Apelação/Remessa Necessária Nº 5005036-37.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LUIZ CARLOS DE SOUZA |
ADVOGADO | : | GEMERSON JUNIOR DA SILVA |
: | Alexandre da Silva Magalhães |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE RURAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
1. A aposentadoria por idade rural, no valor de um salário-mínimo, é devido aos trabalhadores rurais que comprovem o desempenho de atividade rural no período de carência, imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou anterior ao requerimento administrativo.
2. Comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, com base em início de prova material acompanhada por prova testemunhal idônea, deve ser computado o tempo de serviço respectivo, sendo devida a concessão da aposentadoria por idade desde a data do requerimento administrativo.
3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
4. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, observada a Súmula 76 desta Corte.
5. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 497, caput, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e ao reexame necessário e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de maio de 2017.
Ezio Teixeira
Juiz Federal Convocado
| Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Juiz Federal Convocado, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8961608v3 e, se solicitado, do código CRC F7546CD. | |
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| Signatário (a): | Ezio Teixeira |
| Data e Hora: | 22/05/2017 14:58 |
Apelação/Remessa Necessária Nº 5005036-37.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LUIZ CARLOS DE SOUZA |
ADVOGADO | : | GEMERSON JUNIOR DA SILVA |
: | Alexandre da Silva Magalhães |
RELATÓRIO
Trata-se de reexame necessário e apelação do INSS contra sentença que julgou procedente o pedido com o seguinte dispositivo:
"3. DISPOSITIVO:
Posto isso, julgo procedente o pedido inicial para reconhecer o tempo de labor rural do autor de 1998 a 2013 e condenar o INSS à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural a LUIZ CARLOS DE SOUZA, no valor equivalente a um salário mínimo mensal.
Condeno o INSS no pagamento das parcelas vencidas desde a data do requerimento administrativo, incidindo a contar do vencimento de cada prestação, os índices oficiais, e jurisprudencialmente aceitos[1].
Os juros de mora devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no
art. 3º do Decreto-Lei n.º 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula n.º 75 do Tribunal Regional da 4ª Região.
A contar de 01-07-2009, data em que passou a viger a Lei n.º 11.960, de 29-06-2009, publicada em 30-06-2009, que alterou o art. 1.º-F da Lei n.º 9.494/97, para fins de atualização monetária e juros haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança.
Quanto às parcelas vencidas, por se tratarem de obrigação de pagar, deve a parte autora proceder à execução da sentença na forma do art. 604 do CPC, juntando cópia de memorial de cálculos para a citação do réu (INSS), na forma do art. 730, do Código de Processo Civil.
No mais, condeno o requerido no pagamento das custas processuais (súmula 179 do STJ) e honorários advocatícios, estes no percentual de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data desta sentença.
Julgo extinto o processo com resolução do mérito, na forma do art. 269, I do Código deProcesso Civil.
Submetam-se os presentes autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região para reexame necessário.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Posteriormente, arquive-se."
O INSS, em seu apelo, busca a reforma da sentença para afastar a concessão da aposentadoria por idade rural. Alega que a parte autora não pode ser considerada como segurada especial pois exerce a atividade em área superior a 4 módulos fiscais, utiliza maquinário e mão-de-obra, caracterizando-se como produtor rural, necessitando verter contribuições.
A parte autora apresentou contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O caso dos autos trata do pedido de concessão de aposentadoria por idade rural desde 16/01/2014 (DER), mediante o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar suficiente ao preenchimento do período de carência, já tendo a parte autora preenchido o requisito etário na data do requerimento administrativo.
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
APOSENTADORIA POR IDADE DOS TRABALHADORES RURAIS
O benefício de aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais está previsto no art. 48, § 1º da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.032, de 28.4.95 e alterado pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)".
Já o art. 39, inciso I, da Lei nº 8.213/91, estabelece a concessão do benefício no valor de um salário-mínimo, desde que comprovado o desempenho da atividade rural em regime de economia familiar no período de carência, nos seguintes termos:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido;"
A partir da redação dos dispositivos supra, retira-se que os requisitos necessários à concessão do benefício são a qualidade de segurado, o preenchimento do período de carência e a idade. O legislador, sensível às condições mais dificultosas do trabalhador do campo, reduziu a idade mínima exigida em cinco anos, para ambos os sexos.
