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DIREITO DA SAÚDE. MEDICAMENTO. BORTEZOMIBE. MIELOMA MÚLTIPLO. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. ÓBITO. DIREITO PERSONALÍSSIMO. CAUSALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCAT...

Data da publicação: 13/04/2022, 07:01:16

EMENTA: DIREITO DA SAÚDE. MEDICAMENTO. BORTEZOMIBE. MIELOMA MÚLTIPLO. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. ÓBITO. DIREITO PERSONALÍSSIMO. CAUSALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. TEMA 1.002 DP STF. 1. O direito à saúde é direito personalissimo da parte insucetível de sucessão. Deste modo, com o óbito do autor ocorre a perda superveniente do objeto da demanda. 2. Constatada a perda superveniente do objeto da demanda cabe, na fixação da verba sucumbencial, observar o princípio da causalidade cabendo a que deu causa ao ajuizamento da ação, suportar os ônus da sucumbência. 5. São devidos honorários advocatícios pela União à Defensoria Pública da União - DPU. Diante da repercussão geral da questão relativa aos honorários advocatícios, resta suspensa a exigibilidade da condenação até o julgamento do Tema 1.002 do STF. (TRF4, AC 5002522-62.2021.4.04.7102, QUINTA TURMA, Relator FRANCISCO DONIZETE GOMES, juntado aos autos em 05/04/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002522-62.2021.4.04.7102/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: ARI FLORES (AUTOR)

ADVOGADO: MARCOS MAZZOTTI (DPU)

INTERESSADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação de sentença publicada em 18/11/2021 (evento 98, SENT1) na qual o juízo a quo julgou procedente o pedido, lançando o seguinte dispositivo:

ANTE O EXPOSTO, ratifico a tutela antecipada concedida e, no mérito, julgo procedente o pedido para condenar, em definitivo, os réus a fornecerem o medicamento Bortezomibe 3,5mg para todo o tratamento de saúde da parte autora, observando as doses e periodicidade indicadas na prescrição médica.

A União deverá suportar integralmente os custos da aquisição do fármaco, sendo que o ressarcimento ao Estado do RS deverá ocorrer no âmbito administrativo.

Réus isentos do pagamento de custas (Lei nº 9.289/96, art. 4º, I).

Condeno os réus no pagamento, pro rata, dos honorários advocatícios ao patrono da parte autora, verba que fixo em R$1.500,00 (um mil e quinhentos reais), na forma do art. 85, §8º, do CPC (proveito econômico inestimável), montante que deverá ser corrigido monetariamente até a data do efetivo pagamento pelo IPCA-E.

Dispensada a remessa necessária (art. 496, §3º, do CPC).

Havendo recurso de apelação desta sentença, intime-se a parte recorrida para oferecimento de contrarrazões, observado o disposto nos artigos 1.009, § 2º e 1.010, § 2º, do CPC. Em seguida, remetam-se os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, independentemente de juízo de admissibilidade, inclusive no que se refere à regularidade do preparo, nos termos do artigo 1.010, § 3º, do mesmo diploma legal.

Sentença publicada e registrada eletronicamente. Intimem-se.

Apelou a União (evento 103, APELAÇÃO1) requerendo a reforma da sentença quanto à fixação de honorários advocatícios em desfavor da Defensoria Pública da União. Por fim, prequestionou a matéria debatida.

Informado o óbito ainda no processamento do feito perante o Juízo Singular, foi oportunizada manifestação às partes, tendo ratificado a União seu interesse no julgamento do recurso (evento 13, PET1).

Processado o feito, vieram os autos a esta Corte para julgamento.

É o relatório.

VOTO

Legislação Aplicável

Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.

Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.

Recebimento do recurso

Importa referir que a apelação deve ser conhecida, por ser própria, regular e tempestiva.

Da perda do objeto da demanda

No que toca à dispensação medicamentosa, perdeu objeto o pedido, o que apresenta efeitos na distribuição dos ônus sucumbenciais.

