APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5005389-94.2013.4.04.7009/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | JOSE ROZEVAL DA SILVA |
ADVOGADO | : | MARLY APARECIDA PEREIRA FAGUNDES |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL RECONHECIDA. RECONHECIMENTO JURÍDICO DO PEDIDO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME FAMILIAR. TEMPO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. AUXILIAR DE PRODUÇÃO. EPI. CONVERSÃO DE TEMPO ESPECIAL EM COMUM. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REVISÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
1. Transcorridos mais de 5 anos entre a data de início do benefício e a data do ajuizamento da ação, aplica-se a prescrição quinquenal.
2. Deve ser homologado o reconhecimento jurídico do pedido de contagem do tempo de serviço rural pelo INSS, em audiência.
3. Comprovado o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, com base em início de prova material acompanhada por prova testemunhal idônea, deve ser computado o tempo de serviço delimitado ao período para o qual há a conjugação do início de prova material à prova testemunhal, exceto para fins de carência na aposentadoria por tempo de contribuição.
4. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade da atividade laboral por ele exercida.
5. É admitida como especial a atividade em que o segurado ficou exposto a ruídos superiores a 80 decibéis até 5/3/1997, em que aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos 53.831/64 e 83.080/79; superiores a 90 decibéis no período de 6/3/1997 a 18/11/2003, de acordo com o Decreto 2.172/97, e, a partir de 19/11/2003 superiores a 85 decibéis, nos termos do Decreto 4.882/2003.
6. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades.
7. O segurado pode optar pela forma de cálculo mais vantajosa da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com o direito adquirido antes da EC 20/98 ou antes ou depois da Lei 9.876/99, para a revisão do benefício a partir da data de entrada do requerimento administrativo, observada a prescrição quinquenal das diferenças nas prestações vencidas.
8. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
9. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 497, caput, do novo Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da parte autora, negar provimento ao reexame necessário e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 14 de dezembro de 2016.
Ezio Teixeira
Relator
| Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8780048v2 e, se solicitado, do código CRC 233A6625. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Ezio Teixeira |
| Data e Hora: | 20/12/2016 13:39 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5005389-94.2013.4.04.7009/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | JOSE ROZEVAL DA SILVA |
ADVOGADO | : | MARLY APARECIDA PEREIRA FAGUNDES |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de reexame necessário e apelação interposta pelo INSS contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido com o seguinte dispositivo:
"Ante o exposto, com relação ao pedido de reconhecimento do exercício de atividade rural no período 01/01/1969 a 31/12/1969, homologo o reconhecimento manifestado pelo INSS, resolvendo o mérito, na forma do artigo 269, inciso II, do CPC. Quanto aos demais pedidos, julgo-os procedentes em parte, resolvendo o mérito, nos termos do artigo 269, inciso I, do Código de Processo Civil, para reconhecer o exercício de atividade rural pelo autor nos períodos de 01/01/1968 a 31/12/1968 e 01/01/1970 a 17/08/1972 e condenar o INSS a averbá-los independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias.
Em decorrência, condeno o INSS a revisar o benefício do autor mediante a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, em substituição à aposentadoria proporcional, e recálculo do fator previdenciário de acordo com a nova somatória de tempo de serviço, bem como a pagar os valores atrasados devidos desde a data de início do benefício, em 02/11/2007, ressalvadas as parcelas alcançadas pela prescrição quinquenal, que deverão ser atualizados pelos índices e na forma estipulada no Manual de Cálculos da Justiça Federal para os benefícios previdenciários.
Restam improcedentes, por outro lado, os pedidos de reconhecimento do exercício de atividade rural de 30/08/1961 a 31/12/1967 e de atividade especial no período de 24/05/2001 a 01/11/2007.
Em razão da sucumbência recíproca, deixo de condenar as partes no pagamento dos honorários advocatícios.
O INSS está isento de custas quando demandado na Justiça Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96), bem como a parte autora, por ser beneficiária de assistência judiciária gratuita (art. 3º, I e II, Lei nº 1.060/50).
Sentença sujeita ao reexame necessário (artigo 475, inciso I, do Código de Processo Civil).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se."
A parte autora, em seu recurso, busca a reforma da sentença para obter o reconhecimento do tempo de serviço rural em regime de economia familiar no período de 30/08/1961 a 31/12/1967, sob alegação de haver início de prova material e prova testemunhal que delimita especificamente o período de atividade. Também defende o reconhecimento da atividade especial de 24/05/2001 a 01/11/2007. Diz que houve cerceamento de defesa, pois as divergências sobre os níveis de ruído nos documentos apresentados deveriam ser esclarecidas por perícia técnica que não foi realizada. Alega que há prova da atividade especial, seja em laudo de empresa similar que deve ser utilizada como prova emprestada, seja em laudo da própria empresa. Defende a aplicação do Decreto 4.882/2003 retroativamente a 05/03/1997, para considerar o limite de tolerância de 85 dB(A) a partir dessa data. Também pediu fosse afastada a Lei 11.960/2009 na determinação dos critérios de correção monetária e juros moratórios.
O INSS apresentou contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O caso dos autos trata do pedido de revisão de aposentadoria por tempo de contribuição desde 02/11/2007 (DER), mediante a contagem de tempo de serviço rural em regime de economia familiar e de tempo de serviço especial convertido em tempo de serviço comum.
