Apelação Cível Nº 5009844-80.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: VALDECYR BARON
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de recurso interposto pelo INSS (apelação 31) e pela parte autora (apelação 38) contra sentença, publicada em 17/07/2017, que julgou procedente o pedido formulado na inicial, nos seguintes termos (sent29):
Ante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado por Valdecyr Baron em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e, em consequência: _ a) DECLARO o direito do autor ao cômputo do serviço e conversão pelo fator 1,4 (um vírgula quatro) do tempo de serviço especial - 01/0/1979 a 31/12/2000, nos termos da fundamentação, o qual deve ser averbado pelo INSS; b) DETERMlNO ao réu que implante o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição integral, desde a DER (18/06/2010) pelas regras mais vantajosas. As parcelas vencidas deverão ser pagas de uma só vez, observando-se os indices de correção e juros acima indicados. Tendo em vista que o valor da condenação ou do proveito econômico não excederá a 200 (duzentos) salários minimos por ocasião da liquidação (art. 85, §§ 3°, inc. l e 4°, inc. ll, CPC), condeno o réu ao pagamento das custas processuais pela metade (LC n. 156/97, art. 33, § 1°) e dos honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até esta data, devidamente corrigidas (Súmula 111/STJ). O réu deverá implementar o benefício no prazo de 30 (trinta) dias a contar da intimação, sob pena de multa diária de R$ 100,00 (cem reais) (art. 497, caput, CPC). Sentença não sujeita a remessa necessária, pois, embora iliquido, o valor da condenação ou proveito econômico obtido na causa jamais ultrapassará 1.000 (mil) salários minimos (art. 496, § 3°, inc. l, CPC). Publique-se. Registre-se. lntimem-se. Transitada em julgado, aguarde-se o cumprimento voluntário do julgado e, nada sendo requerido, arquivem-se os.
O INSS destaca os seguintes argumentos: a) Período de 01/02/79 a 01/03/81: foi reconhecido como atividade especial como se o autor tivesse laborado na empresa “Perdigão S/A”. Porém, conforme se extrai do CNIS, a atividade foi exercida na empresa “Indústria Reunidas Ouro SC”. Ademais, a CTPS do autor, à fl. 37, também demonstra vínculo com a “Indústria Reunidas Ouro SC”. b) Período de 01/10/1983 a 28/02/1986 - a função do autor era de auxiliar de escritório, não estando sujeito a agentes nocivos e não havendo enquadramento profissional. c) período de 01/03/1986 a 31/12/2000 - Em relação ao ruído, assim como atestado pelo expert, a exposição era eventual, eis que o segurado apenas “transitava por alguns setores com níveis de intensidade sonora”. O mesmo pode se dizer em relação ao frio, conforme pontuado pelo perito. Não é possível que o contato com agentes químicos ocorresse de forma habitual nas funções de “auxiliar de escritório”, “auxiliar administrativo”, “assistente administrativo”, “técnico de controle agropecuário” e “almoxarife”. Veja-se que se tratam de funções de cunho administrativo. Mesmo que o autor recebesse e entregasse materiais químicos, tais agentes não eram efetivamente utilizados por ele, eis que ficavam estocados no almoxarifado. d) O d. juízo de primeiro grau deixou de fixar juros e. correção monetária em relação às parcelas vencidas. Caso mantida a condenação, os juros de mora e a correção monetária deverão ser fixados conforme a Lei 11.960/09.
A parte autora, por sua vez, busca: a) afastar a aplicação do artigo 1°- F da Lei n° 9.494/97, com a redação dada pela Lei n° 11.960/ 2009, pelos fundamentos expostos no presente recurso e relativamente à expressão que elege o “índice da remuneração básica da cademeta de poupança” para fins de atualização monetária das condenações e débitos devidos pelas Fazendas Públicas, em razão da declaração de inconstitucionalidade do referido dispositivo pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal; b) assegurar ao Autor, consequentemente, o direito à atualização dos seus haveres pela variação do INPC (conforme o art. 31 da Lei n° 10.741/03, combinado com a Lei n° 11-.430/06, precedida da MP n° 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n° 8.213/91, e REsp. n° 1.103.122/PR) ou, no mínimo, pela variação do IPCA-E (indice 'mencionado no julgamento do Tema n” 810 da sistemática da repercussão geral).
Foram apresentadas contrarrazões (contraz35).
