APELAÇÃO CÍVEL Nº 5022015-40.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANISIA LOURENCO SANCHES |
ADVOGADO | : | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. PERÍODO DE CARÊNCIA COMPROVADO. USO DE MAQUINÁRIOS. EXTENSÃO DA PROPRIEDADE. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. LEI 11.960/2009. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE PRÓPRIA (EXECUÇÃO).
1. A comprovação do exercício de atividade rural deve-se realizar na forma do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal idônea
2. Tendo em vista que o conjunto probatório demonstrou o exercício de atividade rural durante o período exigido em lei, é devida a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
3. Que o pequeno produtor lance mão de eventual auxílio de empregados não-permanentes ou de maquinário agrícola não descaracteriza o regime de economia familiar, pois que restrições não presentes no art. 11, VII, e §1º, da Lei 8.213/91, consoante o princípio da legalidade, aplicável aos benefícios previdenciários.
4. A extensão da propriedade não impede, por si só, o reconhecimento da condição de segurado especial, devendo ser analisada juntamente com o restante do conjunto probatório que, na hipótese, confirmou o exercício da atividade rural em regime de economia familiar. Precedentes desta Corte.
5. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, de modo a racionalizar o andamento do processo, e diante da pendência, nos tribunais superiores, de decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais e determinar o imediato cumprimento do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 30 de novembro de 2016.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8668936v8 e, se solicitado, do código CRC D3EFCAB8. | |
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| Data e Hora: | 01/12/2016 15:25 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5022015-40.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANISIA LOURENCO SANCHES |
ADVOGADO | : | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA |
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença na qual o Julgador monocrático assim dispôs:
(...) Isto posto, e por tudo que mais dos autos consta, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na petição inicial para CONDENAR a Autarquia Federal requerida a:
a) INSTITUIR, em favor do autor, o benefício da aposentadoria por idade rural (obrigação de fazer), bem como;
b) PAGAR as parcelas vencidas e vincendas decorrentes do benefício acima referido, desde a data do requerimento administrativo, observada, contudo, a prescrição qüinqüenal, tudo acrescido de correção monetária INPC e juros de mora calculados com base na taxa de juros aplicáveis à caderneta de poupança, em qualquer caso, a contar do vencimento de cada prestação.
Esta decisão deverá ser levada a efeito no prazo máximo de 45 (quarenta e cinco) dias, contado do trânsito em julgado, sob pena de multa diária no valor de R$ 200,00 (Duzentos reais).
Sucumbente, condeno a Autarquia Federal, ainda, ao pagamento das custas processuais e aos honorários advocatícios do(s) patrono(s) da parte autora, fixados, estes, em 10% (dez por cento), sobre as parcelas vencidas até a decisão judicial concessória do benefício previdenciário pleiteado (Súmula nº 76 do TRF4 e nº 111 do STJ). (...)
O INSS recorre alegando, em síntese: a) não haver início de prova material; b) que a prova material deve ser contemporânea ao período controvertido; c) que deve haver início de prova material para localidade e grupo familiar ao qual pertenceu o requerente; d) que a eficácia probatória de documento em nome de um dos cônjuges não se estende ao outro quando aquele venha a exercer atividade urbana; e) que apenas quando o regime de trabalho for de economia familiar se admite documentos em nome de terceiros pertencentes ao grupo familiar para servir de início de prova material; f) que o produto comercializado exige uso de maquinário para a colheita; g) que o marido da autora possui propriedade com seus irmãos de 7,7 módulos rurais e; h) que deve ser aplicada a Lei nº 11.960/09.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos conclusos.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão-somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Remessa Oficial
Em relação à remessa oficial, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 30-06-2009), prestigiou a corrente jurisprudencial que sustenta ser inaplicável a exceção contida no § 2.º, primeira parte, do art. 475 do CPC aos recursos dirigidos contra sentenças (a) ilíquidas, (b) relativas a relações litigiosas sem natureza econômica, (c) declaratórias e (d) constitutivas/desconstitutivas insuscetíveis de produzir condenação certa ou de definir objeto litigioso de valor certo (v.g., REsp. 651.929/RS).
