APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011142-97.2011.4.04.7107/RS
RELATOR | : | CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | RANDON SA IMPLEMENTOS E PARTICIPACOES |
ADVOGADO | : | Cecília Debiasi de Lima de Almeida |
: | LUCIANE MARIA MENEGOTTO | |
APELADO | : | MANUTENCOES KANAA LTDA |
ADVOGADO | : | MAURÍCIO RUGERI GRAZZIOTIN |
: | MARCELO RUGERI GRAZZIOTIN | |
APELADO | : | OS MESMOS |
EMENTA
DIREITO CIVIL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. ACIDENTE DE TRABALHO. BENEFÍCIO ACIDENTÁRIO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS. ARTIGO 120 DA LEI Nº 8.213/91. CONSTITUCIONALIDADE. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL. INTERESSE DE AGIR. LEGITIMIDADE ATIVA DO INSS. LEGITIMIDADE PASSIVA DA EMPRESA TOMADORA DE SERVIÇO. SOLIDARIEDADE COM A EMPRESA PRESTADORA DE SERVIÇO. CULPA EXCLUSIVA DA EMPRESA. COMPROVAÇÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS MORATÓRIOS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRECEDENTES.
. Não há falar em inconstitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, visto que esse Tribunal já firmou posicionamento acerca da constitucionalidade daquele dispositivo, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade (AC nº 1998.04.01.023654-8);
. A pretensão regressiva do INSS, decorrente da negligência da empregadora quanto à adoção e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, recai sobre o direito ao ressarcimento da quantia paga a título de benefício previdenciário, não se discute a relação trabalhista e nem os créditos trabalhistas que resultam do acidente de trabalho, de sorte a pretensão regressiva independe de qualquer pronunciamento da justiça do Trabalho;
. A competência para processar e julgar a ação regressiva ajuizada pelo INSS contra o empregador visando ao ressarcimento de gastos com o pagamento de benefício previdenciário em decorrência de acidente do trabalho é da Justiça Federal;
. Comprovado o prejuízo havido pela concessão de benefício previdenciário ao segurado, decorrente de acidente de trabalho, e demonstrada, em tese, a negligência da empregadora quanto à adoção e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, tem o INSS direito à ação regressiva prevista no artigo 120 da Lei nº 8.213/91;
. Não obstante isso, a redação do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 prevê que a ação regressiva poderá ser proposta contra "os responsáveis". O artigo 121 da mesma lei dispõe que "o pagamento, pela Previdência Social, das prestações do acidente de trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem". Por força desses dispositivos, é correto concluir que, em caso de terceirização de serviços, o tomador e o prestador respondem solidariamente pelos danos causados à saúde dos trabalhadores
. É dever de a empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas consequências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada;
. O conjunto probatório indica que o empregador desrespeitou os padrões exigidos pelas normas de segurança do trabalho, o que contribuiu diretamente para a ocorrência do acidente em questão.
. Comprovada a existência de culpa do empregador, cabe a este ressarcir à Previdência Social pelos valores despendidos com o pagamento do benefício acidentário, até a data de sua cessação;
. No que se refere à correção monetária das parcelas vencidas, deve ser aplicado índice do Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor, que é o mesmo índice utilizado para o pagamento administrativo dos benefícios, a contar do efetivo pagamento de cada uma dessas parcelas. No caso dos autos, a sentença fixou o IPCA-E como índice de correção monetária. Afastada a aplicação da Taxa SELIC, pois o crédito não possui natureza tributária;
. Sobre o quantum indenizatório, os juros moratórios são devidos à taxa de 1% ao mês, contados da citação, conforme mais recente posicionamento do STJ que enfatiza o caráter alimentar do benefício previdenciário. Em relação às parcelas vincendas, no caso de inadimplemento, deverá incidir juros de mora fixados em 1% ao mês, contados da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ e artigo 398 do Código Civil. O evento danoso coincide com a data em que o INSS efetuou o pagamento de cada parcela do benefício previdenciário para o beneficiário;
. Segundo o entendimento desta Corte, os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da causa ou da condenação, ressalvadas as hipóteses quando o valor for muito superior ou muito aquém daquilo que efetivamente deveria receber o procurador da parte vencedora.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, conhecer do agravo retido, negando-lhe provimento, negar provimento à apelação da ré e dar parcial provimento ao recurso adesivo do INSS, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 15 de setembro de 2015.
Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7796395v3 e, se solicitado, do código CRC A90C5B10. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Cândido Alfredo Silva Leal Junior |
| Data e Hora: | 17/09/2015 18:37 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011142-97.2011.4.04.7107/RS
RELATOR | : | CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | RANDON SA IMPLEMENTOS E PARTICIPACOES |
ADVOGADO | : | Cecília Debiasi de Lima de Almeida |
: | LUCIANE MARIA MENEGOTTO | |
APELADO | : | MANUTENCOES KANAA LTDA |
ADVOGADO | : | MAURÍCIO RUGERI GRAZZIOTIN |
: | MARCELO RUGERI GRAZZIOTIN | |
APELADO | : | OS MESMOS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação regressiva ajuizada pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com base no artigo 120 da Lei nº 8.213/91, contra as empresas MANUTENÇÕES KANAÃ LTDA. e SUSPENSYS SISTEMAS AUTOMOTIVOS LTDA., buscando condenação de ambas ao ressarcimento pelas despesas causadas à Previdência Social com o pagamento de benefício acidentário, pensão por morte (NB 21/155.479.099-6), concedido em decorrência de acidente de trabalho, que resultou no óbito do trabalhador.
Narra que a segurada Dulce Dessbesell, empregada da ré MANUTENÇÕES KANAÃ LTDA, contratada para a função de auxilar de limpeza, sofreu acidente de trabalho no dia 06/11/2010. Relata que a trabalhadora sofreu traumatismo torácico e contusão do miocárdio enquanto realizava a limpeza de máquinas e equipamentos, operando máquina plataforma de trabalho elevatória autopropelida (PTA). Afirma que o acidente foi resultado do descumprimento de normas e padrão de segurança e higiene do trabalho. Sustenta que a culpa da empresa restou comprovada no Relatório de Análise de Acidente de Trabalho da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no Rio Grande do Sul. Alega afronta às Normas Regulamentadoras do Ministério do Trabalho, notadamente as NRs nº 1, 4, 11 e 18.
Citado, a empresa SUSPENSYS SISTEMAS AUTOMOTIVOS LTDA suscitou, preliminarmente, a incompetência absoluta do Juízo, a inconstitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, a ilegitimidade ativa do INSS e a própria ilegitimidade passiva. No mérito, argumentou que a empregada acidentada mantinha vínculo de emprego apenas com a outra ré. Na condição de mera tomadora dos serviços, não teria ingerência sobre a atividade da vítima. Referiu que as provas trazidas pelo o INSS são unilaterais e, portanto, insuficientes para embasar a culpa a ela imputada. Asseverou que suas contribuições ao SAT afastam a pretensão do autor. Alegou não ter concorrido para o acidente, invocando a excludente de responsabilidade de caso fortuito ou força maior (Evento 14).
A empregadora MANUTENÇÕES KANAÃ LTDA, por sua vez, suscitou preliminar de carência de ação e a inconstitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91. No mérito, em suma, alegou a insubsistência das provas trazidas pelo INSS e negou o descumprimento de normas de segurança, imputando culpa exclusiva à vítima (Evento 15).
Foi proferida decisão reconhecendo a competência do Juízo e deferindo a produção de provas pericial e testemunhal. Indeferida, contudo, a oitiva dos representantes legais das empresas rés, uma vez que já haviam se manifestado em sede de contestação (Evento 28).
A ré SUSPENSYS SISTEMAS AUTOMOTIVOS LTDA interpôs agravo retido contra a decisão que rejeitou a preliminar de incompetência absoluta do Juízo (Evento 34).
