Agravo de Instrumento Nº 5050532-40.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
AGRAVANTE: JANE DA SILVA CAVALHEIRO
ADVOGADO: Micheline Sicorra Wilemberg (OAB RS063408)
ADVOGADO: Roberta Mattos Rodrigues (OAB RS052612)
ADVOGADO: RENATA MATTOS RODRIGUES (OAB RS052733)
AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
AGRAVADO: MUNICÍPIO DE VIAMÃO/RS
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
INTERESSADO: HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE
RELATÓRIO
Cuida-se de agravo de instrumento interposto por JANE DA SILVA CAVALHEIRO contra decisão (evento 58, originário) da MMª Juíza Federal da 5ª VF de Porto Alegre, proferida nos seguintes termos:
Trata-se de ação entre as partes supra, com pedido de tutela de urgência, para fins de fornecimento das medicações NIVOLUMABE (OPDIVO) e IPILIMUMBE (YERVOY), para o tratamento da enfermidade de que padece a autora (melanoma maligno da pele - CID c43, de canal anal).
Narra a autora ter sido diagnosticada com a referida enfermidade em dezembro de 2019, e que
Foi submetida a amputação abdominoperineal em 05/03/2020 cujo anátomo patológico de cirurgia confirmou diagnóstico de melanoma.Entrou em acompanhamento pós ressecção.
Seus exames de follow upem 26/06/2020 demonstraram PROGRESSÃO DADOENÇA COM SURGIMENTO DE NÓDULOS PULMONARES E LINFONODOS PATOLÓGICOS EM REGIÃO INGUINAL CARACTERIZANDO, PORTANTO, MELANOMA METASTÁTICO, de acordo com relato médico em anexo.
Definido aos níveis de toxidade associadas a quimioterapia (CARBOPLATINA ASSOCIADO AO PACLITAXEL) e a inferioridade dos resultados quando comparada a imunoterapia, os médicos prescreveram como TRATAMENTO DE URGÊNCIA, o uso dos medicamentos NIVOLUMABE (OPDIVO)e IPILIMUMBE (YERVOY), ambos registrados na ANVISA.
Aponta a urgência no fornecimento dos fármacos, pois a patologia é letal, havendo risco de morte por progressão e dor crônica intratável por doença metástica não controlada.
Alega a autora não ter condições financeiras de arcar com o custo dos medicamentos prescritos para o tratamento oncológico, nem para custeio das despesas relacionadas ao processso, pois se sustenta com o benefício de auxílio-doença previdenciário, no valor de R$ 1.039,00. Requer a concessão de assistência judiciária gratuita.
Argumenta com o decidido pelo STF ao apreciar o Tema 793, quanto à responsabilidade dos entes federados, e com o direito à saúde constitucionalmente assegurado, nos termos dos arts. 5º, caput, 6º, 196 e 198 da CF/1988; e arts. 2º, 6º e 23, I, da Lei nº 8.080/1990.
Destaca ter preenchido os requisitos estipulados pelo STJ ao apreciar o Tema 106, pois não tem condições de arcar com o pagamento dos medicamentos, que possuem registro na ANVISA, tendo restado demonstrado nos laudos médicos a necessidade dos fármacos e ausência de outro tratamento disponível pelo SUS, tratando-se de prescrição fornecida por profissional que a atende junto ao CACON do Hospital de Clínicas.
Na emenda à inicial do evento 3, a autora retificou o valor da causa, para o montante de R$ 273.226,56, correspondente à integralidade do tratamento pleitado, e no evento 4 apresentou documentos para demonstrar a negativa na via administrativa.
Na decisão do evento 5 foi deferida a prioridade processual e determinada a juntada da Nota Técnica nº 1534 do Telessaúde/RS, que versou sobre prescrição de uma das medicações pleiteadas, o que foi cumprido no evento 8. Ainda, foi recebida a emenda à inicial e determinada a intimação da autora para apresentar documentação complementar, inclusive laudo técnico comentando a questão acerca do custo-efetividade da medicação Nivolumabe e o apontamento na 88ª Reunião da CONITEC, no sentido da incorporação de nivolumabe, mas não do Ipilimube.
A autora emendou a inicial e juntou documentação adicional no evento 14, apresentando comprovante de rendimentos de seu esposo e dos 3 filhos e reiterando sua incapacidade de arcar com os custos do tratamento. Refere que, conforme laudo médico complementar apresentado, não há estudos de custo-efetividade que tenham sido realizados contemplando a realidade brasileira, e destaca que
Segundo os estudos científicos,inclusive utilizados pelo CONITEC,a efetividade do uso combinado do NIVOLUMABE (OPDIVO) e IPILIMUMBE (YERVOY) proporcionou maior benefício na redução do risco de morte (67%; 23% no pior cenário).
A taxa desobrevida global nos períodos de 1a 5 anos foi avaliada nos ensaios clínicos randomizados referenciados no estudo de Zoratti et al.3456, conforme a tabela a seguir.
[...]
No primeiro ano de seguimento, mais da metade dos pacientes em uso dos medicamentos NIVOLUMABE e IPILIMUMABE, encontravam-se vivos. A taxa de sobrevida foi74% com o uso dos fármacos NIVOLUMABEe IPILIMUMABE. A sobrevida global chega em torno de 52%:
[...]
Asobrevida mediana dos pacientes em tratamento combinado comNIVOLUMABE (OPDIVO) e IPILIMUMBE (Yervoy )é de 60 meses.
A emenda à inicial do evento 14 foi recebida, sendo deferida a gratuidade de justiça à autora e determinada a realização de prova técnica previamente à análise do pedido de tutela de urgência, bem como a citação dos réus e sua intimação para prestar informações preliminares (decisão evento 16).