Assim, em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, dou por interposta a remessa oficial.
Da Aposentadoria por Idade Rural
Saliento que o exercício de atividade rural deve ser comprovado mediante início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea, não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, e súmula 149 do STJ. Trata-se de exigência que vale tanto para o trabalho exercido em regime de economia familiar quanto para o trabalho exercido individualmente.
O rol de documentos do art. 106 da LBPS não é exaustivo, de forma que documentos outros, além dos ali relacionados, podem constituir início de prova material, que não deve ser compreendido como prova plena, senão como um sinal deixado no tempo acerca de fatos acontecidos no passado e que agora se pretendem demonstrar, com a necessária complementação por prova oral.
Não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013)
Caso Concreto
Conforme se extrai da análise dos autos, a parte autora implementou o requisito etário em 09/11/2011 e requereu o benefício na via administrativa em 10/06/2012.
Para comprovar o exercício de atividade rural trouxe aos autos os seguintes documentos:
a) Certidão de casamento, datada de 07/10/1978, aonde consta a profissão do marido como lavrador (EV 1, OUT 8);
b) Notas fiscais em nome do marido datadas de 1984, 1985, 1999, 1998, 1997, 2000, 2001, 2002, 13/03/2007, 2008, 2009, 26/03/2010, 24/11/2011 e 14/03/2012 (EV 1, OUT 9, até EV 1, OUT 14, p. 4) (EV 1, OUT 15, p. 1, 2, e 3) (EV 1, OUT 16, p. 1, 2, 3) e em nome do marido e da autora datadas de 10/02/06, 12/06/2012 (EV 1, OUT 14, p. 5) (EV 1, OUT 16, p. 4);
c) Certidão do registro de imóveis, datada de 22/03/2002, aonde consta a profissão do marido como agricultor (EV 1, OUT 16, p. 5 e 6);
d) CCIR dos anos de 2006, 2007, 2008 e 2009 (EV 1, OUT 16, p. 7/10);
e) Recibos de entrega de declaração de ITR do ano de 2011 (EV 1, OUT 16, p. 11) EV 1, OUT 17, p. 1/16);
f) Cadastro de contribuinte individual em nome da autora, aonde consta a ocupação da autora como segurada especial (EV 1, OUT 17, p. 18) e;
g) Matrículas dos imóveis (EV 1, OUT 17, p. 19 até EV 1, OUT 20, p. 9).
Na audiência, realizada em 29/10/2015, foi tomado o depoimento pessoal da autora e ouvidas 3 testemunhas.
Depoimento pessoal da autora (VÍDEO 01)
Em depoimento pessoal a autora disse:
(...); que começou a trabalhar na roça com 8 (oito) anos de idade no Município de Sabaltia; que ajudava o pai; que o pai tocava café como porcenteiro; que alem dela a mãe e as irmãs também ajudavam o pai; que tinha 5 (cinco) irmãs; que não tinha empregados; que era feito o plantio de café, feijão, arroz, tudo isso; que ficou ajudando o pai nessa propriedade em Sabaltia até os 13 (treze) anos de idade; que depois ela e a família foram para Paranavaí, ficaram 1 (um) ano e depois voltaram para o mesmo sítio em Sabaltia, onde ficou até os 17 (dezessete) anos; que depois foi para outro sítio vizinho também em Sabaltia; que nesse sítio ficou até os 22 (vinte e dois) anos, quando casou; que nessa época exercia a atividade rural; que carpia, ajudava o pai a arrancar feijão, colhia café, etc.; que era um trabalho regular; que o trabalho na roça era o sustento da família; (...); que foi morar em Paranavaí quando casou; que o marido trabalhava na roça; que o marido trabalhava de porcenteiro para o pai dele; que ela e o marido ficaram 5 (cinco) anos em Paranavaí; que teve uma filha; que trabalhava na roça normalmente, só não tendo laborado por ocasião do nascimento da criança; que o sogro vendeu a propriedade em Paranavaí e comprou uma terra em Sabaltia; (...); que nessa propriedade do sogro em Sabaltia ficou até 2.002 (dois mil e dois); que em 1.999 (um mil novecentos e noventa e nove) o sogro morreu e foi dividida a propriedade; (...); que esses anos em que trabalhou para o sogro em Sabaltia foram todos na roça; que plantava café; (...); que foi para o Sítio Santo André quando saiu das terras do sogro; que o sítio Santo André era do sogro e quando foi feita a divisão a propriedade ficou para o marido; que o marido trabalha até hoje na roça; que fazem uns 3 (três) anos que começou a trabalhar um pouco menos; que nunca trabalhou em outra profissão, sempre na roça e; que hoje na propriedade trabalham ela, o marido, as duas filhas e um genro.
