, tenho como procedente a pretensão da parte demandante no tocante à utilização do seguro compreensivo para quitação do saldo devedor existente na data do óbito do mutuário, 28/06/2018, relativamente ao contrato de mútuo firmado em 27/03/2012.

II. 4. Da Quitação do Contrato de Financiamento e da Restituição das Parcelas Adimplidas

Verifico que a CEF não alegou a inadimplência das parcelas do financiamento contratado após o falecimento do de cujus. Além disso, era ele responsável por 100% da renda declarada, fazendo jus à quitação da integralidade do saldo devedor (evento 1, CONTR5).

Destarte, a cobertura securitária importa a quitação integral do contrato de financiamento, com a correlata liberação do gravame de alienação fiduciária, devendo a CEF ser condenada ao ressarcimento aos autores dos encargos mensais adimplidos desde a data do falecimento (em 28/06/2018) com a incidência de correção monetária com base no IPCA-E e juros de mora no patamar de 1% ao mês, a contar da citação e até o efetivo pagamento.

Indefiro, a propósito, o pleito para devolução em dobro das parcelas pagas. A regra prevista no art. 42, §único, CDC aplica-se tão somente naquelas hipóteses em que há prova de que o credor agiu com má-fé, o que não restou configurado no caso dos autos.

Nesse sentido, julgado do TRF da 4ª Região:

SFH. FAR. ÓBITO DO MUTUÁRIO. QUITAÇÃO. DANO MORAL. REPETIÇÃO. SIMPLES. 1. Os autores comunicaram ao Banco do Brasil S/A o óbito do mutuário dentro do prazo estabelecido na Cláusula Décima Sexta, parágrafo segundo do Contrato (Evento 1 CONTR8, CERTOBT10, OUT11). Não obtendo resposta da instituição financeira, continuaram adimplindo as parcelas. Quanto ao ponto, não há controversia, estando comprovado o ilícito e o nexo de causalidade. 2. Atento ao comando do artigo 944 do Código Civil vigente, entendo que o valor fixado pelo juízo a quo (R$ 5.000,00) se mostra adequado a título de indenização por danos morais. 3. Não prospera o pedido de restituição em dobro dos valores cobrados indevidamente, eis que o disposto art. 42, § único, do CDC aplica-se tão somente naquelas hipóteses em que há prova de que o credor agiu com má-fé, o que não restou demonstrado no caso dos autos. (TRF4, AC 5019496-65.2016.4.04.7001, Terceira Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, juntado aos autos em 01/08/2018, grifei)

II.5. Do dano moral

No caso dos autos, não considero que o agir da Caixa Seguros S/A e da CEF, negando a cobertura securitária à parte autora, tenha implicado dano moral indenizável.

Conforme reiterado entendimento jurisprudencial, o mero indeferimento administrativo não caracteriza, por si só, conduta ilícita capaz de ensejar a reparação por dano moral:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. SALÁRIO-MATERNIDADE. REMESSA OFICIAL. DANOS MORAIS. No que tange à remessa oficial, em se tratando de benefício de salário-maternidade (benefício previdenciário no valor de um salário mínimo, devido durante quatro meses), o julgado prescinde de liquidação e a condenação não excederá a sessenta salários-mínimos. A sentença, portanto, está não sujeita ao reexame necessário, por força do disposto no § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n.º 10.352/01. O mero indeferimento do pleito administrativo não é capaz de, por si só, ensejar qualquer abalo de ordem moral ao segurado, o que inocorreu no presente caso. (TRF4, Apelreex 5066799-74.2013.4.04.7100, Quinta Turma, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 03/12/2015)

Ademais, no caso dos autos, a negativa administrativa foi devidamente fundamentada, e partiu da premissa de que o segurado, de fato, não havia declarado doença que já detinha (hipertensão arterial) na Declaração Pessoal de Saúde (DPS) preenchida na contratação do seguro. Conquanto se tenha concluído, na presente sentença, que tal enfermidade não pode ser considerada causa do falecimento do de cujus - mas mero fator de risco -, isso não torna a decisão administrativa descabida a ponto de gerar abalo moral indenizável aos autores.

