APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5038006-71.2012.4.04.7000/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | EDINA APARECIDA LUQUE DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | Vitor Tavares Botti |
: | NOA PIATÃ BASSFELD GNATA | |
: | FABIO CESAR LUQUE DOS SANTOS | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. CANCELAMENTO DE BENEFÍCIO. VÍNCULO EMPREGATÍCIO INEXISTENTE. PROCESSO ADMINISTATIVO. INDEFERIMENTO DE TESTEMUNHAS. VALIDADE. DECLARAÇÃO DE INEXIGIBILIDADE DE VALORES PERCEBIDOS. DESCABIMENTO.
1. O indeferimento de oitiva de testemunhas, em sede de processo administrativo de apuração de concessão de indevida de benefício, não configura, por si só, cerceamento de defesa, quando a instauração do processo se deu por suspeita a respeito de vínculo empregatício em relação ao qual o segurado, depois de intimado, não apresentou documentos aptos a comprovar a sua efetiva existência.
2. Havendo fundada suspeita acerca dos dados constantes da CTPS, uma vez que inexistentes provas de remuneração, recolhimento de contribuições, de FTGS etc., resta afastada a presunção relativa de veracidade das anotações.
3. Tratando-se de processo ajuizado pelo segurado para ter restabelecido o benefício cancelado pelo INSS, inviável a simples declaração de existência do crédito em favor da autarquia, pois tal pedido foi feito em contestação, quando deveria ter sido apresentado através de reconvenção, reabrindo-se o prazo para defesa. Não se trata de mera formalidade, e sim de formação de nova relação processual entre autor e réu.
4. Uma vez que não constam dos autos informações sobre os resultados das apurações levadas a cabo na seara criminal, prevalece, por ora, a presunção de boa-fé no recebimento e afasta-se o dever imediato de devolução. Porém, não pode o ente público ser tolhido no seu direito de cobrança, caso sobrevenham informações que afastem tal presunção em favor da autora, de modo que declarar expressamente a inexigibilidade desse crédito seria impedir uma eventual busca futura dos valores pelo INSS.
5. No presente processo, não cabe manifestação a favor da autora ou do INSS, devendo ser afastada a declaração de inexigibilidade dos valores recebidos pela autora até o cancelamento do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso da autora e dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa necessária, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 07 de junho de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5038006-71.2012.4.04.7000/PR
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | EDINA APARECIDA LUQUE DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | Vitor Tavares Botti |
: | NOA PIATÃ BASSFELD GNATA | |
: | FABIO CESAR LUQUE DOS SANTOS | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Edina Aparecida Luque dos Santos ajuizou ação contra o INSS, requerendo a declaração de nulidade de procedimento administrativo que resultou na cassação de aposentadoria por tempo de contribuição da qual era titular. Requereu também o reconhecimento de tempo de trabalho prestado à empresa Escritório Contábil Brasil S/C, de 01/01/1978 a 30/04/1984, com o consequente restabelecimento do benefício e a declaração de inexistência do débito apurado pelo INSS sob a alegação de que a concessão foi irregular.
A sentença, proferida em 0/12/2013, julgou parcialmente procedente o pedido, somente para declarar a inexigibilidade dos valores recebidos pela autora a título de aposentadoria - NB 144.212.127-8.
A autora interpôs recurso. Alegou, em síntese, que o processo administrativo é nulo, por não lhe ter sido oportunizada a oitiva de testemunhas que comprovariam o vínculo empregatício questionado. Afirmou que as provas dos autos são suficientes para demonstrar que foi empregada no período questionado e que as testemunhas corroboram a existência do labor de 1978 a 1984 no escritório contábil do esposo.
O INSS também recorreu. Alegou que deve ser declarado incidentalmente o débito da autora, já que o benefício foi cancelado e por isso teria de devolver o que recebeu indevidamente.
Com contrarrazões.
A sentença foi submetida ao reexame necessário.
É o relatório.
VOTO
Da validade do processo administrativo
A sentença deve ser mantida quanto ao reconhecimento da validade do processo administrativo que determinou o cancelamento da aposentadoria da autora, concluindo pela inexistência do vínculo empregatício no período de 01/01/1978 a 30/04/1984.