Oitiva da testemunha José Carlos Retameiro (VÍDEO 02)
Ouvida, a testemunha disse:
Que conhece a autora desde 1.986 (um mil novecentos e oitenta e seis); que lembra dessa data porque casou em 1.985 (um mil novecentos e oitenta e cinco) e porque tem uma filha da mesma idade da filha dela; que a propriedade do depoente Ra próxima da propriedade onde a autora morava; (...); que nessa época a autora já trabalhava na roça, sempre no café; que a autora trabalhava carpindo o café, arroz, feijão e milho; que a autora ajudava na colheita; que também tinha gado; que foi vizinho da autora de 1.986 (um mil novecentos e oitenta e seis) até 2.001 (dois mil e um); que a autora saiu de lá antes; que nesses anos a autora sempre trabalhou na roça; que só conheceu a autora trabalhando na roça; que em 2.001 (dois mil e um) a autora mudou para outra propriedade em Santo André e ele continuou morando ali até 2012 (dois mil e doze); que continuou mantendo contato; que essa outra propriedade ficava distante 7 (sete) quilômetros da sua propriedade; que a autora continuou trabalhando na roça; que tem um pouquinho de café ainda; que acha que a autora ainda trabalha na roça; (...) e; que não sabe se a autora trabalhou em outra atividade.
Oitiva da testemunha Raul Borrasca (VÍDEO 03)
Ouvida, a testemunha disse:
Que conhece a autora desde 1.986 (um mil novecentos e oitenta e seis); que lembra dessa data porque foi no ano em que eles se mudaram de Paranavaí para o Sítio da irmandade, vizinho seu; que esse sítio fica em Sabaltia; que a autora trabalhava na roça quando foi para lá; que a autora carpia, apanhava café, rastelava café, de tudo um pouco; que ali eles ficaram de 1.986 (um mil novecentos e oitenta e seis) até 1.999 (um mil novecentos e noventa e nove), quando morreu o sogro dela; que em 2.001 (dois mil e um) eles mudaram; que nesses anos todos sempre manteve contato com a autora; que a autora sempre trabalhou na roça; que trabalhavam com a autora as filhas, os cunhados, todo mundo; que a família tira o sustento do trabalho rural e; que a autora nunca trabalhou em outro tipo de atividade.
Oitiva da testemunha Valmir Simões de Almeida (VÍDEO 04)
Ouvida, a testemunha disse:
Que conhece a autora desde 1.978 (um mil novecentos e setenta e oito) aproximadamente; que é vizinho do sítio onde a autora morou em Sabaltia; que a autora tinha aproximadamente 17 (dezessete) ou 18 (dezoito) anos quando a conheceu; que a autora já trabalhava na roça; que a autora fazia de tudo, carpia, ajudava a colher, tudo o que fosse necessário de roça; que a autora trabalhava junto com o pai, a mãe e os irmãos; que não tinha empregados, só a família; que eles eram porcenteiros; que o trabalho dela era regular, junto com o pai e a mãe; (...); que a autora casou e mudou para o sítio do sogro em Paranavaí; que não lembra quanto tempo eles ficaram em Paranavaí; que depois a autora voltou para Sabaltia para trabalhar na roça; que até hoje vê a autora trabalhando na roça; que a autora nunca trabalhou em outro tipo de atividade; que até hoje a autora é uma trabalhadora rural; que nos últimos anos viu a autora trabalhando no sítio Santo André; que mora perto desse sítio e; que a autora depende dessa propriedade para viver.