Como já decidiu o TRF da 4ª Região, a mera negativa de cobertura securitária, máxime quando fundamentada, não gera dano moral indenizável:

SFH. COBERTURA SECURITÁRIA. MINHA CASA, MINHA VIDA. FGHAB. ESTADO CIVIL. DANO MORAL. 1. A cobertura do Fundo Garantidor da Habitação Popular - FGHab decorre de expressa previsão legal, e pode abranger os eventos morte e invalidez permanente, bem como a ausência de pagamento das prestações em virtude de desemprego ou redução temporária da capacidade de pagamento e, ainda, despesas para a recuperação de danos físicos aos imóveis do Programa Minha Casa Minha Vida. 2. Comprovado documentalmente o óbito do mutuário e tendo a CEF ciência inequívoca do evento, a parte autora faz jus à cobertura do saldo devedor pelo FGHab. 3. Cabe à Caixa Econômica Federal comprovar que a ausência da declaração da existência da união estável poderia modificar as delimitações do contrato. 4. A parte autora tem direito à cobertura pelo FGHab, com o reconhecimento da quitação total do contrato de financiamento nº 8.5555.1752.628-5, bem como à devolução das parcelas adimplidas a partir do evento morte. 5. No caso dos autos, no entanto, não vislumbro que a CEF tenha agido ilicitamente ao negar a cobertura securitária, mormente para o fim de embasar indenização por danos morais. (TRF4, AC 5004849-12.2014.4.04.7203, Terceira Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, juntado aos autos em 22/09/2017)

Indefiro, portanto, o pleito para condenação da Caixa Segurso S/A ao pagamento de indenização por danos morais.

III - DISPOSITIVO

Ante o exposto, afasto as preliminares suscitadas e ponho fim à fase cognitiva do procedimento comum, com resolução do mérito (art. 487, inciso I do CPC), julgando procedentes em parte os pedidos veiculados para o fim de:

(a) declarar o direito da parte autora à utilização do seguro compreensivo contratado para quitação do saldo devedor a contar do evento sinistrado (28/06/2018), o que deverá ser implementado pela Caixa Seguradora S/A;

(b) condenar a CEF ao ressarcimento aos autores dos encargos mensais adimplidos desde a data do falecimento (em 28/06/2018) com a incidência de correção monetária com base no IPCA-E e juros de mora no patamar de 1% ao mês, a contar da citação e até o efetivo pagamento;

(c) indeferir a pretensão de condenação da Caixa Seguros S/A em indenização por danos morais

Ante a sucumbência recíproca, condeno cada uma das partes ao pagamento de honorários advocatícios à parte ex adversa, os quais, considerando o disposto no artigo 85, §2º, do CPC, arbitro em 10% sobre o valor da condenação, atualizáveis até a data do efetivo pagamento com base no IPCA-E, na proporção de 70% a favor da parte autora e 30% a favor das rés. A exigibilidade da condenação em face da parte autora resta suspensa em razão do deferimento da gratuidade de justiça.

Publique-se. Registre-se. Intime-se.

Interposto(s) recurso(s), caberá à Secretaria abrir vista à parte contrária para contrarrazões, e, na sequência, remeter os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

Transitada em julgado, certifique-se e, nada mais sendo requerido, dê-se baixa.

Inobstante ponderáveis os argumentos expendidos pelas partes, entendo que a sentença monocrática deve ser mantida em todos os seus termos.

No que concerne ao apelo da CEF.

No tocante à alegação de cerceamento de defesa, improcede a inconformidade da CEF. Haja vista as informações apontadas na sentença:

Assim concluiu o Relatório de Sindicância de vida efetuado pela Caixa Seguros S/A:

Com base nas informações, exames e prontuários médicos não localizamos pré-existência de doença cardíaca antes da contratação do seguro, porém era portador de Hipertensão Arterial descompensada desde 2009 com uso de Malapril (evento 29, OUT4, fls. 18). Grifei.