Confiram-se os fundamentos utilizados pela magistrada a quo quanto a esse ponto:
Do procedimento administrativo
De início, cabe destacar que, mesmo em sede judicial, não se admite a comprovação do tempo de serviço/contribuição mediante prova exclusivamente testemunhal. É o que preceitua a Lei nº 8.213/91:
Art. 55...
...
§3º. A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme disposto no artigo 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento.
Cabe ressalvar a aplicação da parte final do dispositivo, a remeter às disposições regulamentares, pois se trata de norma infralegal destinada a disciplinar a atuação da Administração Previdenciária. Com efeito, a disciplina da prova para o processo judicial encontra-se no Código de Processo Civil, sem prejuízo da exigência de início de prova material referida na lei previdenciária.
Tal exigência se justifica como medida de assegurar a correta apreciação e concessão de benefícios, prevenindo fraudes ou mesmo erros. Vem, portanto, em benefício de interesse público primário, consistente na correta atuação da Administração e segurança na concessão de prestações beneficiárias, cujo custeio é partilhado por toda a sociedade, direta ou indiretamente.
Esses esclarecimentos iniciais se justificam tanto pela alegação de nulidade do processo administrativo, fundada que foi em suposta violação do contraditório por negativa da prova oral; como se justificam na apreciação da prova testemunhal produzida em Juízo. Com efeito, a simples produção desta prova não implica o reconhecimento judicial de cumprimento da exigência legal de início de prova material.
Antes, porém, cumpre examinar a alegação de nulidade do processo administrativo. Neste ponto, merece transcrição a decisão interlocutória que, conhecendo dos declaratórios, manteve o deferimento parcial da liminar, verbis (evento 13):
'Na cópia do processo administrativo (evento 1, PROCADM9-10), constata-se que o INSS iniciou a revisão do benefício em agosto/10, tendo enviado carta à segurada em junho/11, solicitando esclarecimentos sobre o vínculo de trabalho junto ao Escritório Contábil Brasil S/C (PROCADM9, fl. 28), que foi anotado de forma extemporânea no CNIS e cujo CNPJ é inexistente (fl. 29). Em julho/11 a segurada apresentou sua defesa (fls. 33-34) e apresentou documentos.
Em agosto/11, foram expedidos ofícios à CEF (para verificação de recolhimento de PIS/FGTS em nome da autora no período em discussão - fl. 69) e ao Oficial do Tabelionato de Protestos e Registro de Títulos e Documentos de Cruzeiro do Oeste (para informação sobre a existência da empresa em que a autora alega ter trabalhado - PROCAD10, fl. 1). As respostas constam nas fls. 4 e 9 do PROCADM10. Em outubro/10, tendo por base as informações da segurada, os documentos juntados e as diligência feitas na via administrativa, nova carta foi emitida à requerente, informando-lhe do prazo de 10 dias para apresentar novos elementos der defesa sob pena de suspensão do benefício. Na defesa apresentada em novembro/11 (fls. 21-24), a autora não juntou novos documentos e requereu a realização de justificação administrativa, para ouvir testemunhas referentes ao período controvertido.
A manifestação final da autarquia foi dada ainda em novembro (fl. 30), no sentido de que os documentos anteriormente angariados dão conta de que não houve o vínculo. Se não se comprovou a existência oficial da empresa, conforme normativa interna do INSS, não há como fazer justificação administrativa. A suspensão do benefício foi comunicada em 17/11/211 (fl. 31) e informado o prazo para recurso.'
Confrontando o relato acima com a cópia integral trazida no evento 15, verifica-se perfeita a reprodução do trâmite do procedimento administrativo. A sucessão de atos não aponta para o cerceamento de defesa, mas o seu oposto: desde a primeira suspeita de irregularidade, tratou o INSS de noticiá-la à autora, oportunizando-lhe a apresentação de novos documentos. Assim procedeu a autarquia em mais de uma ocasião, tendo inclusive expedido ofícios à CEF e ao Cartório de Títulos e Documentos de Cruzeiro do Oeste/PR à busca de elementos mais sólidos acerca da existência da sociedade civil apontada como empregadora.