É o relatório.
VOTO
Busca o INSS, em síntese, a desconstituição dos períodos tidos por nocivos na sentença (01/0/1979 a 31/12/2000), alegando que não estão preenchidos os pressupostos para que a atividade seja reconhecida como especial.
O período de 02/03/81 a 30/09/83, reconheciddo como especial, é incontroverso.
A parte autora se insurge basicamente contra o índice de correção monetária.
Em resumo, esses os contornos da lide.
Período de 01/02/79 a 01/03/81: Vínculo laboral
O INSS destaca que o autor não trabalhou para a empresa Perdigão S/A no período apontado, mas sim para a empresa Indústria Reunidas Ouro SC, razão pela qual o PPP não poderia ser aceito.
Destaque-se que "em 1980 a Perdigão passou a controlar a Agropecuária Confiança, a Comércio e Indústria Saulle Pagnoncelli e a Reflora - Empresa de Reflorestamento, localizadas na região de Herval d’Oeste, além das Indústrias Reunidas Ouro, em Capinzal. Em 1981 adquiriu a Nodarisa Empreendimentos Florestais de Curitiba, para administrar as fazendas de reflorestamento e de produção de maçãs em Fraiburgo-SC e Guarapuava-PR." (COSTA, Armando João Dalla, A Perdigão, A Passagem do Poder e a Profissionalização nas Empresas Familiares, disponível em http://www.empresas.ufpr.br/perdigao.pdf).
Assim, não merece acolhida o óbice colocado pela autarquia para reconhecer o direito ao autor, tratando-se as Indústrias Reunidas Ouro de braço societário da Perdigão S/A.
Análise dos períodos especiais no caso concreto
1. Período: 01/02/79 a 01/03/81
Empresa: Perdigão Agroindustrial S/A
Atividade/função: Servente no setor Granja Áurea.
Agente nocivo: umidade e agentes biológicos
Enquadramento legal: Umidade: item 1.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 até 05/03/1997; a partir de então, Anexo nº 10 da NR15 e Súmula 198 do extinto TFR; Agentes biológicos: Códigos 1.3.2 e 2.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/64; Códigos 1.3.4 do Anexo I e 2.1.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79; Código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e Código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99;
Prova/debate: PPP do evento 3, anexos pet. 5, fl. 23, com indicação de responsável técnico.
A simples leitura das atividades desempenhadas pelo autor já indicia a exposição aos mencionados agentes: o segurado realizava trabalhos de limpeza de barreira sanitária, desinfecção de caminhões, fumigaçao de bolsas com ração e trabalhos de ajardinamento.
*** Biológicos: Nos termos da NR15, Anexo 14 da Portaria 3214/78, é considerado Insalubre "Trabalhos ou operações em contato permanente com:
- Carnes, glândulas, vísceras, sangue, ossos, couros, pelos e dejeções de animais portadores de doenças infecto-contagiosas.
- Resíduos de animais deteriorados.
Conforme a Portaria 3.214/78 em sua NR-15, Anexo 14 em "Agentes Biológicos", as atividades exercidas pela requerente são consideradas insalubres até os dias atuais."
Conclui-se que era ínsito ao labor a exposição a agentes biológicos e caracterizar risco à saúde do trabalhador. As atividades de trabalho com exposição habitual onde há sangue, detritos, restos de carne podem transmitir doenças através de: a) bactérias (erisipelóide); b) fungos (histoplasmose); c) vírus (paramixovírus). A transmissão de bactérias e principalmente de fungos pode se dar pelo ar. Há também a possibilidade de dermatites de contato - piodermites de contato - piodermites e furunculoses.
*** Umidade: Tenho que também restou satisfatoriamente demonstrada, ainda, a exposição a umidade excessiva, tendo em vista que o PPP indica exposição a referidos agentes, o que pode ser depreendido da própria natureza da atividade que executava (lavagem e desinfecção das granjas).
EPI: A utilização de equipamentos de proteção individual é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998.
Conclusão: Deve ser mantido o reconhecimento do período como especial.
2. Período: 01/10/1983 a 28/02/1986
Empresa: Perdigão Agroindustrial S/A
Atividade/função: Auxiliar de escritório na granja áurea, sendo assim descritas as atividades do autor, pela própria empresa, no formulário PPP - Granja Áurea Suínos - limpeza e desinfecção, manejo de aves, limpeza dos aviários, trabalho de pintura com cal e serviços burocráticos.