Foram justados aos autos o laudo pericial os termos de audiência (Eventos 134, 184 e 188).
Encerrada a instrução, a ação foi julgada parcialmente procedente pela Juíza Federal Lenise Kleinübing Gregol, enquanto Juíza Federal Substituta da 3ª VF de Caxias do Sul, nos seguintes termos (Evento 199):
"Ante o exposto, julgo parcialmente procedente o pedido para condenar solidariamente as requeridas a:
a) ressarcir ao INSS os valores pagos em razão da concessão do benefício de pensão por morte NB 155.479.099-6 (DIB 06/11/2010, conforme pág. 02 do anexo PROCADM2, evento 01) até o trânsito em julgado desta sentença. O montante devido deverá ser corrigido monetariamente pelo IPCA-E desde cada desembolso e acrescidos de juros de mora de 6% ao ano, desde a citação, e
b) restituir ao INSS, mensalmente, o valor pago a título do mesmo benefício até a sua extinção, nos termos da fundamentação.
Ante a sucumbência mínima do INSS, condeno as requeridas no pagamento dos ônus da sucumbência, quais sejam, custas processuais, os honorários advocatícios devidos ao patrono da parte adversa, que fixo em 10% do valor calculado no item a acima, e honorários periciais".
Em suas razões recursais, a empresa RANDON S/A IMPLEMENTOS E PARTICIPAÇÕES (sucessora legal e incorporadora da ré SUSPENSYS SISTEMAS AUTOMOTIVOS LTDA), preliminarmente, reitera o agravo retido interposto, bem como suscita a ilegitimidade ativa do INSS, a inconstitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 e sua própria ilegitimidade passiva. No mérito, em apertada síntese, rechaça a responsabilidade solidária da empresa tomadora de serviço; reafirma que não tinha qualquer ingerência sobre a atividade da vítima, que era subordinada à outra empresa. Nega ter concorrido com culpa para a ocorrência do acidente, imputando culpa exclusiva à vítima. Alternativamente, requer seja reconhecida a culpa concorrente entre empresa e empregada (Evento 208).
O INNS interpôs recurso adesivo, no qual defende a aplicação da Taxa Selic, para atualização dos valores, e juros de mora de 1% ao mês. Requer a majoração dos honorários advocatícios fixados em sentença (Evento 217).
Com contrarrazões (Eventos 216 e 223), subiram os autos para julgamento.
É o relatório. Inclua-se em pauta.
VOTO
a) Apelação da empresa RANDON S/A IMPLEMENTOS E PARTICIPAÇÕES
a.1) Preliminar de mérito - Agravo Retido (Evento 34)
O INSS busca na presente demanda o ressarcimento das despesas decorrentes da concessão de benefício previdenciário.
A pretensão regressiva do INSS, decorrente da negligência da empregadora quanto à adoção e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, recai sobre o direito ao ressarcimento da quantia paga a título de benefício previdenciário, não se discute a relação trabalhista e nem os créditos trabalhistas que resultam do acidente de trabalho, de sorte a pretensão regressiva independe de qualquer pronunciamento da justiça do Trabalho (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006349-48.2011.404.7000, 4ª TURMA, Juiz Federal MARCELO MALUCELLI, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 06/08/2014).
Por essa razão, a competência para processar e julgar a ação regressiva ajuizada pelo INSS contra o empregador visando ao ressarcimento de gastos com o pagamento de benefício previdenciário em decorrência de acidente do trabalho é da Justiça Federal (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5001916-68.2011.404.7107, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 23/07/2015; TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5026927-86.2012.404.7100, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/06/2015).
Assim, conheço do agravo retido e nego-lhe provimento.
a.2) Interesse de agir e legitimidade ativa do INSS
Comprovado o prejuízo havido pela concessão de benefício previdenciário ao segurado, decorrente de acidente de trabalho, e demonstrada, em tese, a negligência da empregadora quanto à adoção e fiscalização das medidas de segurança do trabalhador, tem o INSS direito à ação regressiva prevista no artigo 120 da Lei nº 8.213/91 (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5006349-48.2011.404.7000, 4ª TURMA, Juiz Federal MARCELO MALUCELLI, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 06/08/2014; TRF4, REEXAME NECESSÁRIO CÍVEL Nº 2003.72.03.000971-2, 4ª TURMA, Des. Federal MARGA INGE BARTH TESSLER, POR UNANIMIDADE, D.E. 10/09/2010, PUBLICAÇÃO EM 13/09/2010).
Considerando o conjunto probatório dos autos, não há falar em ausência de interesse de agir, tampouco na ilegitimidade ativa do INSS.
a.2) Constitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91
Não há falar em inconstitucionalidade do artigo 120 da Lei nº 8.213/91, visto que esse Tribunal já firmou posicionamento acerca da constitucionalidade daquele dispositivo, em sede de Arguição de Inconstitucionalidade (AC nº 1998.04.01.023654-8). Desnecessário, pois, estabelecer maiores digressões a respeito (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5014252-71.2010.404.7000, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 27/02/2015; TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5014666-26.2011.404.7100, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 28/01/2014; e TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005161-40.2013.404.7003, 4ª TURMA, Juíza Federal MARIA CRISTINA SARAIVA FERREIRA E SILVA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 06/10/2014).
O referido artigo não deixa dúvida de que o INSS, na condição de autarquia responsável pela gestão previdenciária, tem a prerrogativa de buscar o ressarcimento do erário quanto às despesas oriundas de acidente de trabalho causado por conduta negligente (culposa) do empregador.
a.3) Legitimidade passiva da empresa tomadora de serviço
De acordo com os artigos 19, parágrafo 1º e 120, da Lei nº 8.213/91, a empresa empregadora é parte legítima para responder pela ação regressiva.
Não obstante isso, a redação do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 prevê que a ação regressiva poderá ser proposta contra "os responsáveis". O artigo 121 da mesma lei dispõe que "o pagamento, pela Previdência Social, das prestações do acidente de trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem".
Por força desses dispositivos, é correto concluir que, em caso de terceirização de serviços, o tomador e o prestador respondem solidariamente pelos danos causados à saúde dos trabalhadores (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000174-14.2011.404.7202, 4ª TURMA, Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/01/2015; TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011924-82.2012.404.7200, 3ª TURMA, Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/08/2013).
Nos termos da sentença: "Neste sentido, cumpre esclarecer que em que pese a empresa Suspensys sustente que a responsabilidade de eventual dever de indenizar recai apenas sobre a prestadora dos serviços de limpeza - responsável pelo fornecimento de equipamentos, materiais e pessoal especializado -, a própria ré reconhece que firmou contrato de prestação de serviços com a empresa Kanaã. Neste sentido, não prospera o argumento de que 'não tinha ingerência sobre a forma que seriam prestados, já que para tanto se contratou a correquerida para tal função' (evento 14, anexo CONT1, página 11), porquanto cabe também à tomadora dos serviços exercer o controle e regularidade das atividades que se realizem nas suas dependências, quer por seus empregados, quer por terceirizados".
Afasto, pois, a alegação de ilegitimidade passiva ad causam da demandada.
a.4) Mérito - Culpa da empresa
A ré RANDON S/A IMPLEMENTOS E PARTICIPAÇÕES (na condição de sucessora legal e incorporadora da ré SUSPENSYS SISTEMAS AUTOMOTIVOS LTDA) nega ter havido negligência por parte das empresas rés, alegando culpa exclusiva da vítima. Rechaça ter havido descumprimento de normas de segurança do trabalho relativas à gestão de segurança e saúde do trabalho.
Contudo, examinados os autos e as alegações das partes, fico convencido do acerto da sentença de procedência. O juízo de origem está mais próximo das partes e dos fatos, devendo ser prestigiada sua apreciação da causa, não existindo nos autos situação que justificasse alteração do que foi decidido.