A União manifestou ciência com renúncia ao prazo para informações preliminares (evento 24), e o prazo para o Municipio de Viamão transcorreu in albis (evento 40).
A autora informou no evento 33 os dados do médico que a assiste.
O Estado do Rio Grande do Sul apresentou informações preliminares no evento 35, alegando que compete ao gestor federal providenciar o fornecimento de medicamento oncológico, destacando a necessidade de observar o direcionamento da repartição de competências reforçado pelo Tema 793 do STF.
Foi apresentada nota técnica pelo Telessaúde/RS no evento 37, com requisição dos honorários respectivos no evento 39.
Na decisão do evento 41 foi determinda a complementação da nota técnica, para que fosse comentada a recente incorporação ao SUS do nivolumabe, nos termos da Portaria nº 23, de 04/08/2020, bem como a intimação das partes da nota apresentada e da autora para apresentar laudo complementar do seu assistente técnico, que comente o fato da indicação em bula da medicação ipilimumabe ser de uso em monoterapia, e não associada com outra medicação, conforme referido no item 5.2 da citada ténica do evento 37.
Apresentada a complementação da nota técnica no evento 55, vieram os autos conclusos para decisão.
É o relatório. Decido.
No presente feito foi produzida nota técnica, juntada ao evento 37, em que concluído acerca da existência de evidências científicas de boa qualidade metodológica, demonstrando que a combinação nivolumabe e ipilimumabe é eficaz em vários desfechos:
Atualmente, existe evidência de boa qualidade metodológica demonstrando que a combinação nivolumabe e ipilimumabe é eficaz em vários desfechos, incluindo sobrevida global, quando utilizada como primeira linha de tratamento em pacientes com diagnóstico de melanoma metastático. Contudo, a combinação possui um custo excessivo e seu impacto orçamentário, mesmo em uma decisão isolada, é elevado.
No entanto, quanto ao custo da tecnologia, o Telesssaúde/RS ressaltou o seguinte:
Em dezembro de 2019, a CONITEC divulgou Relatório de Recomendação parcial em que se posiciona desfavorável à incorporação de nivolumabe+ipilimumabe ao SUS para o tratamento de primeira linha de melanoma avançado não-cirúrgico e metastático (2). Reconheceu a eficácia da tecnologia, porém seu argumento para ser contrário foi econômico: estimou-se o valor de R$ 371.189,80/QALY com impacto orçamentário incremental em cinco anos de R$ 2.937.254.054,10.
A conclusão foi reiterada na nota técnica juntada ao evento 55:
Em parecer preliminar, anterior à consulta pública, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias do SUS (CONITEC) posicionou-se de forma desfavorável à incorporação no SUS de terapia-alvo e da imunoterapia para o tratamento de primeira linha de pacientes com melanoma avançado não-cirúrgico e metastático(1). Justificou-se que, apesar destas terapias apresentarem maior eficácia em relação à quimioterapia padrão, o elevado custo do tratamento produziu uma relação de custo-efetividade incremental e um impacto orçamentário importante que inviabilizavam a sua incorporação. Em consulta pública, observou-se que das 1.994 contribuições, apenas 4% concordaram com essa recomendação preliminar e, em agosto de 2020, o relatório técnico final foi favorável à incorporação da tecnologia (2) . Não houve mudanças significativas no teor do relatório do parecer preliminar em relação ao do parecer final. A CONITEC estimou a razão de custo-efetividade incremental em 543.043,50 R$ por QALY1 ganho e um impacto orçamentário acumulado de R$ 2.926.897.004 em cinco anos (2) . Na recomendação final, frisou-se que "o custo mensal do tratamento de ambos os medicamentos deveriam ainda ser reduzidos conforme valor de referência de 3 PIB per capita para uma razão de custo-efetividade incremental favorável". Nessa linha, instituições internacionais, de países desenvolvidos, como a Inglaterra e o Canadá, condicionaram seu parecer favorável à redução de custo da medicação, obtida por meio de acordos sigilosos (3,4) . O relatório recentemente divulgado vai ao encontro da nota técnica produzida e, portanto, mantemos a recomendação desfavorável.
De acordo com o art. 19-Q da Lei nº 8.080/90, a incorporação de medicamentos no SUS é atribuição do Minitério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, órgão que leva em consideração, para emissão de seus relatórios as evidências científicas sobre a eficácia, acurácia, efetividade e segurança do medicamento, bem como a avaliação econômica comparativa dos benefícios e custos em relação às tecnologias já incorporadas, conforme o §2º, I e d II, do citado art. 19-Q.
Quanto ao ipilimumabe, a decisão da CONITEC, validada pelo Ministério da Saúde, foi de não incoporação da medicação para tratamento de pacientes com melanoma metastático, conforme informação disponível em: http://conitec.gov.br/images/Relatorios/2018/Relatorio_Ipilimumabe_MelanomaMetastatico_FINAL.pdf, acesso nesta data:
Recomendação final da CONITEC: Os membros da Comissão presentes 71ª reunião ordinária em 03 de outubro de 2018 deliberaram, por unanimidade, manter a recomendação de não incorporação de ipilimumabe para o tratamento de pacientes com melanoma metastático. Foi assinado o registro de Deliberação n°378/2018.
Decisão: Não incorporar o ipilimumabe para tratamento de pacientes com melanoma metastático com progressão após quimioterapia no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS. Dada pela Portaria nº 58, de 31 de outubro de 2018, publicada no Diário Oficial da União nº 210, de 31 de outubro de 2018, seção 1, página 41.
