| D.E. Publicado em 12/03/2015 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015056-12.2014.404.9999/PR
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | PEDRO ANDRADE DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Izaias Lino de Almeida |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR NÃO COMPROVADO. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE
1. A aposentadoria rural por idade é benefício devido ao segurado que atinge a idade mínima e comprova o exercício da atividade rural em regime de economia familiar, pelo período exigido em lei, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea.
2. O tamanho da propriedade rural, isoladamente, não tem o condão de descaracterizar o regime de economia familiar, quando preenchidos os demais requisitos legalmente exigidos e a prova testemunhal é consistente quanto à forma de trabalho do grupo familiar. Contudo, no caso dos autos, a grande extensão da propriedade, a titularidade de terras em três municípios, a contratação de mão-de-obra-permanente, a grande produção e o arrendamento de propriedade, descaracterizam a condição de segurado especial do requerente.
3. Considerando que o conjunto probatório não demonstra o exercício de atividade rural em regime de economia familiar, não há como ser restabelecida a aposentadoria por idade rural.
4. Tendo havido omissão fraudulenta de informações na via administrativa, relevantes à configuração dos pressupostos para o gozo da aposentadoria por idade rural, não se mantém a presunção de boa-fé do segurado, a quem compete devolver os valores recebidos indevidamente, nos termos do art. 115 da Lei 8.213/91.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial tida por interposta, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de fevereiro de 2015.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Taís Schilling Ferraz, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 7294202v22 e, se solicitado, do código CRC 11E32AAF. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Taís Schilling Ferraz |
| Data e Hora: | 26/02/2015 13:55 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015056-12.2014.404.9999/PR
RELATORA | : | Juíza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | PEDRO ANDRADE DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Izaias Lino de Almeida |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária proposta por PEDRO ANDRADE DE OLIVEIRA contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando o restabelecimento de benefício de aposentadoria por idade rural ou desde a data da cessação (01/06/2007), ou da data em que completou sessenta e cinco anos de idade (08/05/2006), e que seja declarada a inexistência do débito com o INSS de R$ 23.107, 86 (vinte e três mil, cento e sete reais e oitenta centavos).
O juízo a quo proferiu sentença, julgando procedente o pedido, para condenar o réu a restabelecer o pagamento do benefício de aposentadoria por idade rural, tendo como data inicial de pagamento 01/06/2007, e declarar a inexistência de débitos junto ao INSS. Condenou o INSS ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença (fls. 396/406).
O INSS apelou, sustentando que o autor pleiteou de forma fraudulenta o benefício como segurado especial. Afirmou que o requerente não exerceu labor rurícola em regime de economia familiar, mas sim como fazendeiro, sendo inclusive empregador rural com matrícula CEI nº 14.133.00011/8.5. Alegou que o demandante possui 282,6 hectares de terras, arrendou parte de sua propriedade denominada Fazenda Alvorada para a Usina Alto Alegre, na qual possui funcionários registrados e fabricou notas fiscais em nome do Sítio Santa Inês, também de sua propriedade, para obter irregularmente a aposentadoria. Requereu a improcedência da ação e a cassação, com efeitos ex tunc, da antecipação da tutela concedida. Subsidiariamente, requereu que os juros moratórios e a correção monetária sejam fixados conforme os índices estabelecidos na Lei 11.960/09 (fls. 413/433).
Com as contrarrazões, vieram os autos os autos a este Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
DA REMESSA DE OFÍCIO
A Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça - com fundamento na Lei 11.672/08, que acresceu o art. 543-C ao CPC, disciplinando o processamento e julgamento dos recursos especiais repetitivos - dirimiu a controvérsia existente e firmou compreensão, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo n.º 1101727/PR, em 04-11-09, no sentido de que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público (Código de Processo Civil, artigo 475, parágrafo 2º), razão pela qual dou por interposta a remessa oficial.
CONSIDERAÇÕES GERAIS SOBRE A APOSENTADORIA RURAL POR IDADE
A apreciação de pedido de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei n.º 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinqüenta e cinco anos para a mulher), e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida, sendo dispensável o recolhimento de contribuições.
O artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei n.º 8.213/91 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completou a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios. Assim, se ao completar a idade no ano de 2006 o segurado precisava de 150 meses de tempo/carência e, nessa data, ainda lhe faltavam 12 meses, deve-se posicioná-lo na tabela a partir do ano em que completaria os 150 meses, ou seja, 2007. Neste ano, a carência será de 156 meses (6 meses além do período inicial), de forma que o segurado poderá implementar os requisitos em 2008.
Deve ser observado que nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994, data da publicação da Medida Provisória n.º 598, que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, (posteriormente convertida na Lei n.º 9.063/95), o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91.
A disposição contida no art. 143 da Lei n.º 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima.
Em qualquer caso, desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, mas caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STJ, REsp n.º 544.327-SP, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, unânime, DJ de 17-11-2003; STJ, REsp. n.º 338.435-SP, Rel. Ministro Vicente Leal, Sexta Turma, unânime, DJ de 28-10-2002; STJ, REsp n.º 225.719-SP, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, unânime, DJ de 29-05-2000).
Como regra geral, a comprovação do tempo de atividade rural para fins previdenciários exige, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (art. 55, §3º, da Lei n.º 8.213/91; Recurso Especial Repetitivo n.º 1.133.863/RN, Rel. Des. convocado Celso Limongi, 3ª Seção, julgado em 13/12/2010, DJe 15/04/2011).
A relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural no período controvertido, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar, em conformidade com o teor da Súmula n.º 73 deste Tribunal Regional Federal: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental. (DJU, Seção 2, de 02/02/2006, p. 524).
Não constituem início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando, sem a devida homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), sejam extemporâneas em relação aos fatos declarados, hipótese em que equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo. Neste sentido: EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 6/11/2012, DJe 19/11/2012; AgRg no REsp 1291466/MG, Rel. Ministro NEWTON TRISOTTO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/SC), QUINTA TURMA, julgado em 18/11/2014, DJe 24/11/2014; AR 3.202/CE, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/4/2008, DJe 6/8/2008.
O início de prova material, de outro lado, não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado, bastando ser contemporâneo aos fatos alegados. A prova testemunhal, desde que robusta, é apta a comprovar os claros não cobertos pela prova documental (STJ, AgRg no REsp 1.217.944/PR, Rel. Min. Jorge Mussi, 5ª Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011).
Quanto à idade mínima para exercício de atividade laborativa, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais consolidou o entendimento no sentido de que A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários. (Súmula n.º 05, DJ 25/09/2003, p. 493). Assim, e considerando também os precedentes da Corte Superior, prevalece o entendimento de que as normas que proíbem o trabalho do menor foram criadas para protegê-lo e não para prejudicá-lo. Logo, admissível o cômputo de labor rural já a partir dos 12 anos de idade.
Nos casos dos trabalhadores rurais conhecidos como boias-frias, diaristas ou volantes especificamente, considerando a informalidade com que é exercida a profissão no meio rural, que dificulta a comprovação documental da atividade, o entendimento pacífico desta Corte é no sentido de que a exigência de início de prova material deve ser abrandada.
Em recente julgado, o Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive para os trabalhadores do tipo boia-fria:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
(Superior Tribunal de Justiça. REsp 1321493/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/10/2012, DJe 19/12/2012)
Evidentemente que a qualidade da prova material exigida, neste caso, é ainda menor, mas não se pode dispensá-la.
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII, da Lei n.º 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural. Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei n.º 1166, de 15/04/71.
Início de prova material em nome de ente familiar, que exerce atividade urbana, não impede que reste configurada a condição de trabalhador rural em regime de economia familiar do requerente. Nesse sentido é a decisão do STJ no RESP n.º 1.304.479, que assentou: a legislação previdenciária estabeleceu a possibilidade de um dos membros do grupo familiar exercer atividade estranha ao regime de subsistência, sem afetar a natureza do trabalho dos demais integrantes.