Ao contrário da conclusão da Caixa Seguros S/A, do exame das provas anexadas aos autos entendo que a morte do segurado não decorreu de enfermidade preexistente à contratação do seguro.

A hipertensão arterial, como é de sabença geral, é uma doença predisponente a outras, um fator de risco, e não um fator causal de morte. Segundo dados do Ministério da Saúde1, é diagnosticada em 24,7% da população. Portanto, é enfermidade que, juntamente com outros fatores de risco (como sedentarismo, obesidade, etc), pode vir a causar infarto agudo do miocárdio, doença que vitimou o segurado.

O acompanhamento dos fatores de risco secundários (hipertensão, tabagismo e obesidade) sem apresentação de sintomas de doença cardiovascular, dificilmente podem levar à consideração de patologia preexistente.

Tendo tal como premissa, verifica-se que não há no histórico médico do segurado constante nos autos informação de que tinha ele já elevado risco de doença cardiovascular por ocasião da assinatura do seguro adjeto ao contrato de mútuo, em 27/03/2012.

Ao contrário, em avaliação cardiológica efetuada em 21/07/2014 no Hospital Pompéia em Caxias do Sul, concluiu-se que o segurado não tinha outros fatores de risco cardiovasculares, sem cardiopatia conhecida. O paciente, à época, foi classificado como sendo de "baixo risco cardiovascular" (evento 29, OUT4, fls. 40). Grifei

O prontuário do segurado no Hospital Universitário de Canoas - onde veio a falecer - registra o primeiro episódio de dor torácica apenas em 16/06/2018 (evento 29, OUT4, fls. 56). Ainda assim, sua internação no nosocômio deu-se a partir de diagnóstico inicial de "infecção bacteriana não especificada" (evento 29, OUT4, fls. 50).

Nesse contexto, presentes múltiplas causas para o falecimento do segurado, tenho como ausentes provas de que detinha doença preexistente, omitida na Declaração Pessoal de Saúde (DPS), que veio a causar seu falecimento.

A cláusula em debate assim dispõe:

CLÁUSULA VIGÉSIMA - SEGURO - Durante a vigência deste contrato e até a liquidação da dívida, o(s) DEVEDOR(ES) concorda(m), e assim se obriga(m), em manter e pagar os prêmios de seguro acrescidos de eventuais tributos, de acordo com estipulado na Apólice de Seguro contratada por livre escolha, conforme declara(m) o(s) mesmo(s) DEVEDOR(ES) em documento anexo a este contrato destinado às coberturas:

MIP – morte decorrente de causas naturais ou acidentes e invalidez permanente ocorrida em data posterior à data da assinatura do contrato de financiamento do imóvel, causada por acidente pessoal ou doença, que determine a incapacidade total e permanente para o exercício da atividade laborativa principal do segurado, no momento do sinistro.

DFI – prejuízos decorrentes de danos físicos ao imóvel dado em garantia do financiamento: incêndio, raio ou explosão; vendaval; desmoronamento total; desmoronamento parcial, assim entendido a destruição ou desabamento de paredes, vigas ou outro elemento estrutural; ameça de desmoronamento, devidamente comprovada; destelhamento; inundação ou alagamento, ainda que decorrente de chuva.

(...)

PARÁGRAFO QUARTO – O(s) DEVEDOR (ES) declara (m) estar ciente (s) de que, não haverá cobertura para os riscos de morte e de invalidez permanente decorrentes e/ou relacionados à doença manifesta em data anterior à assinatura do contrato de financiamento, de conhecimento do segurado e não declarada na proposta do seguro, bem como decorrentes de eventos comprovadamente resultantes de acidente pessoal, ocorrido em data anterior à assinatura deste contrato.

A fazer prevalecer a pretensão da CEF, necessária seria a perícia médica prévia à contratação, ocasião em que a ora apelante disporia de documento formalizado hábil a estabelecer limites ou, caso detectada doença grave, recusar a contratação.

