APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5030332-61.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMA APARECIDA NAVARRO DE MELO |
ADVOGADO | : | INIS DIAS MARTINS |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONCESSÃO. RECONHECIMENTO DA ATIVIDADE RURAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. MANUTENÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA POR FORÇA DO CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
1. A aposentadoria por idade rural, no valor de um salário-mínimo, é devido aos trabalhadores rurais que comprovem o desempenho de atividade rural no período de carência, imediatamente anterior ao implemento do requisito etário ou anterior ao requerimento administrativo.
2. Comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, com base em início de prova material acompanhada por prova testemunhal idônea, deve ser computado o tempo de serviço respectivo, sendo devida a concessão da aposentadoria por idade desde a data do requerimento administrativo.
3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
4. Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, observada a Súmula 76 desta Corte.
5. Mantida a tutela antecipada por força da tutela específica para o cumprimento imediato do acórdão, devendo ser comprovada a manutenção do benefício em 45 dias, nos termos do artigo 497, caput, do novo Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao Apelo da parte ré e à remessa oficial, bem como manter a tutela antecipada, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de junho de 2017.
Ezio Teixeira
Relator
Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8976010v3 e, se solicitado, do código CRC 5A28D72C. | |
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5030332-61.2015.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMA APARECIDA NAVARRO DE MELO |
ADVOGADO | : | INIS DIAS MARTINS |
RELATÓRIO
Trata-se de remessa necessária e apelação do INSS contra sentença que julgou procedente o pedido, concedendo à parte autora o benefício de aposentadoria por idade rural desde a DER e condenando o INSS ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% sobre o valor da condenação.
Apela a parte ré pugnando pela reforma da sentença. Sustenta a inexistência de provas materiais contemporâneas. Requer a improcedência do feito e a redistribuição dos ônus sucumbenciais.
Com as contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
O caso dos autos trata do pedido de concessão de aposentadoria por idade rural desde 22/08/2014 (DER), mediante o reconhecimento da atividade rural em regime de economia familiar suficiente ao preenchimento do período de carência, já tendo a parte autora preenchido o requisito etário na data do requerimento administrativo.
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
APOSENTADORIA POR IDADE DOS TRABALHADORES RURAIS
O benefício de aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais está previsto no art. 48, § 1º da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.032, de 28.4.95 e alterado pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)".
Já o art. 39, inciso I, da Lei nº 8.213/91, estabelece a concessão do benefício no valor de um salário-mínimo, desde que comprovado o desempenho da atividade rural em regime de economia familiar no período de carência, nos seguintes termos:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido;"
A partir da redação dos dispositivos supra, retira-se que os requisitos necessários à concessão do benefício são a qualidade de segurado, o preenchimento do período de carência e a idade. O legislador, sensível às condições mais dificultosas do trabalhador do campo, reduziu a idade mínima exigida em cinco anos, para ambos os sexos.
Anoto que não é necessária a carência em si, ou seja, as contribuições referentes ao período, mas apenas o lapso temporal da carência. Para verificar-se qual o número de meses necessários utiliza-se o art. 142, quando o segurado especial tenha iniciado suas atividades em período anterior à Lei nº 8.213/91, bem como sua tabela de transição. O segurado deverá, por conseguinte, comprovar a atividade rural pelo número de meses correspondente ao ano de implemento das condições.
Caso o segurado tenha iniciado o desempenho de suas atividades em período posterior à Lei nº 8.213/91, aplica-se a carência de 180 meses de atividade rural, conforme o art. 25, II da Lei nº 8.213/91.
Seguindo o entendimento do STJ, a atividade rural para preenchimento do período de carência não deve, necessariamente, ser contínua e ininterrupta. Em decorrência disso, o exercício de trabalho urbano intercalado ou concomitante ao labor campesino, por si só, não retira a condição de segurado especial do trabalhador rural. (AgRg no REsp 1342355/SP, DJe 26/08/2013; AgRg no AREsp 334.161/PR, DJe 06/09/2013).
DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
Tratando-se de rurícola, cumpre ao julgador valorar os fatos e circunstâncias evidenciados com ênfase no artigo 5.º da Lei de Introdução ao Código Civil e levar em conta a realidade social em que inserido o trabalhador, na qual predomina a informalidade na demonstração dos fatos. Vale lembrar que não se mostra razoável exigir que os documentos carreados ao processo sigam sempre a forma prescrita em lei, por isso devem ser considerados válidos quando de outra forma atingir a finalidade precípua de comprovar o exercício da atividade rural, consoante disposto no art. 244 do CPC.
Visando à comprovação do efetivo exercício nas atividades agrícolas, a parte autora poderá apresentar, alternativamente, os documentos relacionados nos incisos do artigo 106 da Lei de Benefício (rol não exaustivo), não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no parágrafo 3º do art. 55 da Lei n.º 8213/91 e Súmula n.º 149 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Registre-se que o início de prova material, consoante interpretação sistemática da lei, configurar-se-á mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos postulados, devendo ser contemporâneos à época dos fatos que se pretende comprovar, ainda que parcialmente.