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
DA PRESCRIÇÃO QUINQUENAL
Quanto à prescrição, o parágrafo único do art. 103 da Lei 8.213/91 estabelece o prazo prescricional de 05 anos para as parcelas devidas pela Previdência Social, alcançando as diferenças apuradas antes do qüinqüênio precedente ao ajuizamento da causa. No entanto, o fundo de direito em questões previdenciárias é imprescritível, a teor do art. 103 da Lei 8.213/91, assim como também o era na época que a ela antecedeu. A interrupção da prescrição ocorre com a citação, mas retroage à data da propositura da ação (art. 240, § 1º, CPC/2015).
No caso dos autos, tendo em vista que a ação em debate foi protocolada no Juízo Federal em 19/06/2013, e o início do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição que a parte autora busca a revisão é de 02/11/2007, estão prescritas eventuais diferenças nas prestações vencidas antes de 19/06/2008.
RECONHECIMENTO JURÍDICO DO PEDIDO
Em audiência, o INSS claramente admite como devido o reconhecimento da atividade rural no período de 01/01/1969 a 31/12/1969.
Por isso, não há razões para alterar a sentença, no ponto em que acolheu o reconhecimento jurídico do pedido, com base na manifestação do INSS em audiência.
ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
Inicialmente, entende-se por "regime de economia familiar" nas palavras da Lei nº 8.213/91, através de seu art. 11, § 1°, "a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados".
No que concerne à prova do tempo de serviço exercido nesse tipo de atividade, deve-se observar a regra art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
Para a análise do início de prova material, filio-me aos seguintes entendimentos sumulados:
Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Súmula nº 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
Súmula nº 577 do STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Quanto à contagem do tempo de serviço rural em regime de economia familiar prestado por menor de 14 anos, entendo ser devida. Conforme o STJ, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (AR nº 3.629/RS, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 9/9/2008; EDcl no REsp nº 408.478/RS, Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 5/2/2007; AgRg no REsp nº 539.088/RS, Ministro Felix Fischer, DJ 14/6/2004). No mesmo sentido é a Sumula nº 05 da TNU dos JEF.
Esclareço ser possível a formação de início razoável de prova material sem a apresentação de notas fiscais de produtor rural em nome próprio. Com efeito, a efetiva comprovação da contribuição é flexibilizada pelo fato de o art. 30, inciso III, da Lei nº 8.212/91, atribuir a responsabilidade de recolher à empresa que participa da negociação dos produtos referidos nas notas fiscais de produtor, seja na condição de adquirente, consumidora, consignatária ou se trate de cooperativa. Nesse caso, a contribuição especificada não guarda relação direta com a prestação de serviço rural em família, motivo pelo qual se pode reconhecer o tempo de serviço rural, ainda que ausentes notas fiscais de produtor rural como início de prova material.
A existência de início de prova material, todavia, não é garantia de obtenção do tempo de serviço postulado. A prova testemunhal é de curial importância para que se confirme a atividade e seu respectivo lapso temporal, complementando os demais elementos probatórios.
No que respeita à não exigência de contribuições para a averbação do tempo de serviço do segurado especial, a questão deve ser analisada sob o prisma constitucional, eis que em seu texto foi prevista a unificação da Previdência Social, outorgando a qualidade de segurado do RGPS aos trabalhadores rurais.
Obedecendo a tais mandamentos, o § 2º, do art. 55, da Lei nº 8.213/91 previu a possibilidade de que o tempo de serviço rural dos segurados especiais fosse computado independentemente do recolhimento de contribuições ou indenização:
"O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência conforme dispuser o Regulamento."
Tal entendimento foi esposado pelo Supremo Tribunal Federal na decisão liminar da ADIN 1664-4-DF. Assim, desde que devidamente comprovado, o tempo de serviço que o segurado trabalhou em atividade rural poderá ser utilizado para fins de qualquer aposentadoria por tempo de serviço independentemente de contribuições.
Também devem ser observados os precedentes vinculantes, conforme estipula o art. 927 do CPC/2015. Do STJ, temos as seguintes teses firmadas:
Tema 644 - Concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição a trabalhador urbano mediante o cômputo de atividade rural
"Não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência, eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL). (REsp 1352791/SP)
Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria"
"o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)
Temas 532, 533 - Repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei 8.213/1991
"3.O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana." (REsp 1304479/SP)
No caso dos autos, verifico que a sentença conferiu a adequada análise ao conjunto probatório, que ampara o reconhecimento do tempo de serviço rural em regime de economia familiar somente nos períodos de 01/01/1968 a 31/12/1968 e 01/01/1970 a 17/08/1972, motivo pelo qual cito a fundamentação da sentença como razões de decidir:
"No caso dos autos, visando atender aos reclames de prova material foram apresentados os seguintes documentos:
a)1968 - certificado de dispensa de incorporação do autor, constando a profissão como lavrador;
b)1982 - registro de propriedade rural em nome do pai do autor, qualificado como lavrador.
Quanto à prova oral, consiste em depoimentos colhidos Juízo por ocasião da audiência de instrução.
Em seu depoimento pessoal o autor disse que foi nascido e criado na lavoura, seu pai tinha um terreno em Cerradinho, município de Tibagi; que plantavam feijão, milho, arroz para o gasto; que viviam disso; que vendiam a produção em Tibagi; que eram em três irmãos; que o depoente ajudava o pai diariamente; que começou a ajudar o pai com 8 anos de idade, já carpir; que a partir dos 16 anos já começou a estudar, ia para a escola a pé, a 10 km; que ajudava o pai na lavoura depois das aulas, pela tarde; que saiu da lavoura em 21/08/1971, quando foi para a Florestal, onde fazia tudo quanto é tipo de serviço, inclusive combate de formigas; que até então tinha trabalhado apenas com o pai na lavoura; que trocava dia de serviço com os vizinhos; que saiu com 21 anos da lavoura, e não voltou mais; que sua família ficou no meio rural.