Quanto à existência de doença preexistente

Observa-se que a previsão estabelecida, para sua adequada aplicabilidade, exige, antes de qualquer coisa, uma apurada análise do quadro de saúde do contratante segurado, sem a qual resta impossibilitada uma conclusão acerca da época em que teve início a doença que levou a segurada a óbito. Assim, o mínimo que se deveria exigir, em tais situações, seria a realização de um exame médico do contratante segurado, prévio à contratação do seguro.

A propósito, leiam-se o seguinte precedente:

'PROCESSO CIVIL, CIVIL, CONSUMIDOR E SFH. RECURSO ESPECIAL. DEFICIÊNCIA NA FUNDAMENTAÇÃO. SÚMULA 284/STF. SEGURO HABITACIONAL. CONTRATAÇÃO FRENTE AO PRÓPRIO MUTUANTE OU SEGURADORA POR ELE INDICADA. DESNECESSIDADE. CLÁUSULA DE EXCLUSÃO DE COBERTURA POR DOENÇA PREEXISTENTE. PRÉVIO EXAME MÉDICO. NECESSIDADE. - É inadmissível o recurso especial deficientemente fundamentado. Incidência da Súmula 284/STF. - A despeito da aquisição do seguro ser fator determinante para o financiamento habitacional, a lei não determina que a apólice deva ser necessariamente contratada frente ao próprio mutuante ou seguradora por ele indicada. Precedentes. - Nos contratos de seguro, o dever de boa-fé e transparência torna insuficiente a inserção de uma cláusula geral de exclusão de cobertura; deve-se dar ao contratante ciência discriminada dos eventos efetivamente não abrangidos por aquele contrato. - O fato do seguro ser compulsório não ilide a obrigatoriedade de uma negociação transparente, corolário da boa-fé objetiva inerente a qualquer relação contratual, em especial aquelas que caracterizam uma relação de consumo. - No seguro habitacional, é crucial que a seguradora, desejando fazer valer cláusula de exclusão de cobertura por doença preexistente, dê amplo conhecimento ao segurado, via exame médico prévio, sobre eventuais moléstias que o acometam no ato de conclusão do negócio e que, por tal motivo, ficariam excluídas do objeto do contrato. Essa informação é imprescindível para que o segurado saiba, de antemão, o alcance exato do seguro contratado, inclusive para que, no extremo, possa desistir do próprio financiamento, acaso descubra estar acometido de doença que, não abrangida pelo seguro, possa a qualquer momento impedi-lo de dar continuidade ao pagamento do mútuo, aumentando sobremaneira os riscos do negócio. Assim, não se coaduna com o espírito da norma a exclusão desse benefício nos casos de doença preexistente, porém não diagnosticada ao tempo da contratação. Em tais hipóteses, ausente a má-fé do mutuário-segurado, a indenização securitária deve ser paga. Recurso especial não conhecido.' (REsp 1074546/RJ, Rel. Ministro Massami Uyeda, Terceira Turma, julgado em 22/09/2009, DJe 04/12/2009) (original sem grifos)

No caso dos autos, não ocorreu exame médico prévio à contratação. Diante disso, só poderia a seguradora se eximir de seu dever de indenizar se comprovasse que a mutuária agiu com má-fé quando da contratação do seguro, o que não é o caso. Em outras palavras, ante a inexistência de exame médico prévio, as apeladas não podem invocar a cláusula 20, § 4º do contrato no tocante à morte que resulta de doença alegadamente existente em data anterior à assinatura do contrato.

O agente financeiro não ignora que todos os seus contratos estão sujeitos ao seguro habitacional obrigatório, seguro que tem como seu maior objetivo, exatamente, a cobertura do sinistro. Se assim não for, o seguro obrigatório terá perdido toda sua utilidade. A relação contratual que se estabelece entre as partes a partir da concretização da avença e não gera apenas os deveres e obrigações expressamente estipulados.