Agente nocivo/ Enquadramento legal:: Umidade: item 1.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto n.º 53.831/64 até 05/03/1997; a partir de então, Anexo nº 10 da NR15 e Súmula 198 do extinto TFR; Agentes biológicos: Códigos 1.3.2 e 2.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto nº 53.831/64; Códigos 1.3.4 do Anexo I e 2.1.3 do Anexo II do Decreto nº 83.080/79; Código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto nº 2.172/97 e Código 3.0.1 do Anexo IV do Decreto nº 3.048/99;
Prova/debate: PPP do evento 3, anexos pet. 5, fl. 25, com indicação de responsável técnico.
Destaco que pouco importa o nome do cargo do autor, mas sim as atividades que efetivamente desempenhava, as quais estão descritas de modo solar no formulário mencionado e mostram, à toda evidência, exposição a agentes nocivos.
Remeto as considerações sobre umidade e agentes biológicos realizadas no item 1.
EPI: A utilização de equipamentos de proteção individual é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998.
Conclusão: Deve ser mantido o reconhecimento do período como especial.
3. Período: 01/03/1986 a 31/12/2000
Empresa: Perdigão Agroindustrial S/A
Atividade/função: Diversos cargos no setor Almoxarifado (Auxiliar administrativo, assessor administrativo, técnico de controle agropecuário, almoxarife e auxiliar de almoxarife).
Agente nocivo: Químicos (formol. permanganato de potássio. hipoclorito de sódio. amonex. paraformol. cloreto de amônia. soda cáustica. inseticidas e amônia quatemária).
Enquadramento legal: álcalis cáusticos: Código 1.2.12 do Anexo I do Decreto n. 83.080/79. Anexo XIII da NR 15. Súmula 198 do TFR. formol: Anexo nº 11 da NR nº 15 do MTB;
Prova/debate: PPP do evento 3, anexos pet. 5, fl. 25, com indicação de responsável técnico, LTCATS do OFÍCIO C13, laudo pericial judicial (Laudo peric 21).
Em primeiro lugar, refuto o argumento do INSS de que o exercício de atividades ditas administrativas afastaria a nocividade presente no ambiente laboral, Para tanto extraio trecho da documentação da própria empresa:
No que toca ao período em debate, o perito judicial foi claro ao indicar a exposição a agentes químicos. - Segundo informações do Autor, como funcionário do DMS (Almoxarifado), realizava a função de descarga de caminhões (estiva) e contagem de estoque. Recepcionava os produtos químicos - cloro, soda cáustica, soda líquida, álcool, hipoclorito de sódio e detergentes, em “bombonas”, realizava seu fracionamento em embalagens menores, para serem encaminhadas aos diversos setores do frigorífico. Como o almoxarifado ficava distante da área de produção, sua função era a de carregar estes produtos e condimentos / embalagens -sal, tambores com corantes / glicose, caixas para embalar produtos na embalagem final e no setor de banha - em uma carretinha acoplada em um trator marca Tobatta, e descarrega-la nos diversos setores de produção. A atividade de abastecimento destes “produtos” ao frigorífico era realizada de madrugada a reposição feita durante a jomada de trabalho. A temperatura das áreas atendidas variava de 1° a 10°C.
*** Formol - Quanto ao agente químico, algumas considerações devem ser tecidas. Alinho-me ao entendimento de que a aplicação da NR-15 para além do campo do Direito do Trabalho, alcançando as causas previdenciárias, ocorreu a partir da Medida Provisória 1.729, publicada em 03.12.1998 e convertida na Lei 9.732, quando a redação do artigo 58, § 1º, da Lei 8.213/1991 passou a incluir a expressão "nos termos da legislação trabalhista". (A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo. § 1º A comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho nos termos da legislação trabalhista).
É justamente a partir deste marco temporal (03/12/1998) que as disposições trabalhistas concernentes à caracterização de atividades ou operações insalubres (NR-15) - com os respectivos conceitos de "limites de tolerância", "concentração", "natureza" e "tempo de exposição ao agente" passam a influir na caracterização da natureza de uma dada atividade (se especial ou comum).