A testemunha José Leodair Barbosa disse que tinha 15 a 16 anos quando o depoente foi morar perto do sítio da família do autor; que o autor era um pouco mais novo; que o sítio do pai dele ficava no Cerradinho; que o autor trabalhava na lavoura com o pai e irmãos, era 4 ou 5; que trocava dia de serviço com a família dele; que eles plantavam milho e feijão; que eles não tinham empregados; que o terreno era o suficiente para manter o sustento deles; que o depoente morou lá por uns 4 anos; que quando o depoente saiu o autor ainda continuou com a família lá; que o trabalho na lavoura era diário; que eles não tinham empregado.
A testemunha Valdenir Pinto Ribeiro disse que conheceu o autor quanto tinha cerca de 17 anos de idade, no sítio, na localidade de Cerradinho, em Tibagi-PR; que trocava dia de serviço com a família do autor; que eles não tinham empregados; que o pai dele era lavrador apenas; que eles plantavam milho e feijão; que tem uns 30 anos que o depoente mora em Telêmaco Borba, tinha 31 anos de idade quando deixou o meio rural; que o autor saiu antes para trabalhar em Telêmaco, na Florestal, tinha mais de 20 anos quando isso aconteceu; que o autor estudava, estudou junto com o autor.
Na análise do conjunto probatório, destaca-se, primeiramente, a uniformidade dos depoimentos, que são bastante convincentes quanto ao efetivo labor rural pelo autor desde a infância.
As duas testemunhas apresentadas confirmam a versão do autor de que ele morava com a família na zona rural de Cerradinho, onde seus pais tinham terras.
As testemunhas confirmam também que não havia empregados e que o grupo sobrevivia apenas da lavoura que desenvolvia. As duas testemunhas mencionaram que chegaram a trocar dia de serviço com a família do autor.
Quanto aos documentos apresentados, verifica-se que o indício mais antigo de exercício de atividade rural pelo autor consiste no certificado de dispensa de incorporação que o qualifica como agricultor em 1968.
Diante disso, tenho que somente é possível o reconhecimento do exercício de atividade rural a partir do ano de 1968, com base no certificado de dispensa de incorporação.
Para os anos anteriores, no entanto, não há início de prova material que indique o exercício de atividade rural. Saliento que não se está a exigir evidências em nome do segurado, o que não seria razoável uma vez que na época possuía tenra idade. Em verdade, a exigência de início de prova material poderia ser suficientemente atendida por documentos que demonstrassem a vocação rurícola de seus pais e irmãos, o que não foi apresentado no presente caso.
Poderia ser questionado o atendimento da exigência de início de prova material pelo documento expedido no ano de 1968, de modo a retroagir seus efeitos aos anos anteriores. Todavia, entendo que essa retroação não é possível, pois o termo inicial do período a ser reconhecido deve ser demarcado por prova material contemporânea, ainda que em nome do grupo familiar. As provas materiais se prestam justamente a essa finalidade, conferir segurança ao reconhecimento de tempo de serviço, por mais convictas que sejam as testemunhas ouvidas, visando resguardar o sistema previdenciário de fraudes. Não havendo um indicativo de vocação rurícola da família, o reconhecimento de tempo de serviço do menor, apenas com base nas declarações das testemunhas - sem evidências contemporâneas - implicaria em evidente violação ao artigo 55, § 3º da Lei de Benefícios.
Deste modo, considero que a parte autora somente apresentou início de prova material que permita o reconhecimento do exercício de atividade rural a partir do ano de 1968.
A continuidade do labor rural pode ser estendida com base nos depoimentos que apontam não ter o autor se afastado do meio rural até seu primeiro vínculo de emprego, registrado a partir de 18/08/1972 com a empresa Rural Agric. Tibagi Ltda. Esse entendimento está de acordo com pacífica jurisprudência, segundo a qual a 'presunção de continuidade do trabalho rural permite que, com base em testemunhas, inexistente prova em sentido contrário, sejam ampliados os efeitos probantes dos documentos existentes no feito.' (TRU da 4ª Região, IUJEF 0004708-41.2008.404.7251/SC, julgado em 21/06/2012).
Reforço que o exercício de atividade rural pelo autor no período de 01/01/1969 a 31/12/1969 já foi reconhecido pelo INSS em audiência
Assim, considerando a existência de início de prova material e prova testemunhal consonante, reconheço o exercício de atividade rural pelo autor, em regime de economia familiar, apenas nos períodos de 01/01/1968 a 31/12/1968 e 01/01/1970 a 17/08/1972, que deverão ser averbados pelo INSS como tempo de serviço independentemente do recolhimento de contribuições previdenciárias, nos termos do artigo 55, § 2º da Lei de Benefícios."
A tese recursal da parte autora não merece prosperar. Embora a prova testemunhal idônea permita estender a delimitação do período de atividade rural para épocas anteriores aos anos a que se refere o início de prova material, essa extensão deve ser feita com parcimônia e razoabilidade, de modo que se possa ter um mínimo de proximidade das datas dos documentos utilizados como início de prova material e os períodos de atividade rural que se pretende delimitar.
No caso dos autos, as testemunhas afirmaram que conheceram o autor, aproximadamente, nos anos de 1960 ou 1961, conforme pode ser extraído das idades que as testemunhas afirmaram ter, quando conheceram o autor na localidade de Cerradinho. Ocorre que o documento relativo à propriedade rural do pai do autor indica que o estado do Paraná fez a cessão da área de terras em 1978, conforme consta no registro de propriedade de 1982, não havendo vestígios documentais da propriedade rural antes de 1978.