Anoto que não é necessária a carência em si, ou seja, as contribuições referentes ao período, mas apenas o lapso temporal da carência. Para verificar-se qual o número de meses necessários utiliza-se o art. 142, quando o segurado especial tenha iniciado suas atividades em período anterior à Lei nº 8.213/91, bem como sua tabela de transição. O segurado deverá, por conseguinte, comprovar a atividade rural pelo número de meses correspondente ao ano de implemento das condições.
Caso o segurado tenha iniciado o desempenho de suas atividades em período posterior à Lei nº 8.213/91, aplica-se a carência de 180 meses de atividade rural, conforme o art. 25, II da Lei nº 8.213/91.
Seguindo o entendimento do STJ, a atividade rural para preenchimento do período de carência não deve, necessariamente, ser contínua e ininterrupta. Em decorrência disso, o exercício de trabalho urbano intercalado ou concomitante ao labor campesino, por si só, não retira a condição de segurado especial do trabalhador rural. (AgRg no REsp 1342355/SP, DJe 26/08/2013; AgRg no AREsp 334.161/PR, DJe 06/09/2013).
ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
Inicialmente, entende-se por "regime de economia familiar" nas palavras da Lei nº 8.213/91, através de seu art. 11, § 1°, "a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados".
No que concerne à prova do tempo de serviço exercido nesse tipo de atividade, deve-se observar a regra art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
Para a análise do início de prova material, filio-me aos seguintes entendimentos sumulados:
Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Súmula nº 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
Súmula nº 577 do STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Quanto à contagem do tempo de serviço rural em regime de economia familiar prestado por menor de 14 anos, entendo ser devida. Conforme o STJ, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (AR nº 3.629/RS, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 9/9/2008; EDcl no REsp nº 408.478/RS, Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 5/2/2007; AgRg no REsp nº 539.088/RS, Ministro Felix Fischer, DJ 14/6/2004). No mesmo sentido é a Sumula nº 05 da TNU dos JEF.
Esclareço ser possível a formação de início razoável de prova material sem a apresentação de notas fiscais de produtor rural em nome próprio. Com efeito, a efetiva comprovação da contribuição é flexibilizada pelo fato de o art. 30, inciso III, da Lei nº 8.212/91, atribuir a responsabilidade de recolher à empresa que participa da negociação dos produtos referidos nas notas fiscais de produtor, seja na condição de adquirente, consumidora, consignatária ou se trate de cooperativa. Nesse caso, a contribuição especificada não guarda relação direta com a prestação de serviço rural em família, motivo pelo qual se pode reconhecer o tempo de serviço rural, ainda que ausentes notas fiscais de produtor rural como início de prova material.
A existência de início de prova material, todavia, não é garantia de obtenção do tempo de serviço postulado. A prova testemunhal é de curial importância para que se confirme a atividade e seu respectivo lapso temporal, complementando os demais elementos probatórios.
No que respeita à não exigência de contribuições para a averbação do tempo de serviço do segurado especial, a questão deve ser analisada sob o prisma constitucional, eis que em seu texto foi prevista a unificação da Previdência Social, outorgando a qualidade de segurado do RGPS aos trabalhadores rurais.
Obedecendo a tais mandamentos, o § 2º, do art. 55, da Lei nº 8.213/91 previu a possibilidade de que o tempo de serviço rural dos segurados especiais fosse computado independentemente do recolhimento de contribuições ou indenização:
"O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência conforme dispuser o Regulamento."
Tal entendimento foi esposado pelo Supremo Tribunal Federal na decisão liminar da ADIN 1664-4-DF. Assim, desde que devidamente comprovado, o tempo de serviço que o segurado trabalhou em atividade rural poderá ser utilizado para fins de qualquer aposentadoria por tempo de serviço independentemente de contribuições.
Também devem ser observados os precedentes vinculantes, conforme estipula o art. 927 do CPC/2015. Do STJ, temos as seguintes teses firmadas:
Tema 644 - Concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição a trabalhador urbano mediante o cômputo de atividade rural
"Não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência, eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL). (REsp 1352791/SP)
Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria"
"o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)
Temas 532, 533 - Repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei 8.213/1991
"3.O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana." (REsp 1304479/SP)
No caso dos autos, assim decidiu o Juízo a quo sobre o tempo de serviço rural postulado:
"Para comprovação do efetivo imprescindível exercício da atividade rural a existência, ao menos, de início de prova documental, sendo inadmissível a prova exclusivamente testemunhal.