Com relação ao agente químico formol, porém, admite-se o cômputo diferenciado do tempo de serviço, independentemente da concentração do agente químico. Isso porque o Ministério do Trabalho e Emprego editou a Portaria Interministerial nº 9, de 7 de outubro de 2014, publicando a Lista Nacional de Agentes Cancerígenos para Humanos, sendo que no Grupo 1 - Agentes confirmados como carcinogênicos para humanos, encontra-se listado o formaldeído (registro CAS 000050-00-0).
O Decreto nº 3.048/99 traz a seguinte disposição:
Art. 68. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos, biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, considerados para fins de concessão de aposentadoria especial, consta do Anexo IV. (...) § 4º. A presença no ambiente de trabalho, com possibilidade de exposição a ser apurada na forma dos §§ 2º e 3º, de agentes nocivos reconhecidamente cancerígenos em humanos, listados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, será suficiente para a comprovação de efetiva exposição do trabalhador. (Redação dada pelo Decreto nº 8.123, de 2013)
Destarte, deve ser reconhecida a especialidade do interregno independentemente de os níveis de concentração ultrapassarem, ou não, os limites postos pela NR 15, tendo em vista que o formaldeído se trata de substância reconhecidamente cancerígena e sua avaliação é qualitativa. Em caso análogo, já decidiu esta Corte que, Uma vez verificado por meio de laudo (evento 78, LAU1) que o autor esteve exposto a agentes nocivos (formol, metanol, ácido clorídrico, ácido sulfúrico, nítrico e ácido peracético), com o potencial de causar queimaduras, câncer, irritação à pele, aos olhos (inclusive perda de visão), aos aparelhos respiratório e digestivo, afetar o sistema nervoso central e o fígado (...) restou comprovado o tempo laborado como especial para fins previdenciários. (APELREEX 5020639-34.2012.404.7000, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Juiz Federal Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 30/05/2014).
***Houve exposição, ainda, a álcalis cáusticos (soda cáustica). Quanto aos agentes químicos descritos no Anexo 13 da NR 15 (ácido sulfúrico) é suficiente a avaliação qualitativa de risco, sem que se cogite de limite de tolerância, independentemente da época da prestação do serviço, se anterior ou posterior a 02/12/1998, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que reste configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes (APELREEX nº 2002.70.05.008838-4, Relator Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Quinta Turma, D.E. 10/05/2010; EINF nº 5000295-67.2010.404.7108, Relator p/ Acórdão Desembargador Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, Terceira Seção, julgado em 11.12.2014). Nos períodos apontados, a exposição ao agente nocivo caracteriza especialidade independente do nível de exposição sofrida pelo segurado, portanto.
No que pertine à habitualidade e permanência na sujeição ao agente nocivo, cumpre gizar que esta Corte, ao julgar os EINF nº 0010314-72.2009.404.7200 (Relator Des. Federal Celso Kipper, Terceira Seção, D.E. 07/11/2011), decidiu que Para caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada.
De fato, Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente (TRF/4, AC nº 2000.04.01.073799-6/PR, 6ª Turma, Relator Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, DJU 09/05/2001).
A exposição a frio e ruído foi retratada como eventual, de modo que não caracteriza a especialidade.
EPI: O Supremo Tribunal Federal, em regime de repercussão geral, deixou assentado que O direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial (ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015).
Todavia, o simples fornecimento do EPI pelo empregador não exclui a hipótese de exposição do trabalhador aos agentes nocivos à saúde. É preciso que, no caso concreto, estejam demonstradas a existência de controle e periodicidade do fornecimento dos equipamentos, a sua real eficácia na neutralização da insalubridade ou, ainda, que o respectivo uso era, de fato, obrigatório e continuamente fiscalizado pelo empregador. Tal interpretação, aliás, encontra respaldo no próprio regramento administrativo do INSS, conforme se infere da leitura do art. 279, § 6º, da IN nº 77/2015, mantida, neste item, pela subsequente IN nº 85/2016.
No que diz respeito à prova da eficácia dos EPIs/EPCs, a Terceira Seção desta Corte, na sessão de julgamento realizada em 22/11/2017, nos autos do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas nº 5054341-77.2016.4.04.0000 (Tema nº 15), decidiu por estabelecer a tese jurídica de que a mera juntada do PPP referindo a eficácia do EPI não elide o direito do interessado em produzir prova em sentido contrário (Relator para acórdão Des. Federal Jorge Antonio Maurique, por maioria). Restou assentada no aresto, ainda, a orientação no sentido de que a simples declaração unilateral do empregador, no Perfil Profissiográfico Previdenciário, de fornecimento de equipamentos de proteção individual, isoladamente, não tem o condão de comprovar a efetiva neutralização do agente nocivo. Deve ser propiciado ao segurado a possibilidade de discutir o afastamento da especialidade por conta do uso do EPI, como garantia do direito constitucional à participação do contraditório.