É dever de a empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança, não lhe sendo dado eximir-se da responsabilidade pelas consequências quando tais normas não são cumpridas, ou o são de forma inadequada.
O conjunto probatório indica que a empresa MANUTENÇÕES KANAÃ LTDA desrespeitou os padrões exigidos pelas normas de segurança do trabalho, o que contribuiu diretamente para a ocorrência do acidente em questão.
Do relatório elaborado pelo agente do Ministério do Trabalho no âmbito do processo administrativo, consta a conclusão de que o acidente ocorreu por ausência de capacitação da empregada e por falha na supervisão da atividade por ela desempenhada (PROCADM3 e PROCADM4 - Evento 1).
Corroborando para a comprovação da culpa do empregador, a mesma conclusão foi apontada pelo laudo pericial, nos seguintes termos (Evento 134):
"A Suspensys não apresentou nenhuma comprovação da exigência de 'Treinamento' da trabalhadora para operação da PTA, nem de Instruções de Serviços e Segurança, para o equipamento, a empresa prestadora de serviços, atitude adotada após o evento, inclusive com necessidade da PERMISSÃO DE TRABALHO EM PTA. Atualmente os procedimentos referidos são tidos como padrão, conforme depoimento de seus representantes.
A Manutenções Kanaa, por intermédio de seu representante, também não comprovou que tivesse propiciado treinamento especifico para operação do equipamento a trabalhadora, requisito exigido pela fabricante da plataforma. O Sr. Fernando informou que havia recebido treinamento do fabricante e repassado para Sr. Dulce".
(...)
"e se materializou pelas inobservâncias de parte das duas empresas, das NR 1, NR 4, NR 11, NR 18, constantes da Portaria 3.214/78, nas seguintes circunstâncias:
1. Inexistência de comprovante de treinamento, ministrado por pessoa autorizada, quanto à operação da PTA, condição exigida pelo fabricante do equipamento;
2. Inobservância das orientações do fabricante do equipamento quanto a ser obrigatória operação por dois trabalhadores, um no cesto da plataforma e outro no piso, junto à torre;
3. Ausência de procedimentos de operação e segurança, para a PTA.
4. Inexistência de procedimentos por parte da contratante, quanto de comprovação do treinamento específico dos trabalhadores da contratada.
5. Ausência de gerencia da contratada ou supervisão do trabalho da contratante, no momento da ocorrência, já que se tratava de trabalho eventual que não poderia ser realizado por único operador.
A empresa, após o evento, passou a adotar exigência de documentação comprobatória de treinamento dos trabalhadores de contratadas para trabalhos em PTA e outras, bem como necessidade de permissão específica, fornecida pelo setor de segurança do trabalho, para as tarefas no âmbito da empresa".
Por fim, o perito ressaltou que não restou comprovado que a trabalhadora tenha sofrido um mal súbito no momento do evento. No entanto, frisou que, se a operação da plataforma tivesse ocorrendo como deveria, haveria mais um operador, ao nível do piso, para evitar o desfecho.
Os depoimentos das testemunhas ratificam o entendimento do perito, afirmando que não havia supervisão do trabalho da vítima (Evento 188).
Comprovada a existência de culpa do empregador, cabe a este ressarcir à Previdência Social pelos valores despendidos com o pagamento do benefício acidentário, até a data de sua cessação (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5014252-71.2010.404.7000, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 27/02/2015).
Conforme já referido, a redação do artigo 120 da Lei nº 8.213/91 prevê que a ação regressiva poderá ser proposta contra "os responsáveis". O artigo 121 da mesma lei dispõe que "o pagamento, pela Previdência Social, das prestações do acidente de trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem". Por força desses dispositivos, é correto concluir que, em caso de terceirização de serviços, o tomador e o prestador respondem solidariamente pelos danos causados à saúde dos trabalhadores.
Por essas razões, nego provimento à apelação.
b) Recurso adesivo do INSS
b.1) Correção monetária e juros moratórios
Conforme determinado em sentença, a condenação ao pagamento das parcelas vincendas se estende até a cessação definitiva do benefício. O direito de regresso previsto na Lei de Benefícios refere-se às parcelas efetivamente pagas pela Previdência ao segurado ou seus dependentes. Não é diverso o entendimento deste Tribunal (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000205-91.2012.404.7204, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 12/06/2013).
A concessão do benefício (NB 21/155.479.099-6) à segurada está devidamente comprovada nos autos (PROCADM2 - Evento 1).
No que se refere à correção monetária das parcelas vencidas, ao contrário do que sustenta o Instituto autor, deve ser aplicado índice do Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor, que é o mesmo índice utilizado para o pagamento administrativo dos benefícios, a contar do efetivo pagamento de cada uma dessas parcelas (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5026927-86.2012.404.7100, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/06/2015; TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000582-48.2010.404.7005, 4ª TURMA, Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 16/03/2012).
No caso dos autos, a sentença fixou o IPCA-E como índice de correção monetária.
Afastada a aplicação da Taxa SELIC, pois o crédito não possui natureza tributária.
Entretanto, os juros moratórios são devidos à taxa de 1% ao mês, contados da citação, conforme mais recente posicionamento do STJ que enfatiza o caráter alimentar do benefício previdenciário (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005678-24.2013.404.7107, 4ª TURMA, Juiz Federal SÉRGIO RENATO TEJADA GARCIA, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 21/08/2015).
Em relação às parcelas vincendas, no caso de inadimplemento, deverá incidir juros de mora fixados em 1% ao mês, contados da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ e artigo 398 do Código Civil. O evento danoso coincide com a data em que o INSS efetuou o pagamento de cada parcela do benefício previdenciário para o beneficiário (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5026927-86.2012.404.7100, 4ª TURMA, Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/06/2015).
Merece, pois, parcial provimento o recurso do autor.
c) Honorários advocatícios
Segundo o entendimento desta Corte, os honorários advocatícios devem ser fixados em 10% sobre o valor da causa ou da condenação, ressalvadas as hipóteses quando o valor for muito superior ou muito aquém daquilo que efetivamente deveria receber o procurador da parte vencedora (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5002801-16.2010.404.7108, 4ª TURMA, Des. Federal CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, POR UNANIMIDADE, JUNTADO AOS AUTOS EM 29/04/2015).
Por essa razão, tendo em vista os vetores estipulados no artigo 20, parágrafos 3º e 4º, do CPC, e considerando complexidade da causa e a sucumbência mínima do INSS, entendo que o valor fixado pelo Juízo a quo é proporcional e razoável para remunerar o trabalho dos patronos.
d) Conclusão
Dito isso, em relação às questões preliminares e de mérito, mantenho e adoto como razões de decidir a sentença proferida pela Juíza Federal Lenise Kleinübing Gregol, enquanto Juíza Federal Substituta da 3ª VF de Caxias do Sul, transcrevendo-a e adotando-a como razão de decidir, nestes termos:
"II. FUNDAMENTAÇÃO
Preliminarmente
Inicialmente, cabe analisar as preliminares invocadas pelas requeridas em contestação.
Primeiramente, afasto a prefacial de incompetência do Juízo, porquanto a lide não trata de questão atinente a acidente do trabalho, exceptuada pelo art. 109, I, da CF/88, mas de demanda regressiva do INSS contra a empresa requerida por pagamento de pensão por morte a dependente de segurado que sofreu acidente, sendo distintas as naturezas das demandas.
A arguição de inconstitucionalidade do art. 120 da Lei nº 8.213/91 confunde-se com o mérito da ação, devendo ser com ele apreciada.