A propósito, com o advento da Lei n.º 11.718/08, que alterou diversos dispositivos da Lei n.º 8.213/91, isso ficou mais claro, haja vista o que estabelecem o art. 11, §§9º e 10º, I, "a", da Lei n.º 8.213/91. A Instrução Normativa INSS/PRES 45, 06/08/10, em seu art. 7º, §5º, é clara:
Art. 7º É segurado na categoria de segurado especial, conforme o inciso VII do art. 9º do RPS, a pessoa física residente no imóvel rural ou em aglomerado urbano ou rural próximo que, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, na condição de:
I - produtor, seja proprietário, usufrutuário, possuidor, assentado, parceiro ou meeiro outorgados, comodatário ou arrendatário rurais, que explore atividade:
a) agropecuária em área contínua ou não de até quatro módulos fiscais, observado o disposto no § 17 deste artigo; e
b) de seringueiro ou extrativista vegetal na coleta e extração, de modo sustentável, de recursos naturais renováveis, e faça dessas atividades o principal meio de vida;
II - pescador artesanal ou a este assemelhado, que faça da pesca profissão habitual ou principal meio de vida, observado o disposto no inciso IX do § 1º deste artigo; e
III - cônjuge ou companheiro, bem como filho maior de dezesseis anos de idade ou a este equiparado do segurado de que tratam os incisos I e II deste artigo que, comprovadamente, tenham participação ativa nas atividades rurais do grupo familiar.
...§ 5º Não é segurado especial o membro de grupo familiar (somente ele) que possuir outra fonte de rendimento, exceto se decorrente de:
I ..."
O trabalhador rural que atua como boia-fria, diarista ou volante, deve ser equiparado, para os fins da aposentadoria rural por idade, ao segurado especial, aplicando-se-lhe, em consequência, o disposto no art. 39, I, da Lei 8.213/91, sem as limitações temporais previstas no art. 143 da mesma lei. Com efeito, não há o que justifique tratamento diferenciado, especialmente se considerada a maior vulnerabilidade social a que está sujeito o trabalhador rural sem vínculo empregatício e desprovido dos meios para, por conta própria, retirar seu sustento e de sua família do trabalho na terra.
Registro, que, em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições. Quanto à Carteira de Identificação e Contribuição, prevista no art. 106 da Lei n.º 8.213/91 como necessária à comprovação do exercício de atividade rural a partir de 16/04/94, trata-se de documento voltado principalmente à esfera administrativa, sendo instrumento que visa a facilitar futura concessão de benefício ou reconhecimento de tempo de serviço e cuja expedição, via de regra, dá-se após a comprovação junto à Seguradora das alegadas atividades agrícolas. Uma vez expedida, é instrumento hábil, por si só, àquela comprovação. Todavia, a inexistência do referido documento não obsta a demonstrar sua condição de segurado especial por outros meios, mormente no âmbito judicial.
DO CASO CONCRETO
No caso em exame, para fazer prova do exercício de atividade rural, foram acostados aos autos os seguintes documentos:
a) certidão de casamento do autor, datada de 1963, na qual consta ser lavrador (fls. 21);
b) cópia de escritura pública de compra e venda, datada de 1982, na qual consta que o autor adquiriu imóvel rural com 72,60 hectares (fls. 22/26);
c) documentos de ITR, datado de 1990, 1991, 1992, 1993, 1994, 1995, 1996 referente ao Sítio Santa Inês (fls. 27/34);
d) CCIR 1996/1997, 1998/1999 referentes ao Sítio Santa Inês (fls. 35/36);
e) notas fiscais de produtor rural em nome do autor, datadas de 1990, 1991, 1992, 1994, 1995, 1996, 1997, 1998,1999, 2000, 2001 (fls. 37/48);
f) certificado de reservista do autor, datado de 1962, no qual é qualificado como lavrador (fl. 58);
No caso, os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material. Contudo, a controvérsia versa sobre sua condição de segurado especial no período de carência necessário para concessão do benefício, ou seja, nos dez anos anteriores a 2001 (120 meses, já que completou a idade mínima em 2001), já que há indícios de que se trate de produtor rural.
O INSS havia concedido na via administrativa o benefício de aposentadoria rural por idade ao autor em 18/12/2001. O benefício foi suspenso em 01/06/2007 pela autarquia sob argumento de que havia irregularidades em sua concessão.