Por sua vez, o documento mais antigo apresentado pelo autor é o certificado de dispensa de incorporação, do ano de 1968, quando afirmou a profissão de lavrador. Esse documento atesta uma situação existente no momento da sua confecção e é muito distante do ano de 1961, em relação ao qual a parte autora pretende o reconhecimento da atividade rural.
Então, no caso dos autos, entendo não ser possível estender o início de prova material por 5 anos, com base na prova testemunhal, motivo pelo qual mantenho o reconhecimento da atividade rural aos períodos delimitados em sentença.
ATIVIDADE ESPECIAL
O reconhecimento da atividade especial em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado deve observar a legislação vigente à época do desempenho da atividade, com base na qual passa a compor o patrimônio jurídico previdenciário do segurado, como direito adquirido. Significa que a comprovação das condições adversas de trabalho deve observar os parâmetros vigentes na época de prestação, não sendo aplicável retroativamente legislação nova que estabeleça restrições à análise do tempo de serviço especial.
Esse é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial repetitivo 1.115.363/MG, precedente de observância obrigatória, de acordo com o art. 927 do CPC/2015. Ademais, essa orientação é regra expressa no art. 70, § 1º, do Decreto 3.048/99, na redação dada pelo Decreto 4.827/2003.
A partir dessas premissas, associadas à sucessão de leis no tratamento da matéria, é necessário definir qual a legislação em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Nesse prisma, a análise do tema deve observar a seguinte evolução legislativa:
1) Até 28/04/1995, com base na Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original, havia presunção legal da atividade especial, de acordo com o enquadramento por ocupações ou grupos profissionais (ex.: médico, engenheiro, motorista, pintores, soldadores, bombeiros e guardas), ou por agentes nocivos químicos, físicos ou biológicos, demonstrado o desempenho da atividade ou da exposição a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor, para os quais é necessária a mensuração dos níveis de exposição por perícia técnica ou formulário emitido pela empresa;
2) A partir de 29/04/1995, não subsiste a presunção legal de enquadramento por categoria profissional, excepcionadas aquelas referidas na Lei 5.527/68, cujo enquadramento por categoria pode ser feito até 13/10/1996, dia anterior à MP 1.523, que revogou expressamente a Lei 5.527/68. No período compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, diante das alterações que a Lei 9.032/95 realizou no art. 57 da Lei 8.213/91, o enquadramento da atividade especial depende da efetiva exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, sendo suficiente a apresentação de formulário padrão do INSS preenchido pela empresa (SB-40, DSS-8030), sem a exigência de embasamento em laudo técnico, exceto quanto aos agentes nocivos ruído, frio e calor, que dependem da mensuração conforme visto acima;
3) A partir de 06/03/1997, o enquadramento da atividade especial passou a depender da demonstração da efetiva exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, através de formulário padrão (DSS-8030, PPP) baseado em laudo técnico da empresa ou perícia técnica judicial demonstrando as atividades em condições especiais de modo: permanente, não ocasional, nem intermitente, por força da Lei nº 9.528/97, que convalidou a MP nº 1.523/96, modificando o artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91. O Decreto nº 2.172/97 é aplicável de 06/03/1997 a 05/05/1999, sendo substituído pelo Decreto nº 3.048/99, desde 06/05/1999.
4) A partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para análise da atividade especial postulada (art. 148 da IN 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Esse documento substitui os antigos formulário e exime a apresentação de laudo técnico em juízo, desde que adequadamente preenchido, com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica.
O enquadramento das categorias profissionais deve observar os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79 somente até 28/04/1995. A partir dessa data, a Lei 9.032/95 extinguiu o reconhecimento da atividade especial por presunção legal, exceto para as profissões previstas na Lei 5.527/68, que permaneceram até 13/10/1996, por força da MP 1.523.
O enquadramento dos agentes nocivos, por sua vez, deve seguir os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79, até 05/03/1997, e os Decretos 2.172/97 e 3.048/99, a partir de 06/03/1997, com incidência do Decreto 4.882/2003, quanto ao agente nocivo ruído. Ainda, tais hipóteses de enquadramento não afastam a possibilidade de reconhecimento da atividade especial no caso concreto, por meio de perícia técnica, ainda que não prevista a atividade nos Decretos referidos. Esse entendimento encontra amparo na Súmula 198 do TFR, segundo a qual "atendidos os demais requisitos, é devida aposentadoria especial, se a perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento".
Para fins de reconhecimento da atividade especial, a caracterização da habitualidade e permanência, nos termos do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não exige que a exposição ocorra durante toda a jornada de trabalho. É suficiente para sua caracterização o contato cujo grau de nocividade ou prejudicialidade à saúde ou integridade física fique evidenciado pelas condições em que desenvolvida a atividade.
É perfeitamente possível o reconhecimento da especialidade da atividade, mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre. Necessário, apenas, restar demonstrado que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde.
A permanência não pode ter aplicação restrita, como exigência de contato com o agente nocivo durante toda a jornada de trabalho do segurado, notadamente quando se trata de nocividade avaliada de forma qualitativa. A exposição permanente depende de constatação do grau e intensidade no contato com o agente, com avaliação dos riscos causados à saúde do trabalhador, embora não seja por todas as horas da jornada de trabalho.
Quanto ao agente nocivo ruído, a sucessão dos decretos regulamentares indica a seguinte situação:
- Até 05.03.97: Anexo do Decreto n.º 53.831/64 (Superior a 80 dB) e Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (Superior a 90 dB).
- De 06.03.97 a 06.05.99: Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 (Superior a 90 dB).
- De 07.05.99 a 18.11.2003 Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, na redação original (Superior a 90 dB).
