APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001838-53.2015.4.04.7004/PR
RELATOR | : | HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | MITUKO MIYAWAKI TOMINAGA |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
: | GILMARA GONÇALVES BOLONHEIZ | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADO. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 11.960/2009. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE PRÓPRIA (EXECUÇÃO). HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS E DESPESAS PROCESSUAIS. DATA DE INÍCIO DO BENEFÍCIO.
1. Tendo em vista que o conjunto probatório demonstrou o exercício de atividade rural durante o período exigido em lei, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
2. A extensão da propriedade não impede, por si só, o reconhecimento da condição de segurado especial, devendo ser analisada juntamente com o restante do conjunto probatório que, na hipótese, confirmou o exercício da atividade rural em regime de economia familiar. Precedentes desta Corte.
3. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo, e diante da pendência, nos tribunais superiores, de decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes.
4. O INSS é condenado nos honorários advocatícios de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão que reforme a sentença de improcedência, em conformidade com o disposto na Súmula n.º 76 deste Tribunal.
5. O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96).
6. O benefício de aposentadoria por idade rural é devido a contar da data de entrada do requerimento administrativo, nos termos do artigo 49, II, da Lei nº 8.213/91.
7. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 461 do CPC.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais e determinar o imediato cumprimento do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de julho de 2016.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8356590v11 e, se solicitado, do código CRC C13CA6B9. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Hermes Siedler da Conceição Júnior |
| Data e Hora: | 29/07/2016 17:47 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001838-53.2015.4.04.7004/PR
RELATOR | : | HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | MITUKO MIYAWAKI TOMINAGA |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
: | GILMARA GONÇALVES BOLONHEIZ | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
MITUKO MIYAWAKAI TOMINAGA ajuizou ação ordinária contra o INSS objetivando a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural a contar do requerimento administrativo, formulado em 28/10/2010.
Na sentença, o Julgador monocrático assim dispôs:
"Pelo exposto, forte no art. 269, inciso I, do CPC, julgo improcedente o pedido.
Condeno a parte autora a pagar honorários advocatícios ao INSS, os quais, sopesados os critérios legais (CPC, art. 20, §§ 3.º e 4.º), arbitro em 10% do valor atualizado da causa. A exigibilidade dessa verba, no entanto, está condicionada ao disposto no art. 12 da Lei n.º 1.060/1950, em razão do benefício da justiça gratuita concedido à parte autora.
Sem custas (art. 4, inciso II, da Lei n.º 9.289/1996).
Decorrido o prazo recursal, nada sendo requerido pelo réu no prazo de 30 dias, certifique-se e arquivem-se os autos.
Sentença publicada e registrada eletronicamente, na data do lançamento da fase no Sistema de Processo Eletrônico (e-proc). Intime(m)-se."
A parte autora apela alegando, em síntese: a) estar comprovado o exercício de atividade rural no período de carência exigido em lei, tendo direito à concessão do benefício de aposentadoria por idade rural e; b) que o tamanho da propriedade e a contratação eventual de terceiros não descaracterizam o regime de economia familiar.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão-somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Da Aposentadoria por Idade Rural
Saliento que o exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ. Trata-se de exigência que vale tanto para o trabalho exercido em regime de economia familiar quanto para o trabalho exercido individualmente.
O rol de documentos do art. 106 da LBPS não é exaustivo, de forma que documentos outros, além dos ali relacionados, podem constituir início de prova material, que não deve ser compreendido como prova plena, senão como um sinal deixado no tempo acerca de fatos acontecidos no passado e que agora se pretendem demonstrar, com a necessária complementação por prova oral.
Não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013)
Caso Concreto
Conforme se extrai da análise dos autos, a parte autora implementou o requisito etário em 15/08/2004 e requereu o benefício na via administrativa em 28/10/2010.
Para comprovar o exercício de atividade rural trouxe aos autos os seguintes documentos:
a) certidão de casamento, datada de 22/12/1973, onde consta a ocupação do marido como lavrador (EV 1, PROCADM9, p. 5);
b) notas de produtor rural (EV 1, NFISCAL 8, páginas 1/5) (EV 1, PROCADM9, páginas 6/9;
c) matrícula de imóvel rural (EV 1, PROCADM9, páginas 20 e 21);
d) ITR dos anos de 1991, 1992, 1993, 1994, 1995 e 1996 (EV 1, PROCADM 9, páginas 22/25);
e) declaração da Cocamar com a relação da entrega de mercadorias e;
g) CCIR dos anos de 2006/2009 (EV 1, OUT 4, p. 1).