A decisão se manteve conforme se verificar do Relatório de Recomendação nº 541 de julho de 2020 da CONITEC, disponível em: http://conitec.gov.br/images/Relatorios/2020/Relatorio_541_TerapiaAlvo_Melanoma_Final_2020.pdf, acesso nesta data, do qual transcrevo o Resumo Executivo:
4. RESUMO EXECUTIVO
Tecnologias: terapia-alvo (vemurafenibe, dabrafenibe, cobimetinibe, trametinibe) e imunoterapia (ipilimumabe, nivolumabe, pembrolizumabe).
Indicação: tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático.
Demandantes: Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde (SCTIE/MS) e Bristol-Meyers Squibb Farmacêutica Ltda (nivolumabe).
Introdução: Embora não esteja entre os tumores malignos com maior incidência, o melanoma é considerado o tipo mais agressivo de câncer de pele devido ao grande potencial de disseminação à distância e consequente elevada letalidade. Em 2018, um total de 6.260 casos novos de melanoma maligno de pele foram estimados no Brasil, com aproximadamente 26% dos casos em estágio metastático e 1.794 óbitos registrados em 2015. O presente estudo avaliou as opções terapêuticas sistêmicas aprovadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para o tratamento de primeira linha do melanoma avançado não cirúrgico e metastático.
Pergunta: O uso de terapia-alvo ou imunoterapia é mais eficaz, seguro e custo-efetivo do que a quimioterapia com dacarbazina para o tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático?
Evidências científicas: Quando comparadas ao tratamento padrão com dacarbazina, todas as terapias demonstraram superioridade estatisticamente significativa, tanto no desfecho de sobrevida livre de progressão (SLP) quanto em sobrevida global (SG), exceto dabrafenibe isolado. Em relação à SG, as estimativas pontuais demonstram maior benefício na redução do risco de morte com a combinação de nivolumabe/ipilimumabe (67%; 23% no pior cenário) seguida das imunoterapias isoladas com nivolumabe ou pembrolizumabe (54%; 41% no pior cenário), terapias-alvo combinadas (44-46%; 23-27% no pior cenário), imunoterapia isolada com ipilimumabe (32%; 7% no pior cenário) e terapia-alvo isolada com vemurafenibe (20%; 3% no pior cenário). Os eventos adversos graus 3/4 foram avaliados entre as classes terapêuticas de terapia-alvo, imunoterapia e quimioterapia. Os estudos reportaram menor risco de eventos adversos para a imunoterapia isolada anti-PD-1 (nivolumabe e pembrolizumabe) em relação à dacarbazina. As classes terapêuticas que apresentaram maior risco de eventos adversos foram: terapia-alvo isolada, terapia-alvo combinada, imunoterapia isolada com anti-CTLA-4 e imunoterapia combinada, todas com estimativa pontual de risco relativo acima de 1,40.
Avaliação econômica: A avaliação de custo-efetividade demonstrou o ipilimumabe como a alternativa com menor razão de custo-efetividade incremental (ICER) em relação à dacarbazina. O nivolumabe e a sua associação com ipilimumabe tiveram melhores resultados em efetividade, porém com maior custo. Uma redução do preço do nivolumabe em 8 vezes tornaria seu ICER menor que 1 PIB per capita em relação à dacarbazina. A análise de sensibilidade probabilística revelou incertezas sobre a análise e o nivolumabe + ipilimumabe teve maior probabilidade que a dacarbazina de ser custo-efetivo em limiares próximos a R$322.000/QALY.
Avaliação de impacto orçamentário: O impacto orçamentário incremental em 5 anos variou de R$ 617.226.282,43 a R$ 2.880.924.401,13 para o ipilimumabe e sua associação com nivolumabe, respectivamente. As associações com terapia-alvo resultaram em impacto orçamentário menor que o nivolumabe, pois nessas estratégias apenas metade da população que tem a mutação BRAF seria tratada. O modelo buscou considerar além dos custos com os medicamentos, os custos diretos relacionados aos tratamentos.
Recomendação preliminar da Conitec: Os membros do Plenário da CONITEC presentes na 84ª reunião ordinária, no dia 05 de dezembro de 2019, definiram que o tema deve ser submetido à consulta pública com recomendação preliminar desfavorável à incorporação no SUS de terapia-alvo e da imunoterapia para o tratamento de primeira linha de pacientes com melanoma avançado não-cirúrgico e metastático. Apesar destas terapias apresentarem maior eficácia em relação à dacarbazina, o elevado custo do tratamento produziu uma relação de custo-efetividade e um impacto orçamentário incrementais que inviabilizam a sua incorporação.