Como já referido, o rol de documentos previsto no art. 106 da Lei de Benefícios não é exaustivo, sendo certa a possibilidade de alternância das provas ali referidas. Ademais, não existe consenso sobre o alcance temporal dos documentos, para efeitos probatórios, nem se há ou não necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado. Para chegar a uma conclusão, é preciso averiguar a função da prova material nesse contexto.
Na maioria dos casos que vêm a juízo, contudo, os documentos não são suficientes à comprovação do tempo de trabalho, necessitando ser corroborados por depoimentos testemunhais. Nesse caso, a prova material (ainda que incipiente) tem a função de ancoragem da prova testemunhal, sabido que esta é flutuante, sujeita a esquecimentos, enganos e desvios de perspectiva. Com efeito, aquela serve de base, sustentação, pilar em que esta se apóia (apesar dos defeitos apontados).
Em razão disso, não se pode aferir os efeitos da prova material em relação a si mesma, devendo a análise recair sobre esta em relação à prova testemunhal, aos demais elementos dos autos e ao ambiente socioeconômico subjacente; em outras palavras, a apreciação deve ser conjunta. A consequência dessa premissa é que não se pode afirmar, a priori, que há necessidade de documento relativo ao início do período a ser comprovado, ou que a eficácia probatória do documento mais antigo deve retroagir a um número limitado de anos. O alcance temporal da prova material dependerá do tipo de documento, da informação nele contida (havendo nuances conforme ela diga respeito à parte ou a outrem), da realidade fática presente nos autos ou que deles possa ser extraída e da realidade socioeconômica em que inseridos os fatos sob análise.
"In casu", a autora acostou documentos suficientes para comprovar o trabalho rural, conforme fazem prova as certidões, notas fiscais acostadas e o cadastro de contribuinte individual em nome da autora, aonde consta a ocupação da autora como segurada especial. Os testígios, por sua vez, foram firmes e convincentes em afirmar que o autor se dedicou ao trabalho na roça.
Em relação ao alegado pela autarquia previdenciária, de que não há nenhum documento para o período de 1997 a 2012, tenho que não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção, o que se mostrou nos autos, pois juntou a autora documentos referentes aos anos de 1999 até 2012 (EV 1, OUT 14, p. 5) (EV 1, OUT 16, p. 4), além do labor rural ter sido referido pelas testemunhas, pois está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).
O argumento levantado pelo INSS, de que a eficácia probatória de documento em nome de um dos cônjuges não se estende ao outro quando aquele venha a exercer atividade urbana, não merece ser acolhido. Conforme consta no caderno processual, ainda que o marido tenha exercido atividade urbana, conseguiu a autora juntar documentos em nome próprio, de forma a satisfazer a exigência legal.
Em relação ao argumento de que apenas quando o regime de trabalho for de economia familiar se admite documentos em nome de terceiros pertencentes ao grupo familiar para servir de início de prova material, entendo que a alegação não merece ser aceita. Com efeito, a autarquia não juntou qualquer prova para demonstrar que a autora, juntamente com seu esposo, é na verdade uma latifundiária, motivo pelo qual não se sustenta a tese levantada.
Saliento, por oportuno, a impossibilidade de se afirmar que a utilização de maquinário agrícola impossibilita a caracterização do regime de economia familiar. Não há qualquer exigência legal a que o trabalhador rural exerça toda a atividade manualmente. A utilização de máquinas agrícolas é apenas mais um aspecto a ser analisado juntamente com o restante do conjunto probatório, não constituindo, por si só, óbice ao reconhecimento da condição de segurado especial. As circunstâncias de cada caso concreto é que vão determinar se o segurado se enquadra ou não na definição do inc. VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91. No caso dos autos a autarquia não comprovou que a autora e o marido fazem uso de maquinário, apenas limitou-se a alegar que por se tratar de soja o trabalho mecanizado é necessário. Dessa forma, a alegação não merece ser acolhida.
