| D.E. Publicado em 01/02/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007082-55.2013.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | CLAUDINOR ROBERTO SBARDELOTTO |
ADVOGADO | : | Ivo Signor e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. IMPOSSIBILIDADE. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por prova testemunhal idônea.
2. Consoante recentes decisões exaradas pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Resp 1.304.479-SP e do Resp 1.321.493-PR, recebidos pela Corte como recursos representativos da controvérsia, não há possibilidade de estender a prova material em nome de membro do grupo familiar que passa a exercer trabalho urbano, bem como a regra geral pela imprescindibilidade de prova material para comprovação de tempo de serviço para fins previdenciários.
3. No caso, observados os parâmetros estabelecidos pela Corte Superior, não há início de prova material a corroborar os depoimentos testemunhais, o que inviabiliza a averbação postulada.
4. Mantida a sucumbência proclamada na sentença.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 25 de janeiro de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8733692v8 e, se solicitado, do código CRC 8ECFB0A2. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007082-55.2013.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | CLAUDINOR ROBERTO SBARDELOTTO |
ADVOGADO | : | Ivo Signor e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
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RELATÓRIO
Claudionor Roberto Sbardelotto propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 10/4/2012 (fl. 2), postulando a averbação de períodos de atividade rural, exercidos em regime de economia familiar, compreendidos entre 15/11/1976 e 3/5/1983 e entre 1/9/1987 e 30/5/1988, bem como a expedição de Certidão de Tempo de Serviço correspondente aos períodos de labor rural a serem reconhecidos.
Em 15/3/2013 (fls. 133/138) sobreveio sentença que julgou improcedente o pedido do autor, condenado-o ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00 (um mil reais).
Inconformada a parte autora apresentou recurso de apelação (fls. 140/149) defendendo, em síntese, a possibilidade de averbação dos períodos de atividade rural que restaram indeferidos na sentença, bem como a expedição de ofício à autarquia para que expeça a correspondente certidão de tempo de serviço rural.
Com contrarrazões ao recurso (fls. 150/153), vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Atividade rural
Para a comprovação do tempo de atividade rural com vista à obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal (artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91 e Súmula 149 do STJ).
A respeito do assunto, encontra-se longe de mais alguma discussão, no âmbito dos tribunais, a necessidade de que o período de tempo de atividade seja evidenciado por documentos que informem, a cada ano civil, o seu exercício (TRF4: AC 2003.04.01.009616-5, 3ª Seção, Relator Desembargador Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. de 19/11/2009; EAC 2002.04.01.025744-2, 3ª Seção, Relator para o Acórdão Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 14/6/2007; EAC 2000.04.01.031228-6, 3ª Seção, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU de 9/11/2005). Também já está fora de qualquer dúvida, a possibilidade de que os documentos civis, como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, em que consta a qualificação, como agricultor, do autor da ação, assim como de seu cônjuge ou de seus pais (Súmula 73 deste Tribunal), constituem início de prova material (STJ, AR 1166/SP, 3ª Seção, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU de 26/2/2007; TRF4: AC 2003.71.08.009120-3/RS, 5ª Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. de 20/5/2008; AMS 2005.70.01.002060-3, 6ª Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, DJ de 31/5/2006).
A prova material, conforme o caso, pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade rural, bastando, para exemplificar, a existência de registro contemporâneo em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS de contrato de trabalho como empregado rural. Em tal situação, em tese, não haveria necessidade de inquirir testemunhas para a comprovação do período registrado.
Na maioria dos casos, porém, a documentação apresentada é insuficiente à comprovação do tempo de atividade rural, do que resulta a habitual complementação por meio do depoimento de testemunhas.
Em razão disso, a qualidade do início de prova material não pode ser isoladamente avaliada sem que seja compreendido o contexto probatório, a que se aduz, em regra, a produção da prova oral. Decorre dessa orientação, que a diversidade de documentos que podem constituir início de prova material impõe conclusões judiciais igualmente distintas, sem que para tanto deva existam premissas invariáveis como, aparentemente, poderia constituir a obrigatoriedade de presença nos autos de documentos relacionados ao começo do período a ser comprovado, ou, ainda, a retroação da eficácia temporal, de modo fixo, a um número restrito de anos.
A irradiação temporal dos efeitos do início de prova material dependerá do tipo de documento, das informações nele contidas (havendo distinções conforme digam respeito ao próprio autor da ação, ou a terceiros) e das circunstâncias que envolvem o quadro fático descrito no processo.
Por fim, registre-se que os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando relacionados à respectiva titularidade dos pais ou do cônjuge, consubstanciam admitido início de prova material do trabalho rural.