Outrossim, não há impedimento a que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que indiquem a continuidade da atividade rural.
Sabe-se, ainda, que os documentos expedidos em nome de integrantes do grupo familiar e a qualificação em certidões têm sido aceitos pela jurisprudência como início de prova material, haja vista que o trabalho com base em uma única unidade produtiva tem como regra a documentação emitida em nome de uma única pessoa. Esse entendimento, aliás, reproduz a orientação consolidada no âmbito das Turmas integrantes da 3ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (AGREsp n.º 603.663/RS, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 19-04-2004; REsp n.º 461.302/RS, Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJU de 12-05-2003).
Em sendo assim, o importante é a apresentação de documentos que caracterizem o efetivo exercício da atividade rural, os quais, como já referido, não precisam estar em nome da parte autora para serem tidos como início de prova do trabalho rural, pois não há essa exigência na lei e, via de regra, nesse tipo de entidade familiar os atos negociais são efetivados em nome do chefe do grupo familiar, geralmente o chefe da unidade familiar, o qual, normalmente é o genitor. Nesse sentido: EDREsp n.º 297.823/SP, STJ, 5.ª T, Rel. Min. Jorge Scartezzini, DJU de 26.08.2002; AMS n.º 2001.72.06.001187-6/SC, TRF 4.ªR, 5.ªT, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum, DJU de 05-06-2002).
De outro modo, a qualificação de lavrador ou agricultor em atos do registro civil tem sido considerada, também, como início de prova material, se contemporânea aos fatos, podendo estender-se ao cônjuge, se caracterizado o regime de economia familiar (STJ - AgRg no REsp n.º 318511/SP, 6.ª T, Rel. Min. Paulo Gallotti, DJU de 01.03.2004 e AgRg nos EDcl no Ag n.º 561483/SP, 5.ª T, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 24-05-2004). Ademais, não se exige prova material plena da atividade rural em todo o período requerido, mas início de prova material, o que vai ao encontro da realidade social no sentido de não inviabilizar a concessão desse tipo de benefício.
No tocante à possibilidade do cômputo do tempo na qualidade de segurado especial a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade do cômputo do tempo de serviço laborado em regime de economia familiar a partir dessa idade, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo recentemente a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-05, se pronunciado a favor do reconhecimento do tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo tal questão maiores digressões.
A existência de início de prova material, todavia, não é garantia de obtenção do tempo de serviço postulado. A prova testemunhal é de curial importância para que se confirme a atividade e seu respectivo lapso temporal, complementando os demais elementos probatórios.
In casu, a parte autora requer o reconhecimento do tempo de serviço rural em regime de economia familiar que alega sempre ter exercido.
Como prova material foram apresentados os seguintes documentos:
- Comprovante de pagamento do ITR e contribuição sindical rural em nome de Orlando Guirao Martinez, do ano de 1992 (evento 1, OUT2);
- Notas fiscais de produtor em nome de Orlando Guirao e Manoel Navarro Messa, Cristóvão Girau, dos anos de 1975, 1980, 1984, 1985, 1987, 1989, 1990, 1991, 1993, 1994, 1995, 1996 e 1997 (evento 1, OUT3);
- Certidão de Casamento da autora com Ezequiel Salustiano de Melo, celebrado em 19/02/1977, qualificado como funcionário público municipal, com averbação de separação judicial em 25/05/1984 e conversão em divórcio em 12/03/2009 (evento 1, OUT5);
- Escrituras públicas de compra e venda de imóveis rurais com 3,6 hectares de extensão entre parentes da parte autora, em 20/10/2006, e de imóvel rural com 12,10 hectares adquirido em 30/04/1971 pelos genitores da autora em condomínio com terceiros (evento 1, OUT10).
Realizada audiência judicial, a parte autora declarou, em seu depoimento pessoal (evento 55, VÍDEO2), que sempre trabalhou na roça, inicialmente, na propriedade dos pais. Com o casamento, persistiu na atividade com o marido, trabalhavam juntos. Depois de 2006 trabalha nas terras do filho Cristóvão Guirao, com 2 alqueires de extensão. Não possuem empregados, nem maquinário. Criam um pouco de gado e plantam mandioca e outros. Às vezes, trabalha em outras propriedades, como para Orlando Guirao, tio da autora, quando precisa de dinheiro. São propriedades diferentes. Nunca exerceu atividade diversa. Foi casada por 6 anos com o Sr. Ezequias, hoje ele é advogado. Na propriedade da família nunca tiveram empregados.
Pela testemunha Maria Rodrigues da Silva (evento 55, VÍDEO1), foi dito que conhece a autora há cerca de 40 anos, disse que sempre trabalhou na roça. Inicialmente em Zimaré em uma chácara do pai da autora com cerca de 5 alqueires, em culturas como café, mandioca, milho e feijão. Lá ela trabalhou muitos anos, depois um filho dela comprou terras em Itaúna, onde a autora passou a trabalhar. Disse que ela exerce a atividade até hoje, sem afastamentos. Durante o casamento e depois da separação, a autora trabalhou nas terras do pai.