Consulta pública: A Consulta Pública nº 85/2019, ocorreu entre os dias 02/01/2020 e 21/01/2020. Foram recebidas 2.300 contribuições, das quais 1.995 (mil novecentos e noventa e cinco) foram do formulário de experiência ou opinião e 305 (trezentos e cinco) do formulário técnico científico. Das contribuições de experiência ou opinião, 92% discordaram da recomendação preliminar e entre as contribuições técnico-científicas, 95% discordaram da recomendação preliminar e a maior parte das contribuições foram relacionadas à eficácia da terapia-alvo e da imunoterapia quando comparadas à dacarbazina. Os principais argumentos foram relacionados ao direito ao acesso ao tratamento de alto custo, eficácia dos tratamentos avaliados, e obsolescência do medicamento mais amplamente utilizado atualmente do SUS (dacarbazina). Foram recebidas contribuições de 4 (quatro) empresas fabricantes das tecnologias. Algumas contribuições levaram à atualização do modelo econômico, mas mostraram que o nivolumabe e a combinação nivolumabe com ipilimumabe permaneceram sendo as estratégias não dominadas. Outras terapias passaram a ter dominância extendida, mas não passaram a ser dominantes. Na discussão do tema, os membros do Plenário destacaram que a utilização do desfecho “cura dos pacientes com melanoma metastático”, conforme apresentado pelo fabricante, não é adequado, por se tratar de uma avaliação indireta por meio de dados da literatura sobre respostas completas sustentadas em um período determinado de tempo. Foi ressaltado, em termos gerais, que as terapias avaliadas, principalmente imunoterapias anti-PD1, mudam inteiramente o contexto atual do melanoma metastático, representando uma evolução no tratamento. Porém, o custo das terapias permanece muito elevado. Houve novas propostas de preços pelas empresas fabricantes dos medicamentos anti-PD1 avaliados (nivolumabe e pembrolizumabe) que apresentaram satisfatórios perfis de eficácia e segurança. Com as informações adicionais a avaliação econômica foi atualizada com a alteração da duração de tratamento do pembrolizumabe e com novos preços propostos pelas empresas. Para o nivolumabe houve a proposta de redução do preço que era de R$27.882,36 para R$20.939,69, com duração de tratamento até a progressão da doença ou morte. Para o pembrolizumabe houve a proposta de redução do preço que era de R$28.954,80 para R$23.724 (ICMS 17%) ou R$19.690,02 (ICMS 0%), com duração de tratamento até progressão da doença ou morte ou até vinte e quatro meses em pacientes sem progressão.
Recomendação final: Os membros da Conitec presentes na 88ª reunião ordinária, no dia 08 de julho de 2020, deliberaram, por unanimidade, por recomendar a incorporação no Sistema Único de Saúde da classe anti-PD1 (nivolumabe ou pembrolizumabe), para tratamento de primeira linha do melanoma avançado não cirúrgico e metastático, conforme modelo da assistência oncológica no SUS. Foram levadas em consideração as novas propostas de preços apresentadas pelas empresas fabricantes dos medicamentos anti-PD1 avaliados (nivolumabe e pembrolizumabe) além dos satisfatórios perfis de eficácia e segurança demonstrado pelos dois medicamentos. Discutiu-se que o custo mensal do tratamento de ambos os medicamentos deveriam ainda ser reduzidos conforme valor de referência de 3 PIB/per capita para uma razão de custo-efetividade incremental favorável. Foi discutida também a possibilidade de criação de um valor máximo para o procedimento na tabela SIGTAP com a recomendação da classe terapêutica. Foi assinado o Registro de Deliberação nº 533/2020.
Decisão: incorporar a classe anti-PD1 (nivolumabe e pembrolizumabe) para o tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático, conforme o modelo da assistência oncológica, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, conforme a Portaria nº 23, publicada no Diário Oficial da União nº 149, seção 1, página 91, em 05 de agosto de 2020 (grifei)
E, quanto ao nivolumabe, foi incorporado pela Portaria SCTIE/MS nº 23, de 04/08/2020, juntada ao evento 22, juntamente com o pembrolizumabe, para tratamento de primeira linha, conforme o modelo de assistência oncológica, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS, com prazo máximo de oferta ao SUS de cento e oitenta dias:
PORTARIA SCTIE/MS Nº 23, DE 4 DE AGOSTO DE 2020
Torna pública a decisão de incorporar a classe anti-PD1 (nivolumabe e pembrolizumabe) para o tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático, conforme o modelo da assistência oncológica, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS.
Ref.: 25000.157908/2019-33, 0016035149.
O SECRETÁRIO DE CIÊNCIA, TECNOLOGIA, INOVAÇÃO E INSUMOS ESTRATÉGICOS EM SAÚDE, DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, no uso de suas atribuições legais e, nos termos dos art. 20 e art. 23, do Decreto nº 7.646, de 21 de dezembro de 2011, resolve:
Art. 1º Incorporar a classe anti-PD1 (nivolumabe e pembrolizumabe) para o tratamento de primeira linha do melanoma avançado não-cirúrgico e metastático, conforme o modelo da assistência oncológica, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS.
Art. 2º Conforme determina o art. 25 do Decreto nº 7.646/2011, o prazo máximo para efetivar a oferta ao SUS é de cento e oitenta dias.
Art. 3º O relatório de recomendação da Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no Sistema Único de Saúde (CONITEC) sobre essa tecnologia estará disponível no endereço eletrônico: http://conitec.gov.br/.
Art. 4º Esta Portaria entra em vigor na data de sua publicação.
O prazo à oferta da nivolumabe estabelecido pela Portaria do Ministério das Saúde ainda não decorreu. Assim, a obrigação judicial de dispensação imediata, por parte dos entes públicos implicaria desigualação entre a parte autora e os demais pacientes atendidos pelo SUS.
Não se olvide que a política pública deve atender igualmente a todos os pacientes do SUS e que, na interpretação de normas sobre gestão pública, serão considerados os obstáculos e as dificuldades reais do gestor, assim como as exigências das políticas públicas a seu cargo, sem prejuízo dos direitos dos administrados conforme previsão do art. 22 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
Deferir a tutela implicaria desconsideração da política pública estruturada pelo SUS, com grave violação da isonomia em relação ao direito dos demais pacientes, seja pelo acréscimo de medicação expressamente não incorporada (ipilimumabe) em razão da relação custo/benefício, seja pelo adiantamento do fornecimento de medicação incorporada (nivolumabe), mas com prazo ainda não decorrido para dispensação pelo SUS, na forma do Decreto nº 7.646/2011, art. 25:
Art. 25. A partir da publicação da decisão de incorporar tecnologia em saúde, ou protocolo clínico e diretriz terapêutica, as áreas técnicas terão praxo máximo de cento e oitenta dias para efetivar a oferta ao SUS.