Considerando-se o óbito da autora em 03/11/2021 (evento evento 107, CERTOBT3) e diante de ser o direito postulado personalíssimo, a uníssona jurisprudência desta Corte considera que há perda do objeto da demanda, devendo ser observado o princípio da causalidade:

FALECIMENTO DA PARTE AUTORA. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. DIREITO PERSONALÍSSIMO. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. - Não há interesse processual quando não mais existe a necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida. - Na hipótese dos autos, comprovado o falecimento da parte autora, impõe-se a extinção do processo, sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, VI e IX, do Código de Processo Civil. - A responsabilidade pelo pagamento da verba sucumbencial, no caso de extinção do processo sem exame do mérito, é da parte que deu causa a demanda. - Tratando-se de causa relacionada à garantia do direito à saúde, cujo valor material é inestimável, correta a aplicação do § 8º do art. 85 do novo CPC, que remete à apreciação equitativa considerando os incisos do § 2º do artigo citado (grau de zelo profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa, trabalho realizado pelo advogado e tempo exigido para o seu serviço). (TRF4, AC 5000004-22.2018.4.04.7000, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 21/09/2018)

ADMINISTRATIVO. MEDICAMENTO. ÓBITO DO AUTOR. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE PROCESSUAL. DIREITO PERSONALÍSSIMO. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. SUCUMBÊNCIA. 1. Não há interesse processual quando não mais existe a necessidade de ir a juízo para alcançar a tutela pretendida. 2. A responsabilidade pelo pagamento da verba sucumbencial, no caso de extinção do processo sem exame do mérito, é da parte que deu causa a demanda. (TRF4, AC 5000525-90.2016.4.04.7111, QUARTA TURMA, Relator LUÍS ALBERTO D'AZEVEDO AURVALLE, juntado aos autos em 21/09/2018)

ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO. FALECIMENTO. PERDA DE OBJETO. EXTINÇÃO DA AÇÃO. SUCUMBÊNCIA. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. 1. Diante do falecimento do autor/paciente, configurada a perda superveniente do objeto da ação, eis que o fornecimento de medicamentos por parte do Poder Público é um direito intransmissível, em razão de sua natureza personalíssima. Impõe-se a extinção do feito, nos termos do art. 485, IX e § 3º, do NCPC. 2. A imposição dos ônus sucucumbenciais pauta-se pelo princípio da causalidade, segundo o qual aquele que deu causa à instauração do processo deve arcar com as despesas dele decorrente. Precedentes do STJ. (TRF4, AC 5002283-54.2018.4.04.7105, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 23/08/2018)

Veja-se, a propósito do tema, o precedente a seguir:

DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. CONTRATO DE LOCAÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA OBJETIVANDO A REINTEGRAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS-LOCADORES NA POSSE DO IMÓVEL. ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL PELA LOCATÁRIA. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE DE AGIR. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA A SER ARCADO PELA RÉ, ORA RECORRENTE. PRECEDENTE DO STJ. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (...)

3. Em razão do princípio da causalidade, as custas e honorários advocatícios devem ser suportados pela parte que deu causa à extinção do processo sem julgamento do mérito ou pela parte que viesse a ser a perdedora caso o magistrado julgasse o mérito da causa. Precedente do STJ.

4. Hipótese em que, quando do ajuizamento da demanda, efetivamente existia o legítimo interesse de agir dos recorridos, sendo certo, ademais, que a perda do objetoda ação se deu por motivo superveniente causado pela recorrente, ao arrematar o imóvel que antes ocupava na condição de locatária.

5. Recurso especial conhecido e provido.

(STJ, RESP 200802083990, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 02/08/2010).