Pela testemunha Adão Botelho Lopes (evento 55, VÍDEO3), foi dito que conhece a autora e sua família desde 1971/1972. Referiu que ela trabalhou na propriedade dos pais, hoje trabalha na chácara do filho, às vezes trabalha para terceiros. Cultiva pasto e mandioca. Faz de tudo na roça. A propriedade dos pais tinha cerca de 4 a 5 alqueires, sem empregados. Quando casou-se, continuou trabalhando com o pai, assim como após a separação. Nos dias atuais a autora ainda exerce a atividade rural.
Destaco que com a entrada em vigor do CPC/2015, o art. 927, inciso III, estabeleceu ser vinculante o acórdão de julgamento de recurso especial repetitivo.
Nesse sentido o tema 554 dos recursos especiais repetitivos tratou de estabelecer a necessidade de apresentação de início de prova material pelo trabalhador rural boia-fria. Todavia, sensível à realidade dos trabalhadores rurais, no que pertine à comprovação do labor campesino, assentou que a apresentação de provas somente sobre parte do período rural alegado seria suficiente e não violaria o teor da Súmula 149/STJ, que deve ser mitigada se os documentos apresentados forem corroborados por prova testemunhal idônea e robusta:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA. 1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias. 2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. 4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. 5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados. 6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp 1321493 PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
Com efeito, à vista do contexto probatório, não ignoro que a prova material não seja robusta, porém, conforme já exposto, a legislação previdenciária não exige prova documental plena, mas apenas um início, de modo que entendo preenchido o disposto no art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, satisfazendo o requisito do razoável início de prova material.
Outrossim, como já referido, as provas materiais possuem força probatória prospectiva (e não somente para o ano em que foram emitidas), preenchendo o hiato existente, face às peculiaridades do caso em apreço.
Os vínculos urbanos do ex-marido não guardam relação com a autora, pois são posteriores à separação do casal.
A prova oral, por seu turno, esclareceu que a autora sempre exerceu a atividade campesina, desde tenra idade até a atualidade, sem contratação de empregados, nem utilização de maquinário. As testemunhas relataram que a autora trabalhou inicialmente com seus genitores, depois com o marido, sendo que na constância do casamento e após a separação sempre exerceu a atividade nas terras dos pais. A partir de 2006, passou a trabalhar com o filho em terras que este adquiriu. Eventualmente, faz alguns bicos como bóia-fria.
Outrossim, tratando-se de segurada do sexo feminino, a dependência da família é maior, pois na atividade rural presume-se a realização de economia própria aos trabalhadores do sexo masculino com a maioridade civil, mas as mulheres, ainda mais em períodos pretéritos, não possuíam tal independência, restando mais ligadas ao núcleo familiar.
Logo, considerando que a prova testemunhal corroborou satisfatoriamente o acervo material apresentado, entendo que deve ser reconhecido em favor da parte autora como tempo de serviço rural em regime de economia familiar o período de 05/10/1969 (dos 12 anos de idade) a 22/08/2014 (DER), passível de cômputo como carência para fins previdenciários sem necessidade de recolhimento de contribuições.
O interregno de 05/10/1969 a 22/08/2014 totaliza 44 anos, 10 meses e 18 dias de atividade, equivalente a 539 meses de carência.
Como a parte autora completou 55 anos de idade no ano de 2012, pois nasceu em 05/10/1957, necessita cumprir 180 meses de carência.
Computando a parte autora mais de 180 meses de carência, e cumprido o requisito etário, é possível a concessão da aposentadoria por idade rural desde 22/08/2014 (DER).
CONSECTÁRIOS. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, que fixo em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
TUTELA ANTECIPADA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis. Assim, mantenho a tutela antecipada, por força da tutela específica, quanto à implantação do benefício da parte autora (NB 164.643.284-0), comprovada a sua manutenção em 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
CONCLUSÃO
Mantida a sentença monocrática, agregando-se fundamentação para estabelecer o reconhecimento do tempo de serviço rural em favor da parte autora no interregno de 05/10/1969 a 22/08/2014 (DER), conceder o benefício de aposentadoria por idade rural com o pagamento de parcelas vencidas desde a DER e condenar o INSS ao pagamento de honorários advocatícios no importe de 10% sobre o valor da condenação.
Improvidos o recurso da parte ré e a remessa oficial.
DISPOSITIVO
Diante do exposto, voto por negar provimento ao Apelo da parte ré e à remessa oficial, bem como manter a tutela antecipada.
Ezio Teixeira
Relator
Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8976008v5 e, se solicitado, do código CRC A655C0B0. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/06/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5030332-61.2015.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00025490220148160121
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Alexandre Amaral Gavronski |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VILMA APARECIDA NAVARRO DE MELO |
ADVOGADO | : | INIS DIAS MARTINS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 07/06/2017, na seqüência 948, disponibilizada no DE de 23/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE RÉ E À REMESSA OFICIAL, BEM COMO MANTER A TUTELA ANTECIPADA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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