Na situação em apreço, não restou demonstrado que a nocividade tenha sido neutralizada pelo uso de EPI eficazes. O perito nomeado pelo juízo destacou que os equipamentos fornecidos pela empresa não foram suficientes/adequados para elidir a nocividade do agente (frio):
Qzuesito n°. 4 - A empresa Perdigão Agrgindustrial S/A (posteriormente BRF - Brasil Foods S/A), comprova se naquela época fomecia e se o Autor efetivamente utilizava equipamentos de proteção individual (EPl's)? Em caso positivo, o uso do equipamento de proteção individual tomou a atividade do Autor imune à nocividade do ambiente laboral ou apenas amenizou os seus efeitos deletérios? Resposta: Não. O uso de EPl's não tomou a atividade do Autor imune à agressividade do ambiente laboral.
Não é demais dizer que, Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete (STF - Tema nº 555, ARE nº 664.335, Tribunal Pleno, Relator Ministro Luiz Fux, DJE 12/02/2015).
Conclusão: Não merece acolhida o recurso do INSS, devendo a sentença que reconheceu a especialidade do período ser mantida por seus próprios fundamentos.
Conclusão quanto ao tempo de atividade especial
O período especial reconhecido no presente acórdão (01/0/1979 a 31/12/2000) totaliza 21 anos, 11 meses .
Fator de conversão
Destaco que, quanto ao fator de conversão deve ser observada a relação existente entre os anos de trabalho exigidos para a aposentadoria por tempo de serviço ou de contribuição na data do implemento das condições, e os anos exigidos para a obtenção da aposentadoria especial (15, 20ou 25 anos de tempo de atividade, conforme o caso).
Em se tratando de benefício que a ser deferido a segurado que implementou as condições já na vigência da Lei nº 8.213/91, como sabido, a concessão do benefício depende da comprovação de 35 anos de tempo de serviço ou de contribuição, se homem, e 30 anos, se mulher. Nesse contexto, a relação a ser feita para a obtenção do fator aplicável para a conversão do tempo de serviço especial para comum, quando se trata de enquadramento que justifica a posentadoria aos 25 anos de atividade, é de 25 anos para 35, se homem, e 25anos para 30, se mulher, resultando, assim, num multiplicador de 1,4 paraaquele e 1,2 para esta.
Prestado o serviço sob a égide de legislação que o qualifica como especial, o segurado adquire o direito à consideração como tal até quando possível a conversão. A conversão, todavia, só pode ser disciplinada pela lei vigente à data em que implementados todos os requisitos para a concessão do benefício. Não se pode confundir critério para reconhecimento de especialidade com critério para concessão de benefício, aí incluídas a possibilidade e a sistemática de conversão de tempo especial pretérito.
O Decreto 3.048/99, em seu artigo 70, determina a utilização do fator 1,40 quanto ao homem e 1,20 quanto à mulher para a conversão do tempo especial sob regime de 25 anos, independentemente da data em que desempenhada a atividade.
Do direito do autor no caso concreto
No caso dos autos, somando-se o tempo especial reconhecido em sede judicial convertido pelo fator 1,4 (08 anos, 09 meses e 06 dias), com o lapso reconhecido em sede administrativa (31 anos, 04 meses e 18 dias - evento 3, anexos pet 5, fl. 33) tem-se que o autor, por ocasião do requerimento administrativo (DER - 18/06/2010), contava com 40 anos, 01 mês e 24 dias de tempo de serviço/contribuição.
Nessas condições, o autor tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição na DER - 18/06/2010 - (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88), assegurada a concessão do benefício mais vantajoso, nos termos da decisão proferida pelo STF no RE 630.501.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção monetária
A correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp mº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, D DE 02-03-2018), o qual resta inalterada após a conclusão do julgamento de todos os EDs opostos ao RE 870947 pelo Plenário do STF em 03-102019 (Tema 810 da repercussão geral), pois foi rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Juros moratórios
Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.