Por fim, tendo a incoproração se dado pelo modelo de assistência oncológica, conforme informações do Anexo 2 juntado ao evento 20, cabe aos hospitais fazerem a cobertura com base no valor da APAC paga pelo Ministério da Saúde, de acordo com o critério definido em protocolo institucional do próprio CACON, conforme Portaria SAES/MS 1.399/2019, art. 23, inciso V:
Art. 23 Compete ao estabelecimento de saúde habilitado na alta complexidade em oncologia:
(...)
V – adotar os protocolos clínicos e diretrizes terapêuticas (PCDT) publicados pelo Ministério da Saúde, quando existentes, e estabelecer protocolos e condutas institucionais para diagnóstico, estadiamento, tratamento e seguimento dos pacientes com base nas Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT) publicadas pelo Ministério da Saúde, quando existentes, conforme o tipo de habilitação e com os serviços acordados com o respectivo gestor do SUS.
Assim, por ora, tenho por indeferir a tutela.
Intimem-se e aguarde-se o prazo das contestações (eventos 26 a 28).
Sem prejuízo, determino a inclusão do Hospital de Clínicas como interessado na autuação, considerando a prescrição emitida pelo seu Serviço de Oncologia Clínica, bem com sua intimação para que apresente as seguintes informações a fim de instruir o feito, no prazo de dez dias:
a) de forma análoga ao disposto no inciso VI do art. 23 da Portaria SAES/MS 1.399/2019, que redefine os critérios e parâmetros referenciais para a habilitação de estabelecimentos de saúde na alta complexidade em oncologia no âmbito do SUS, disponibilize os protocolos e condutas institucionais vigentes e adotados pela equipe multiprofissional e na instituição para o diagnóstico, estadiamento, tratamento e seguimento dos pacientes com o mesmo câncer de que sofre a autora;
b) apresente parecer de seu serviço de oncologia comparando a medicação prescrita para a paciente (nivolumabe + ipilimumabe) com a medicação incorporada pela Portaria SCTIE/MS Nº 23, DE 4 DE AGOSTO DE 2020.
Abra-se vista de todo o processado ao MPF, pelo prazo de dez dias, considerando a existência de ação civil pública por ele proposta e em trâmite perante a 1ª Vara Federal de Porto Alegre sob nº ACP 5059415-50.2019.4.04.7100/RS, na qual se discute a forma de financiamento da medicação, conforme informação juntada ao evento 20 do processo em trâmite perante este juízo sob nº 50490093320204047100.
A parte agravante alega, em síntese, que a decisão agravada deve ser reformada. Sustenta que estão presentes nos autos os elementos necessários à concessão da medida de urgência determinando a obtenção do medicamento Nivolumabe (Opdivo) e do medicamento Ipilimumabe (Yervoy) para serem utilizados em associação, diante de tais medicamentos possuirem melhores resultados em relação à terapia-padrão oferecida pelo SUS. Subsidiariamente, requerem a dispensação do fármaco Opdivo cuja reconhecida eficácia fundou sua recente incorporação ao SUS.
O pedido de efeito suspensivo foi deferido em parte (evento 2).
Não foram apresentadas contrarrazões.
Foi apresentado pedido de bloqueio de valores (evento 19), rejeitado por este relator (evento 21).
É o relatório.
VOTO
Na decisão preambular assim decidiu o eminente Juiz Federal José Luís Luvizetto Terra:
Nos termos do art. 932, II c/c art. 1.019, I, ambos do CPC, para a antecipação de tutela recursal, é necessário a presença, concomitante, de dois requisitos, quais sejam, o risco de dano grave, de difícil ou impossível reparação (periculum in mora) e a demonstração da probabilidade de provimento do recurso (fumus boni iuris).
Não é o caso sub judice.
O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas.
Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.
Não se trata de direito absoluto, uma vez que é desarrazoado exigir do Estado custear todo e qualquer tratamento de saúde aos cidadãos, sob pena de instaurar uma desordem administrativa e inviabilizar o funcionamento do SUS.
É certo que a atribuição de formular e implantar políticas públicas na defesa da saúde da população é do Executivo e do Legislativo, entretanto, não pode o Judiciário se furtar de seu múnus público quando chamado para apreciar alegações de desrespeito a direitos fundamentais individuais e sociais, entre eles o direito à saúde do cidadão.
O egrégio Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 17/03/2010, no Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada 175, definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde:
(a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente;
(b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente;
(c) a aprovação do medicamento pela ANVISA; e
(d) a não configuração de tratamento experimental.
Na mesma senda, o egrégio Superior Tribunal de Justiça estabeleceu (Tema 106) requisitos para fins de concessão de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (REsp 1657156/RJ, rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, DJe 04/05/2018).
O leading case está assim ementado:
ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 106. JULGAMENTO SOB O RITO DO ART. 1.036 DO CPC/2015. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO CONSTANTES DOS ATOS NORMATIVOS DO SUS. POSSIBILIDADE. CARÁTER EXCEPCIONAL. REQUISITOS CUMULATIVOS PARA O FORNECIMENTO.
1. Caso dos autos: A ora recorrida, conforme consta do receituário e do laudo médico (fls. 14-15, e-STJ), é portadora de glaucoma crônico bilateral (CID 440.1), necessitando fazer uso contínuo de medicamentos (colírios: azorga 5 ml, glaub 5 ml e optive 15 ml), na forma prescrita por médico em atendimento pelo Sistema Único de Saúde - SUS. A Corte de origem entendeu que foi devidamente demonstrada a necessidade da ora recorrida em receber a medicação pleiteada, bem como a ausência de condições financeiras para aquisição dos medicamentos.