- A partir de 19.11.2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 (Superior a 85 dB).
Desse modo, até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto 53.831/64. Já a partir de 06/03/1997, deve ser observado o limite de 90 dB até 18/11/2003. O nível de 85 dB somente é aplicável a partir de 19/11/2003, pois o Superior Tribunal de Justiça, em precedente de observância obrigatória (art. 927 do CPC/2015) definiu o entendimento segundo o qual os estritos parâmetros legais relativos ao nível de ruído, vigentes em cada época, devem limitar o reconhecimento da atividade especial (REsp repetitivo 1.398.260/PR), nos seguintes termos:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ." (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Por fim, destaco que os níveis de pressão sonora devem ser aferidos por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Em relação aos agentes químicos, a caracterização da atividade especial não depende da análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, pois são avaliados de forma qualitativa. Os Decretos que regem a matéria não exigem patamares mínimos, para tóxicos orgânicos e inorgânicos, ao contrário do que ocorre com os agentes físicos ruído, calor, frio ou eletricidade. Nesse sentido a exposição habitual, rotineira a agentes de natureza química são suficientes para caracterizar a atividade prejudicial à saúde ou à integridade física, conforme entendimento desta Corte (TRF4, APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10/05/2010).
Quanto aos agentes biológicos a exposição deve ser avaliada de forma qualitativa, não sendo condicionada ao tempo diário de exposição do segurado. O objetivo do reconhecimento da atividade especial é proporcionar ao trabalhador exposto a agentes agressivos a tutela protetiva, em razão dos maiores riscos que o exercício do labor lhe ocasiona, sendo inerente a atividade profissional a sujeição a esses agentes insalubres.
Com relação às perícias por similaridade ou por aferição indireta das condições de trabalho, destaco que esse procedimento tem sido admitido, nos casos em que a coleta de dados in loco se mostrar impossível para a análise da atividade especial. Nesse sentido cito os seguintes precedentes desta Corte:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. [...] A jurisprudência pátria reconhece a validade da perícia técnica por similaridade para fins de comprovação do tempo de serviço especial nos casos de impossibilidade de aferição direta das circunstâncias de trabalho. (TRF4, APELREEX 0009499-10.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 25/08/2016)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. [...] LAUDO EXTEMPORÂNEO. SIMILARIDADE. [...] 5. A perícia técnica deve ser realizada de forma indireta, em empresa similar àquela em que laborou o segurado, quando não há meio de reconstituir as condições físicas do local de trabalho em face do encerramento das suas atividades. (TRF4 5030892-81.2012.404.7000, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 06/07/2016)
No que tange ao uso de equipamentos de proteção individual (EPI), somente a partir de 03/12/1998 é relevante a sua consideração na análise da atividade especial. Nessa data entrou em vigor a MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o art. 58, § 2º, da Lei 8.213/91, estipulando a exigência de o laudo técnico conter informações sobre a existência de tecnologia de proteção individual eficaz para diminuir a intensidade do agente nocivo a limites de tolerância e recomendação do empregador para o uso. Logo, antes dessa data é irrelevante o uso de EPI, sendo adotado esse entendimento pelo próprio INSS (IN 77/2015, art. 268, inciso III).
Ainda, é pacífico o entendimento deste Tribunal e também do Colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 462.858/RS, Relator Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, DJU de 08-05-2003) no sentido de que esses dispositivos não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovados, por meio de perícia técnica especializada, o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho e a sua real efetividade.
Quando se trata de ruído, há precedente de aplicação obrigatória, nos termos do art. 927, do CPC/2015, o qual firmou a tese de que a utilização de EPI não impede a caracterização da atividade especial por exposição ao agente ruído. Trata-se do ARE 664.355 (Tema 555 reconhecido com repercussão geral), no qual o STF firmou a tese de que a utilização de Equipamento de Proteção Individual - EPI não ilide de modo eficaz os efeitos nocivos do agente físico ruído, porquanto não se restringem aos problemas relacionados às funções auditivas, restando assentado que mesmo na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no PPP, no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
No caso de exposição a hidrocarbonetos, "o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais" (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011).
FONTE DE CUSTEIO
Não deve ser acolhida a tese comumente apresentada pelo INSS, a respeito da ausência de fonte de custeio para o reconhecimento da atividade especial, em razão do fornecimento de equipamentos de proteção individual pelo empregador e ausência de indicação do código de recolhimento no campo GFIP do PPP.
De acordo com o art. 195 da Constituição Federal de 1988, a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, com base numa pluralidade de fontes de custeio. Nesse sentido a previsão de fonte de financiamento nas contribuições a cargo da empresa (art. 57, § 6º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 22, II, da Lei 8.212/91) não configura óbice à análise da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum, na medida em que o RGPS é regime de repartição e não de capitalização, no qual a cada contribuinte corresponde um fundo específico de financiamento do seguro social.
Ademais, o benefício de aposentadoria especial foi estipulado pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º, c/c art. 15 da EC 20/98), o que implica a possibilidade de sua concessão independente da identificação da fonte de custeio (STF, AI 553.993). Logo, a regra à específica indicação legislativa da fonte de custeio é dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.
Da mesma forma, se estiver comprovado o trabalho em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, a ausência do código ou indicação equivocada no campo GFIP do PPP não impede o reconhecimento da atividade especial. Isso porque o INSS possui os meios necessários para fiscalizar irregularidades na empresa, não podendo ser o segurado responsabilizado por falha do empregador.