Com efeito, como o artigo 11, §1º, da Lei 8.213/1991, define regime de economia familiar como a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes, deverá ser cauteloso o exame da prova, na medida em que, no mais das vezes, os atos negociais do grupo parental são formalizados, não individualmente, mas em nome do pai da família ou cônjuge masculino, que naturalmente representa a todos.
Essa compreensão está sintetizada na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Por fim, a respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(Grifo nosso)
No referido julgamento, o STJ manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, havendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Conquanto o acórdão acima transcrito aprecie benefício diverso do postulado na presente demanda, as diretrizes fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça em relação ao início de prova material também devem ser observadas para os casos de cômputo de tempo rural como boia-fria para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
O autor, nascido em 15/11/1964 (fl. 7), buscou a averbação de períodos de atividade rural, exercidos em regime de economia familiar, compreendidos entre 15/11/1976 e 3/5/1983 e entre 1/9/1987 e 30/5/1988, os quais restaram indeferidos na sentença nos seguintes termos:
In casu, a parte autora juntou os seguintes documentos, almejando comprovar a atividade agrícola em regime de economia familiar:
a) comprovante de pagamento de ITR em nome de Américo Floriano Sbardelotto, pai do autor, referente ao ano de 1974 (fl. 13);
b) documentos relativos a uma propriedade rural (fls. 14/15), adquirida por Vitorio Sbardelotto, avô paterno do demandante, conforme certidão de casamento de seus pais da fl. 11;
c) documentos de Giovani Citolin, dito pelo demandante na inicial como sendo seu avô materno, o que é comprovado pela certidão de casamento de seus pais (fl. 11), atinentes a declaração de rendimentos - agricultura - e ao FUNRURAL, ano de 1974 (fls. 16/17);
d) recibo de entrega de declaração de propriedade no nome de Vitorio Sbardelotto, de 1966 (fl. 18);
e) mais documentos referentes a propriedade rural, alguns em nome de Giovani Citolin e pertinentes à sua herança (fls. 19/24);
f) notas de comercialização de produtos rurais em nome de Américo Sbardelotto, pai do autor, dos anos de 1982/1983 e 1988 (fls. 26/31);
g) nota fiscal em nome de Novelino Lucietto, do ano de 1981 (fl. 32);
h) talões de produtor de titularidade de Alderico Sbardelotto, anos de 1976/1978 e 1980 (fls. 34/35 e 37/42).
Conforme já reconhecido pela jurisprudência, a maioria dos negócios rurícolas eram realizados em nome do patriarca familiar, porém este era auxiliado por todos os componentes do grupo. E os filhos, desde pequenos, laboravam nas lides campesinas, auxiliando na renda familiar. Desse modo, o labor da agricultura pode ser computado, por entendimento jurisprudencial pacificado, somente a contar dos 12 (doze ) anos de idade.
Nesse norte foi o pedido do demandante, já que nasceu em 15/11/1964 (fl. 07) e postula o cômputo do labor rural desde 15/11/1976. Ocorre que, a prova testemunhal evidenciou que o pai do demandante foi proprietário de um mercado a contar de 1973, de forma que a agricultura não era a principal fonte de renda da família. Insta transcrever os depoimentos (fls. 127/129):
Cecilia Clara Lucietto
"A depoente disse que é vizinha do autor, morando perto dele. Disse que atualmente o autor trabalha na prefeitura, antes trabalhava na agricultura junto com os pais. Os pais do autor moravam em Rondinha, na rua Padre Eugênio, sendo que quando foi morar em Rondinha em 1971 eles já moravam no local. [...] A depoente afirma que o autor morou com os pais até uns 18 ou 20 anos. [...] Segundo a mesma o autor começou a trabalhar com 8 ou 10 anos. O autor ficou sem trabalhar aproximadamente 2 anos, depois que foi para a cidade, e depois voltou para a roça. Ficou mais 2 anos trabalhando na mesma propriedade rural. Sabe que a mãe do autor é aposentada por atividade rural. Nada mais. PELO RÉU: o pai do autor em determinado tempo chegou a abrir um mercado e uma loja de eletrodomésticos, em torno de 1973 ou 1974, trabalhando bastante tempo nisso. Esse estabelecimento era no centro da cidade, na Avenida Sarandi, no mercado trabalhavam o pai do autor e o marido da depoente, tendo também 2 empregadas e vendedores. Disse que o endereço indicado dos pais do autor fica na saída para Constantina, sendo que as terras trabalhadas ficam junto no local. Eles continuavam morando no local e o pai do ator ia na cidade para trabalhar, depois de abrir o mercado sempre trabalhavam na roça, mas não em toda área, pagavam alguém para lavrar a terra e depois trabalhavam na área. Acha que o autor trabalhou 2 anos no mercado, pois ele também ajudou. Não sabe se ele tinha carteira assinada. Nada mais." (grifei)