Pretende o autor o reconhecimento de seu labor no meio rural, contudo, sustenta que sempre exerceu atividade rural, na condição de volante-bóia-fria, juntando aos autos prova indiciária de tal labor a seguinte documentação:
1) Declaração do Sindicado dos Trabalhadores Rurais, onde comprova o efetivo exercício de atividade rural do Autor;
2) Declaração de Testemunhas, onde comprova o efetivo exercício de atividade rural do Autor;
3) Certidão de Casamento do Autor, onde consta a profissão de lavrador, no ano de 1982;
3) Cópia de Matricula de Imóvel Rural, da propriedade onde o autor exerce atividades rurais;
4) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1988;
5) Ficha de Cadastro de Cooperativa, em nome do autor, onde consta sua residência em propriedade rural;
6) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1990;
7) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1991;
8) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1994;
9) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1995;
10) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1996;
11) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1998;
12) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 1997;
13) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 2000;
14) Cerificado de Cadastro de Imóvel Rural, dos anos de 2006 até 2009;
15) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 2009;
16) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 2011;
17) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 2012;
18) Nota Fiscal de Produtor, do ano de 2013;
Ademais, não se pode exigir farta prova documental na hipótese, sob o risco de afastar o único benefício que tais trabalhadores podem contar após terem esgotado sua força física e esperança no labor diário da terra. Sim, porque seria demais exigir que a trabalhadora campesina, carente de condições econômicas e de informação documentasse todas as suas atividades prevendo futura necessidade.
Contudo, à prova material existente nos autos deve ser aliada as provas testemunhais, que foram uníssonas em descrever a atividade do autor no meio rural durante o período mencionado na inicial.
O autor iniciou seu depoimento dizendo que labora na propriedade rural de sua família, juntamente com seus dois irmãos, desde os 9 anos de idade até os dias atuais. Relatou ainda, que nesta propriedade não há empregados e nem maquinários e que atualmente exerce atividades voltadas a ordenha de vacas, e também ao plantio de soja e milho.
A testemunha José Luiz Silva disse ser vizinho do autor e conhecê-lo desde 1983. Disse que o autor trabalha na propriedade rural de sua família juntamente com seus irmãos. Por fim, relatou que o autor sempre exerceu labor rural, inclusive até os dias atuais.
A testemunha Francisco Ferreira de Lima afirmou que conhece o autor há 40 anos e que tem conhecimento de que ele sempre laborou como lavrador. Disse, ainda, que o autor exerce atividade rural na propriedade de sua família, juntamente com seus irmãos. Por fim, relatou que o autor nunca exerceu qualquer atividade urbana.
Por fim, a testemunha Manoel Custódio Ribeiro afirmou que tem conhecimento de que o autor sempre laborou na propriedade de sua família, juntamente com seus irmãos e que nunca exerceu qualquer atividade urbana.
Relembre-se que o período laborado no meio rural pode ser comprovado mediante prova material indiciária que deve ser complementada por prova testemunhal, conforme pacífico entendimento jurisprudencial, veja-se:
PREVIDENCIÁRIO. PEDIDO DE CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO DO DIREITO. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. SENTENÇA MANTIDA. I - A hipótese é de apelação em face de sentença pela qual se julgouprocedente o pedido de concessão de aposentadoria por idade. II - A aposentadoria por idade, no que tange ao exercício de atividade rural, encontra-se disciplinada nos artigos 11, 48 §§ 2º e 3º, 142 e 143 da Lei nº 8.213/91 e, ainda, no art. 201, § 7, II da CF/88, tendo como pressupostos a exigência de que o labor rural tenha sido exercido em período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício, além da idade de 60 anos para o homem e 55 para a mulher. III - Cumpre consignar que para a comprovação do exercício da atividade rural não basta a prova meramente testemunhal, sendo imprescindível a produção de início de prova material e que a relação de documentos estipulados no art. 106 para a comprovação de atividade rural não é exaustiva, mas apenas exemplificativa (STJ, RESP 433237, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp e TRF2, AGTAC 361966 Primeira Turma Especializada). IV - Em tal contexto, tendo a autora mais de 55 anos por ocasião do requerimento do benefício, em atendimento ao requisito etário, e tendo apresentado início razoável de prova documental e testemunhal capaz de comprovar o exercício da atividade rural, faz jus ao benefício previdenciário de aposentadoria por idade de trabalhador rural (fls. 17/55 e 103/105). V - Apelação e remessa necessária conhecidas, mas não providas. (TRF-2 - REEX: 201302010181753, Relator: Desembargador Federal MARCELLO FERREIRA DE SOUZA GRANADO, Data de Julgamento: 25/02/2014, PRIMEIRA TURMA ESPECIALIZADA, Data de Publicação: 18/03/2014)
Evidente que a informalidade que permeia o trabalho no campo dificulta sobremaneira a prova do labor rural, por isso, a exigência de início de prova material, leia-se, documental, para a comprovação do tempo de serviço deve ser interpretada com temperamento, sob pena de inviabilizar a tal categoria o direito à aposentadoria.