Por fim, o recolhimento das contribuições previstas nos arts. 57, §§ 6º e 7º, da Lei 8.213/91 e art. 22, II, da Lei 8.212/91, compete ao empregador, de acordo com o art. 30, I, da Lei 8.212/91, motivo pelo qual a ausência do recolhimento não pode prejudicar o segurado.
Assim, a tese do INSS não deve ser acolhida.
TEMPO DE ATIVIDADE ESPECIAL NO CASO CONCRETO
A parte autora pretende o reconhecimento da atividade especial nos períodos de 24/05/2001 a 01/11/2007.
A partir do conjunto probatório presente nos autos, a atividade especial pretendida deve ser analisada nos seguintes termos:
Período/Empresa: 24/05/2001 a 01/11/2007 - Wosgrau Participações Indústria e Comércio Ltda.
Função/Atividades: auxiliar de produção. No período de 24/05/2001 a 31/07/2001, "Abastece a esteira com auxílio de uma alavanca (02 empregados da linha Schiffer e 01 da linha IKL), cuida para que as toras fiques alinhadas, controla a quantidade de tora que entra na linha de produção, informa o encarregado a quantidade e as dimensões das toras que entraram na linha de produção durante o seu turno e auxilia na limpeza de resíduos de casca do estaleiro".
No período de 01/08/2001 a 01/11/2007, o autor "Faz controle do nível de água no tanque de alimentação, ligar e desligar rosca sem fim, bombas de água ventiladores, verifica manômetro de pressão, injeta água morna no balão, observa a alimentação da esteira, procede a limpeza na esteira de alimentação, do cinzeiro, do decantador, do lubo de caldiera e da chaminé, faz a descarga de vapor da caldeira e da chaminé (para não entupir), verifica o funcionamento da bomba de produtos químicos e procede a manutenção e limpeza de todo o local".
Agentes nocivos: o PPP indica nível de ruído de 90 dB(A), para o período de 24/05/2001 a 31/07/2001, e de 82 dB(A), para o período de 01/08/2001 a 01/11/2007.
Essa diminuição no nível de ruído, entretanto, não encontra amparo no Laudo Técnico de Condições Ambientais de Trabalho emitido pela empresa, o qual indica o ruído mensurado em 90 dB(A) com a esteira em funcionamento.
Embora a mudança na descrição das tarefas do autor, verifico que ele permaneceu na linha de produção, no mesmo ambiente de trabalho e manteve atividades de alimentação e limpeza da esteira com a matéria-prima utilizada pela empresa para fabricação de seus produtos. O que ocorreu foi o acréscimo de atribuições ao autor, não havendo, porém, elementos que justificassem a redução do nível de ruído indicado no PPP. Por isso, entendo que deve ser dada prevalência ao LTCAT da própria empresa, já que o autor permaneceu no mesmo ambiente de trabalho e manteve as suas atividades relacionadas à esteira que era a fonte de ruído. Logo, reconheço o índice de ruído de 90 dB(A) para todo o período de atividade.
No mesmo sentido, os documentos apresentados pela empresa não podem conduzir a que se ignore o laudo pericial que o autor apresentou por similaridade. A empresa relativa ao laudo similar se dedica ao mesmo ramo de atividade da empresa em que o autor trabalhou, de modo que guardam simetria em seus ambientes de trabalho e agentes nocivos a que se encontravam expostos os seus trabalhadores. Na empresa Indústria e Com. de Madeiras Natalmenegassi Ltda., os níveis de ruído apontados na linha de produção estão todos acima do limite de 90 dB(A), o que reforça o reconhecimento da atividade especial.
Enquadramento legal:
Decreto 3.048/99: código 2.0.1 - RUÍDO - a) exposição permanente a níveis de ruído acima de 90 decibéis.
Decreto 3.048/99 depois do Decreto 4.882/2003: código 2.0.1 - RUÍDO - a) exposição a Níveis de Exposição Normalizados (NEN) superiores a 85 dB(A).
Provas: LTCAT da empresa (Evento 25, LAUDO5) e laudo de empresa similar (Evento 1, LAUDO12)
Conclusão: a parte autora desempenhou atividade especial no período em análise.
Logo, merece ser provido o apelo da parte autora, motivo pelo qual reconheço o exercício de atividade especial, em relação ao período de 24/05/2001 a 01/11/2007.
CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM PARA FINS DE APOSENTADORIA
O demandante busca a conversão de tempo de serviço exercido sob condições especiais em tempo de serviço comum, para fins de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
O art. 57, § 5º, da Lei 8.213/91 estabelecia a possibilidade de converter o tempo de serviço especial em comum. Por força do art. 28 da MP 1.663-10, de 28/05/1998, o referido parágrafo havia sido revogado, com a finalidade de vedar a possibilidade de conversão de tempo especial em comum, após 28/05/1998. Quando convertida na Lei 9.711/98, contudo, a revogação do art. 57, § 5º, da Lei 8.213/91 não foi mantida. Nesse sentido é o entendimento do STJ, firmado nos temas 422 e 423 dos recursos repetitivos:
"EMENTA [...] PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO. 1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/1991. [...] 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido." (REsp 1151363 MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)
Esse entendimento é de observância obrigatória, nos termos do art. 927, do CPC.
Ainda, o Decreto nº 4.827, de 03 de setembro de 2003 alterou o art. 70 do Decreto nº 3.048/99, permitindo a conversão do tempo de serviço especial em comum a qualquer tempo. Da mesma forma o INSS assegura o direito de conversão do tempo de serviço especial em comum para qualquer tempo, nos termos do art. 256 da IN 77/2015:
"Art. 256. O tempo de trabalho exercido sob condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, conforme a legislação vigente à época da prestação do serviço será somado após a respectiva conversão ao tempo de trabalho exercido em atividade comum, qualquer que seja o período trabalhado, aplicando- se para efeito de concessão de qualquer benefício, a tabela de conversão constante no Anexo XXVIII."