Ademais, cabe ressaltar que a extensão da propriedade rural só passou a ser requisito para caracterização da condição de segurado especial a partir da vigência da Lei n. 11.718, de 20-06-2008, que deu nova redação ao inciso VII do art. 11 da Lei de Benefícios da Previdência Social. Com efeito, antes de tal alteração legislativa, não havia previsão legal que condicionasse a qualidade de segurado especial à dimensão do imóvel rural.
Tendo em vista que o período a ser considerado para concessão do benefício é anterior à referida alteração legislativa, tal regramento não se aplica ao caso dos autos. Dessa forma, o tamanho da propriedade constitui apenas mais um fator a ser analisado com o restante do conjunto probatório, não podendo, por si só, obstaculizar o reconhecimento da condição de segurado especial, salvo nas hipóteses em que a área do imóvel seja de tal monta que inviabilize a sua exploração apenas pelo grupo familiar.
Logo, a análise de vários fatores - localização do imóvel, tipo de cultura explorada, quantidade de produção comercializada, número de membros familiares que trabalham na atividade rural, utilização ou não de maquinário agrícola e de mão de obra de terceiros de forma não eventual - juntamente com a extensão do imóvel, é que permitirão um juízo de valor seguro acerca da condição de rurícola do segurado. As circunstâncias de cada caso concreto é que vão determinar se o segurado se enquadra ou não na definição do inc. VII do art. 11 da Lei n. 8.213/91 (TRF4, APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO Nº 0017609-37.2011.404.9999, 6ª Turma, Des. Federal CELSO KIPPER, POR UNANIMIDADE, D.E. 10/04/2012; EIAC n. 2000.04.01.043853-1/RS, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Terceira Seção, unânime, DJU de 11-02-2004).
Além disso, no caso dos autos coube ao marido da autora apenas a propriedade do sítio Ouro Verde, conforme fazem prova as declarações de ITR do ano de 2011.
O conjunto probatório, portanto, comprova o exercício da atividade rural pela parte autora desde longa data, até, no mínimo, a ocasião em que requereu o benefício perante o INSS.
Correção monetária e juros de mora
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente regulados por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que sejam definidos na fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a decisão acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo Tribunal Superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei nº 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de Precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei nº 11.960/2009.
Honorários advocatícios
Os honorários advocatícios, em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença, foram fixados de acordo com o entendimento desta Corte.
Custas e despesas processuais
O INSS responde pelo pagamento das custas processuais quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 desta Corte).
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497 do novo CPC, que repete dispositivo constante do art. 461 do antigo CPC, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Rel. para o acórdão Des. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007), determino o cumprimento imediato do acórdão, a ser efetivado em 45 dias, mormente pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais, pelo seu caráter alimentar e necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, diferir para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais e determinar o imediato cumprimento do acórdão.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8668935v27 e, se solicitado, do código CRC 74D7E089. | |
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| Signatário (a): | Hermes Siedler da Conceição Júnior |
| Data e Hora: | 01/12/2016 15:25 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 30/11/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5022015-40.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00010191320138160148
RELATOR | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Geral da República Juarez Mercante |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | ANISIA LOURENCO SANCHES |
ADVOGADO | : | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 30/11/2016, na seqüência 600, disponibilizada no DE de 16/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL, DIFERIR PARA A FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA A FORMA DE CÁLCULO DOS CONSECTÁRIOS LEGAIS E DETERMINAR O IMEDIATO CUMPRIMENTO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Juíza Federal MARINA VASQUES DUARTE DE BARROS FALCÃO |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8742478v1 e, se solicitado, do código CRC 78D05C74. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 30/11/2016 17:56 |