2. Alegações da recorrente: Destacou-se que a assistência farmacêutica estatal apenas pode ser prestada por intermédio da entrega de medicamentos prescritos em conformidade com os Protocolos Clínicos incorporados ao SUS ou, na hipótese de inexistência de protocolo, com o fornecimento de medicamentos constantes em listas editadas pelos entes públicos. Subsidiariamente, pede que seja reconhecida a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado por outros já padronizados e disponibilizados.
3. Tese afetada: Obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (Tema 106).
Trata-se, portanto, exclusivamente do fornecimento de medicamento, previsto no inciso I do art. 19-M da Lei n. 8.080/1990, não se analisando os casos de outras alternativas terapêuticas.
4. TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015 A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos: (i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
(ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
(iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.
5. Recurso especial do Estado do Rio de Janeiro não provido. Acórdão submetido à sistemática do art. 1.036 do CPC/2015.
Cabe referir que, com a finalidade de criar uma diretriz institucional para a dispensação de medicamentos no âmbito do SUS, em especial diante da necessidade de incorporar novas tecnologias cuja eficácia e adequação fossem comprovadas, de modo a constituirem-se em parte da assistência terapêutica integral fornecida pelo SUS, foi alterada a Lei nº 8.080/90 pela Lei nº 12.401/2011, que criou um procedimento, a cargo do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS - CONITEC.
De especial interesse para a apreciação do caso concreto, os artigos 19-M e 19-Q, fornecem diretrizes para a dispensação medicamentosa que considero relevantes:
Art. 19-M. A assistência terapêutica integral a que se refere a alínea d do inciso I do art. 6o consiste em:
I - dispensação de medicamentos e produtos de interesse para a saúde, cuja prescrição esteja em conformidade com as diretrizes terapêuticas definidas em protocolo clínico para a doença ou o agravo à saúde a ser tratado ou, na falta do protocolo, em conformidade com o disposto no art. 19-P;
“Art. 19-P. Na falta de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, a dispensação será realizada:
I - com base nas relações de medicamentos instituídas pelo gestor federal do SUS, observadas as competências estabelecidas nesta Lei, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada na Comissão Intergestores Tripartite;
II - no âmbito de cada Estado e do Distrito Federal, de forma suplementar, com base nas relações de medicamentos instituídas pelos gestores estaduais do SUS, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada na Comissão Intergestores Bipartite;
III - no âmbito de cada Município, de forma suplementar, com base nas relações de medicamentos instituídas pelos gestores municipais do SUS, e a responsabilidade pelo fornecimento será pactuada no Conselho Municipal de Saúde.”
“Art. 19-Q. A incorporação, a exclusão ou a alteração pelo SUS de novos medicamentos, produtos e procedimentos, bem como a constituição ou a alteração de protocolo clínico ou de diretriz terapêutica, são atribuições do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS.
Observa-se que foi definido legalmente conceito de assistência integral de saúde de forma mais restrita, buscando equilibrar a necessidade do cidadão de um tratamento que seja mais eficaz e os limitados recursos do sistema de saúde para alcançar esta finalidade.
Considero que tais parâmetros encontram-se dentro daquilo que razoavelmente pode ser exigido do Estado pelo cidadão, levando em consideração o princípio da isonomia e os termos do princípio da reserva do possível. Ou seja, na dispensação medicamentosa deve-se levar em consideração o alcance do medicamento a todos os cidadãos em situação similar o que, no caso de medicamentos de alto custo, deve ser não somente possível, mas também sustentável.
Deste modo, a atuação do Judiciário em seara que não é de sua natural ambientação, uma vez que se ingressa no âmbito da discrecionariedade administrativa, se qualifica e justifica quando visa assegurar o efetivo fornecimento de medicamentos ou outras prestações de saúde integrados à política de saúde vigente e que não estejam sendo fornecidos ou, excepcionalmente, quando o SUS não fornece tratamento eficaz, não oferece qualquer tratamento ou, ainda, quando, especialmente quando se trata de aumento de sobrevida ou de qualidade de vida, quando o medicamento apresenta eficácia diversa da opção indicada pelo SUS, sendo, de qualquer sorte, de se buscar observar as diretrizes da CONITEC, nos termos do art. 19-Q da Lei nº 8.080/90, naquilo que se revele adequado.
Observo, ainda, que a CONITEC, além de expedir Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) apresenta, no caso dos tratamentos oncológicos, as Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT), fundamentadas em evidências científicas, que nos termos do próprio site (http://conitec.gov.br/index.php/protocolos-e-diretrizes), constituem documento que não se restringe às tecnologias incorporadas no SUS, mas sim, ao que pode ser oferecido a este paciente, considerando o financiamento repassado aos centros de atenção e a autonomia destes na escolha da melhor opção para cada situação clínica.
Deste modo, é lastreado nas referidas diretrizes que o tratamento oncológico pelo SUS, em que os medicamentos são fornecidos pelos estabelecimentos de saúde credenciados pelo SUS, habilitados em oncologia, na qualidade de UNACON (Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia) e CACON (Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia), aos quais cabe prestar assistência especializada e integral ao paciente.
Relevante, ainda, para o tratamento da matéria é a avaliação do alto custo do medicamento postulado, diante das diretrizes recentemente fixadas no julgamento do Tema 06 do Supremo Tribunal Federal (RE 566471, julgado em 11/03/2020, Rel. Min. Marco Aurélio de Mello, Pleno, por maioria, vencido o Min. Luiz Edson Facchin) que, apontou que o Estado não está obrigado a fornecer medicamento de alto custo não incluído nas políticas públicas públicas de saúde, salvo comprovada hipossuficiência de recursos do requerente e de sua família solidária e, ainda, da comprovada indispensabilidade da medicação requerida.