Esse dispositivo demonstra que o próprio INSS vem reconhecendo a atividade especial, quando comprovada, em períodos anteriores a 1980. Nesse ponto deve ser rejeitada a tese de ser vedada a possibilidade de conversão, em período anterior a 10/12/1980. Tal vedação resultaria em prejuízo do trabalhador, indo de encontro ao objetivo da Lei 6.887/80, a qual buscou justamente possibilitar ao trabalhador aposentar-se antes da data em que se aposentaria, se simplesmente somasse os tempos de serviço, sem antes convertê-los, reparando, desse modo, os danos causados pelas condições adversas de trabalho. Nessa linha, entendo como perfeitamente possível a conversão de atividade especial em comum antes da Lei nº 6.887/80.
Quanto ao fator de conversão, deve ser utilizado o parâmetro vigente no momento da aposentação, aplicando-se o multiplicador 1,40, para homem, e 1,20, para mulher. Esse critério segue o entendimento firmado pelo STJ nos temas 422 e 423 dos recursos repetitivos:
"Temas 422/423 - Fator de conversão
EMENTA [...] CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. OBSERVÂNCIA DA LEI EM VIGOR POR OCASIÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE. DECRETO N. 3.048/1999, ARTIGO 70, §§ 1º E 2º. FATOR DE CONVERSÃO. EXTENSÃO DA REGRA AO TRABALHO DESEMPENHADO EM QUALQUER ÉPOCA. 1. A teor do § 1º do art. 70 do Decreto n. 3.048/99, a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho. 2. O Decreto n. 4.827/2003, ao incluir o § 2º no art. 70 do Decreto n. 3.048/99, estendeu ao trabalho desempenhado em qualquer período a mesma regra de conversão. Assim, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento. 3. A adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático e não de regra previdenciária. 4. Com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/1999, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pela regra da tabela definida no artigo 70 (art. 173 da Instrução Normativa n. 20/2007). 5. Descabe à autarquia utilizar da via judicial para impugnar orientação determinada em seu próprio regulamento, ao qual está vinculada. Nesse compasso, a Terceira Seção desta Corte já decidiu no sentido de dar tratamento isonômico às situações análogas, como na espécie (EREsp n. 412.351/RS). 6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (REsp 1151363 MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011)"
Com base nesses fundamentos, os segurados do Regime Geral da Previdência Social que trabalhem sob condições especiais podem converter o tempo de serviço especial em tempo de serviço comum, mesmo antes de 10/12/1980 e após 28/05/1998, com a aplicação dos fatores de conversão estabelecidos na legislação vigente no momento da aposentadoria.
DIREITO À APOSENTADORIA E FORMA DE CÁLCULO DO BENEFÍCIO
O direito à aposentadoria antes da Emenda Constitucional nº 20/98 surgia para o segurado homem com 30 anos de serviço e para a mulher com 25 anos, eis que prevista a possibilidade de concessão do benefício de forma proporcional. Com o advento da referida emenda, ocorreram grandes mudanças nas regras de concessão da aposentação. Porém, o art. 3º da inovação constitucional assegurou a concessão de aposentadoria e pensão, a qualquer tempo, aos segurados do RGPS, bem como aos seus dependentes, que, até a data da publicação da Emenda, tenham cumprido os requisitos para a obtenção destes benefícios, com base nos critérios da legislação então vigente.
Da mesma forma, a Lei 9.876/99 que mudou o cálculo do valor do salário-de-benefício, instituindo o fator previdenciário, determinou em seu art. 6° que o segurado que até o dia anterior à data de publicação da Lei tenha cumprido os requisitos para a concessão de benefício teria o cálculo da sua renda mensal inicial segundo as regras até então vigentes. Dessa forma, a aquisição do direito à concessão da aposentadoria possui três marcos aquisitivos, nos quais se verifica a situação do segurado nesses momentos, calculando-se o coeficiente da renda mensal inicial, de acordo com o tempo de serviço do segurado em cada um desses momentos. Significa que o segurado, para ter aplicado à sua aposentadoria a forma de cálculo do salário-de-benefício de acordo com a EC nº 20/98 ou Lei nº 9.876/99, não poderá contar tempo posterior às respectivas datas dessas normas, para o aumento de coeficiente de cálculo.