Alega o INSS que o autor é fazendeiro e não segurado especial, que possui no total 282,6 hectares de terras e pleiteou o benefício de forma fraudulenta, omitindo a propriedade de várias fazendas e emitindo notas fiscais de produtor em nome somente da Fazenda Santa Inês, de 30 alqueires, localizada no município de Santa Fé- PR. Afirma que o requerente é proprietário também da Fazenda Alvorada, com área de 70 alqueires paulistas, localizada no município de Lobato-PR, cuja parte da área é arrendada para Usina Alto Alegre. Afirma que na Fazenda Alvorada, o demandante contratava empregados para a atividade de pecuária de leite e que na fazenda Santa Inês, em nome da qual as notas foram emitidas, o requerente nunca manteve produção de leite.
Em contestação, para demonstrar que a suspensão do benefício foi correta, o INSS juntou os seguintes documentos referentes a propriedades em nome do autor:
a) espelho do imóvel rural Sítio Santa Inês, com área de 72,6 hectares, localizado em Santa Inês- PR (fls. 107/111);
b) espelho do imóvel rural Fazenda Alvorada, com área de 169, 4 hectares, localizado em Lobato-PR, na qual consta contratação de um assalariado permanente (fl. 112/116);
c) espelho do imóvel rural Sítio Santo Antônio Lote 220-E, localizado em Lobato-PR, com área de 16,9 hectares (fls. 118/122);
d) espelho do imóvel rural sítio São João, localizado em Estrela do Norte- SP, com área de 23,7 hectares (fls. 123/127);
e) CCOR- consulta conta-corrente de estabelecimento, CEI 14.133.00011/8.5, com registro de contribuições no período de 1992 a 1996 (fls. 197/202);
f) contrato de parceria agrícola, pelo qual o autor cedeu a totalidade do Sítio Santa Inês (30 alqueires paulistas) e 55 alqueires paulistas da Fazenda Alvorada (total de 70 alqueires) para que a Usina Alto Alegre realizasse plantação da cana-de-açúcar, com validade de 15/12/1997 a 2002 para o sítio Santa Inês e de 01/01/1998 a 2003 para a Fazenda Alvorada (fls. 205/211);
g) CNIS- dados cadastrais de empregador, CEI 14.133.00011/8.5, referentes à Fazenda Alvorada, e totais de vínculos de admissões e rescisões -RAIS, nas quais consta que no período de 1990 a 1996, o requerente sempre empregou funcionários, variando de 1 a 3 funcionários no período (fls. 287/294);
Os documentos juntados pelo INSS demonstram que o requerente não exerceu o labor rural em regime de economia familiar no período de carência necessário para concessão do benefício.
Os espelhos rurais comprovam que a soma das propriedades do autor, já no período que está sendo analisado (dez anos anteriores a 2001), era bastante superior a 4 módulos fiscais. No Município de Lobato, o módulo fiscal é de 16 hectares e no município de Santa Fé o módulo fiscal é de 18 hectares. Conforme o contrato de parceria rural (fls. 205/211) o requerente já era proprietário do Sítio Santa Inês e da Fazenda Alvorada quando do requerimento de seu benefício, em um total de 100 alqueires paulistas, ou seja, aproximadamente 242 hectares.
A extensão da propriedade rural por si só não descaracteriza a condição de segurado especial, contudo há outros elementos nos autos que somados a ela demonstram que o autor não exercia a atividade em regime de economia familiar. Entre os fatores que demonstram tratar-se de fazendeiro está o número de cabeças de gado registrado nos espelhos rurais juntados pelo INSS na contestação. Pode ser observado nos documentos o registro de criação de 73 bovinos no Sítio Santa Inês e 221 na Fazenda Alvorada. São números incompatíveis com a produção de um trabalhador em regime de economia familiar.
Também pode ser observado nos espelhos de imóveis rurais que o requerente possui propriedades rurais em três municípios: Lobato- PR, Santa Fé-PR e Estrela do Norte- SP. É inverossímil que possuindo quatro propriedades rurais localizadas em três municípios, o autor consiga desenvolver o labor rural somente com o apoio mútuo de seu grupo familiar.
Adicionalmente, há evidências de que o autor contratou empregados para a Fazenda Alvorada no período de 1990 a 1996. Conforme os Totais de Vínculos e Totais de Admissões e Rescisões -RAIS juntados aos autos, verifica-se que não eram contratações esporádicas (fls. 287/294).