No que diz respeito à ilegitimidade do INSS, melhor sorte não assiste à contestante. Isso porque a ré confunde a indenização buscada pelo trabalhador - para qual somente este detém legitimidade - com a regressiva que pode ser intentada pela Autarquia, como é o caso dos autos e para a qual o INSS é parte legítima.
Por fim, no que refere à ilegitimidade das rés, tenho que a preliminar também merece ser afastada, porquanto tange a questão da responsabilidade sobre o acidente ocorrido, o que deve ser apreciado e decidido por ocasião da análise de mérito da ação.
Superadas essas questões, passo à análise do mérito.
Mérito
Trata-se de ação regressiva ajuizada pelo INSS contra o empregador e empresa contratante de seus serviços, visando ao ressarcimento dos gastos com pagamento de benefícios de pensões por morte previdenciária e auxílio-doença, devidos em decorrência de acidente do trabalho ocorrido nas dependências da empresa Suspensys Sistemas Automotivos Ltda., contratante dos serviços de limpeza da prestadora vinculada è empresa Manutenções Kanaã Ltda., para realização de atividades no desempenho das quais a segurada Dulce Dessbesell acabou por sofrer acidente, de que resultou sua morte.
A pretensão da Autarquia Previdenciária tem lastro nos seguintes dispositivos:
Lei nº 8.213/91
'Art. 120. Nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Art. 121. O pagamento, pela Previdência Social, das prestações por acidente do trabalho não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de outrem.'
Decreto nº 3.048/99
'Art. 341. Nos casos de negligência quanto às normas de segurança e saúde do trabalho indicadas para a proteção individual e coletiva, a previdência social proporá ação regressiva contra os responsáveis.
Art. 342. O pagamento pela previdência social das prestações decorrentes do acidente a que se refere o art. 336 não exclui a responsabilidade civil da empresa ou de terceiros.'
Ainda, nos termos do art. 19, § 1º, da Lei de Benefícios, a 'empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção e segurança da saúde do trabalhador'. Significa que, caso não adote as precauções necessárias e o empregado venha a se acidentar, a empresa pode ser compelida a indenizar a Previdência Social, em ação regressiva, pelas despesas que tiver com o segurado acidentado ou com seus dependentes.
Neste sentido, cumpre esclarecer que em que pese a empresa Suspensys sustente que a responsabilidade de eventual dever de indenizar recai apenas sobre a prestadora dos serviços de limpeza - responsável pelo fornecimento de equipamentos, materiais e pessoal especializado -, a própria ré reconhece que firmou contrato de prestação de serviços com a empresa Kanaã. Neste sentido, não prospera o argumento de que 'não tinha ingerência sobre a forma que seriam prestados, já que para tanto se contratou a correquerida para tal função' (evento 14, anexo CONT1, página 11), porquanto cabe também à tomadora dos serviços exercer o controle e regularidade das atividades que se realizem nas suas dependências, quer por seus empregados, quer por terceirizados.
Importa salientar ainda que a responsabilidade do empregador, neste caso, não tem guarida na teoria do risco, que é fundamento para a responsabilidade objetiva, no sentido de que a empresa que exerce uma atividade perigosa deve assumir os riscos e, portanto, reparar o dano dela decorrente. Ao contrário, a Lei nº 8.213/91 condiciona a responsabilidade da empresa à comprovação de sua culpa (responsabilidade subjetiva), especificamente a 'negligência quanto às normas padrão de segurança', sem a qual não é possível condenação pleiteada pelo INSS. Outrossim, sua configuração está condicionada também à prova do nexo entre a conduta omissiva ou comissiva do empregador e o evento que deu causa à prestação previdenciária.
No caso dos autos, o acidente sofrido por Dulce Dessbesell e as despesas suportadas pela Previdência Social em razão do pagamento do benefício de pensão por morte NB 155.479.099-6 são fatos incontroversos. Da mesma forma, não se discute as circunstâncias em que se deu o sinistro, quais sejam, a contratação de terceirizada para o procedimento de manutenção e reparação de máquinas, sendo que ao deslocar-se verticalmente para proceder à limpeza, foi atingida por braço móvel de uma talha, de que decorreu o seu óbito.
Assim, o cerne da questão reside em saber, diante das circunstâncias em que se deu o acidente, se as empresas, de alguma forma, concorreram para o infortúnio. Por outras palavras, o ponto nodal da questão está centrado em verificar se houve negligência do tomador e do empregador quanto às normas padrão de segurança do trabalho e, em caso positivo, se tal negligência concorreu para o evento danoso.
Segundo o INSS, as empresas não contavam com uma política de segurança adequada para evitar acidentes no desempenho daquela atividade, o que conclui a partir das observações declinadas no Relatório de Acidentes do Trabalho anexado à inicial (anexos PROCADM3 e PROCADM4 do evento 01, sic). Observe-se:
O acidente de trabalho ocorreu no setor de usinagem da empresa contratante, na máquina (PTA) plataforma de trabalho elevatória autopropelida Star 10 supra descrita, durante a execução de atividade de limpeza da viga metálica que sustenta o braço móvel da talha.
No dia 06/11/2010 a Sra. Dulce Dessbesell realizava suas atividades cotidianas na execução de tarefa de limpeza de máquinas e equipamentos. Segundo as informações do CAT, às 10h, passou a realizar a limpeza de talha (...) utilizando a máquina plataforma de trabalho elevatória autopropelida, de marca Haulotte Star 10, locada pela empresa Suspensys Sistemas Automotivos Ltda., que já se encontrava no local da tarefa.
A talha é composta de uma viga metálica, onde estão acoplados dois braços móveis, sendo o primeiro a uma altura de aproximadamente 3,23m (três metros e vinte e três centímetros) e o segundo braço a uma altura de aproximadamente 4m (quatro metros), ambos em relação ao piso da fábrica. A função da talha consiste em levantar as peças que serão usinadas e transportá-las até a máquina centro de usinagem.
Dando prosseguimento a atividade de limpeza, a Sra. Dulce Dessbell, sozinha, entrou no cesto acoplado e através do painel de comando, que se encontra na parte superior do cesto deu início as manobras operacionais.
Supõe-se que para movimentação do cesto a Sra. Dulce selecionou no botão o pictograma de movimento de subida do cesto, atuou o dispositivo de validação e em seguida acionou o manipulador (dispositivo de comando de ação continuada: comando manual que inicia e mantém o movimento apenas enquanto for mantido atuado) no sentido de baixo para cima.
Durante o deslocamento vertical do cesto a Sra. Dulce foi atingida pelo primeiro braço móvel da talha, que se encontrava no trajeto de movimentação do cesto, vindo a óbito em consequência de traumatismo torácico e contusão do miocárdio, conforme declaração de óbito.
As atividades de limpeza são desenvolvidas durante os finais de semana onde não há atividades de produção da contratante. No dia do acidente, sábado, havia atividades de PCP onde alguns trabalhadores circulando pela fábrica depararam com o corpo da acidentada curvado sobre o cesto suspenso da plataforma de trabalho, chamando de imediato o socorro médico.
4. CONCLUSÕES DO AUDITOR FISCAL DO TRABALHO:
4.1 Causas prováveis que deram origem ao acidente:
Analisando a configuração da máquina plataforma de trabalho elevatória autopropelida, sistema de funcionamento e o processo de trabalho na execução da tarefa de limpeza de máquina, podemos concluir que os seguintes fatores concorreram para o acidente:
- Operação de máquina automotriz (autopropelida) por trabalhador não capacitado;
- Ausência de procedimento de trabalho pata tarefa em altura utilizando PTA (plataforma de trabalho aéreo);
- Inobservância das instruções de utilização da máquina consignadas no manual do fabricante, por parte do empregador e contratante.
A máquina operada pela trabalhadora no momento do acidente é classificada como PTA autopropelida, isto é máquina com movimento de translação (deslocamento horizontal sobre rodas), deslocamento vertical do cesto (sobe/desce) e movimentação do cesto (para frente/atrás, para esquerda/direita), com força motriz própria, cujas características já foram elencadas.