Nesse diapasão, com base no respeito ao direito adquirido, pode-se resumir a situação dos segurados, conforme o implemento dos requisitos para aposentadoria e o método de cálculo de seus benefícios da seguinte forma:
Situação 1 - Direito adquirido até a EC 20/98
1.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 15/12/1998, de acordo com o art. 202, II da CF/88, antes EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da lei 8.213/91
1.2 Aposentadoria proporcional: 25 anos de serviço (mulheres) / 30 anos de serviço (homens) / 70 % da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 15/12/1998 + 6% a cada ano adicional até essa data, como determina o art. 202, §1º da CF/88, antes da EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da Lei 8.213/91
Situação 2 - Direito adquirido até a Lei 9.876/99
2.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 28/11/1999, conforme o art. 201, § 7º da CF/88, com redação dada pela EC 20/98 c/c redação original do art. 29 e 53 da lei 8.213/91
2.2 Aposentadoria proporcional: para os segurados já vinculados ao RGPS antes de 15/12/1998 (EC 20/98) / 25 anos de serviço e idade de 48 anos (mulheres) / 30 anos de serviço e idade de 53 anos (homens) + 40% do tempo faltante até 15/12/98 (pedágio) / 70% da média dos 36 últimos salários-de-contribuição, encontrados nos 48 meses antes de 28/11/1999, + 5% a cada ano adicional até essa data, com fundamento no art. 9º, § 1º, inc. I e II da EC 20/98 c/c redação original do art. 29 da lei 8.213/91
Situação 3 - Direito adquirido após a Lei 9.876/99
3.1 Aposentadoria Integral: 30 anos de serviço (mulheres) / 35 anos de serviço (homens) / 100% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição desde julho de 94 com fator previdenciário, de acordo com o art. 201, § 7º da CF/88, com redação dada pela EC 20/98 c/c art. 29 da lei 8.213/91, redação dada pela lei 9.876/99, e art. 53 da Lei 8.213/91 e art. 39, IV do Decreto 3.048/99
3.2 Aposentadoria Proporcional: para os segurados já vinculados ao RGPS antes de 15/12/1998 (EC 20/98) / 25 anos e idade de 48 anos (mulheres) / 30 anos e idade de 53 anos (homens) + 40% do tempo faltante até 15/12/98 (pedágio) / 70% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição desde julho de 94 com fator previdenciário + 5% a cada ano adicional, conforme o art. 9º, § 1º, inc. I e II da EC 20/98 c/c art. 3º da lei 9.876/99
No caso concreto, a soma do tempo de serviço já reconhecido pelo INSS com o tempo de serviço rural e o acréscimo do tempo de serviço especial convertido em comum resulta o seguinte quadro ao autor:
Data inicial | Data Final | Fator | Conta p/ carência ? | Tempo até 02/11/2007 | Carência |
01/01/1968 | 31/12/1968 | 1,00 | Não | 1 ano, 0 mês e 0 dia | 0 |
01/01/1969 | 31/12/1969 | 1,00 | Não | 1 ano, 0 mês e 0 dia | 0 |
01/01/1970 | 17/08/1972 | 1,00 | Não | 2 anos, 7 meses e 17 dias | 0 |
18/08/1972 | 31/07/1975 | 1,00 | Sim | 2 anos, 11 meses e 14 dias | 36 |
01/09/1975 | 24/07/1983 | 1,00 | Sim | 7 anos, 10 meses e 24 dias | 95 |
01/08/1983 | 02/06/1997 | 1,00 | Sim | 13 anos, 10 meses e 2 dias | 167 |
06/04/1998 | 04/04/2000 | 1,00 | Sim | 1 ano, 11 meses e 29 dias | 25 |
02/03/2001 | 23/05/2001 | 1,00 | Sim | 0 ano, 2 meses e 22 dias | 3 |
24/05/2001 | 01/11/2007 | 1,40 | Sim | 9 anos, 0 mês e 5 dias | 78 |
Marco temporal | Tempo total | Carência | Idade |
Até 16/12/98 (EC 20/98) | 30 anos, 0 mês e 8 dias | 307 meses | 49 anos e 3 meses |
Até 28/11/99 (L. 9.876/99) | 30 anos, 11 meses e 20 dias | 318 meses | 50 anos e 2 meses |
Até a DER (02/11/2007) | 40 anos, 6 meses e 23 dias | 404 meses | 58 anos e 2 meses |
Nessas condições, a parte autora, em 16/12/1998, tinha direito à aposentadoria proporcional por tempo de serviço (regras anteriores à EC 20/98), com o cálculo de acordo com a redação original do art. 29 da Lei 8.213/91.
Posteriormente, em 28/11/1999, não tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição porque não preenchia a idade (53 anos).
Por fim, em 02/11/2007 (DER) tinha direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (regra permanente do art. 201, §7º, da CF/88). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, porque a DER é anterior a 18/06/2015, data do início da vigência da MP 676/2015, convertida na Lei 13.183/2015.
Logo, a parte autora tem o direito à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição, podendo optar pela forma de cálculo mais favorável, entre as seguintes, na forma do art. 3º da EC 20/98:
a) 70% da média aritmética dos 36 últimos salários-de-contribuição encontrados nos últimos 48 meses anteriores a 16/12/1998, devidamente atualizados até essa data, com a RMI atualizada desde essa data até 02/11/2007 (DIB);
b) 100% da média dos 80% maiores salários-de-contribuição existentes após julho de 1994, devidamente atualizados até 02/11/2007 (DIB), com fator previdenciário.
O termo inicial do benefício deve ser fixado em 02/11/2007 (DER), na forma do art. 54 c/c o art. 49, ambos da Lei 8.213/91.
Ressalto que somente o primeiro reajuste após a data de início do benefício será proporcional, devendo ser aplicado o reajuste integral aos demais.
Para fins de pagamento, porém, deverá ser observada a prescrição das diferenças nas prestações vencidas antes de 19/06/2008.
JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Por força da sucumbência, o INSS deve arcar com os honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
TUTELA ESPECÍFICA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis. Assim, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação da renda mensal revista benefício da parte autora (NB 143.107.014-6), a ser efetivada em 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
CONCLUSÃO
Reformada, em parte, a sentença quanto ao reconhecimento dos períodos especiais, bem como quanto à revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição desde 02/11/2007 (DIB) e o pagamento das parcelas vencidas e não prescritas desde 19/06/2008, prejudicado o exame do critério de aplicação dos juros e correção monetária.
A apelação da parte autora deve ser parcialmente provida, enquanto o reexame necessário não merece provimento.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da parte autora, negar provimento ao reexame necessário e determinar o cumprimento imediato do acórdão.
Ezio Teixeira
Relator
| Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8780047v2 e, se solicitado, do código CRC D50385DD. | |
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