No caso dos autos a autora demonstra que é portadora de Melanoma Maligno de Pele, CID C 43 e a prescrição dos fármacos Novolumabe e Ipilimumabe em associação (evento 1, OUT13), tendo iniciado tratamento em 2019 com a ressecção da lesão e, posteriormente, diante da detecção de nódulos pulmonares e lifonodos na região inguinal, diagnosticada a doença metastática, deixou de se submeter à terapia padrão do SUS por conta de sua toxidade e inferioridade de resultados.
A Nota Técnica do TelessaúdeRS (evento 37), considerada aqui como supridora da exigência contida na Súmula 101 desta Corte para o fim de concessão de tutela antecipada em matéria de saúde, concluiu desfavoravelmente ao pleito da autora:
Atualmente, existe evidência de boa qualidade metodológica demonstrando que a combinação nivolumabe e ipilimumabe é eficaz em vários desfechos, incluindo sobrevida global, quando utilizada como primeira linha de tratamento em pacientes com diagnóstico de melanoma metastático. Contudo, a combinação possui um custo excessivo e seu impacto orçamentário, mesmo em uma decisão isolada, é elevado. De acordo com análise econômica divulgada recentemente pela CONITEC para o cenário de incorporação apenas do nivolumabe ao SUS, seu custo deveria ser diminuído cerca de oito vezes para atingir um limiar de custo-efetividade razoável (abaixo de 1 PIB per capita por QALY ganho). Dessa forma, agências de análise de tecnologia tanto nacionais quanto internacionais foram desfavoráveis a sua incorporação, exceto mediante redução importante de preço.
Diante da não recomendação da CONITEC da associação de tratamentos e da inexistência de comprovação da impropriedade ou inadequação da política pública de saúde oferecida à parte, entendo que não se pode conceder a tutela pleiteada.
Isto porque resta assentado na jurisprudência que a concessão de medicamento excepcional deve ser lastreada em prova da ineficácia ou impropriedade da medicação oferecida.
Quanto ao ponto, cabe referir o Enunciado 14 da 1ª Jornada de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça, que afirma: "Não comprovada a inefetividade ou impropriedade dos medicamentos e tratamentos fornecidos pela rede pública de saúde, deve ser indeferido o pedido não constante das políticas públicas do Sistema Único de Saúde.".
A contrário sensu, apresentada a prova da ineficiência ou impropriedade do tratamento, resta autorizada a dispensação, nos termos do Enunciado 16 da mesma Jornada:
ENUNCIADO N.º 16
Nas demandas que visam acesso a ações e serviços da saúde diferenciada daquelas oferecidas pelo Sistema Único de Saúde, o autor deve apresentar prova da evidência científica, a inexistência, inefetividade ou impropriedade dos procedimentos ou medicamentos constantes dos protocolos clínicos do SUS.
Deste modo, não sendo ineficaz ou impróprio o tratamento oferecido e não utilizado pela parte, não merece reparos a decisão lançada.
Quanto ao pedido subsidiário, cabe referir que a tecnologia debatida tem eficácia comprovada. De fato, esta Turma têm reconhecido a eficácia do tratamento isolado com o fármaco Nivolumabe, recentemente incorporado pelo SUS, nos casos de Linfomas de Hodgkin, comprovado o esgotamento das opções de tratamento oferecidas pelo SUS (vide AG 5021634-17.2020.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 26/08/2020; TRF4 5004869-91.2019.4.04.7117, QUINTA TURMA, Relatora GISELE LEMKE, juntado aos autos em 10/09/2020), sendo contrária a orientação no caso de Melanoma Maligno, diante existência de opções terapêuticas oferecidas pela Administração (vide PREVIDENCIÁRIO. PRESTAÇÃO DE SAÚDE. NIVOLUMABE. MELANOMA MALIGNO. MEDICAMENTO AUSENTE DAS LISTAS DE DISPENSAÇÃO DO SUS. ALTERNATIVAS DISPONÍVEIS. A concessão de tutela de urgência para o fornecimento de medicamento que não conste das listas de dispensação do Sistema Único de Saúde (SUS), cuja vantagem terapêutica esteja evidenciada, é condicionada à demonstração do esgotamento ou da ineficácia dos tratamentos disponibilizados na rede pública de saúde. (TRF4, AG 5013742-57.2020.4.04.0000, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 02/07/2020).
Cabe, por certo, concluir que a própria Administração reconheceu a eficácia do uso da medicação ao incorporá-la como terapia-alvo em primeira linha para o melanoma avançado, não-cirúrgico e metastático, o que se operou através da Portaria SCTIE/MS nº 23, de 4 de agosto de 2020. Tal portaria prevê como prazo de oferta pública o de 180 dias, o que a preclara decisão singular considerou como limite à dispensação imediata do fármaco. Todavia, em nada obstante o brilhantismo dos argumentos lançados, têm-se compreendido nesta Corte que prevalece a urgência do tratamento postulado diante da gravidade da enfermidade de que padece a parte, cujo avanço até a data prevista para oferta pública, pode conduzir a deletério desfecho. Ademais, como é de conhecimento comum, nem sempre os referidos prazos são cumpridos (vide p.ex. o caso do Acetato de Abiraterona nos casos de Neoplasia Maligna de Próstata), o que pode alongar ainda mais a oferta pública do tratamento postulado.
Deste modo, conclui-se que deve ser deferida a dispensação do medicamento Nivolumabe (Opdivo).