Na audiência, realizada em 28/09/2015, foi tomado o depoimento pessoal da autora e ouvidas 2 testemunhas.
Depoimento pessoal da autora (VÍDEO 02)
(...)
J. A senhora mora onde hoje?
A. Umuarama.
J. Faz tempo que a senhora mora aqui em Umuarama?
A. Cinco anos.
J. Cinco anos?
A. Sim.
J. E antes morava aonde?
A. Altônia.
J. Lá na cidade ou no sítio?
A. No sítio, até 84. Depois nois muda pro cidade, mais de a gente ia trabalhar no sítio.
J. Por que a senhora foi morar na cidade em 1984?
A. por causa das crianças irem na escola.
(...)
J. A senhora teve quantos filhos?
A. Quatro filho.
J. Hoje eles não moram mais com a senhora ou todos?
A. Um mora junto.
J. Os outros filhos já casaram, estudaram?
A. Sim.
J. Tem algum formado já?
A. Já.
J. O que que esse formado faz?
A. Administrador.
J. E esse sítio lá de Altônia, a senhora tem ele ainda, a sua família tem o sítio ainda?
A. Não, já vendemos.
J. Quando foi vendido mais ou menos?
A. 2013.
(...)
J. E ai depois de 2013 com o que a família sobrevive? Qual foi a fonte de renda da família após 2013? Vocês tem algum negócio?
A. Tem a aposentadoria do marido né.
J. Essa é a única fonte de renda de vocês?
A. Sim.
J. Esse sítio, ele tinha 49 alqueires mais ou menos?
A. Sim. È que era sócio com o irmão. (...).
J. E o marido da senhora, o nome dele é ...
A. Yoshiro Tominaga.
J. Yoshiro né?
A. Sim.
J. E o irmão dele é o Tetugo?
A. Sim.
J. Em 84, quando vocês foram morar em Altônia, quem que ficou morando lá no sítio?
A. É que nois ia da cidade pra trabalhar pro sítio né. Não tinha ninguém.
(...).
J. E o que que era cultivado lá no sítio?
A. Tinha café, nois plantava um pouco de verdura.
J. Tá mais, mesmo depois que houve aquela geada de75 comtinuou com café?
A. Sim.
J. Até quando que foi cultivado o café lá?
A. Eu não lembro muito bem.
J. Depois de 90 teve café ou não?
A. Não, arrancaram.
J. E aí depois que acabou o café fizeram o que com a terra? O que que plantaram?
A. Pasto. Fizeram pasto.
J. Aí foi só criação de gado.
A. Sim.
J. Criação de gado leiteiro ou de corte?
A. De corte.
J. Quantas cabeças eram criadas lá mais ou menos?
A. Não sei bem certo não, más umas 200, por aí.
J. Vocês chegaram a plantar soja, milho lá?
A. Plantava, mais não saia né. Acho que plantou uma ou duas vezes só.
J. O cunhado da senhora, o Tetugo, morava em Altônia ou morava no sítio?
A. Morou um tempo. Depois ele veio pra Umuarama por causa das criança pra estudar.
J. A senhora sabe quando que ele veio aqui pra Umuarama?
A. Lá por 81.
J. Ele foi bem antes da senhora.
A. Sim.
J. E ele tinha alguma outra atividade profissional?
A. Não. Ele ia trabalhar lá também.
J. Mesmo Vindo de Umuarama ele ia trabalhar lá todos os dias.
A. Sim. Ele posava lá tamém né.
J. E a senhora ia todo dia pro sítio?
A. Sim.
J. Segunda a Sábado?
A. É.
J. E o que a senhora fazia lá quando tinha só pasto?
A. Plantava um pouco de verdura.
J. Essa verdura era pra consumo da família ou era pra vender?
A. Pra vender.
J. E quem que ajudava a família?
A. Nois mesmo plantava.
J. Só a família?
A. É.
J. Quem por exemplo? A senhora, seu marido e seu cunhado?
A. E meu cunhado.
J. Só vocês três?
A. Sim.
J. Seu marido tinha alguma outra atividade lá em Altonia, como comércio?
A. Não. Não tinha nada.
J. foi pra Iporã que a senhora foi, ou foi pra Altonia?
A. Ficou um ano só.
J. Em Iporã?
A. É.
J. Ai depois a senhora foi pra Altonia.
A. Foi pra Altonia, é.
J. Ficou lá um ano lá um ano, e voltou para a cidade de Altônia.
A. Sim.
J. Quando residiu em Iporã, ia trabalhar no sítio em Altônia duas ou três vezes por semana de carro com o marido. Era isso mesmo?
