APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005925-34.2015.4.04.7204/SC
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MALTER JOANES GONZALEZ (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
: | ANA MARIA FERNANDES GONZALEZ (Curador) | |
ADVOGADO | : | Vanessa Rech Dagostim |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. REQUISITOS.
1. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
2. Atendidos os pressupostos, deve ser concedido o benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Colenda 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 09 de agosto de 2016.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8453376v1 e, se solicitado, do código CRC 2889203F. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005925-34.2015.4.04.7204/SC
RELATOR | : | PAULO AFONSO BRUM VAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MALTER JOANES GONZALEZ (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
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ADVOGADO | : | Vanessa Rech Dagostim |
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RELATÓRIO
Cuida-se de apelação do INSS em face da sentença que julgou procedente o pedido de restabelecimento de benefício assistencial devido à pessoa com deficiência, com efeitos financeiros retroativos à data da cessação do benefício.
Sustenta o INSS, em síntese, que não se faz presente o requisito econômico para o deferimento do benefício pleiteado, porquanto a renda per capita familiar é superior ao limite de ¼ do salário mínimo. Requer a reforma do decisum para que o pedido seja julgado totalmente improcedente.
Com as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo desprovimento da apelação.
É o relatório.
VOTO
Do reexame necessário
Não se desconhece o entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que a sentença ilíquida está sujeita a reexame necessário (Súmula 490). Contudo, tratando-se de remessa necessária de sentença que concedeu benefício assistencial, o qual, como é cediço, corresponde ao valor de um salário mínimo, e a apenas 18 (dezoito) prestações mensais, devidas desde a DCB (01/11/2014) e a data da publicação da sentença (31/03/2015), é certo que a condenação, ainda que acrescida de correção monetária e juros, jamais excederá 1.000 (mil) salários-mínimos, montante exigível para a admissibilidade do art. 496, § 3º, I, do NCPC, razão pela qual não se conhece da remessa oficial.
Premissas
Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a o restabelecimento de BENEFÍCIO ASSISTENCIAL, previsto no art. 203, inciso V, da Constituição Federal e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06-07-2011, e nº 12.470, de 31-08-2011, o qual foi a cancelado pelo INSS sob o fundamento de que a genitora do segurado passara a perceber pensão por morte em 02/2014.
O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.
Saliente-se, por oportuno, que a incapacidade para a vida independente a que se refere a Lei 8.742/93, na redação original, deve ser interpretada de forma a garantir o benefício assistencial a uma maior gama possível de pessoas com deficiência, consoante pacífica jurisprudência do STJ (v.g. STJ, 5ª Turma, RESP 360.202/AL, Rel. Min. Gilson Dipp, DJU de 01-07-2002) e desta Corte (v.g. AC n. 2002.71.04.000395-5/RS, 6ª Turma, Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira, DJU de 19-04-2006).
Desse modo, a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou seja incapaz de se locomover; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene pessoal e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de se expressar ou se comunicar; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros.
No que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça admitiu, em sede de Recurso Repetitivo, a possibilidade de demonstração da condição de miserabilidade por outros meios de prova, quando a renda per capita familiar fosse superior a ¼ do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, DJe 20/11/2009). Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de miserabilidade.
Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora, especialmente medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, podem ser levadas em consideração na análise da condição de miserabilidade da família da parte demandante.
A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.
Exame do caso concreto
Em relação à alegada incapacidade do autor, tal requisito não é objeto da presente controvérsia, constam do laudo pericial confeccionado em ação de interdição (evento 28, LAU2), atestando a sua condição de pessoa portadora de deficiência, nos termos da legislação.
No tocante ao requisito econômico, em que reside a presente discussão, foi elaborado parecer da assistente social, no qual se destacam os aspectos, extraídos da manifestação do MPF (evento 74):
Com efeito, o autor reside com a mãe em uma casa de alvenaria em terreno invadido, possuindo apenas dois quartos, sala, banheiro e área de serviço, encontrando-se a residência do autor em péssimas condições de habitação, não possuindo forro no teto e fiação elétrica exposta. As despesas declaradas pela família compreendem:
a) empréstimo feito no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), dividido em 72 vezes, gerando o custo mensal de R$ 286,65 (duzentos e oitenta e seis reais e sessenta e cinco centavos);
b) energia elétrica: R$ 50,00 (cinquenta reais);
c) água: R$ 91,00 (noventa e um reais);
d) alimentação e higiene: R$ 600,00 (seiscentos reais);
e) medicamentos: R$ 138,00 (cento e trinta e oito reais) e;
f) transporte: R$ 40,00 (quarenta reais).