No âmbito desta Corte, não é diversa a orientação, como demonstra o seguinte aresto:

ADMINISTRATIVO. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS. DESNECESSIDADE DA CONTINUAÇÃO DO TRATAMENTO. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO DA AÇÃO. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. - Ocorre a perda superveniente do objeto da ação em razão da desnecessidade da continuação do tratamento, com a medicação pleiteada, desaparecendo o seu interesse processual, restando desnecessário o provimento jurisdicional. - Nas hipóteses de extinção do processo sem resolução do mérito, decorrente da perda superveniente do interesse processual, a parte que deu causa à instauração do processo deverá suportar o pagamento dos honorários advocatícios, com fundamento no princípio da causalidade. (TRF4, AC 5012189-48.2016.4.04.7102, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 18/05/2018).

Veja-se, a propósito do tema, o precedente a seguir:

DIREITO CIVIL. PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. LOCAÇÃO. CONTRATO DE LOCAÇÃO. AÇÃO ANULATÓRIA OBJETIVANDO A REINTEGRAÇÃO DOS PROPRIETÁRIOS-LOCADORES NA POSSE DO IMÓVEL. ARREMATAÇÃO DO IMÓVEL PELA LOCATÁRIA. PERDA SUPERVENIENTE DO INTERESSE DE AGIR. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA A SER ARCADO PELA RÉ, ORA RECORRENTE. PRECEDENTE DO STJ. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E PROVIDO. (...)

3. Em razão do princípio da causalidade, as custas e honorários advocatícios devem ser suportados pela parte que deu causa à extinção do processo sem julgamento do mérito ou pela parte que viesse a ser a perdedora caso o magistrado julgasse o mérito da causa. Precedente do STJ.

4. Hipótese em que, quando do ajuizamento da demanda, efetivamente existia o legítimo interesse de agir dos recorridos, sendo certo, ademais, que a perda do objetoda ação se deu por motivo superveniente causado pela recorrente, ao arrematar o imóvel que antes ocupava na condição de locatária.

5. Recurso especial conhecido e provido.

(STJ, RESP 200802083990, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, DJ 02/08/2010).

Cabe, deste modo, definir quem deu causa ao ajuizamento da demanda.

Do Mérito

O direito fundamental à saúde está reconhecido pela Constituição Federal, nos seus arts. 6º e 196, como legítimo direito social fundamental do cidadão, que deve ser garantido através de políticas sociais e econômicas.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

É certo que a atribuição de formular e implantar políticas públicas na defesa da saúde da população é do Executivo e do Legislativo, entretanto, não pode o Judiciário se furtar de seu múnus público quando chamado para apreciar alegações de desrespeito a direitos fundamentais individuais e sociais, entre eles o direito à saúde do cidadão.

O egrégio Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária de 17/03/2010, no Agravo Regimental na Suspensão de Tutela Antecipada 175, definiu alguns parâmetros para solução judicial dos casos que envolvem direito à saúde:

(a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente;

(b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente;

(c) a aprovação do medicamento pela ANVISA; e

(d) a não configuração de tratamento experimental.

Na mesma senda, o egrégio Superior Tribunal de Justiça estabeleceu requisitos para fins de concessão de medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (REsp 1657156/RJ, rel. Ministro Benedito Gonçalves, 1ª Seção, DJe 04/05/2018).

O leading case está assim ementado:

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 106. JULGAMENTO SOB O RITO DO ART. 1.036 DO CPC/2015. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NÃO CONSTANTES DOS ATOS NORMATIVOS DO SUS. POSSIBILIDADE. CARÁTER EXCEPCIONAL. REQUISITOS CUMULATIVOS PARA O FORNECIMENTO.
1. Caso dos autos: A ora recorrida, conforme consta do receituário e do laudo médico (fls. 14-15, e-STJ), é portadora de glaucoma crônico bilateral (CID 440.1), necessitando fazer uso contínuo de medicamentos (colírios: azorga 5 ml, glaub 5 ml e optive 15 ml), na forma prescrita por médico em atendimento pelo Sistema Único de Saúde - SUS. A Corte de origem entendeu que foi devidamente demonstrada a necessidade da ora recorrida em receber a medicação pleiteada, bem como a ausência de condições financeiras para aquisição dos medicamentos.
2. Alegações da recorrente: Destacou-se que a assistência farmacêutica estatal apenas pode ser prestada por intermédio da entrega de medicamentos prescritos em conformidade com os Protocolos Clínicos incorporados ao SUS ou, na hipótese de inexistência de protocolo, com o fornecimento de medicamentos constantes em listas editadas pelos entes públicos. Subsidiariamente, pede que seja reconhecida a possibilidade de substituição do medicamento pleiteado por outros já padronizados e disponibilizados.
3. Tese afetada: Obrigatoriedade do poder público de fornecer medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS (Tema 106).
Trata-se, portanto, exclusivamente do fornecimento de medicamento, previsto no inciso I do art. 19-M da Lei n. 8.080/1990, não se analisando os casos de outras alternativas terapêuticas.
4. TESE PARA FINS DO ART. 1.036 DO CPC/2015 A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cumulativa dos seguintes requisitos:

(i) Comprovação, por meio de laudo médico fundamentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da imprescindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS;
(ii) incapacidade financeira de arcar com o custo do medicamento prescrito;
(iii) existência de registro na ANVISA do medicamento.
5. Recurso especial do Estado do Rio de Janeiro não provido. Acórdão submetido à sistemática do art. 1.036 do CPC/2015.

Cabe referir que, com a finalidade de criar uma diretriz institucional para a dispensação de medicamentos no âmbito do SUS, em especial diante da necessidade de incorporar novas tecnologias cuja eficácia e adequação fossem comprovadas, de modo a constituirem-se em parte da assistência terapêutica integral fornecida pelo SUS, foi alterada a Lei nº 8.080/90 pela Lei nº 12.401/2011, que criou um procedimento, a cargo do Ministério da Saúde, assessorado pela Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS - CONITEC.

Deste modo, a atuação do Judiciário se qualifica e justifica quando visa assegurar o efetivo fornecimento de medicamentos ou outras prestações de saúde integrados à política de saúde vigente e que não estejam sendo fornecidos ou, excepcionalmente, quando o SUS não fornece tratamento eficaz, não oferece qualquer tratamento ou, ainda, quando, especialmente quando se trata de aumento de sobrevida ou de qualidade de vida, quando o medicamento apresenta eficácia diversa da opção indicada pelo SUS, sendo, de qualquer sorte, de se buscar observar as diretrizes da CONITEC, nos termos do art. 19-Q da Lei nº 8.080/90, naquilo que se revele adequado.

Observo, ainda, que a CONITEC, além de expedir Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas (PCDT) apresenta, no caso dos tratamentos oncológicos, as Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas (DDT), fundamentadas em evidências científicas, que nos termos do próprio site (http://conitec.gov.br/index.php/protocolos-e-diretrizes), constituem documento que não se restringe às tecnologias incorporadas no SUS, mas sim, ao que pode ser oferecido a este paciente, considerando o financiamento repassado aos centros de atenção e a autonomia destes na escolha da melhor opção para cada situação clínica.

Deste modo, é lastreado nas referidas diretrizes que o tratamento oncológico pelo SUS, em que os medicamentos são fornecidos pelos estabelecimentos de saúde credenciados pelo SUS, habilitados em oncologia, na qualidade de UNACON (Unidade de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia) e CACON (Centro de Assistência de Alta Complexidade em Oncologia), aos quais cabe prestar assistência especializada e integral ao paciente.

Assentados tais pontos, passo a analisar o caso concreto.

No caso dos autos, a autora apresenta indicação do médico assistente para a dispensação do fármaco Bortezomibe para o tratamento de Mieloma Múltiplo, CID C 90 (evento 1, LAUDO6, originário) e o lastro em nota técnica emitida pelo Telessaúde-RS favorável ao pleito (evento 14, PARECER1, originário).