Deve ser operada por trabalhador capacitado e ter as tarefas em que esteja envolvida objeto de procedimento de trabalho, precedido de análise de risco e observância das instruções de utilização e de manutenção fornecidas pelo fabricante, pois constitui risco para o operador e terceiros.
Segundo o manual do fabricante Haulotte, fornecido pela empresa locadora: 'Instruções de Utilização e de Manutenção da Plataforma Automotriz Star 10', item 1.2 - Instruções Antes da Utilização, subitem 1.2.1 - Formação e Conhecimento do operador
(...)
Deve ser titular de uma autorização de condução, passada pela entidade patronal, após verificação de aptidão médica e prova prática da condução da plataforma.
Deve ler e compreender o presente manual antes de utilizar a máquina.
Deve conhecer todas as regras e regulamentações oficiais em vigor no país onde a máquina é utilizada.
Os operadores devem ser sempre em número de dois para que um deles possa:
- Intervir rapidamente em caso de emergência.
- Assumir os comandos em caso de acidente ou de avaria.
- Vigiar e evitar a circulação de máquinas e de pessoas à volta da plataforma.
- Guiar o condutor da plataforma se for necessário.
Na mesma senda o contrato de locação, supra referido, em sua cláusula 8.13 determina:
'É de responsabilidade do cliente, no início da locação, a solicitação prévia da necessidade de treinamento de seus usuários.'
4.2 Infrações Constatadas:
(...)
A trabalhadora acidentada recebeu treinamento genérico da construção civil previsto no item 18.28 da NR18, onde não estava incluído a operação de PTA ou de máquina autopropelida, da mesma forma a contratante não comprovou a realização de capacitação específica.
Da mesma forma não foi comprovado nem pela empregadora, tampouco para uso de PTA, conforme as instruções do fabricante e locador visando à operação segura, os riscos inerentes e equipes de trabalho.
(...)
4.4 O acidente do trabalho, ora analisado, seria evitável se as medidas de proteção coletivas e/ou individual fossem adotadas pela empresa?
Acidente do trabalho facilmente evitável, conduta negligente da empregadora e contratante em deixar de proporcionar capacitação para operadora de máquina e elaboração de procedimentos, conforme determinado em Lei e previsto pelo fabricante e locador.
O perito do Juízo, por seu turno, no laudo anexado ao evento 134, informou que a Sra. Dulce, no dia do fato, era responsável pela equipe da empresa Kanaã que se encontrava presente, e que a mesma distribuiu tarefas aos demais e foi trabalhar sozinha na PTA para limpeza em alturas. Afirmou que não havia supervisão dos trabalhos pela Suspensys e esclareceu que no dia do infortúnio a fábrica estava quase parada, sendo que a trabalhadora foi avistada por um empregado quando já estava desfalecida no cesto de operação da plataforma.
Asseverou que, ao realizar inspeção no equipamento, não detectou qualquer anormalidade mecânica, funcional ou de segurança capaz de ter dado causa ao evento.
Esclareceu ainda que (pág. 07 do laudo, evento 134, sic):
A Suspensys não apresentou nenhuma comprovação da exigência de 'Treinamento' da trabalhadora para operação da PTA, nem de Instruções de Serviços e Segurança, para o equipamento, a empresa prestadora de serviços, atitude adotada após o evento, inclusive com necessidade da PERMISSÃO DE TRABALHO EM PTA. Atualmente os procedimentos referidos são tidos como padrão, conforme depoimento de seus representantes.
A Manutenções Kanaa, por intermédio de seu representante, também não comprovou que tivesse propiciado treinamento especifico para operação do equipamento a trabalhadora, requisito exigido pela fabricante da plataforma. O Sr. Fernando informou que havia recebido treinamento do fabricante e repassado para Sr. Dulce.
As respostas aos quesitos 7 e 8 da empresa Suspensys corroboram o entendimento do perito acerca da concorrência das empresas para o acontecimento, visto que não demonstraram que a trabalhadora teria recebido treinamento próprio à operação de PTA. O engenheiro de segurança do trabalho ainda concluiu que o evento poderia ter sido evitado, bem como que (página 09):
(...) e se materializou pelas inobservâncias de parte das duas empresas, das NR 1, NR 4, NR 11, NR 18, constantes da Portaria 3.214/78, nas seguintes circunstâncias:
1. Inexistência de comprovante de treinamento, ministrado por pessoa autorizada, quanto à operação da PTA, condição exigida pelo fabricante do equipamento;
2. Inobservância das orientações do fabricante do equipamento quanto a ser obrigatória operação por dois trabalhadores, um no cesto da plataforma e outro no piso, junto à torre;
3. Ausência de procedimentos de operação e segurança, para a PTA.
4. Inexistência de procedimentos por parte da contratante, quanto de comprovação do treinamento específico dos trabalhadores da contratada.
5. Ausência de gerencia da contratada ou supervisão do trabalho da contratante, no momento da ocorrência, já que se tratava de trabalho eventual que não poderia ser realizado por único operador.
A empresa, após o evento, passou a adotar exigência de documentação comprobatória de treinamento dos trabalhadores de contratadas para trabalhos em PTA e outras, bem como necessidade de permissão específica, fornecida pelo setor de segurança do trabalho, para as tarefas no âmbito da empresa.
Com efeito, as provas carreadas aos autos demonstram que as rés foram negligentes no que respeita à observância das normas de segurança do trabalho, sobretudo ao permitir que a operária, não comprovadamente treinada, operasse a plataforma sozinha, contrariando tanto as orientações do fabricante, como as do locatário do equipamento. Tais constatações são inclusive corroboradas pelos depoimentos das testemunhas transcritos no evento 188 (destaques acrescidos):
Testemunha Cíntia Matos de Paula Godoi
(...)
JUÍZA: Quando a senhora começou a trabalhar na Suspensys e usar esse tipo de equipamento, foi lhe dado algum treinamento?
TESTEMUNHA: Foi. A gente tem o treinamento tanto eu como ela, que nós fomos, ela foi a primeira que começou, eu fui a segunda, nós somos as primeiras que começamos na área da limpeza, o José e o Fernando que eram nossos chefes me ensinaram e acompanhavam, o José acompanhava nós nos primeiros trabalhos.
JUÍZA: Como é que foi feito? Foi feito lá na Suspensys o treinamento? Como é que foi feito?
TESTEMUNHA: O treinamento foi feito lá na Suspensys. Até no local de trabalho, daí ensinava como é que era, daí o José acompanhava nós para ver se nós estávamos fazendo certo.
JUÍZA: E essa plataforma, ela é utilizada sozinha ou tem que ter duas pessoas?
TESTEMUNHA: Duas pessoas.
JUÍZA: Sempre trabalha em duas?
TESTEMUNHA: Sim. Sempre em duas.
JUÍZA: Sabe se quando a dona Dulce, quando aconteceu o acidente com ela, se ela estava sozinha ou se tinha alguém com ela?
TESTEMUNHA: Pelo o que eu sei ela estava sozinha.
JUÍZA: E o que a senhora atribui isso?
TESTEMUNHA: Como eu não estava lá e as outras minhas colegas que estavam lá, que foi comentado que ela dispensou o rapaz que ia fazer o serviço, que já estava trabalhando durante a semana naquele serviço, naquele dia ela dispensou ele que ela que dava as tarefas, ela o mandou fazer outro serviço e ela foi fazer sozinha.
JUÍZA: Sabe se nessa plataforma tem algum tipo de botão de parada de emergência que a pessoa que esteja lá no alto possa sozinha parar?