Assim, atenta aos fatos públicos e notórios, a jurisprudência, ao permitir a prova do tempo de trabalho exclusivamente testemunhal, tem tentado proteger esses brasileiros para que sobrevivam com um mínimo de dignidade.
Junte a isso o fato de que o esposo da autora possuir apenas vínculos rurícolas no período da carência da autora, o que foi demonstrado pelo próprio INSS na contestação.
Desta forma, a procedência do pedido do autor é medida que se impõe."
À vista do contexto probatório, entendo preenchido o requisito trazido pelo art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, pois há razoável início de prova material da atividade rurícola da parte autora, considerando que a família possuía terras próprias e há comercialização da produção.
A prova testemunhal por seu turno, foi uníssona e convergente com as alegações da parte autora, confirmando sobejamente o exercício da agricultura nos moldes de economia familiar.
As teses sustentadas pelo INSS devem ser rechaçadas, pois restou esclarecido pelas provas produzidas que a área maior, onde se encontram as terras do autor, pertence aos demais membros da família, também agricultores, cada qual realizando o seu labor em partes individualmente consideradas. Esse fracionamento, inclusive, é comprovado pelos certificados emitidos pelo Incra (evento 1, OUT9, fls. 40/42).
Não há nos autos qualquer referência à utilização de mão-de-obra assalariada ou maquinário pesado, sendo que o autor possui apenas um trator e somente contrata terceiros para colher, o que é realizado em apenas dois dias por safra, o que é insignificante, sendo que a atividade preponderante é a pecuária, como se verifica das notas de produtor acostadas.
Por fim, destaco que a esposa do autor aposentou-se como segurada especial em 03/04/2012 (evento 1, OUT11, fl. 3), o que corrobora a alegação do exercício da atividade em regime de economia familiar.
Nessas condições, reconheço a atividade rural da parte autora, estabelecendo como marco inicial 01/01/1998, até 16/12/2013 (implemento do requisito etário), nos termos da sentença monocrática, considerando a inexistência de recurso voluntário da parte autora.
A partir desses fundamentos, considerando que o segurado nasceu em 16/12/1953, necessita atingir 180 meses de carência para a concessão do benefício postulado.
Reconhecida em favor da parte autora, por força desta ação, a atividade rural em regime de economia familiar no período de 01/01/1998 a 16/12/2013, equivalente a 15 anos, 11 meses e 16 dias de tempo de serviço e 192 meses de carência, preenche o período de carência imediatamente anterior à data de completude do requisito etário (60 anos em 16/12/2013).
Assim, deve ser mantida a concessão da aposentadoria por idade rural desde 16/01/2014 (DER), na forma do art. 49, II, da Lei 8.213/91.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Por força da sucumbência, o INSS deve arcar com os honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
TUTELA ESPECÍFICA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis.
Assim, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB 164.547.383-7), o que for mais vantajoso, a ser efetivada em 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
CONCLUSÃO
Mantida a sentença quanto ao reconhecimento da atividade rural, ao reconhecimento do período de carência e concessão da aposentadoria por idade rural com o pagamento das prestações vencidas desde 16/01/2014 (DER), prejudicado o exame do critério de aplicação dos juros e correção monetária.
A apelação da autarquia e o reexame necessário devem ser improvidos.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e ao reexame necessário e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Ezio Teixeira
Juiz Federal Convocado
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/05/2017
Apelação/Remessa Necessária Nº 5005036-37.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00044955020148160075
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da Republica Paulo Gilberto Cogo Leivas |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LUIZ CARLOS DE SOUZA |
ADVOGADO | : | GEMERSON JUNIOR DA SILVA |
: | Alexandre da Silva Magalhães |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/05/2017, na seqüência 2157, disponibilizada no DE de 02/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E AO REEXAME NECESSÁRIO E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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