A. Nois quase ia todo dia sim, é.
J. Após voltar para Altônia, continuou indo trabalhar no sítio duas a três vezes por semana. Residia 18 quilômetros do sítio. É isso mesmo?
A. Sim.
J. No sítio residia durante todo o período uma família de retireiros que trabalha de empregado no sítio. Isso é verdade? Tinha uma família lá?
A. É, tinha, más é, só ajudava assim.
J. E até quando que essa família ficou lá?
A. Não lembro certo.
J. Quando vocês vieram aqui pra Umuarama tinha família no sítio ainda?
A. Não. É o sobrinho que cuidava lá né.
J. Que sobrinho que era?
A. Filho do Tetsuo.
J. Tá, mais essa família aqui, que família que era essa? Era família do sobrinho ou tinha outra?
A. Não.
J. Ou tinha empregados?
A. Não, depois disso o meu sobrinho cuidava, então não tinha família não.
J. Mais antes do sobrinho cuidar, que família que ficou lá, a senhora lembra?
A. ajudava lá a tirar um pouco de leite.
J. Quando tinha pasto.
A. Sim.
J. A senhora lembra o período que ele ficou lá?
A. Não, não lembro.
J. Até hoje tem retireiro empregado, isso a senhora falou em 2009, em 2010 melhor dizendo. Em 2009, ou 10, tinha empregado lá ainda, tinha retireiro?
A. Acho que entrava uns e depois saia né.
J. Além da família do retireiro nas colheitas de café, tinha outras famílias que residiam no sítio para trabalhar. Quando tinha café, tinha outras famílias morando lá?
A. Um pouco né.
J. Tinha uma espécie de colônia então lá no sítio.
A É, umas casinha né.
J. Mais isso é antes do gado.
A. É. Antes do gado.
J. Então a senhora ajudava na horta e na colheita do café?
A. Sim.
J. E quando tinha gado, o que que a senhora fazia?
A. plantava um pouco de verdura né.
J. Más o trabalho da senhora fazia diferença lá? A senhora tinha que trabalhar todos os dias?
A. É, ajudava na lida né.
Oitiva da testemunha Ermindo Lopes Monteiro (VÍDEO 03)
J. O senhor conhece a dona Mytuko há quanto tempo mais ou menos?
T. Eu conheço ela desde a década de 70.
J. E como senhor conheceu ela?
T. Eu conheci porque eu tinha uma propriedade lá perto na época. Não era tão vizinho, más era perto lá.
J. Onde ficava essa propriedade?
T. Na estrada Gavião também.
J. Já em Altônia?
T. Em Altônia.
J. Eles moravam no sítio naquela época?
T. Eles moravam no sítio.
J. Ela e o marido dela o Sr ... . Como é que é o nome dele, o Sr. Lembra?
T. Nois conhece por Fernando, agora o nome japonês é outro nome, é ... .
J. Yoshiro.
T. Yoshiro né. Então, mais o nome que nois dava pra ele era Fernando.
J. Ele tinha esse sítio lá em Altônia.
T. É.
J. Ele tinha sócio, era só dele, era da família?
T. Parece que tinha um irmão de sócio.
J. O Sr. Tetuo, o Sr. Chegou a conhecer o Teuo?
T. Eu cheguei a conhecer também.
J. E o Sr. Ficou lá vizinho deles até quando mais ou menos?
T. A gente entrou lá em 64, e mais ou menos na década de 70 que eles chegaram.
(...)
J. Quando que o Sr. Vendeu a propriedade?
T. A minha propriedade eu vendi no ano de 2011 me parece.
J. quando o Sr. vendeu, eles tinham a propriedade ainda?
T. Eu acho que, até nessa época eles tinham né.
J. Eles venderam depois.
T. Eles venderam logo depois.
J. Eles plantavam café lá?
T. Plantavam café.
J. Quando que acabou o café mais ou menos, o Sr. Lembra?
T. O café deve ter acabado ...
J. Na década de noventa.
T. Década de noventa ainda tinha café. Até mais ou menos 98/99, por aí, ainda tinha. Aí depois que acabou o café, eu sei que teve um tempo eles saíram pra cidade né, mudaram pra Altônia, más ainda continuavam trabalhando no sítio. Mexeram com horta né, com criação, essas coisas né.
J. Criação de gado?
T. Não posso te afirmar, más acho que tinha gado também né.
J. Mais depois que acabou o café, qual que era o forte? Com o que eles ganhavam dinheiro? Por que era uma propriedade grande, 49 alqueires né?