TESTEMUNHA: Na verdade a plataforma, cada botão que tu acionar ela fica três segundos, é a segurança dela, fica funcionando, aí se tu queres, ela não faz o movimento se tu não acionares ela de novo, ela em três segundos ela faz aquele.
JUÍZA: Ela não fica?
TESTEMUNHA: É. Ela não fica a não ser que tu fiques segurando os 'manetezinhos' para ela ficar fazendo o movimento.
JUÍZA: No habitual do serviço de vocês tem alguém que fica supervisionando?
TESTEMUNHA: Cada firma tem os técnicos de segurança. A gente faz uma PT, que eles analisam os perigos, os riscos, mas eles não ficam o dia inteiro. A gente tem os lideres nossos, que no caso era ela, que acompanhava, que acompanha o serviço, mas não tinha uma pessoa especifica. Os técnicos de segurança acompanhavam o serviço, eles andam na firma, mas eles não ficam o dia inteiro cuidando.
JUÍZA: Os técnicos das empresas?
TESTEMUNHA: Das empresas que contratam.
JUÍZA: Que contratam?
TESTEMUNHA: Isso.
JUÍZA: Tem a própria empresa Manutenções Kanaã tem algum técnico que acompanha alguém acompanha?
TESTEMUNHA: Não. Porque a empresa que contrata é que tem os técnicos.
JUÍZA: E os técnicos do grupo Randon acompanham?
TESTEMUNHA: Eles que, isso. Acompanham.
JUÍZA: Mas não ficam o tempo inteiro? É isso?
TESTEMUNHA: Não. Não fica o tempo inteiro.
JUÍZA: Sabe se esse treinamento que a senhora recebeu prático para aprender a operar, foi feito algum tipo de registro desse treinamento ou era só uma coisa informal?
TESTEMUNHA: Eu acho que foi mais informal.
JUÍZA: Sabe se a dona Dulce recebeu também esse treinamento?
TESTEMUNHA: Sim. Nós recebemos juntas. Nós, como eu disse, nós fomos as primeiras que trabalhavam nessa área da limpeza, então nós recebemos o treinamento juntos. Nós trabalhávamos sempre juntas em duas pessoas e um acompanhante no começo que era o José que acompanhava depois que a gente aprendeu bem, que a gente tinha prática aí nós trabalhávamos em duas.
JUÍZA: Então a dona Dulce já trabalhava há bastante tempo com esse equipamento?
TESTEMUNHA: Sim. Desde quando nós começamos a gente já teve que aprender, porque o serviço, a maioria, tem que usar esse equipamento.
(...)
Testemunha Renato Guerino Pezzi
(...)
UÍZA: Pelo o que o senhor acompanhou da perícia, então, o que teria ocasionado o acidente?
TESTEMUNHA: Não. O que teria ocasionado o acidente não ficou determinado. Na perícia não está determinado.
JUÍZA: O que foi feito na perícia então? O que o senhor acha?
TESTEMUNHA: Foi visto o equipamento, foram entrevistadas algumas pessoas que acompanharam, que viram e que estavam e que tinham conhecimento do fato. Mas principalmente foi visto o equipamento.
JUÍZA: O equipamento.
TESTEMUNHA: E nesse acompanhamento foi visto que a senhora essa ela tinha uma patologia. Supõe-se, medicamente, como médico, supõe-se alguma coisa em relação a essa patologia. Mas basicamente foi visto o tipo de equipamento, o que tinha o equipamento.
JUÍZA: E o que vocês observaram do equipamento?
TESTEMUNHA: Que o equipamento não teve problema nenhum. Que o equipamento tinha botoeiras de emergência, tinha manuseios, tinha acionamento com tempo de acionamento 5 segundos mantendo o botão. Quer dizer isso é um equipamento de proteção, que existia proteção, que o operador trabalha dentro de uma gaiola. Eu chamo gaiola, termos de medicina do trabalho, basicamente isso no equipamento. O equipamento foi vistoriado depois do acidente pelo Ministério do Trabalho e pela Justiça Civil, a Polícia Civil.
JUÍZA: Não se detectou nenhum problema no equipamento?
TESTEMUNHA: Não houve, o equipamento não foi interditado.
JUÍZA: Mas esse equipamento então estava em boas condições?
TESTEMUNHA: Boas condições, sem qualquer problema, porque os dois órgãos públicos vistoriando esse equipamento.
JUÍZA: E com relação a utilização desse equipamento, ele pode ser utilizado por uma pessoa sozinha?
TESTEMUNHA: Poder pode. Poder ele pode ser utilizado por uma pessoa sozinha. Preconiza-se que não seja, mas poder pode. Ele tem todos os comandos, existem comandos duplos nesse equipamento, então existe um painel de comando dentro da gaiola, que a pessoa que vai operar o equipamento; e existe, o mesmo painel de comando, existe fora da gaiola, quer dizer isso pressupõe que deva ter duas pessoas.
JUÍZA: Deve ter duas.
TESTEMUNHA: Em trabalhos em alturas sempre se preconiza que hajam duas pessoas.
JUÍZA: Para que, se acontecer alguma coisa, a pessoa que está em baixo poça desligar e parar?
TESTEMUNHA: Exatamente. Preconiza-se sim, mas pode ser que.
JUÍZA: Ao que se apurou ela estaria trabalhando sozinha.
TESTEMUNHA: Como?
JUÍZA: Ao que se apurou ela estaria trabalhando sozinha no momento do acidente.
TESTEMUNHA: Ao que se apurou, ela dispensou uma pessoa que estava trabalhando com ela.
JUÍZA: Mas estava sozinha?
TESTEMUNHA: Sim.
JUÍZA: Ela estando sozinha, poderia, foi aventado de cair algum pano em cima e esse pano ter acionando alguma coisa? Um pano tem o peso suficiente para?
TESTEMUNHA: O acionamento desse aparelho ele é feito por um comando tipo um joystick. Então são comandos assim, são alavancas comandam esse aparelho. O botão ele é um botão que ele é acionando, ele tem que ter uma força tal que desloque.
JUÍZA: Essa é a minha pergunta.
TESTEMUNHA: Ele tem que ter uma força tal que desloque esse botão no curso de meio centímetro, e que esse peso se mantenha por 5 segundos.
JUÍZA: Dificilmente um pano vai conseguir?
TESTEMUNHA: A não ser que este pano estivesse muito sujo, a não ser que este pano estivesse com outro objeto. Eu não vi esse pano, esse seguinte pano. Mas um pano, tipo assim, um lenço, não faz isso.
JUÍZA: Um pano de limpeza que estivesse caído lá de cima encima do?
TESTEMUNHA: Esse é o botão de acionamento, eu não saberia dizer. Eu não saberia dizer como foi que esse pano.
JUÍZA: Sim. Isso é só uma hipótese.
TESTEMUNHA: Eu não saberia. Por isso eu não saberia dizer.
JUÍZA: O senhor não faz treinamentos para ensinar a manusear essa máquina?
TESTEMUNHA: Essa máquina? Não. Equipamentos assim, o treinamento é obrigatório que o fornecedor, o fabricante, dê esse treinamento. Não sou eu, eu não faço isso.
JUÍZA: O senhor saberia se a empresa Kanaã faz esse treinamento com os seus funcionários?
TESTEMUNHA: Naquela perícia, naquela ocasião, foi visto que, bem, o fabricante é obrigado a dar esse tipo de treinamento para alguém. Naquela perícia foi dito e foi visto, o perito oficial estava junto e viu, que o fabricante forneceu esse treinamento para uma pessoa da empresa e a empresa repassou esse treinamento para essa senhora. Para essa pessoa.
JUÍZA: Mais alguma coisa que o senhor tenha visto na perícia que julgue relevante mencionar?