Das atribuições, custeio e reembolso das despesas entre os réus
Sobre a questão, não havendo dúvida quanto à legitimidade passiva dos réus e sendo solidária a responsabilidade destes na demanda, também são igualmente responsáveis pelo fornecimento e pelo ônus financeiro do serviço de saúde pleiteado e concedido. Cabe, todavia, direcionar o cumprimento da obrigação, nos termos do definido no Tema 793 do Supremo Tribunal Federal, em 23.05.2019, em que restou fixada a seguinte tese de repercussão geral:
Os entes da federação, em decorrência da competência comum, são solidariamente responsáveis nas demandas prestacionais na área da saúde, e diante dos critérios constitucionais de descentralização e hierarquização, compete à autoridade judicial direcionar o cumprimento conforme as regras de repartição de competências e determinar o ressarcimento a quem suportou o ônus financeiro.
Assim sendo, tendo em vista que na Portaria SAS/MS nº 346, de 23/06/2008, editada pela Secretaria de Atenção à Saúde, restou assentado que o financiamento dos tratamentos oncológicos ministrados nos CACON's e UNACON's são sustentados pelo Ministério da Saúde por meio das denominadas APACs ONCO, reforça-se a obrigação da União em custear a referida medicação.
Ao ERGS caberá oferecer sua expertise auxiliando no cumprimento da decisão e, em caso de falha da União no custeio da medicação, podendo ser acionado para prestar em seu lugar ou acaso se pactue em comissão tripartite ou bipartite, distribuição diversa de competências, ressalvado o direito de ressarcimento, caso em que a compensação deverá se efetuar na esfera administrativa.
O armazenamento, dispensação e acompanhamento do tratamento deverá ser feito perante o CACON/UNACON em que a parte realiza seu tratamento.
Prazo para o cumprimento da obrigação: vinte dias úteis.
Ante o exposto, defiro em parte o pedido de antecipação de tutela.
Comunique-se.
Intimem-se, sendo o agravado para os fins do art. 1.019, II do CPC.
Quanto ao cumprimento da tutela deferida nestes autos, observa-se que o Juízo Singular está adotando as medidas necessárias no processo principal.
Não vindo aos autos nenhuma informação atual capaz de modificar os fundamentos da decisão inicial, adoto-os como razões de decidir.
Acrescento, tão somente, que ficam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes cuja incidência restou superada pelas próprias razões de decidir do recurso.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao agravo de instrumento.
Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002307712v3 e do código CRC f0891781.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Data e Hora: 26/2/2021, às 17:32:0
Conferência de autenticidade emitida em 06/03/2021 08:00:54.
Agravo de Instrumento Nº 5050532-40.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
AGRAVANTE: JANE DA SILVA CAVALHEIRO
ADVOGADO: Micheline Sicorra Wilemberg (OAB RS063408)
ADVOGADO: Roberta Mattos Rodrigues (OAB RS052612)
ADVOGADO: RENATA MATTOS RODRIGUES (OAB RS052733)
AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
AGRAVADO: MUNICÍPIO DE VIAMÃO/RS
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
INTERESSADO: HOSPITAL DE CLÍNICAS DE PORTO ALEGRE
EMENTA
DIREITO DA SAÚDE. agravo de instrumento FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. NIVOLUMABE (OPDIVO). MELANOMA MALIGNO. MEDICAMENTO INCORPORADO ao sus. DIRECIONAMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER. TEMA 793 DO STF.
1. O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas. 2. Observando as premissas elencadas no julgado Suspensão de Tutela Antecipada n. 175 (decisão da Corte Especial no Agravo Regimental respectivo proferida em 17 de março de 2010, Relator o Ministro Gilmar Mendes), quando da avaliação de caso concreto, devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores: (a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA (só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99) e (d) a não configuração de tratamento experimental. 3. Ainda, justifica-se a atuação judicial para garantir, de forma equilibrada, assistência terapêutica integral ao cidadão na forma definida pelas Leis nº 8.080/90 e 12.401/2011 de forma a não prejudicar um direito fundamental e, tampouco, inviabilizar o sistema de saúde pública. 4. Incorporado o medicamento ao SUS para o tratamento da enfermidade que acomete ao apelante, pode ser deferido judicialmente o fornecimento do fármaco. 5. Por conta da solidariedade, a responsabilidade pelo cumprimento da decisão judicial é igual entre os demandados, sendo o caso de se apontar o órgão responsável pelo cumprimento e o direito de ressarcimento, nos termos do Tema 793 do STF, ressalvado que o ressarcimento se há de processar na esfera administrativa.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao agravo de instrumento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 25 de fevereiro de 2021.
Documento eletrônico assinado por ALTAIR ANTONIO GREGORIO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002307713v4 e do código CRC 6f2f8392.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Data e Hora: 26/2/2021, às 17:32:0
Conferência de autenticidade emitida em 06/03/2021 08:00:54.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 18/02/2021 A 25/02/2021
Agravo de Instrumento Nº 5050532-40.2020.4.04.0000/RS
RELATOR: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON
AGRAVANTE: JANE DA SILVA CAVALHEIRO
ADVOGADO: Micheline Sicorra Wilemberg (OAB RS063408)
ADVOGADO: Roberta Mattos Rodrigues (OAB RS052612)
ADVOGADO: RENATA MATTOS RODRIGUES (OAB RS052733)
AGRAVADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
AGRAVADO: MUNICÍPIO DE VIAMÃO/RS
AGRAVADO: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 18/02/2021, às 00:00, a 25/02/2021, às 14:00, na sequência 275, disponibilizada no DE de 05/02/2021.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 06/03/2021 08:00:54.