T. Então, até o meu conhecimento, foi mais ou menos no tempo do café né. Aí depois eu não posso afirmar pra Vossa Excelência.
J. Tinha alguma família que morava lá quando eles foram pra morar em Altônia? Tinha alguma família que ficou morando lá?
T. Não tenho conhecimento não.
J. Quando eles começaram a criar gado, sabe se tinha algum retireiro que morava lá, alguma família?
T. Também não sei.
J. Quando eles foram morar na cidade por volta da década de 80, a Sra. Mytuko ia todo dia lá pro sítio? De vez em quando?
T. Me parece que é todo dia, não posso afirmar pra Vossa Excelência, me parece que eles iam sempre lá no sítio.
Oitiva da testemunha Otacílio José da Silva (VÍDEO 04)
J. O Sr. conhece a dona Mytuko há quanto tempo mais ou menos?
T. Eu conheço ela de 82 até a base de 2000.
J. Onde que o Sr. conheceu ela?
T. Eu conheci lá no sítio.
J. no sítio de quem?
T. No sítio dela. Eu tinha um sítio vizinho com eles, fundo com eles.
J. O senhor ficou com o sítio até dois mil ...
T. eu morei lá de 82 até 89. Em 89 mudei para Ouro Verde. Morei um na Ouro Verde e de Ouro verde eu mudei pra Altonia. Mais eles já trabalhava na fazenda, e lá continuou trabalhando. Até 2001 mais ou menos eu conheci eles trabalhando.
J. A dona Mytuko nesse tempo todo mourou lá no sítio, ou ela na morou lá o tempo todo?
T. Não, eu conheci ela morando um tempo lá no sítio, depois eu mudei e depois eles mudou tamém e aí eu via sempre eles indo lá trabalhar mais não ...
J. E qual que era a atividade deles lá no sítio?
T. Olha, cultivava horta, mexia com café, mexia com lavoura branca, (...).
J. Quando que o café acabou, o senhor sabe me dizer? Quando que eles tiraram o café?
T. Num sei, ai o senhor vai me desculpar eu não sei quando que eles tiraram o café. Eu sei que eu ia lá e eles tava lavando verdura pra ensacar, (...). Tão eu via ela carpindo lá na horta lá.
J. Tinha alguém que morava lá no sítio quando eles foram pra cidade?
T. Olha, acho que tinha gente morando lá com eles, más agora não sei o que que eles faziam.
J. O que que é? Tinha uma família que morava lá?
T. É, acho que eles tinham uma família que morava lá, agora não sei o que é que eles faziam, se era empregado, o que que era. Isso ai eu não posso falar pro senhor não.
J. E essa pessoa que morava lá, essa família, fazia o que lá?
T. Acho que eles tocava café do outro irmão dele, que eles era sócio do irmão, acho que tocava café pro Oto irmão. (...)
J. Ta, mais e a horta, quem que mexia na horta?
T. Quem mexia na horta era eles, (...).
J. E quem que ajudava eles na horta?
T. Oia, quem ajudava que eu via sempre o seu Fernando lá.
J. Seu Fernando é o marido dela.
(...).
J. E esse irmão aí do Sr. Fernando Tominaga, ele morava no sítio? Ia lá de vez em quando ou o senhor nunca viu?
T. Quem, o ...
J. O Tetugo.
T. Oia, eu não conhecia ele por Tetugo, eu conhecia ele por Bernardino. E também não vo dizer ao senhor que ele morava lá porque poça relação de intimidade eu tinha com ele. (...)
J. Quantas casas tinha lá no sítio?
T. Ah, lá tinha bastante. Tinha umas cinco, seis casa lá.
J. E as casas eram todas habitadas, tinha gente morando em todas as casas?
T. Oia, tinha umas que tinha gente morando, otras não ...
J. No tempo que tinha café, tinha todas as casas habitadas dessas famílias que trabalhavam com café?
T. É, tinha família, acho que tocava café lá tamém. Agora não sei se tocava com ele ou com o irmão dele, que eles era sócio lá no sítio né.
Há farta documentação acarreada aos autos que constituem início de prova material para comprovação do efetivo desempenho da atividade rural exercido pela autora ao longo de sua vida. Por sua vez, os depoimentos das testemunhas foram uníssonos e convincentes em demonstrar o exercício desempenhado pela demandante durante o período de carência exigido, constituindo a atividade rural como a única fonte de renda do grupo familiar.