Se é verdade que são inúmeros os contratos habitacionais firmados, também o é que tais contratos são de extrema relevância para os contratantes, pois dizem respeito à sua moradia, são longos (chegam a durar 30 anos) e consomem boa parte do orçamento familiar, não se podendo admitir que a instituição financeira deixe de analisar com cuidado a documentação apresentada, zelando pela apresentação de todas as informações necessárias ao correto cumprimento do contrato de seguro.

Além desses, as partes obrigam-se, também, ao cumprimento de deveres anexos ou secundários, derivados da boa-fé objetiva que deve nortear as relações contratuais. A boa-fé objetiva nada mais é do que uma norma de conduta a ser observada pelos contratantes tanto na fase pré-contratual como na fase de execução do contrato, segundo a qual as partes devem agir com lealdade e transparência durante toda a relação contratual, prestando os esclarecimentos e as informações que se fizerem necessárias.

Nos contratos habitacionais, mesmo fora do âmbito do Sistema Financeiro da Habitação, a contratação do seguro é obrigatória, pois visa garantir o objeto do contrato, ou seja, a obrigação de pagamento do saldo devedor, de forma que, na hipótese de ocorrência de morte ou invalidez permanente do mutuário, e ainda, garantir a solidez do imóvel dado em garantia.

Registre-se que se trata de contrato padronizado, vinculado a sistema complexo cuja compreensão escapa, muitas vezes, aos próprios especialistas. Regulam-se os riscos e sua cobertura, reclamando do mutuário o pagamento das parcelas mensais e a comunicação do sinistro à credora.

Sabe-se que a CEF e a seguradora aceitaram receber os prêmios do seguro sem a realização de exame médico prévio, e por isso não podem invocar a restrição contratual para se eximir da responsabilidade de indenizar.

Não é outro o entendimento do STJ, explicitado no trecho do voto da Ministra Nancy Andrighi, no RE 1.074.546 - RJ, julgado pela Terceira Turma em 05/05/2009, ora transcrito:

'Por outro lado, não se pode ignorar o entendimento de longa data pacificado nesta Corte, no sentido de que a cláusula de exclusão de cobertura por doença preexistente 'pode ser oposta pela seguradora ao segurado apenas se houver prévio exame médico ou prova inequívoca de má-fé do segurado' (AgRg no Ag 818.443/RJ, 3ª Turma, minha relatoria, DJ de 19.03.2007. No mesmo sentido: REsp 777.974/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Castro Filho, DJ de 12.03.2007; AgRg no Ag 777.211/MG, 3ª Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 16.10.2006; e REsp 576.088/ES, 4ª Turma, Rel. Min. Barros Monteiro, DJ de 16.09.2004). (sem grifos no original).

[...]

Não vislumbro, desse modo, a má-fé no agir do segurado, nem intencionalidade na omissão de sua doença.

Nesse mesmo sentido, colaciona-se entendimento do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:

ADMINISTRATIVO. CONTRATOS BANCÁRIOS. ARRENDAMENTO RESIDENCIAL COM RECURSOS DO PAR. SEGURO OBRIGATÓRIO. DENUNCIAÇÃO DA LIDE. IRB. INDENIZAÇÃO SECURITÁRIA. DOENÇA PREEXISTENTE. AUSÊNCIA DE MÁ-FÉ DO SEGURADO. INEXISTÊNCIA DE EXAME MÉDICO PRÉVIO. 1. Muito embora seja cabível a denunciação da lide com fundamento no artigo 70, inciso III, da Lei Civil Adjetiva, a fim de permitir que, no mesmo processo em que demandada para cobrança de seguro, a seguradora exerça seu direito de regresso contra o IRB, a formação do litisconsórcio passivo entre ambos pode ser rejeitada em nome da celeridade e da economia processual, por não ser condição para o exercício do direito de regresso, que ainda pode ser buscado via ação regressiva. 2. Nos contratos de arrendamento residencial com recursos oriundos do PAR, é obrigatória a contratação pelo arrendatário de um seguro de vida, através do qual, mediante o recebimento do prêmio, a seguradora assume o risco de ter que pagar, em favor do agente financeiro, a dívida que ainda exista, na hipótese de se verificar o óbito ou a invalidez permanente do segurado, contanto que o sinistro não decorra de doença preexistente. 3. Não pode ser negado o pagamento da indenização securitária quando não comprovado definitivamente que o segurado contratou o arrendamento residencial, com cobertura securitária, com o propósito deliberado de fraudá-lo, sonegando informações relevantes acerca de seu estado de saúde. 4. É firme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que 'a seguradora que não exigiu exames médicos previamente à contratação não pode eximir-se do pagamento da indenização, sob a alegação de que houve omissão de informações pelo segurado' (AgRg no Ag 1062383/RS, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em 02/10/2008, DJe 15/10/2008). (TRF4, AC 0010783-73.2008.404.7000, Terceira Turma, Relator João Pedro Gebran Neto, D.E. 15/02/2011) Grifei