O medicamento possui registro na ANVISA e previsão nas Diretrizes Diagnósticas e Terapêuticas do CONITEC, recomendando-o como primeira linha de tratamento associado à quimioterapia (Portaria nº 708, de 6, 08/2015), não tendo sido ainda emitido protocolo clínico de incorporação do fármaco ao SUS.

Assim consta da Portaria SAS nº 708, de 06/08/2015:

8.3.1 Quimioterapia de primeira linha

Os seguintes medicamentos possuem atividade clínica anti-mieloma e podem ser igualmente usados na poliquimioterapia de primeira linha em diferentes combinações: bortezomibe, ciclofosfamida, cisplatina, dexametasona, doxorrubicina, doxorrubicina lipossomal, etoposido, melfalano, vincristina e talidomida [92-119].

No ano de 2020 o medicamento foi incorporado ao SUS para o caso de pacientes que padecem de Mieloma Múltiplo previamente tratados (Portaria SCTIE/MS nº 44, de 25/09/2020), o que acabou por salientar a adequação e eficácia da medicação no caso em tela, estampando-se a imprescindibilidade da medicação.

Concluo que a maior probabilidade para o julgamento do caso era de procedência do pedido, pendendo a causalidade em desfavor da apelante. Neste sentido, a jurisprudência deste Tribunal:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. LEGITIMIDADE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. IMBRUTINIBE (IMBRUVICA®). INEXISTÊNCIA DE ALTERNATIVAS TERAPÊUTICAS. ESTUDOS CIENTÍFICOS PELA INDICAÇÃO. 1. A responsabilidade dos Entes Federados configura litisconsórcio passivo facultativo, podendo a ação em que se postula fornecimento de prestação na área da saúde ser proposta contra a União, Estado ou Município, individualmente ou de forma solidária, a critério da parte proponente, devendo, eventual acerto de contas em virtude do rateio estabelecido, ser realizado administrativamente ou em ação própria. 2. A Constituição Federal de 1988, após arrolar a saúde como direito social em seu artigo 6º, estabelece, no art. 196, que a saúde é "direito de todos e dever do Estado", além de instituir o "acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação". 3. Como se está a tratar de questão extremamente sensível, ligada ao próprio direito fundamental à vida, e tendo em vista que a Constituição estabeleceu, no inciso XXXV de seu art. 5º, que "a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito", o resultado é a atual judicialização da política de assistência farmacêutica através de demandas individuais e coletivas, devendo a interferência judicial dar-se de forma equilibrada a fim de não prejudicar um direito individual e, tão-pouco, inviabilizar o sistema de saúde pública. 4. Observando as premissas elencadas no julgado Suspensão de Tutela Antecipada n. 175 (decisão da Corte Especial no Agravo Regimental respectivo proferida em 17 de março de 2010, Relator o Ministro Gilmar Mendes), quando da avaliação de caso concreto, devem ser considerados, entre outros, os seguintes fatores: (a) a inexistência de tratamento/procedimento ou medicamento similar/genérico oferecido gratuitamente pelo SUS para a doença ou, no caso de existência, sua utilização sem êxito pelo postulante ou sua inadequação devido a peculiaridades do paciente; (b) a adequação e a necessidade do tratamento ou do medicamento pleiteado para a doença que acomete o paciente; (c) a aprovação do medicamento pela ANVISA (só podendo ser relevado em situações muito excepcionais, segundo disposto nas Leis n.º 6.360/76 e 9.782/99) e (d) a não configuração de tratamento experimental. 5. Faz jus ao fornecimento do medicamento pelo Poder Público a parte que demonstra a respectiva imprescindibilidade, que consiste na conjugação da necessidade e adequação do fármaco e da ausência de alternativa terapêutica. 6. Tendo em vista o esgotamento da política do SUS, bem como a existência de comprovação da eficácia terapêutica do fármaco requerido para o tratamento da doença que acomete a paciente, é de ser judicialmente deferida a dispensação do fármaco requerido. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000705-30.2016.4.04.7007, 3ª Turma , Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, POR MAIORIA, JUNTADO AOS AUTOS EM 12/04/2018)

Honorários Advocatícios

Tratando-se de sentença publicada já na vigência do novo Código de Processo Civil, aplicável o disposto em seu art. 85 quanto à fixação da verba honorária.