A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.
Honorários advocatícios recursais
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).
Aplica-se, portanto, em razão da atuação do advogado da parte em sede de apelação, o comando do §11 do referido artigo, que determina a majoração dos honorários fixados anteriormente, pelo trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º e os limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º do art. 85.
Confirmada a sentença no mérito, majoro a verba honorária, elevando-a de 10% para 15% (quinze por cento) sobre as parcelas vencidas (Súmula 76 do TRF4), considerando as variáveis dos incisos I a IV do § 2º do artigo 85 do NCPC.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96) e responde por metade do valor no Estado de Santa Catarina (art. 33, parágrafo único, da Lei Complementar estadual 156/97).
Implantação do benefício
Reconhecido o direito da parte, impõe-se a determinação para a imediata implantação do benefício, nos termos do art. 497 do NCPC [Art. 497. Na ação que tenha por objeto a prestação de fazer ou de não fazer, o juiz, se procedente o pedido, concederá a tutela específica ou determinará providências que assegurem a obtenção de tutela pelo resultado prático equivalente.] e da jurisprudência consolidada da Colenda Terceira Seção desta Corte (QO-AC nº 2002.71.00.050349-7, Rel. p/ acórdão Des. Federal Celso Kipper). Dessa forma, deve o INSS implantar o benefício em até 45 dias, a contar da publicação do presente acórdão, conforme os parâmetros acima definidos, incumbindo ao representante judicial da autarquia que for intimado dar ciência à autoridade administrativa competente e tomar as demais providências necessárias ao cumprimento da tutela específica.
Saliente-se, por oportuno, que, na hipótese de a parte autora estar auferindo benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício ora deferido apenas se o valor da renda mensal atual desse benefício for superior ao daquele.
Faculta-se, outrossim, à parte beneficiária manifestar eventual desinteresse quanto ao cumprimento desta determinação.
Conclusão
- Recurso do INSS ao qual se nega provimento;
- Sentença mantida no que toca:
a) a ao reconhececimento como tempo de serviço especial dos períodos de 01/0/1979 a 31/12/2000;
c) reconhecimento do direito da parte autora, na DER (18/06/2010), à aposentadoria integral por tempo de contribuição, oportunidade em que contava com 40 anos, 01 mês e 24 dias de tempo de serviço/contribuição (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88), assegurada a concessão do benefício mais vantajoso, nos termos da decisão proferida pelo STF no RE 630.501.
- honorários advocatícios majorados;
- recurso da parte autora acolhido no que toca à fixação do índice de correção monetária conforme decisão do Tema 810/STF e Tema 905/STJ;
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo do INSS, dar provimento ao recurso da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001910026v29 e do código CRC d995fd02.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 21/8/2020, às 17:59:32
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Apelação Cível Nº 5009844-80.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: VALDECYR BARON
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES biológicos, QUÍMICOS e umidade. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONCESSÃO.
1. A exposição a agentes biológicos, mesmo quando não é permanente, caracteriza a insalubridade do labor, sendo possível o cômputo do tempo de serviço especial diante do risco de contágio sempre presente.
2. Conforme se infere da leitura conjugada do art. 68, § 4º, do Decreto 3.048/99 e do art. 284, parágrafo único da IN/INSS 77/2015, os riscos ocupacionais gerados pelos agentes cancerígenos constantes no Grupo I da LINHAC, estabelecida pela Portaria Interministerial n° 9, de 07 de outubro de 2014, não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa.
3. Quanto aos agentes químicos descritos no anexo 13 da NR 15 do MTE, é suficiente a avaliação qualitativa de risco, sem que se cogite de limite de tolerância, independentemente da época da prestação do serviço, se anterior ou posterior a 02/12/1998, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS, dar provimento ao recurso da parte autora e determinar a imediata implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 20 de agosto de 2020.
Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001910027v5 e do código CRC a906ca8c.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 21/8/2020, às 17:59:32
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 13/08/2020 A 20/08/2020
Apelação Cível Nº 5009844-80.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: VALDECYR BARON
ADVOGADO: SILVIO LUIZ DE COSTA (OAB SC005218)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/08/2020, às 00:00, a 20/08/2020, às 16:00, na sequência 273, disponibilizada no DE de 03/08/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS, DAR PROVIMENTO AO RECURSO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMEDIATA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
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