Esse entendimento foi consolidado pelo STJ, na Súmula n° 609, in verbis:

"A recusa de cobertura securitária sob a alegação de doença pré-existente é ilícita se não houve a exigência de exames prévios à contratação ou a demonstração de má-fé do segurado."

Passo à análise do recurso adesivo da parte autora.

Restituição dos encargos em dobro.

Considerando a declaração do direito da parte autora à cobertura securitária, e o reconhecimento da data do sinistro como sendo 28/06/2018, deverá a CEF dar por quitado o saldo devedor em referida data.

Com a quitação do débito na data do sinistro, tem-se que os encargos contratuais pagos posteriormente acima dos valores devidos não poderiam ter sido cobrados.

E, havendo cobrança indevida em face do consumidor, o CDC - diploma cuja incidência foi reconhecida acima - preceitua:

"Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável." (destaquei)

Como se vê, a legislação consumerista prevê a devolução em dobro de valores cobrados indevidamente.

Bem verdade que o dispositivo legal transcrito faz ressalva à restituição em dobro, definindo que, se houver engano justificável, a restituição será simples.

Quanto à locução "engano justificável", a jurisprudência vem entendendo que, ausente má-fé do fornecedor, fica caracterizado engano justificável.

Nesse sentido:

"ADMINISTRATIVO E CONSUMIDOR. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SERVIÇOS TELEFÔNICOS NÃO SOLICITADOS PELO USUÁRIO. COBRANÇA INDEVIDA. DEVOLUÇÃO EM DOBRO. REVISÃO DO ACÓRDÃO. SÚMULA 7/STJ. 1. Dispõe o art. 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor que "o consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável". 2. Segundo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, o engano é considerado justificável quando não decorrer de dolo (má-fé) ou culpa na conduta do prestador do serviço público. 3. No caso, o Tribunal de origem, soberano na análise das circunstâncias fáticas da causa, concluiu que a cobrança indevida de serviços telefônicos não solicitados pelo usuário enseja a restituição em dobro dos valores pagos. 4. A modificação do julgado, nos termos propugnado, demandaria a análise acerca do elemento subjetivo norteador da conduta do agente (dolo ou culpa) o que é vedado a teor do contido no enunciado 7 da Súmula do STJ. 5. Agravo regimental a que se nega provimento." (destaquei)