Tais gastos perfazem a quantia de, aproximadamente, R$ 1.205,65 (mil duzentos e cinco reais e sessenta e cinco centavos). Assim, não há um saldo para a família utilizar com outros gastos, saúde, vestuário, etc, além de eventuais dispêndios necessários à manutenção de todo e qualquer grupo familiar e, principalmente, aqueles especiais que são imprescindíveis em virtude da moléstia que acomete o autor,, sobrevivendo o núcleo familiar devido as doações recebidas da comunidade e de auxílio de familiares.
Diante de tais fatos, restou caracterizado que a situação socioeconômica da família do autor constitui o estado de pobreza legalmente considerado e a deficiência mental permanente do autor, elementos capazes de ensejar a concessão do benefício pleiteado, desde à época do indeferimento administrativo do benefício.
Em que pese a renda familiar per capita ter sido incrementada com a percepção de pensão pela genitora do autor, deve-se ter em conta que, diante das despesas básicas da família (luz, água, alimentação, roupas etc.), além das demais cincunstâncias sociais acima destacadas, permanecem as razões que revelam a miserabilidade do autor.
Como observado, ainda, na sentença, em que pese o rendimento do grupo familiar supere o limite de 1/4 do salário-mínimo, os demais caracteres sócio-econômicos demonstram tratar-se de caso de manifesta hipossuficiência, merecendo destaque a idade relativamente avançada da genitora, além das graves limitações impostas pela patologia do autor, o que impõe maior dispêndio o econômico.
Conclusão quanto ao direito da parte autora no caso concreto
Dessarte, o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui incapacidade, necessitando de ajuda para sobreviver com dignidade, sendo que a percepção de pensão por morte por sua genitora não altera esse quadro. Portanto, deve ser reconhecido o direito ao restabelecimento do benefício assistencial, desde a DCB (01/11/2014), impondo-se, portanto, a ratificação da sentença.
Dos consectários
Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:
Correção Monetária e Juros
Não obstante a determinação do artigo 491 do NCPC no sentido de que "na ação relativa à obrigação de pagar quantia, ainda que formulado pedido genérico, a decisão definirá desde logo a extensão da obrigação, o índice de correção monetária, a taxa de juros, o termo inicial de ambos e a periodicidade da capitalização dos juros, se for o caso", tal deliberação resta inviabilizada, neste momento, em razão da pendência do julgamento das ADIs 4.357 e 4.425 pelo STF e dos recursos representativos de controvérsia (Resp 1495146/MG, 1495144/RS e 1492221/PR) pelo STJ (Tema 905).
Por conseguinte, ainda que o percentual de juros e o índice de correção monetária devam ser aqueles constantes da legislação em vigor em cada período em que ocorreu a mora da Fazenda Pública (INSS), difere-se, excepcionalmente, para a fase de execução a forma de cálculo dos consectários legais, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária, no ponto, nos termos da deliberação proferida pelo STJ (EDcl no MS 14.741/DF , Rel. Ministro JORGE MUSSI, Terceira Seção, DJe 15/10/2014).
Honorários Advocatícios
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, atualizados pelo IPCA-E, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte ("Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência"), bem como o disposto no artigo 85, §§ 2º e 3º, I, do Código de Processo Civil.
Custas Processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul, devendo, contudo, pagar eventuais despesas processuais, como as relacionadas a correio, publicação de editais e condução de oficiais de justiça (artigo 11 da Lei Estadual nº 8.121/85, com a redação da Lei Estadual nº 13.471/2010, já considerada a inconstitucionalidade formal reconhecida na ADI nº 70038755864 julgada pelo Órgão Especial do TJ/RS), isenções estas que não se aplicam quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que, no Estado de Santa Catarina (art. 33, par. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
Da antecipação de tutela
Pelos fundamentos anteriormente elencados, é de ser mantida a antecipação da tutela deferida, uma vez presentes os requisitos da verossimilhança do direito e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, bem como o caráter alimentar do benefício, porquanto relacionado diretamente com a subsistência, propósito maior dos proventos pagos pela Previdência Social.
Conclusão
Confirma-se a sentença que julgou procedente o pedido para reconhecer o direito do autor ao restabelecimento do benefício assistencial de prestação continuada no valor de um salário mínimo a partir de 01/11/2014.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao apelo do INSS.
Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8453375v11 e, se solicitado, do código CRC D4D985B4. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 09/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005925-34.2015.4.04.7204/SC
ORIGEM: SC 50059253420154047204
RELATOR | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Juarez Mercante |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | MALTER JOANES GONZALEZ (Absolutamente Incapaz (Art. 3º, II e III CC)) |
: | ANA MARIA FERNANDES GONZALEZ (Curador) | |
ADVOGADO | : | Vanessa Rech Dagostim |
MPF | : | MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 09/08/2016, na seqüência 306, disponibilizada no DE de 18/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ |
: | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR | |
: | Juiz Federal MARCELO CARDOZO DA SILVA |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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