Como referido na decisão do evento 13, o contraditório e a ampla defesa não encerram um comando de esgotamento de todas as fontes possíveis de prova, mas determinam ao ente processante o cuidado em ouvir as partes ou interessados, apreciando os pedidos de prova à luz do ordenamento jurídico em vigor. Do contrário, surgiria o risco de eternizarem-se os procedimentos, em instruções infindáveis e de utilidade no mínimo questionável. Basta ver que, tanto na seara judicial, como na administrativa, compete à autoridade processante apreciar os pedidos de prova, indeferindo aquelas que se mostrarem inúteis ou meramente protelatórias (CPC, art. 130; L. 9.784/99, art. 38, §2º).
Correta a conclusão da juíza de primeiro grau, pois não se verificou qualquer nulidade no processo administrativo que culminou no cancelamento do benefício da autora. Desde a primeira suspeita de irregularidade, o INSS a intimou para prestar esclarecimentos, e o simples fato de não ter sido deferida a prova testemunhal e não se ter realizado a justificação administrativa, o que ocorreu em razão da fragilidade dos documentos apresentados, não caracteriza cerceamento de defesa, do contrário, a fase de instrução poderia se tornar infindável com a produção de elementos probatórios desnecessários.
Vale lembrar que em ambas as esferas, judicial e administrativa, cabe à autoridade determinar as provas necessárias ao julgamento das questões postas pelas partes, conforme o art. 130 do CPC/1973, art. 370 do CPC/2015 e art. 38, § 2º, da Lei nº 9.784/99.
Portanto, o indeferimento da prova testemunhal, nesse contexto, não configura cerceamento de defesa, inexistindo nulidade no processo administrativo.
Do cancelamento do vínculo empregatício de 01/01/1978 a 30/04/1984 no Escritório Contábil Brasil S/C
A sentença deve ser igualmente mantida no tocante ao não reconhecimento da relação de emprego da autora no referido período.
O vínculo em questão foi cancelado em virtude de investigação por suspeita de fraude, o que levou à instauração do já mencionado processo administrativo pelo INSS, cujo desfecho foi o cancelamento da aposentadoria da parte autora.
Transcrevo, a seguir, a correta análise realizada pela juíza a quo:
Do período cancelado - 01/01/1978 a 30/04/1984
Quanto à revisão do ato concessivo, pelo INSS, de fato não parece ter havido ilegalidade ou abuso de poder pela autarquia. Como visto, a autarquia oportunizou à autora a apresentação de novos documentos e, apreciando-os, não vislumbrou ali início de prova material a autorizar a produção de prova testemunhal. À vista dos documentos juntados é realmente difícil afirmar a existência de vínculo de trabalho.
Primeiro, há que se ter em conta que a presunção de veracidade dos registros em CTPS é relativa e, portanto, pode ser afastada ante indícios de irregularidades, sejam eles identificados no próprio documento, sejam eles oriundos de outros documentos. Em segundo lugar, importa referir que o escritório contábil pertencia ao esposo da autora. Embora não haja vedação na lei trabalhista e mesmo na previdenciária quanto à caracterização de vínculo laboral entre familiares, a situação causa estranheza. Basta lembrar que dentre os elementos do contrato de trabalho figuram a subordinação e a onerosidade, circunstâncias de difícil configuração entre familiares, ao menos no sentido que a legislação social exige. A Lei nº 8.213/91 se reporta expressamente a tais elementos quando define o segurado empregado:
Art. 11. São segurados obrigatórios da Previdência Social:
I - como empregados:
a) aquele que presta serviço de natureza urbana ou rural à empresa, em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, inclusive como diretor empregado;
(...)
As anotações em CTPS (evento 15, PROCADM8, p. 6-10 e PROCADM9, p. 1-4) foram todas (data de admissão, data de saída, alterações de salário, contribuição sindical, anotações de férias) feitas pela pessoa jurídica denominada Escritório Contábil Brasil S/C, no período que vai de janeiro de 1978 a abril de 1984. Entretanto, o distrato da sociedade foi averbado nos idos de abril de 1977 (e. 15, PROCADM11, p. 9-10 e PROCADM12, p. 1-2), antecedendo em aproximadamente oito meses a data em que anotado o início do contrato.
Alega a autora que a dissolução jurídica da sociedade não implicou dissolução de fato, tendo escritório continuado sob a direção de seu esposo. Ainda que se admita a persistência da sociedade de fato ou, quando menos, da atividade desempenhada, não há justificativa para que todos os registros na CTPS da autora fossem feitos em nome pessoa jurídica já dissolvida, ao menos formalmente. Não mais subsistindo a pessoa jurídica, não poderia ela praticar quaisquer atos jurídicos, tais como a contratação ou a demissão de empregados, sendo descabidas as anotações posteriores feitas em seu nome.