(AGARESP 201303763268, Og Fernandes, STJ - Segunda Turma, DJE data:03/02/2014 ..DTPB:.)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. PERÍCIA. DESNECESSIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO DEMONSTRADO. PLANO DE EQUIVALÊNCIA SALARIAL. APLICAÇÃO DA TAXA REFERENCIAL (TR) PARA CORREÇÃO DO SALDO DEVEDOR. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA TABELA PRICE. LEGALIDADE. CAPITALIZAÇÃO ILEGAL DOS JUROS JÁ AFASTADA. REPETIÇÃO EM DOBRO DO INDÉBITO. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE CONSTATAÇÃO DA MÁ-FÉ. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. A análise da relação contratual sob a ótica do CDC não implica alteração das conclusões do acórdão impugnado. 2. O Superior Tribunal de Justiça entende que não configura cerceamento de defesa o julgamento da causa, sem a produção de prova pericial, quando o Tribunal de origem entender substancialmente instruído o feito, declarando a existência de provas suficientes para seu convencimento. 3. A aplicação do PES refere-se apenas às prestações mensais, e não ao reajuste do saldo devedor. 4. É possível a aplicação da Taxa Referencial (TR) para correção do saldo devedor de contrato de mútuo habitacional vinculado ao Sistema Financeiro da Habitação, ainda que firmado antes da vigência da Lei 8.177/91, desde que pactuado o mesmo índice aplicável à caderneta de poupança. 5. A utilização do Sistema Francês de Amortização, Tabela Price, para o cálculo das prestações da casa própria não é ilegal e não enseja, por si só, a incidência de juros sobre juros. 6. Verificada a existência de amortizações negativas, impõe-se o afastamento da indevida capitalização, providência já determinada pelo juízo de origem. 7. A Segunda Seção desta Corte firmou o entendimento de que a devolução em dobro dos valores pagos pelo consumidor somente é possível quando demonstrada a má-fé do credor, o que não ocorreu no caso dos autos. 8. Agravo regimental a que se nega provimento.

(STJ, 4ª Turma, AgRg no AREsp 533.528/RS, Rel. Ministro Raul Araújo, julgado em 03/02/2015, DJe 13/02/2015)

Pelo exposto, não há falar em repetição em dobro.

Acerca dos danos morais.

Em que pese o reconhecimento nesta sentença do direito à cobertura securitária, o indeferimento administrativo não gera abalo moral suficiente a embasar o pagamento de danos morais.

SFH. COBERTURA SECURITÁRIA. MINHA CASA, MINHA VIDA. FGHAB. ESTADO CIVIL. DANO MORAL. 1. A cobertura do Fundo Garantidor da Habitação Popular - FGHab decorre de expressa previsão legal, e pode abranger os eventos morte e invalidez permanente, bem como a ausência de pagamento das prestações em virtude de desemprego ou redução temporária da capacidade de pagamento e, ainda, despesas para a recuperação de danos físicos aos imóveis do Programa Minha Casa Minha Vida. 2. Comprovado documentalmente o óbito do mutuário e tendo a CEF ciência inequívoca do evento, a parte autora faz jus à cobertura do saldo devedor pelo FGHab. 3. Cabe à Caixa Econômica Federal comprovar que a ausência da declaração da existência da união estável poderia modificar as delimitações do contrato. 4. A parte autora tem direito à cobertura pelo FGHab, com o reconhecimento da quitação total do contrato de financiamento nº 8.5555.1752.628-5, bem como à devolução das parcelas adimplidas a partir do evento morte. 5. No caso dos autos, no entanto, não vislumbro que a CEF tenha agido ilicitamente ao negar a cobertura securitária, mormente para o fim de embasar indenização por danos morais. (TRF4, AC 5004849-12.2014.4.04.7203, Terceira Turma, Relatora Marga Inge Barth Tessler, juntado aos autos em 22/09/2017)

Por fim, cumpre destacar que, conforme reiterado entendimento jurisprudencial, o mero indeferimento administrativo não caracteriza, por si só, conduta ilícita capaz de ensejar a reparação por dano moral:

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. SALÁRIO-MATERNIDADE. REMESSA OFICIAL. DANOS MORAIS. No que tange à remessa oficial, em se tratando de benefício de salário-maternidade (benefício previdenciário no valor de um salário mínimo, devido durante quatro meses), o julgado prescinde de liquidação e a condenação não excederá a sessenta salários-mínimos. A sentença, portanto, está não sujeita ao reexame necessário, por força do disposto no § 2º do artigo 475 do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n.º 10.352/01. O mero indeferimento do pleito administrativo não é capaz de, por si só, ensejar qualquer abalo de ordem moral ao segurado, o que inocorreu no presente caso. (TRF4, APELREEX 5066799-74.2013.4.04.7100, Quinta Turma, Relator Paulo Afonso Brum Vaz, juntado aos autos em 03/12/2015)

Sendo assim, confirmo a sentença que negou a indenização por dano moral às autoras.

