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DIREITO DA SEGURIDADE SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RETROATIVIDADE DO TERMO INICIAL À DATA REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. EXCLUSÃO DE RENDIM...

Data da publicação: 23/03/2023, 07:01:40

EMENTA: DIREITO DA SEGURIDADE SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RETROATIVIDADE DO TERMO INICIAL À DATA REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. POSSIBILIDADE. EXCLUSÃO DE RENDIMENTO PREVIDENCIÁRIO DE VALOR MÍNIMO. No cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Sendo assim, na hipótese dos autos, é devido o BPC desde a DER. (TRF4, AC 5008862-27.2022.4.04.9999, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 15/03/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5008862-27.2022.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: EVA DE FATIMA GONZAGA BITENCOURTT

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação interposta pela parte autora em face da sentença, publicada em 23-05-2022 (e. 34.1), que julgou improcedente o pedido de benefício assistencial devido à pessoa com deficiência:

Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, julgo procedente o pedido formulado para o fim de:

a) DECLARAR o direito da requerente ao recebimento do benefício de prestação continuada de natureza assistencial, no valor mensal de 1 (um) salário-mínimo, com DIB (data de início do benefício) a contar de 26.11.2021 (reafirmação da DER).

b) CONDENAR a parte ré a quitar, de uma só vez, as parcelas vencidas a partir da data indicada no item anterior.

c) Tratando-se de relação jurídica não-tributária, os juros de mora incidem desde a citação calculados com base no índice oficial de juros aplicados à caderneta de poupança, na forma do art. 1º-F da Lei n. 9.497/97, com a redação dada pela Lei n. 11.960/2009. A correção monetária, por sua vez, incidirá a partir do vencimento de cada parcela em atraso pelo índice IPCA-E (RE 870947 - Tema 810)

A plantação do benefício deverá ocorrer, independentemente do trânsito em julgado, no prazo máximo de 45 dias da intimação do procurador federal ou da agência executiva do INSS, o que ocorrer primeiro, sob pena de multa diária de R$ 100,00, limitada à R$ 10.000,00.

Condeno o réu ao pagamento de honorários advocatícios, os quais, nos termos dos 85, §3º, inciso I, do CPC, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data desta sentença (STJ, Súmula n. 111).

Isento o réu do pagamento das custas (LC n. 156/1997, art. 33, §1).

Sustenta, em síntese, que o benefício é devido desde DER (06-03-2018), pois a vulnerabilidade social já estava presente desde então (e.39.1).

Com as contrarrazões, subiram os autos.

A Procuradoria Regional da República da 4ª Região opinou pelo provimento do recurso (e. 51.1).

É o relatório.

VOTO

A controvérsia recursal cinge-se à retroatividade do termo inicial fixado na sentença nestes termos:

b. Do risco social.

Quanto à indicação de risco social, nota-se que foi esse o motivo invocado na via administrativa para o indeferimento da pretensão (e. 1-8, pág. 36), porquanto, segundo o INSS, a renda mensal per capita superava 1/4 do salário-mínimo (art. 20, § 3º, da Lei 8.742).

Conforme antes já exposto, a jurisprudência, há muito, já pacificou que o referido critério não é absoluto, devendo o INSS levar em conta os particulares do caso concreto, inclusive nesse sentido é a expresso o § 11 do art. 20 da Lei 8.742, introduzido pela Lei 13.146/2015 (que nada mais fez do que incorporar o entendimento jurisprudencial cristalizado).

Na hipótese, com base nos documentos anexados na via administrativa, observa-se que o grupo familiar era composto por duas pessoas (dados do CadÚnico atualizado até 1.12.2017): a requerente e seu companheiro, Pedro Rodrigues.

A renda do grupo familiar, no importe de um salário-mínimo, provinha do benefício assistencial auferido pelo companheiro da requerente.

Tal benefício auferido pelo companheiro (salário-mínimo) resulta, portanto, em uma renda familiar de ½ salário-mínimo, que é deveras baixo, mas não indica situação de (absoluto) de miserabilidade, conforme já assinalado, que somente é presumida quando se está diante de renda familiar igual ou inferior à 1/4 do salário mínimo.