Não tendo havido impugnação quanto ao valor fixado, resta mantida a sentença no ponto.

Impugnou a União a fixação de honorários advocatícios em favor de pessoa representada pela Defensoria Pública da União - DPU, sob o argumento de que há confusão patrimonial entre entes que fazem parte da mesma Fazenda Pública, a justificar seja afastada a condenação da União.

Alterando o posicionamento que até então adotei no tratamento da matéria, considero que a questão possui orientação desfavorável ao pleito da União no âmbito do Superior Tribunal Federal - STF, sendo, todavia, melhor servido o processo pela apreciação uniforme da questão a ser efetivada nos autos do RE 1140005/RJ, em que reconhecida a repercussão geral da matéria (Tema nº 1002).

Assim, mantenho a condenação vertida em desfavor da União, suspendendo sua exigibilidade até o julgamento do Tema 1.002 do STF.

Neste sentido:

PREVIDENCIÁRIO. DECADÊNCIA E PRESCRIÇÃO. REVISÃO ADMINISTRATIVA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. IDOSO. ASPECTO SOCIOECONÔMICO. IRREGULARIDADES NÃO VERIFICADAS. RESTABELECIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FIXAÇÃO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS EM FAVOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. RECONHECIDA A REPERCUSSÃO GERAL PELO STF NO RE 114005/RG. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar em 16-10-2013 o recurso extraordinário 626.489-SE sob o regime da repercussão geral, decidiu que "não há prazo decadencial para a formulação do requerimento inicial de concessão de benefício previdenciário, que corresponde ao exercício de um direito fundamental relacionado à mínima segurança social do indivíduo;". 2. Em matéria previdenciária e assistencial, consoante remansosa e antiga jurisprudência, não há prescrição do fundo de direito; apelas as parcelas vencidas são prescritíveis, a teor da Súmula 85 do STJ e do parágrafo único do artigo 103 da Lei 8.213/91. 3. É devido o benefício de prestação continuada à pessoa com deficiência e ao idoso que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família. 4. Constatado que a revisão administrativa que ensejou a cancelamento do benefício assistencial embasou-se majoritariamente em análise econômica de outro grupo familiar, em evidente erro administrativo, não subsistem os motivos que geraram o débito junto à Autarquia Previdenciária, devendo ser declarada a inexigibilidade dos valores apurados. 5. O valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima, como o valor auferido a título de benefício assistencial em razão de deficiência ou previdenciário por incapacidade, independentemente de idade, devem ser excluídos do cálculo da renda familiar per capita. 6. Diante da inexistência de superação da condição de vulnerabilidade social, e considerando que a única renda familiar recebida é proveniente de benefício assistencial à filha da autora, na condição de portadora de deficiência, deve ser restabelecido o benefício, pois evidenciada a situação de risco social. 7. Preenchidos os requisitos legais, é devido o restabelecimento do benefício assistencial desde a cessação de seu pagamento, respeitada a prescrição quinquenal. 6. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, sem modulação de efeitos. 7. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E. 8. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29/06/2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o percentual aplicado à caderneta de poupança. 9. Após as Emendas Constitucionais n.ºs 45/2004, 74/2013 e 80/2014, houve mudança da legislação correlata à Defensoria Pública da União, permitindo a condenação da União ao pagamento de honorários advocatícios em demandas patrocinadas por aquela instituição de âmbito federal, diante de sua autonomia funcional, administrativa e orçamentária (STF, Ação Rescisória n.º 1937). Contudo, tendo o STF reconhecido repercussão geral ao tema, sinalizando para a possibilidade de haver mudança no entendimento, deve ser suspensa a execução da condenação da União no pagamento de honorários à Defensoria Pública, até julgamento do RE 114005/RG. (TRF4, AC 5001559-22.2019.4.04.7103, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 09/12/2021)