TESTEMUNHA: Apenas que ela tinha uma patologia, diabete, que tem algumas implicações, que em uma eventualidade, em uma hipótese, poderia ter ocasionado algum problema de desfalecimento, de perda de sentidos. Poderia.
JUÍZA: Poderia?
TESTEMUNHA: Poderia. Foi visto isso durante a perícia e que na minha cabeça poderia ser.
JUÍZA: Mas não tinha como saber qual o grau de glicose que ela estava no momento do? Eu não sei se tem como saber.
TESTEMUNHA: Eu não a vi no dia. Não sei.
A testemunha Rivaldo Pereira Witt, que teve inclusive contato direto com a vítima no dia do acidente, também afirmou que os procedimentos à semelhança daquele em que ocorrido o sinistro são realizados por duas pessoas.
Acerca da possibilidade de o acionamento da plataforma ter ocorrido em virtude de objetos que teriam sido largados ou teriam caído sobre os comandos da máquina, bem como acerca da hipótese de a autora ter sofrido um mal súbito em decorrência de sua condição de diabética, observe-se que as testemunhas levantaram apenas suposições, sendo que em nenhum momento restou demonstrado que tais acontecimentos teriam desencadeado o acidente. Ademais, ainda que fosse qualquer dos casos, não se pode olvidar que se a segurada estivesse trabalhando na companhia de outro empregado, como requerem as normas de segurança para o caso, a probabilidade de que o acidente tivesse tomado proporções bem menores é bastante grande, visto que uma segunda pessoa poderia cessar o funcionamento da máquina em tempo de salvar a vida da operária.
Observa-se, portanto, que diversos foram os apontamentos de irregularidades em todo o procedimento de limpeza que por vitimar o empregada da empresa Kanaã, sobretudo a falta de treinamento apropriado, a inexistência de proteção e supervisionamento dos trabalhos, o que denota negligência técnica e geração de riscos aos trabalhadores.
Com efeito, restou devidamente demonstrado que a empregada estava submetida a condições inseguras de trabalho, já que não foi documentalmente comprovada a existência de procedimentos fiscalizatórios, bem como os demais destinados a informar os riscos e os meios para prevenir os acidentes na utilização das plataformas.
Assim, não há como afastar a responsabilidade das empresas rés pelo sinistro. Ora, os elementos coligidos aos autos são suficientes para demonstrar que o infortúnio ocorreu porque a segurada não havia sido adequadamente instruída, bem como porque não foram tomadas medidas destinadas à anulação dos riscos, conforme acima explicitado. Em resumo, é possível concluir que o sinistro não teria ocorrido se as empresas tivessem observado todos os procedimentos de segurança apontados no relatório de acidente do trabalho, ou, minimamente, a empresa Suspensys não tivesse aquiescido com a operação do maquinário por uma só pessoa, desacompanhada de um segundo trabalhador.
Não é demasiado recordar que a Consolidação das Leis do Trabalho define a relação de trabalho como sendo de subordinação do empregado, cumprindo ao empregador dirigir e fiscalizar a execução dos serviços prestados: 'Artigo 3º - Considera-se empregado toda pessoa física que prestar serviços de natureza não eventual a empregador, sob a dependência deste e mediante salário'.
Portanto, não basta a existência de normas de conduta, ou que os avisos e os equipamentos de proteção estejam à disposição dos trabalhadores, uma vez que a responsabilidade do empregador não é obstada por esses motivos, sobretudo se a omissão restar consubstanciada no seu dever de implementar as políticas de segurança cabíveis. Frise-se, as normas de segurança são de caráter obrigatório, assumindo o empregador, e neste caso também a contratante dos serviços, dada a peculiaridade do caso, a responsabilidade pela sua negligência em cobrar de modo efetivo sua observância ou em promover a instalação dos os equipamentos respectivos nos locais onde podem ocorrer acidentes, além de instruir os trabalhadores sobre a forma de manejar seus instrumentos e equipamentos de trabalho.
Deste modo, inexistem elementos nos autos alteram ou eximem as obrigações do empregador Kanaã e da empresa Suspensys, os quais não se desincumbiram do ônus de comprovar que adotaram as precauções recomendáveis de fiscalizar e implementar as normas de segurança pertinentes à operação de limpeza de que decorreu o incidente. Nesse sentido (grifos acrescidos):
'PROCESSO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE DO TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA CONTRA EMPREGADOR. ART. 120 DA LEI Nº 8.213/91. CULPA EXCLUSIVA. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. ART. 602 DO CPC. (...). 4. A pessoa jurídica responde pela atuação desidiosa dos que conduzem suas atividades, em especial daqueles que têm o dever de zelar pelo bom andamento dos trabalhos. 5. Para avaliarmos, diante de um acidente de trabalho, se a eventual conduta imprudente de um empregado foi causa do evento, basta um raciocínio simples: se essa conduta imprudente fosse realizada em local seguro, seria, ela, causadora do sinistro? (...). (TRF 4ª Região, AC 1998.04.01.023654-8/RS, Rel. Marga Inge Barth Tessler, DJU-II de 02-07-2003, p. 599)'
'ACIDENTE DE TRABALHO. AÇÃO REGRESSIVA DO INSS CONTRA O EMPREGADOR. CABIMENTO. NEGLIGÊNCIA DA EMPRESA. RESPONSABILIDADE. PROVA DO PAGAMENTO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. 1. É constitucional o art. 120 da Lei 8.213/91. O fato das empresas contribuírem para o custeio do regime geral de previdência social, mediante o recolhimento de tributos e contribuições sociais, dentre estas aquela destinada ao seguro de acidente do trabalho - SAT, não exclui a responsabilidade nos casos de acidente de trabalho decorrentes de culpa sua, por inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho. 2. É dever da empresa fiscalizar o cumprimento das determinações e procedimentos de segurança do trabalho. Nesse prisma, a não-adoção de precauções recomendáveis, se não constitui a causa em si do acidente, evidencia negligência da empresa que, com sua conduta omissiva, deixou de evitar o acidente, sendo responsável, pois, pela reparação do dano, inclusive em ação regressiva ajuizada pelo INSS. 3. A efetiva execução da sentença condenatória proferida na ação regressiva (processo de conhecimento) se fará mediante comprovação dos pagamentos efetuados pelo inss, vencidos e vincendos.' (TRF 4ª Região, AC 2000.72.02.000687-7, Rel. Francisco Donizete Gomes, DJU-II de 13-11-2002, p. 973)
Deste último acórdão, convém colacionar o seguinte excerto, extraído do voto proferido pelo relator:
'É fato incontroverso nos autos, por exemplo, a inexistência de ordens de serviço por escrito dando instruções ao operador sobre os riscos da atividades e como evitá-los, não se prestando a suprir tal exigência, que consta da Norma Regulamentadora nº 1, do Ministério do Trabalho, o fato dos trabalhadores terem recebido treinamento quanto à operação da máquina e procedimentos de segurança. (...). Não há dúvida que o trabalhador foi imprudente ao não utilizar o pilão para pressionar a carne, isto sobre um piso escorregadio. Todavia, se houvesse uma fiscalização mais rigorosa para forçar o uso do pilão pelos empregados ou se houvesse um mecanismo de proteção que impedisse a mão de escorregar para dentro do moedor ou, ainda, se a plataforma estivesse fixada ao piso (escorregadio) certamente o acidente teria sido evitado. Ou seja, embora não constituam a causa única do acidente, se as medidas preventivas citadas tivessem sido adotadas, o acidente teria sido evitado. É aí que reside a culpa da ré pelo acidente, impondo-lhe o dever de ressarcir o inss pelas despesas efetuadas.' (grifos acrescidos)
Em suma, não há como afastar a responsabilização das empresas rés pelo acidente sofrido por Dulce Dessbesell, já que se tivessem sido devidamente orientada quanto às precauções a serem tomadas no sentido de evitar acidentes, bem como fiscalizada e acompanhada por profissional habilitado em matéria de segurança no trabalho, o infortúnio certamente não teria ocorrido, ou teria sido de menores proporções.