Calha ressaltar que à época do requerente administrativo (2018), intentando perante a APS de Pato Branco (certamente porque residia à época no Paraná - e. 1-8, pág. 233) o companheiro da requerente contava com 62 anos de idade, eis que nascido em 30.8.1956 (e. 1-8, pág. 8), e, assim, não seria viável excluir do cálculo da renda familiar o referido benefício de prestação continuada, vez que somente é aplicável, por analogia, ao art. 34 do estado do Idoso1 a pessoas com mais de 65 anos de idade, condição esta que somente se configurou em 30.8.2021.

Nesse sentido, isto é, sobre a viabilidade de se excluir o benefício de prestação continuada, no valor do salário-mínimo, do cálculo da renda familiar auferida por idosos com, pelo menos, 65 anos de idade, também é a posição da jurisprudência:

(...). No cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima. 7.(...) (TRF4, AC 5023175-27.2021.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relatora CLÁUDIA CRISTINA CRISTOFANI, juntado aos autos em 23/03/2022)

Assim, agiu bem o INSS ao emitir carta de exigência, para complementação das informações, inclusive para que a requerente se submetesse a estudo social administrativo, a fim de que fosse analisada eventual condição de miserabilidade, a qual, por se estar diante de renda superior à ¼ do salário-mínimo nacional, demandaria prova de risco social acentuado.

Ocorre que a parte requerente não atendeu aos chamados do INSS, no que ensejou no indeferimento do benefício:

“ressalta-se que emitimos carta de exigência para comprovação das despesas, porém tal solicitação não foi atendida. Ressalta-se que não há ciência na carta de exigências, pois a requerente não informou telefone para contato, realizamos diversas tentativas de contato com a assistente social, porém não houve sucesso.” (e. 1-7, pág. 2)

Os próprios causídicos que assistem a requerente indicaram textualmente na réplica também possuírem severas dificuldades em manter contato com a requerente e seu companheiro, ambos com algum grau de dificuldade de comunicação e compreensão.

Na presente via Judicial, por ocasião da propositura da ação, tampouco a requerente apresentou qualquer prova da condição de hipossuficiência junto, a exemplo de custos com medicamentos não padronizados na rede pública, alimentação especial, faldas etc., limitando-se a colacionar, para além de cópias do processo administrativo, histórico de atendimento médico realizado pelo SUS, que apenas dá conta da condição de pessoa com deficiência, tópico este que, como dito, sequer representa ponto controvertido.

Em verdade, apenas com o Estudo Social anexado no e. 20 se pôde constatar, estreme de dúvidas, a condição de extrema vulnerabilidade social do grupo social ao qual pertence a parte requerente, senão vejamos:

Durante a visita domiciliar e a entrevista neste núcleo familiar, verificado que Eva e seu companheiro Pedro enfrentam muitas dificuldades socioeconômicas, como a falta de acesso a serviços essenciais (saneamento básico, saúde, energia elétrica, bens de consumo, sobretudo alimentos, e bens materiais necessários para a manutenção da vida em condições básicas. A restrição ao acesso, por sua vez, está ligada à renda individual de 01 (um) salário percebido por Pedro que está sendo insuficiente para atender as necessidades da família. ( Estudo Social)

Com efeito, não sendo hipótese de se presumir a condição de miserabilidade do grupo familiar, pois auferem renda per capita superior a 1/4 do salário-mínimo, a parte requerente somente faz jus a percepção do benefício em questão a contar de 26.11.2021, quando da juntada do Estudo Social.

IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.

Considerando a eficácia mandamental dos provimentos que impõem obrigações de fazer (art. 497, caput, do CPC), e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, deve-se cumprir imediatamente a condenação no que diz respeito à implantação do benefício, observado o cálculo do melhor benefício, no prazo de 45 dias contados da comunicação via Eproc ao Procurador Federal ou à Gerência Executiva /APS do INSS, sob pena de multa.

Destaca-se, desde já, que a eventual frustração na intimação direta da gerência executiva do INSS não serve de pretexto para retardar a implantação do benefício, tampouco impõe qualquer óbice para a imposição de multa.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, nos termos do art. 487, inciso I, do CPC, julgo procedente o pedido formulado para o fim de:

a) DECLARAR o direito da requerente ao recebimento do benefício de prestação continuada de natureza assistencial, no valor mensal de 1 (um) salário-mínimo, com DIB (data de início do benefício) a contar de 26.11.2021 (reafirmação da DER).