É verdade que a existência de empregados importa na descaracterização do regime de economia familiar (Lei nº 8.213/91, art. 11, § 7º). Ocorre que, "in casu", o marido da autora possui sociedade com o irmão, de forma que os trabalhadores em questão não estão vinculados a ele, conforme trecho do depoimento da testemunha Otacílio José da Silva, que diz:
(...)
J. Tinha alguém que morava lá no sítio quando eles foram pra cidade?
T. Olha, acho que tinha gente morando lá com eles, más agora não sei o que que eles faziam.
J. O que que é? Tinha uma família que morava lá?
T. É, acho que eles tinham uma família que morava lá, agora não sei o que é que eles faziam, se era empregado, o que que era. Isso ai eu não posso falar pro senhor não.
J. E essa pessoa que morava lá, essa família, fazia o que lá?
T. Acho que eles tocava café do outro irmão dele, que eles era sócio do irmão, acho que tocava café pro Oto irmão. (...)
(...)
Com efeito, nos comprovantes de ITR dos anos de 1991, 1992 e 1993 (EV 1, PROCADM 9, páginas 22 e 23) consta como contribuinte o irmão do autor, o que corrobora o trecho do depoimento acima transcrito. Necessário observar, ainda, que em 1994 já não havia mais qualquer empregado na propriedade (EV 1, PROCADM9, páginas 24 e 25).
Ademais, cabe ressaltar que a extensão da propriedade rural só passou a ser requisito para caracterização da condição de segurado especial a partir da vigência da Lei n. 11.718, de 20-06-2008, que deu nova redação ao inciso VII do art. 11 da Lei de Benefícios da Previdência Social. Com efeito, antes de tal alteração legislativa, não havia previsão legal que condicionasse a qualidade de segurado especial à dimensão do imóvel rural.
Tendo em vista que o período a ser considerado para concessão do benefício é anterior à referida alteração legislativa, tal regramento não se aplica ao caso dos autos. Dessa forma, o tamanho da propriedade constitui apenas mais um fator a ser analisado com o restante do conjunto probatório, não podendo, por si só, obstaculizar o reconhecimento da condição de segurado especial, salvo nas hipóteses em que a área do imóvel seja de tal monta que inviabilize a sua exploração apenas pelo grupo familiar.
Logo, a análise de vários fatores - localização do imóvel, tipo de cultura explorada, quantidade de produção comercializada, número de membros familiares que trabalham na atividade rural, utilização ou não de maquinário agrícola e de mão de obra de terceiros de forma não eventual - juntamente com a extensão do imóvel, é que permitirão um juízo de valor seguro acerca da condição de rurícola do segurado. As circunstâncias de cada caso concreto é que vão determinar se o segurado se enquadra ou não na definição do inc. VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0017609-37.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, D.E. 10/04/2012; EIAC n. 2000.04.01.043853-1/RS, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, unânime, DJU de 11-02-2004).
Imperioso destacar que o artigo 11, VII, "a", "1", da Lei nº 8.213/91 determina:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social as seguintes pessoas físicas:
(...)
VII - como segurado especial: a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo a ele que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
a) produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
1. agropecuária em área de até 4 (quatro) módulos fiscais;
(...)
No caso em tela a propriedade possuía 49 alqueires, sendo que o marido da autora cuidava da mesma em sociedade com o irmão, razão pela qual a extensão deve ser dividida por dois, de maneira que cabia a autora e ao marido apenas parte da extensão total. Importante mencionar, ainda, que mesmo que toda a terra fosse de propriedade da autora e de se marido, ainda sim estaria abarcada pelo permissivo legal, haja vista que quatro módulos fiscais equivalem a aproximadamente 56 ha.
O conjunto probatório, portanto, comprova o exercício da atividade rural pela parte autora desde longa data, até, no mínimo, a ocasião em que requereu o benefício perante o INSS.
Correção monetária e juros de mora
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais.
Honorários advocatícios
O INSS é condenado nos honorários advocatícios de 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data do acórdão que reforme a sentença de improcedência, em conformidade com o disposto na Súmula n.º 76 deste Tribunal.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas processuais no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei n.º 9.289/96).
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora, diferir para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais e determinar o imediato cumprimento do acórdão.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/07/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001838-53.2015.4.04.7004/PR
ORIGEM: PR 50018385320154047004
RELATOR | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Cláudio Dutra Fontela |
APELANTE | : | MITUKO MIYAWAKI TOMINAGA |
ADVOGADO | : | JOÃO LUIZ SPANCERSKI |
: | GILMARA GONÇALVES BOLONHEIZ | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/07/2016, na seqüência 450, disponibilizada no DE de 11/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, DIFERIR PARA A FASE DE EXECUÇÃO A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS E DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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