Por fim, o contrato de parceria rural deixa claro que a totalidade do Sítio Santa Inês (30 alqueires paulistas) foi outorgada à Usina Alto Alegre para plantio de cana-de-açúcar no período de 15/12/1997 a 2002. Entretanto, na entrevista rural na via administrativa realizada em 18/12/2001, o requerente afirmou que desenvolvia atividade rural em regime de economia familiar nos trinta alqueires do Sítio Santa Inês. Pelo mesmo contrato, verifica-se que 55 alqueires, de um total de 70, da Fazenda Alvorada, foram outorgadas no período de 15/12/1997 a 2002 para a Usina Alto Alegre (fls. 205/211).
As provas juntadas demonstram que o autor no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo e ao implemento do requisito etário não era segurado especial. O tamanho das suas propriedades, as contribuições como empregador rural, os registros de empregados, e o contrato de parceria rural em que outorgava grande extensão de terras à Usina Alto Alegre, demonstram que não exerceu trabalho rural em regime de economia familiar.
Na audiência de instrução e julgamento, realizada em 04/09/2013, foram ouvidos o autor e as testemunhas Olírio Xavier Cotrim, Manoel José da Silva, e Emídio Mendes de Almeida (fls. 361/367). A prova testemunhal foi contraditória com os documentos apresentados aos autos quanto à contratação de mão-de-obra. Enquanto a documentação aponta para o fato de o autor ter contratado empregados entre 1990 a 1996, os depoentes afirmaram que o labor rural era exercido somente por familiares, com auxílio esporádico do trabalho de diaristas.
Diante de toda prova documental juntada, a prova testemunhal não foi suficiente para demonstrar que o autor era segurado especial no período anterior ao requerimento do benefício. As provas apontam que no período em questão o autor era proprietário de grande extensão de terras, da qual auferia renda pela outorga de grande parte para a Usina Alto Alegre, além de ter grande produção de gado e ter sido empregador rural.
O apelo do INSS, portanto, merece prosperar quanto à improcedência do pedido de restabelecimento de aposentadoria rural por idade. Uma vez que o autor não detinha a condição de segurado especial quando do requerimento administrativo e tampouco há provas de que tenha exercido o labor rural em regime de economia familiar no período de carência para concessão do benefício, não é possível restabelecer o benefício suspenso pela autarquia em 01/06/2007.
Quanto à devolução dos valores percebidos pelo autor entre a data de concessão de seu benefício e a suspensão, embora o INSS pudesse ter tomado medidas para evitar o deferimento da aposentadoria, desde o início, é caso de aplicação do disposto no art. 115 da Lei 8213/91. Diante do contexto fático-probatório, e da omissão de informações não há como sustentar que o autor tenha agido de boa-fé.
A hipótese não é de apenas erro na interpretação jurídica quanto à possibilidade de titularizar um benefício previdenciário. O autor omitiu suas outras atividades rurais, bem como que tinha empregados, que arrendava uma de suas fazendas e que tinha muito mais terras que as declaradas ao INSS, relativas às notas de produção que instruíram o pedido de aposentadoria.
Cabível, portanto, a cobrança dos valores pagos indevidamente pelo INSS.
Quanto à antecipação de tutela concedida na sentença, resta revertida pela improcedência do pedido do autor.
Custas processuais e honorários advocatícios
Provido o apelo do INSS para julgar improcedente o pedido de restabelecimento de aposentadoria rural por idade, caberá ao autor o pagamento das custas e honorários advocatícios que vão fixados em R$ 1.000,00, atualizáveis pelo INPC a contar da presente data.
Restam prequestionados, para fins de acesso às instâncias recursais superiores, os dispositivos legais e constitucionais elencados pelas partes.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial tida por interposta.
Juíza Federal Taís Schilling Ferraz
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 24/02/2015
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0015056-12.2014.404.9999/PR
ORIGEM: PR 00000916320138160180
RELATOR | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
PRESIDENTE | : | Rogerio Favreto |
PROCURADOR | : | Dr Fábio Nesi Venzon |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | PEDRO ANDRADE DE OLIVEIRA |
ADVOGADO | : | Izaias Lino de Almeida |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 24/02/2015, na seqüência 578, disponibilizada no DE de 04/02/2015, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL TIDA POR INTERPOSTA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
VOTANTE(S) | : | Juiza Federal TAÍS SCHILLING FERRAZ |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO | |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS DE CASTRO LUGON |
Marilia Ferreira Leusin
Supervisora
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