Examinando os autos, entendo que assiste razão à recorrente, porquanto pacificada a jurisprudência de que o rendimento de valor mínimo deve ser excluído do cálculo da renda familiar para viabilizar a concessão de BPC, como verificado na espécie.

Nesse sentido, opinou a Procuradoria Regional da República da 4ª Região, verbis:

[...] Importa ressaltar, todavia, que o magistrado não considerou os ditames da Lei nº 13.982/20, que introduziu o § 14º no art. 20 da Lei nº 8.742/93, o qual estabelece que o benefício percebido pelo deficiente não deva ser computado para fins de apreciação da renda familiar, limitando-se a raciocinar apenas quanto ao requisito etário (65 anos de idade) do companheiro da recorrente, o qual, da mesma forma, autoriza a exclusão do cômputo da sua renda ao respectivo núcleo familiar, verbis:

Art. 20. O benefício de prestação continuada é a garantia de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011) (Vide Lei nº 13.985, de 2020.

[..]

§ 14. O benefício de prestação continuada ou o benefício previdenciário no valor de até 1 (um) salário-mínimo concedido a idoso acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade ou pessoa com deficiência não será computado, para fins de concessão do benefício de prestação continuada a outro idoso ou pessoa com deficiência da mesma família, no cálculo da renda a que se refere o § 3º deste artigo. (original sem grifos)

Infere-se dos autos (evento 1 - PROCADM8, fl. 31), que além de a autora ter comprovado os requisitos para que lhe fosse concedido o beneficio de prestação continuada, dentre eles ser portadora de deficiência, da mesma forma o seu companheiro é deficiente, sendo portanto aplicável a ele os termos do § 14 do art. 20 da Lei nº 8.742/93.

No ponto, o entendimento jurisprudencial vai ao encontro dos ditames da Súmula 22 da Turma de Uniformização dos Juizados Especiais Federais, DJ de 07/10/2004, no sentido de considerar que, “se a prova pericial realizada em juízo dá conta de que a incapacidade já existia na data do requerimento administrativo, esta é o termo inicial do benefício assistencial”.

[...]

Impõe-se considerar, assim, que o grupo familiar é composto por dois deficientes, a autora e seu companheiro, cujo BPC no valor de um salário-mínimo deveria ter sido excluído do cálculo da renda per capita, de maneira que a renda do grupo familiar torna-se nula, o que evidencia a satisfação do requisito econômico à concessão do benefício assistencial (art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93) à data do requerimento administrativo e justifica, por conseguinte, a reforma da sentença recorrida, que condenou o INSS à concessão do benefício assistencial postulado apenas a partir de 26/11/2021 (reafirmação da DER). Portanto, imperativo o provimento recursal para que o benefício assistencial de prestação continuada, em favor da recorrida, seja concedido a partir da data do requerimento administrativo (DER), em 28/03/2018.

Com efeito, no que diz respeito ao requisito econômico, seria paradoxal que o Judiciário, apesar de ter reconhecido a inconstitucionalidade do critério econômico de acessibilidade ao BPC (renda familiar per capita igual ou inferior a ¼ do salário mínimo), enquanto aqui se discute a renda mínima de cidadania universalizada (Projeto de Lei 4856/19), a exemplo de outros países e estados, como Itália, Quênia, Finlândia, Barcelona, Canadá (Ontário), Califórnia (Stockton), Escócia, Holanda, Reino Unido, Índia e outros, que já colocaram em funcionamento ou estão preparando programas-piloto de renda básica universalizada, para enfrentar o grave problema das desigualdades econômicas decorrentes do modelo capitalista, persista medindo com régua milimétrica a insuficiência de recursos familiares das pessoas que, além de estarem em situação de vulnerabilidade, sofrem com as barreiras naturais e as que a sociedade lhes impõe, em razão da idade avançada ou da deficiência.

Não foi em vão que o Tribunal da Cidadania, em precedente prolatado no REsp nº 1.112.557/MG, pela 3ª Seção, sendo Relator o Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, publicado em 20/11/09, processado como representativo de controvérsia, nos termos do art. 543-C, do CPC, assentou a relativa validade do critério legal, tornando vinculante a necessidade de exame mais compreensivo para a análise judicial da hipossuficiência econômica:

“RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA, QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.