DIREITO À SAÚDE. AGRAVO INTERNO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. 1. São devidos honorários em favor da Defensoria Pública da União (DPU) mesmo quanto litiga em face da União (STF, AR 1937 AgR, Relator Min. Gilmar Mendes, Tribunal Pleno, julgado em 30/06/2017). 2. Como a questão será decidida de modo uniforme em repercussão geral, determina-se a suspensão da exigibilidade dos valores até que o tema seja definitivamente resolvido pelo Supremo Tribunal Federal. (TRF4 5001667-96.2020.4.04.7109, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 11/11/2021)

Por fim, deixo de aplicar a majoração de que trata o §11 do art. 85 do CPC, uma vez que o recurso da União foi acolhido em parte.

Conclusão

Reconhecer a perda do objeto da demanda quanto à questão de fundo (fornecimento da medicação).

Dar parcial provimento à apelação da União para suspender a exigibilidade da condenação até o julgamento do Tema 1002 do STF.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por reconhecer a perda do objeto da demanda e dar parcial provimento à apelação da União.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003069990v10 e do código CRC 48355456.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 4/4/2022, às 16:22:27


5002522-62.2021.4.04.7102
40003069990.V10


Conferência de autenticidade emitida em 13/04/2022 04:01:16.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5002522-62.2021.4.04.7102/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: ARI FLORES (AUTOR)

ADVOGADO: MARCOS MAZZOTTI (DPU)

INTERESSADO: ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RÉU)

EMENTA

DIREITO DA SAÚDE. MEDICAMENTO. bortezomibe. mieloma múltiplo. PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO. ÓBITO. DIREITO PERSONALÍSSIMO. CAUSALIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO. TEMA 1.002 DP STF.

1. O direito à saúde é direito personalissimo da parte insucetível de sucessão. Deste modo, com o óbito do autor ocorre a perda superveniente do objeto da demanda. 2. Constatada a perda superveniente do objeto da demanda cabe, na fixação da verba sucumbencial, observar o princípio da causalidade cabendo a que deu causa ao ajuizamento da ação, suportar os ônus da sucumbência. 5. São devidos honorários advocatícios pela União à Defensoria Pública da União - DPU. Diante da repercussão geral da questão relativa aos honorários advocatícios, resta suspensa a exigibilidade da condenação até o julgamento do Tema 1.002 do STF.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, reconhecer a perda do objeto da demanda e dar parcial provimento à apelação da União, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 29 de março de 2022.



Documento eletrônico assinado por FRANCISCO DONIZETE GOMES, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003069991v3 e do código CRC c2366dbf.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): FRANCISCO DONIZETE GOMES
Data e Hora: 5/4/2022, às 14:39:11


5002522-62.2021.4.04.7102
40003069991 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 13/04/2022 04:01:16.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 22/03/2022 A 29/03/2022

Apelação Cível Nº 5002522-62.2021.4.04.7102/RS

RELATOR: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): VITOR HUGO GOMES DA CUNHA

APELANTE: UNIÃO - ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO (RÉU)

APELADO: ARI FLORES (AUTOR)

ADVOGADO: MARCOS MAZZOTTI (DPU)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 22/03/2022, às 00:00, a 29/03/2022, às 16:00, na sequência 338, disponibilizada no DE de 11/03/2022.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, RECONHECER A PERDA DO OBJETO DA DEMANDA E DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA UNIÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 13/04/2022 04:01:16.

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