Nesse diapasão, verifica-se que a decisão proferida pelo Juízo a quo não merece qualquer reproche, devendo ser mantida, em todos os seus termos.

Ante o improvimento do apelo e do recurso adesivo, tendo sido mantida na íntegra a sentença quanto ao mérito, e em obediência ao disposto no § 11 do art. 85 do CPC, deve ser majorada a verba honorária com o acréscimo de 1% ao percentual fixado, mantida a proporção arbitrada na senteça, e observada a suspensão da exigibilidade em favor da parte autora, eis que litiga sob a AJG.

Em face do disposto nas súmulas n.ºs 282 e 356 do STF e 98 do STJ, e a fim de viabilizar o acesso às instâncias superiores, explicito que a decisão não contraria nem nega vigência às disposições legais/constitucionais prequestionadas pelas partes.

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação e ao recurso adesivo.



Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001732727v4 e do código CRC 56e72605.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
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Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5000775-33.2019.4.04.7107/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5000775-33.2019.4.04.7107/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

APELANTE: LUCAS TEIXEIRA WEBER DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELANTE: MARIA CELI TEIXEIRA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELANTE: CAIXA SEGURADORA S/A (RÉU)

APELANTE: ALINE TEIXEIRA WEBER DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

EMENTA

DIREITO ADMINISTRATIVO. SISTEMA FINANCEIRO DE HABITAÇÃO - SFH. PROCESSUAL CIVIL. COBERTURA SECURITÁRIA. CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO CONFIGURADO. DOENÇA PREEXISTENTE. NÃO OCORRÊNCIA. RESTITUIÇÃO EM DOBRO DE PARCELAS PAGAS INDEVIDAMENTE. INDEFERIMENTO. DANO MORAL INDEVIDO.

É entendimento deste Tribunal que o julgamento antecipado da lide não configura cerceamento de defesa, eis que desnecessária a realização de prova pericial quando os documentos anexados aos autos são suficientes para o deslinde da questão, como no caso dos autos.

Não demonstrada inequívocamente a anterioridade à contratação do seguro, da doença que vitimou o mutuário, não há falar em doença preexistente a motivar a recusa de cobertura.

Não restou demonstrado má-fé do agente financeiro quanto à exigência das prestações antes do reconhecimento da sua invalidez pela seguradora, razão pela qual indevido o pedido de restituição em dobro.

A responsabilidade por indenização de danos morais, seja ela subjetiva ou objetiva, pressupõe a comprovação de efetivo dano moral, ou seja, a efetiva comprovação de abalo moral relevante sofrido pela vítima. Com efeito, cabe ao magistrado, guiando-se pelo princípio da razoabilidade, analisar se houve dano grave e relevante que justifique a indenização buscada. Hipótese em que não configurado dano moral.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação e ao recurso adesivo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 03 de junho de 2020.



Documento eletrônico assinado por VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001732728v3 e do código CRC fd1fa216.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA
Data e Hora: 5/6/2020, às 16:4:49


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40001732728 .V3


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Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 26/05/2020 A 03/06/2020

Apelação Cível Nº 5000775-33.2019.4.04.7107/RS

RELATORA: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

PRESIDENTE: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

PROCURADOR(A): JUAREZ MERCANTE

APELANTE: ALINE TEIXEIRA WEBER DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELANTE: LUCAS TEIXEIRA WEBER DA SILVA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELANTE: MARIA CELI TEIXEIRA (AUTOR)

ADVOGADO: CARINE DALL AGNO (OAB RS091945)

APELANTE: CAIXA SEGURADORA S/A (RÉU)

APELADO: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF (RÉU)

APELADO: OS MESMOS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 26/05/2020, às 00:00, a 03/06/2020, às 14:00, na sequência 1258, disponibilizada no DE de 15/05/2020.

Certifico que a 4ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 4ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E AO RECURSO ADESIVO.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargadora Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA

Votante: Desembargador Federal RICARDO TEIXEIRA DO VALLE PEREIRA

Votante: Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 00:34:30.

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