2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.

3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).

4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana, especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e economicamente vulnerável.

5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo.

6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art. 131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.

7. Recurso Especial provido (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).

Com efeito, no que diz respeito ao requisito econômico, cabe ressaltar o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, em 18-04-2013, a Reclamação nº 4374 e o Recurso Extraordinário nº 567985, este com repercussão geral, reconheceu e declarou, incidenter tantum, a inconstitucionalidade do parágrafo 3º do artigo 20 da Lei 8.742/93 (LOAS), por considerar que o critério ali previsto - ser a renda familiar mensal per capita inferior a um quarto do salário mínimo - está defasado para caracterizar a situação de vulnerabilidade, razão pela está consolidada a jurisprudência deste Tribunal (v.g. AC 5001745-37.2018.4.04.7214, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, de minha Relatoria, juntado aos autos em 13/12/2019; AC 5014437-21.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator Des. Federal CELSO KIPPER, juntado aos autos em 12/12/2019; AC 5020718-90.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator Des. Federal JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 06/11/2019; AC 5018881-97.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator Des. Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO, juntado aos autos em 04/02/2020; AC 5025288-22.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator Des. Federal MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 07/02/2020; AC 5001203-69.2019.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 17/10/2019; AC 5005447-10.2017.4.04.7122, QUINTA TURMA, Relator Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 26/08/2019).

Assim, forçoso reconhecer que as despesas com os cuidados necessários da parte autora (v.g. medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico) podem ser levadas em consideração na análise da condição de vulnerabilidade da família da parte demandante.

A propósito, a eventual percepção de recursos do Programa Bolsa Família, que, segundo consta no site do Ministério do Desenvolvimento Social e de Combate à Fome (http://www.mds.gov.br/bolsafamilia/), destina-se à "transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o País" e "tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70,00 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos", não só não impede a percepção do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui prova indiciária acima de qualquer dúvida razoável de que a unidade familiar se encontra em situação de grave risco social.

Registre-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do Recurso Extraordinário 580.963/PR, realizado em 17-04-2013, declarou, outrossim, a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família "não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS", baseado nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas com deficiência. Segundo o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.

Este TRF, aliás, já vinha julgando no sentido da desconsideração da interpretação restritiva do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso.

Assim, no cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Ressalto que tal pessoa, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerada na composição familiar, para efeito do cálculo da renda per capita. Diante disso, sobreveio a Portaria nº1.282, de 22 de março de 2021, do do INSS:

Art. 1º Estabelecer que não será computado para o cálculo da renda per capita familiar o benefício previdenciário de até um salário-mínimo ou o Benefício de Prestação Continuada (BPC/LOAS) concedido a idoso, acima de 65 (sessenta e cinco) anos de idade, ou a pessoa com deficiência, para a concessão do BPC/LOAS, diante do disposto no § 14 do art. 20 da Lei nº 8.742, 7 de dezembro de 1993, incluído pela Lei nº 13.982, de 2 de abril de 2020.

Conclusão quanto ao direito da parte autora no caso concreto

Dessarte, o exame do conjunto probatório demonstra que a parte autora possui condição de deficiência, necessitando de cuidados permanentes para sobreviver com dignidade. Portanto, deve ser reconhecido o direito ao benefício assistencial, desde 06-03-2018 (data do requerimento administrativo - e. 1.8 /fl. 04), impondo-se a parcial reforma da sentença.

Dos consectários

Segundo o entendimento das Turmas previdenciárias do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, estes são os critérios aplicáveis aos consectários:

Correção monetária

Em relação aos benefícios assistenciais, devem ser observados os seguintes critérios de correção monetária, porquanto não afetados pela decisão do STJ no Tema 905:

- INPC (de 04/2006 a 29/06/2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).

- IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme decisão do STF na 2ª tese do Tema 810 (RE 870.947), j. 20/09/2017, ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22-09-2017, com eficácia imediata nos processos pendentes, nos termos do artigo 1.035, § 11, do NCPC e acórdão publicado em 20-11-2017, cuja modulação foi rejeitada pela maioria do Plenário do STF por ocasião do julgamento dos embargos de declaração em 03-10-2017).

Juros moratórios

Os juros de mora incidirão à razão de 1% (um por cento) ao mês, a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29/06/2009.