Além disso, a CEF informou não constar qualquer recolhimento de PIS e FGTS efetuado pela pessoa jurídica 'Escritório Contábil Brasil' em nome da autora, denotando que a anotação de opção pelo FGTS não passou de mera formalidade documental. Ainda que se trate de obrigação do empregador, ambos os recolhimentos se dão em folha, circunstância que leva a uma de duas conclusões: ou as retenções foram feitas, mas os valores não foram debitados em favor da autora, na condição de empregada; ou as retenções nunca foram feitas, revelando que o contrato de trabalho anotado em CTPS nunca se materializou.
Analisando a documentação trazida aos autos, não se vislumbra qualquer prova das retenções ou mesmo que de que a autora tenha sido efetivamente remunerada.
A autora argumentou que a passagem do tempo e do óbito do marido, ocorrido nos idos de 1985, não permitiram a localização de outros documentos. A alegação não merece trânsito, uma vez que, no distrato averbado junto ao Cartório de Títulos e Documentos de Cruzeiro do Oeste, consta que o marido da autora assumiu a guarda dos documentos. Com sua morte é mais que presumível que a guarda tenha passado aos sucessores, considerando a extinção pretérita da pessoa jurídica. O extrato do RAIS trazido com a inicial (evento 1, OUT11, p. 1), a despeito de indicar vínculos empregatícios imputados à razão social 'Escritório Contábil Brasil S/C', revela a descontinuidade: aparecem três vínculos nos anos de 1976 e 1977 e apenas dois já no ano de 1981; entre 1977 e 1981 não há qualquer registro. Além disso, a consulta ao RAIS no ano de 1981 não aponta qualquer recolhimento de FGTS em favor da autora. Ali consta uma remuneração anual de '140,00', valor que fica bem abaixo do salário mínimo, qualquer que seja a moeda considerada: em 1981 a moeda circulante era o cruzeiro e o salário mínimo era de Cr$ 8.464,80 (Dec. 85.950, de 29/04/81); na data do extrato, 14/06/2012, o salário mínimo vigente era de R$ 622,00. Assim, qualquer que seja a moeda tomada em conta, a renda anual fica muito aquém do salário mínimo mensal, pondo em xeque a própria ocorrência de pagamento de salários e, portanto, a onerosidade que caracteriza o trabalho.
À vista de tais elementos, mostra-se correto o afastamento da presunção de veracidade das anotações em CTPS relativas ao período que, assim, não mais pode ser contado para fins de aposentadoria. Como se infere dos outros documentos, as anotações em comento não espelhavam a realidade dos fatos, traduzindo mera formalidade documental.
Note-se que, neste contexto, as anotações em CTPS não servem de início de prova material, já que afastada a presunção de veracidade das anotações. Descumprida assim a exigência de início de prova material, resta obstado o reconhecimento do tempo de trabalho com base exclusivamente nos testemunhos
Conforme visto acima, a autora alega que laborou, de 1978 a 1984, no escritório de contabilidade do esposo, falecido em 1985, mesmo após a dissolução da pessoa jurídica, ocorrida através de distrato social averbado em 1977. Sustentou que a sociedade continuou existindo de fato e permaneceu na atividade, e que não é responsabilidade do empregado o recolhimento de contribuições e do FTGS.
Ainda que tida por verdadeira a afirmação de que o escritório funcionou mesmo após o distrato social, o suposto empregador, nesse caso, era o seu próprio esposo. A relação de emprego, conforme dispõe o art. 11, I, da Lei nº 8.213/91, requer prestação de serviço em caráter não eventual, sob sua subordinação e mediante remuneração, o que, embora não vedado pela legislação, é incomum entre familiares, em especial marido e mulher.
Além disso, não é plausível que o marido da autora não tenha feito recolhimento de qualquer valor relativo a contribuições previdenciárias, PIS, FGTS, em prejuízo a sua esposa, denotando que as anotações em CTPS são inverídicas e foram feitas para dar ares de regularidade a uma relação de emprego que jamais existiu.
Tampouco há provas de pagamento de salário, requisito essencial da relação de emprego. Afora as anotações em CTPS, que, como já explicado, não refletem a realidade, a autora não juntou nenhum extrato ou outro documento hábil a comprovar a remuneração do período.