Clóvis Antônio Grando
"O depoente afirma que conhece o autor de Rondinha, desde criança. O autor também morou em Ronda Alta, quando criança morava com os pais, sendo que as terras ficavam junto com a casa, na Rua Padre Eugênio. Os pais do autor sobreviviam da lavoura, sendo que as terras eram próprias. A área tinha em torno de 15 hectares, plantavam mandioca, milho, soja, tinham galinhas. O autor ajudava os pais na lavoura, tendo visto o mesmo trabalhando, carpindo. Segundo o depoente os pais do autor não tiveram outra profissão ou estabelecimento comercial. Tiveram um mercado, não sabendo em que ano, o qual ficava no centro da cidade. Afirma que o autor ajudava o pai no mercado, depois da lavoura. Acha que no período do mercado, continuavam com a lavoura. O depoente não sabe até que idade o autor ficou com os pais. Nada mais. PELO AUTOR: segundo o depoente o autor começou a trabalhar desde criança na roça. Não sabe o ano que começou a trabalhar na cidade. O autor trabalhou na lavoura, depois foi para o mercado, após voltou para lavoura e então começou a trabalhar como funcionário do município. Na lavoura o autor trabalhava junto com o pai e com irmãos. [...] PELO RÉU: afirma que o autor primeiro trabalhou na lavoura e depois no mercado, nunca exercendo as atividades concomitantemente, sendo que quando trabalhou no mercado, não sabe se era empregado ou não. Nada mais." (grifei)
Jairo Antônio Zorzi
"O depoente afirma que conhece o autor da época em que começou a ir para aula, quando eram crianças. Não eram vizinhos, mas passava na frente da casa que residia o autor. A casa dos pais do autor ficava na saída para Constantina, acreditando que a área possuía 10 ou 12 hectares. Os pais do autor sobreviviam da lavoura, plantando parreiral de uva, soja, milho, tinham vacas leiteiras, galinhas. O autor sempre ajudou a família, carpindo, juntando pasto. O depoente desde pequeno viu o autor ajudando na lavoura, quando ele devia ter em torno de 6 a 7 anos. O depoente disse que o autor também trabalhou no mercado dos pais do autor. O mercado ficava no centro da cidade. O depoente acredita que o autor devia ter uns 15 ou 16 anos quando começou a trabalhar no mercado. Nada mais. PELO AUTOR: depoente afirma que o pai do autor, irmãos, a mãe, ajudavam na lavoura. Pelo que sabe o autor trabalhou um tempo no mercado, depois parou, voltando para a lavoura. Posteriormente foi trabalhar na cidade. Atualmente trabalha na prefeitura. Nada mais. PELO RÉU: o mercado dos pais do autora era de porte médio, era mais familiar, trabalhando apenas o autor e seu pai no referido estabelecimento. Durou 7 ou 8 anos o mercado. Quando fechou o pai do autor voltou para a roça, situação que perdura até hoje. Nada mais." (grifei)
Percebe-se que, pela data aproximada de início das atividades do mercado do pai do requerente, porte do estabelecimento e duração da empresa, resta flagrante que os lucros auferidos com tal ramo de negócios se sobrepunham às atividades agrícolas desenvolvidas pela família, que, consoante o relatado das testemunhas, permaneceram nesse tempo. Aliás, difícil de acreditar que o patriarca da família realizasse trabalho urbano - fosse comerciante - enquanto seus filhos permaneciam em casa trabalhando na produção agrícola, até porque o demandante era criança/adolescente nessa época, tampouco se sustenta eventual tese de que a agricultura era a fonte primordial do grupo familiar.
Além disso, as testemunhas afirmam que o demandante ajudou no mercado, durante tempo considerável, tendo uma delas dito que o autor não desempenhou atividade agrícola nesse lapso temporal. Ademais, considerando a informação de que o autor morou com seus pais até os 19 ou 20 anos, o interregno de tempo entre 15/11/1976 a 03/5/1983 é abarcado, de forma que não se pode considerá-lo como de trabalho rural em regime de economia familiar, como meio de subsistência, por todo o acima destacado.
Da mesma forma, em relação ao período de 1º/9/1987 a 30/5/1988, não há como concluir no sentido do desempenho de atividades do campo pelo autor como modo de sobrevivência. Isso porque a empresa que seu genitor era sócio, Comércio de Cereais Lucietto Ltda., conforme documento da fl. 132, foi aberta em 06/02/1972 e baixada somente em 14/7/1993. Não há indícios de que o requerente, nessa época, possuía grupo familiar próprio, de modo que se pode concluir estava vinculado ao de seu pai, onde a renda com a agricultura não era o meio de sobrevivência, reitero.