A partir de 30/06/2009, incidirão segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei 9.494/97, cuja constitucionalidade foi reconhecida pelo STF ao julgar a 1ª tese do Tema 810 da repercussão geral (RE 870.947), julgado em 20/09/2017, com ata de julgamento publicada no DJe n. 216, de 22/09/2017.

SELIC

A partir de dezembro de 2021, a variação da SELIC passa a ser adotada no cálculo da atualização monetária e dos juros de mora, nos termos do art. 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021:

"Nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), acumulado mensalmente."

Honorários advocatícios recursais

Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do CPC, porquanto a sentença foi proferida após 18/03/2016 (data da vigência do CPC definida pelo Pleno do STJ em 02/04/2016).

Deixo de aplicar a regra do art. 85, §11, do CPC. Isso porque os honorários advocatícios recursais previstos pela nova sistemática do artigo 85, § 11 do Código de Processo Civil de 2015 decorrem não apenas do trabalho adicional posterior à sentença, mas, igualmente, da própria sucumbência da parte em seu pleito recursal. Com efeito, a majoração da verba honorária é estabelecida no intuito de desestimular a interposição de recurso manifestamente improcedente interposto pela parte sucumbente na ação.

Logo, no caso, não tendo havido recurso da parte sucumbente, o percentual da verba honorária deve ser mantida no patamar estipulado pelo juízo de origem, consoante precedente deste Colegiado:

PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. TERMO FINAL. HONORÁRIOS RECURSAIS. [...] 2. Não tendo havido recurso da parte sucumbente, incabível a majoração dos honorários advocatícios prevista no art. 85, §11, do CPC. (TRF4, AC 5026720-13.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 11/10/2019)

Custas Processuais

O INSS é isento do pagamento de custas (art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/96 e Lei Complementar Estadual nº 156/97, com a redação dada pelo art. 3º da LCE nº 729/2018).

Da antecipação de tutela

Pelos fundamentos anteriormente elencados, é de ser mantida a antecipação da tutela deferida pelo juízo de origem e renovada nesta instância (e. 59.1), uma vez presentes os requisitos da verossimilhança do direito e o risco de dano irreparável ou de difícil reparação, bem como o caráter alimentar do benefício, porquanto relacionado diretamente com a subsistência, propósito maior dos proventos pagos pela Previdência Social.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação da parte autora.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003712944v6 e do código CRC 45bf52e9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 15/3/2023, às 12:49:23


5008862-27.2022.4.04.9999
40003712944.V6


Conferência de autenticidade emitida em 23/03/2023 04:01:39.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5008862-27.2022.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

APELANTE: EVA DE FATIMA GONZAGA BITENCOURTT

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

direito da seguridade social. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. retroatividade do termo inicial à data requerimento administrativo. possibilidade. exclusão de rendimento previdenciário de valor mínimo.

No cálculo da renda familiar per capita, deve ser excluído o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (EIAC nº 0006398-38.2010.404.9999/PR, julgado em 04-11-2010), ou de benefício previdenciário de valor superior ao mínimo, até o limite de um salário mínimo, bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (EIAC N.º 2004.04.01.017568-9/PR, Terceira Seção, julgado em 02-07-2009. Sendo assim, na hipótese dos autos, é devido o BPC desde a DER.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 9ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Florianópolis, 14 de março de 2023.



Documento eletrônico assinado por PAULO AFONSO BRUM VAZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003712945v4 e do código CRC ffd0f785.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): PAULO AFONSO BRUM VAZ
Data e Hora: 15/3/2023, às 12:49:23


5008862-27.2022.4.04.9999
40003712945 .V4


Conferência de autenticidade emitida em 23/03/2023 04:01:39.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 07/03/2023 A 14/03/2023

Apelação Cível Nº 5008862-27.2022.4.04.9999/SC

RELATOR: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PROCURADOR(A): WALDIR ALVES

APELANTE: EVA DE FATIMA GONZAGA BITENCOURTT

ADVOGADO(A): PATRICIA FOLADOR (OAB SC023853)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 07/03/2023, às 00:00, a 14/03/2023, às 16:00, na sequência 444, disponibilizada no DE de 24/02/2023.

Certifico que a 9ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 9ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ

Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 23/03/2023 04:01:39.

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