Frise-se que o RAIS juntado aos autos deste processo não milita em favor da demandante, pois, na linha da sentença, constam três vínculos nos anos de 1976 e 1977 e apenas dois já no ano de 1981; sem nenhum registro entre 1977 e 1981. Assim, os dados listados no documento afastam a onerosidade exigida do vínculo empregatício. Além disso, o INSS apontou que os dados foram inseridos no CNIS extemporaneamente.
A presunção de veracidade das informações anotadas em carteira de trabalho é relativa, podendo ser afastada em caso de existência de suspeita de que os dados não são verdadeiros, como é o caso em comento. A autora não logrou êxito em demonstrar com outras provas a real existência da relação de emprego, de modo que a CTPS não serve de início de prova material, o que dá respaldo ao indeferimento da prova testemunhal pelo INSS no processo administrativo.
Portanto, nego provimento ao recurso da autora, mantendo o cancelamento do período de 01/01/1978 a 30/04/1984.
Da devolução de valores recebidos até o cancelamento do benefício
O INSS e a autora requereram declarações expressas do juízo em relação aos valores percebidos até que o benefício fosse cancelado. A autarquia postulou que a sentença declarasse a existência do crédito, enquanto a autora pleiteou fosse reconhecida a inexigibilidade dos valores percebidos de boa-fé.
Em relação ao pedido do INSS, filio-me ao entendimento da juíza a quo no sentido de não ser viável a simples declaração de existência do crédito em favor da autarquia, pois tal pedido deveria ter sido apresentado através de reconvenção, reabrindo-se o prazo para autora.
Ademais, o teor do art. 5º do antigo CPC determina que se, no curso do processo, se tornar litigiosa relação jurídica de cuja existência ou inexistência depender o julgamento da lide, qualquer das partes poderá requerer que o juiz a declare por sentença. Não é a situação em tela, já que a declaração de existência do crédito é o próprio pedido do INSS, e não um pressuposto incidental para o julgamento do mérito.
Entretanto, entendo incabível a declaração de inexigibilidade dos valores por parte do INSS. Isso porque se por um lado não houve comprovação cabal de fraude, o que caracterizaria a má-fé da autora ao receber o benefício e que seria requisito para que fosse exigida a devolução dos valores, conforme firme jurisprudência a respeito, tampouco houve conclusão segura da sua boa-fé.
Assim, se não constam dos autos informações sobre os resultados das apurações levadas a cabo na seara criminal e administrativa ou outros elementos que permitam afirmar a existência de conluio entre a autora e o servidor apontado como autor das concessões indevidas, prevalece, por ora, a presunção de boa-fé no recebimento e afasta-se o dever imediato de devolução.
Porém, não pode o ente público ser tolhido no seu direito de cobrança, caso sobrevenham informações que afastem tal presunção em favor da autora, de modo que declarar expressamente a inexigibilidade desse crédito seria impedir uma eventual busca futura dos valores pelo INSS.
Enfim, não cabe manifestação a favor da autora ou do INSS nesse caso, devendo ser afastada a declaração de inexigibilidade dos valores recebidos pela autora até o cancelamento do benefício.
Conclusão
O recurso da autora resta desprovido.
O recurso do INSS e o reexame necessário restam parcialmente providos, somente para afastar a declaração de inexigibilidade dos valores recebidos pela autora até o cancelamento de sua aposentadoria.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso da autora e dar parcial provimento ao recurso do INSS e à remessa necessária.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 07/06/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5038006-71.2012.4.04.7000/PR
ORIGEM: PR 50380067120124047000
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Alexandre Amaral Gavronski |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | Dr. Vitor Tavares Botti (Videoconferência de Curitiba) |
APELANTE | : | EDINA APARECIDA LUQUE DOS SANTOS |
ADVOGADO | : | Vitor Tavares Botti |
: | NOA PIATÃ BASSFELD GNATA | |
: | FABIO CESAR LUQUE DOS SANTOS | |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído no Aditamento da Pauta do dia 07/06/2017, na seqüência 1187, disponibilizada no DE de 29/05/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO DA AUTORA E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO INSS E À REMESSA NECESSÁRIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9037350v1 e, se solicitado, do código CRC E5C9C8D. | |
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| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 08/06/2017 18:31 |