De qualquer sorte, mesmo se desconsiderado o documento da fl. 132, juntado com os memoriais, o trabalho entre 1º/9/1987 e 30/5/1988 não pode ser computado. É que o demandante diz na peça portal que trabalhou na roça com sua ex-esposa, entretanto apenas junta a certidão de seu segundo casamento (fl. 10), ocorrido em 2003, quando era divorciado. Nem ao menos há referência ao nome da sua primeira esposa nos autos - muito menos as testemunhas falam dela ou da época de casamento do autor -, não sendo possível precisar o momento em que o requerente constituiu grupo familiar próprio e poderia desempenhar atividade agrícola de maneira independente aos labores de seu genitor. Desta feita, presume-se que entre 1º/9/1987 e 30/5/1988 o autor, então com 22/23 anos de idade, ainda era integrante do grupo familiar de seu pai e possuía sua renda vinculada à de toda a família.
Demais disso, a prova documental é parca, restringindo-se a documentos referentes a terras de parentes - dos avôs materno e paterno e do pai -, notas de produtor rural em nome de seu genitor que abarcam período em que a renda principal era proveniente do mercado antes citado (1982/1983 e 1988), nota fiscal em nome de Novelino Lucietto, do ano de 1981, pessoa essa que não se sabe ao certo quem seja e que não foi mencionada por quaisquer das testemunhas, da mesma forma que os talões de produtor de titularidade de Alderico Sbardelotto, anos de 1976/1978 e 1980, não podem ser considerados - não se tem conhecimento do grau de parentesco e não houve menção pelas testemunhas.
Ainda, causa estranheza o relatado na inicial e os documentos referentes a terras dos avôs e talões de parente e de pessoa estranha, já que, se o pai do autor sempre teve terras, por que razão o demandante trabalharia nas terras dos avôs ou de terceiros?!
Outro fato curioso é que o demandante diz que trabalhou em terras cedidas por Novelino Lucietto, juntando nota fiscal de produtor dele, e arrolou a testemunha Cecilia Clara Lucietto, que possivelmente era a esposa de Novelino, diante da sociedade havida entre o marido de Cecilia e o pai do requerente, ou, no mínimo, era parente, mas a referida testemunha nada mencionou sobre o autor laborar em terras de Novelino Lucietto.
Mister anotar também que as testemunhas jamais afirmam que o autor trabalhou em áreas outras que não as de seu pai, de forma que causa espanto a referência ao labor na terra do avô materno Giovani Citolin, assim como nas de Novelino Lucietto, e a juntada de talões de produtor rural que não em nome do pai do autor.
Portanto, diante do conjunto probatório, inviabilizado está o reconhecimento da condição de segurado especial do demandante no período reclamado e, pois, a averbação de tal tempo, já que parca a prova documental e ausente corroboração pela prova testemunhal no sentido de prevalência da renda rural no sustento do grupo familiar do requerente.
(...)
Sendo assim, improcede o pedido de averbação de tempo de atividade rural.
Ainda que, em alguns casos, se admita o exercício concomitante de atividades laborativas, certo é que a percepção de rendimentos não oriundos do labor agrícola, uma vez que o pai do autor era proprietário de um mercado na região central da cidade, depõe contra o efetivo exercício de atividade rural em regime de economia familiar, nos moldes definidos pelo artigo 11, inciso VII, e § 1º, da Lei 8.213/1991, principalmente se consideramos que a prova documental apresentada encontra-se na sua integralidade em nome do pai e dos avôs do autor e não em nome próprio.
A matéria controvertida diz respeito à repercussão da atividade urbana de um integrante do grupo familiar na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural prevista no artigo 143 da Lei 8.213/1991, bem como à possibilidade de admitir prova exclusivamente testemunhal para configurar tempo de serviço rural para fins previdenciários.
Os Recursos Especiais 1.304.479-SP e 1.321.493-PR, tidos como representativos de controvérsia, foram assim ementados:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista
no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas provas em nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana, mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta em período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está em conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ. (REsp 1321493/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
Diante desse contexto, deve ser mantida a sentença monocrática, por seus próprios fundamentos, uma vez que foi proferida em consonância com o entendimento dominante neste Tribunal.
Mantida a sucumbência nos termos proclamados na sentença.
Conclusão
Mantida a sentença de improcedência e, via de consequência, improvido o apelo da parte autora.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8733691v23 e, se solicitado, do código CRC 5914D952. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 25/01/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0007082-55.2013.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00010104720128210148
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Claudio Dutra Fontella |
APELANTE | : | CLAUDINOR ROBERTO SBARDELOTTO |
ADVOGADO | : | Ivo Signor e outros |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 25/01/2017, na seqüência 1121, disponibilizada no DE de 10/01/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 26/01/2017 01:33 |