No que concerne ao argumento da parte ré de que seria indevido o ressarcimento pretendido pelo INSS nesta demanda, em virtude de os valores já terem sido recolhidos por meio das contribuições recolhidas para o RAT/SAT, razão não lhe assiste.
Sobre a contribuição aludida, é oportuno referir que, ainda que seja destinada ao custeio da Seguridade Social, sua instituição e compulsoriedade não eximem as empresas empregadoras da observância de políticas de segurança e higiene do trabalho.
Atente-se que a previsão de flutuação das alíquotas da contribuição RAT mediante a aplicação do Fator Acidentário de Produção - FAP visa a estimular as empresas à adoção de políticas de redução de acidentes de trabalho - razão pela qual, inclusive, se afere o desempenho da empresa na sua atividade -, sendo que a conjugação dos índices de frequência, gravidade e custo, componentes do FAP, pode, ao fim da equação, ensejar a diminuição da contribuição. Portanto, a finalidade da variação de alíquotas consiste em medida de cunho extrafiscal, que almeja um fim social, qual seja, a adoção de medidas preventivas dos acidentes de trabalho.
O legislador pretendeu, mediante o cotejo de índices de frequência, gravidade e custo (Lei nº 10.666/2003, art. 10), fazer incidir a contribuição em maior ou menor alíquota de acordo com o desempenho da empresa frente a sua respectiva atividade econômica, de maneira que atividades que ofereçam maior risco contribuam mais, e logicamente, as de menor sejam menos gravadas com o tributo.
Não obstante tal sistemática de apuração da contribuição devida, e o fato de o elemento frequência integrar a equação do FAP das contribuintes, é imperioso ter em conta que tal sistemática não visa à punição de empresas com maior incidência de acidentes do trabalho, tampouco serve de compensação ou de chancela à existência, ainda que potencial, de tais riscos, em maior ou menor grau.
Ao revés, e conforme já se referiu, o intento maior da instituição do FAP é fomentar, nos diversos setores econômicos, uma postura preventiva frente aos acidentes do trabalho, sendo que, quanto mais eficazes forem as medidas adotadas, menores são as ocorrências, e tais elementos refletirão na alíquota aplicável às contribuintes.
A questão posta na lide, entretanto, se distancia sobremaneira de tal intenção legislativa, uma vez que a ré invoca sua condição de contribuinte do RAT como se o mero fato de ser contribuinte já a eximisse da obrigação de reparação do dano perseguida na demanda, que trata de caso de inobservância das normas de segurança e higiene do trabalho.
Admitir-se tal pretensão implicaria, inclusive, desvirtuar o intento extrafiscal a que se referiu, e tornaria despiciendo perquirir culpa e responsabilização das empregadoras, porquanto, sempre que houvesse acidentes do trabalho, partindo-se do pressuposto de que as contribuições que visam ao custeio daquelas contingências são destinadas às respectivas coberturas, a exemplo de um seguro privado, nenhum sentido faria o exame das circunstâncias em que se deram os acidentes.
Também, pelos motivos expostos, descabe o pedido de compensação formulado pela requerida, no tocante aos valores pagos a título de contribuição para o RAT e da contribuição previdenciária paga pela empresa.
Sendo assim, improcedem os argumentos da ré.
Assim, uma vez comprovada a culpa das rés no evento danoso, o pedido é procedente, devendo as empresas serem condenadas a ressarcir ao INSS os valores despendidos com o pagamento do benefício de pensão por morte NB 155.479.099-6 (DIB 06/11/2010). A presente condenação abrange as parcelas pagas até o trânsito em julgado desta decisão e aquelas a vencer, permanecendo até a data de cessação de cada benefício, por alguma das causas legais. Os valores já desembolsados serão corrigidos monetariamente pelo IPCA-E desde cada desembolso e acrescidos de juros de mora de 6% ao ano, desde a citação.
Neste ponto, um último aspecto deve ser considerado.
A Autarquia postula que seja a embargada condenada no ressarcimento de 'todas as despesas com prestações e benefícios que o INSS tiver pago até a data da liquidação ou ainda vier a pagar após a liquidação, tendo em vista o infortúnio laboral ocorrido' (págs. 16/17).
Em que pese o acolhimento do pedido de condenação da parte ré no ressarcimento do benefício concedido ao segurado, em virtude o acidente ter decorrido das condições inapropriadas de segurança a higiene, como sói se referiu, descabe o pedido acima reproduzido, porquanto contrário ao que estabelece o art. 460, parágrafo único, do CPC: A sentença deve ser certa, ainda quando decida relação jurídica condicional.
Acolher o pedido da Autarquia para condenar a requerida no pagamento de quaisquer outros benefícios ou serviços atrelados ao acidente do trabalho em voga, concedidos posteriormente ao ajuizamento, e mormente a partir da prolação desta decisão, implica ignorar a certeza que deve ser conferida à decisão, porquanto alargaria seus efeitos a eventos incertos.
Por fim, em se tratando de ressarcimento, via regressiva, dos valores despendidos pelo INSS em virtude da concessão de benefício previdenciário, não cabe a aplicação da norma contida no art. 475-Q do CPC. Isso porque a constituição de capital visa a garantir o cumprimento de prestação de alimentos, tratando-se, portanto, de garantia à subsistência do alimentando, para que o pensionamento não sofra solução de continuidade. Assim, como o pedido veiculado na presente demanda não é de condenação ao pagamento de prestação alimentícia, mas sim ao ressarcimento de valores pagos pelo INSS ao acidentado, não há subsunção da norma invocada ao caso presente.
No que tange às parcelas vincendas, a Autarquia dará continuidade ao pagamento da pensão por morte até a extinção do benefício e, em contrapartida, deverá receber mensalmente o reembolso desses valores, que serão pagos pelas rés, solidariamente, observando-se o procedimento apropriado".
Dessa forma, dou parcial provimento ao recurso adesivo do INSS, apenas para determinar que, além da correção monetária pelo IPCA-E, os juros moratórios são devidos à taxa de 1% ao mês, contados da citação. Em relação às parcelas vincendas, no caso de inadimplemento, deverá incidir juros de mora fixados em 1% ao mês, contados da data do evento danoso.
De resto, mantenho a sentença por seus próprios fundamentos.
No intento de evitar eventual oposição de embargos de declaração com a finalidade de interposição de recurso às Cortes Superiores, dou por prequestionados os dispositivos legais e constitucionais mencionados pelas partes e referidos nesta decisão.
Ante o exposto, voto por conhecer do agravo retido, negando-lhe provimento, negar provimento à apelação da ré e dar parcial provimento ao recurso adesivo do INSS.
Desembargador Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 15/09/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5011142-97.2011.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50111429720114047107
RELATOR | : | Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR |
PRESIDENTE | : | CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR |
PROCURADOR | : | Dr. Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELANTE | : | RANDON SA IMPLEMENTOS E PARTICIPACOES |
ADVOGADO | : | Cecília Debiasi de Lima de Almeida |
: | LUCIANE MARIA MENEGOTTO | |
APELADO | : | MANUTENCOES KANAA LTDA |
ADVOGADO | : | MAURÍCIO RUGERI GRAZZIOTIN |
: | MARCELO RUGERI GRAZZIOTIN | |
APELADO | : | OS MESMOS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 15/09/2015, na seqüência 162, disponibilizada no DE de 03/09/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU CONHECER DO AGRAVO RETIDO, NEGANDO-LHE PROVIMENTO, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA RÉ E DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO ADESIVO DO INSS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR |
: | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA | |
: | Des. Federal LUÍS ALBERTO D AZEVEDO AURVALLE |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria
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