APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000349-25.2014.4.04.7130/RS
RELATOR | : | HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | EUDES MARIA MARION |
ADVOGADO | : | SAMIR JOSÉ MENEGATT |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. DOCUMENTOS EM NOME DO MARIDO. VÍNCULO URBANO. AVERBAÇÃO.
1. A comprovação do exercício de atividade rural deve-se realizar na forma do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/91, mediante início de prova material complementado por prova testemunhal idônea.
2. Comprovado o exercício da atividade rural, em regime de economia familiar, no período anterior aos 14 anos, deve ser reconhecido o tempo de serviço respectivo.
3. Não é possível a extensão de prova material de um cônjuge ao outro, quando há vínculos urbanos. Nesse caso, deve o cônjuge titular da prova apresentar documentos em nome próprio.
4. Não cumpridos todos os requisitos para a concessão do benefício, a parte autora tem direito à averbação dos períodos reconhecidos, para fins de obtenção de futura aposentadoria.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação da parte autora e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de junho de 2016.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
| Documento eletrônico assinado por Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8329426v3 e, se solicitado, do código CRC 4B6C5554. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000349-25.2014.4.04.7130/RS
RELATOR | : | HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR |
APELANTE | : | EUDES MARIA MARION |
ADVOGADO | : | SAMIR JOSÉ MENEGATT |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por Eudes Maria Marion contra o INSS, a fim de obter a averbação de período de exercício de atividade rural em regime de economia familiar no período de 14/05/1968 a 30/05/1996.
Foi prolatada sentença que assim decidiu a lide (evento 25):
Ante o exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido formulado na peça vestibular, a fim de reconhecer o desempenho de atividade rurícola em regime de economia familiar pela Autora no período de 14/05/1968 a 01/06/1977, exceto carência e contagem recíproca.
Em razão da sucumbência recíproca, condeno ambas as partes ao pagamento de honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da causa corrigido pelo IPCA-E, determinada a compensação com fundamento no art. 21 do CPC.
Apelou a autora argumentando a existência de provas da atividade rural em todo o período requerido e que, após o casamento, mesmo com a atividade urbana do marido, a atividade rural era fundamental para o sustento do grupo familiar. Requereu a reforma da sentença.
Não foram apresentadas contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão-somente os recursos e remessas em face de sentenças publicadas a contar do dia 18/03/2016.
Remessa Oficial
Em relação à remessa oficial, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR, Rel. Min. Ari Pargendler, julgado em 30-06-2009), prestigiou a corrente jurisprudencial que sustenta ser inaplicável a exceção contida no § 2.º, primeira parte, do art. 475 do CPC aos recursos dirigidos contra sentenças (a) ilíquidas, (b) relativas a relações litigiosas sem natureza econômica, (c) declaratórias e (d) constitutivas/desconstitutivas insuscetíveis de produzir condenação certa ou de definir objeto litigioso de valor certo (v.g., REsp. 651.929/RS).
Assim, em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o Instituto Nacional do Seguro Social só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, dou por interposta a remessa oficial.
Mérito
Pretende a parte autora comprovar o exercício de atividade rural no período de 14/05/1968 a 30/05/1996.
Para comprovar o período controvertido a parte autora juntou aos autos documentos comprobatórios da atividade rural, assim descritos na sentença:
Documentos em nome dos genitores (Antônio Santo Crestanello e Elvira Veronese Crestanello):
* atestado escolar que comprova que a autora frequentou a Escola Estadual de 1º e 2º graus Padre Abilio de M. Sconchiado, situada no Município de Vista Alegre/RS;
* atestado escolar que comprova que a autora e seus irmãos frequentaram a Escola Estadual de 1º e 2º graus Padre Abilio de M. Sconchiado, situada no Município de Vista Alegre/RS;
* declaração do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Frederico Westphalen que comprova que a mãe da autora foi admitida como associada à Entidade em 1970;
* certidão do INCRA que comprova que a mãe da autora foi proprietária de imóvel rural de 1965 a 2009;
* comprovante de pagamento de imposto territorial rural em nome da mãe da autora com data de 1970 e 1971;
* notas de comercialização da produção rural em nome da mãe da autora datadas de 1976 e 1977;
* matrícula imobiliária que comprova que os pais da autora eram proprietários de imóvel rural;
Documentos em nome do marido (Olivo Marion):
* certidão de casamento da autora onde seu marido é qualificado como agricultor em 02/07/1977;
* certidão do INCRA em nome do marido da autora que comprova a propriedade de imóvel rural de 1965 a 2009;
* escritura pública de compra e venda que comprova que o marido da autora adquiriu imóvel rural em 1978 e com a sua qualificação de agricultor;
* matrícula imobiliária que comprova que o marido da autora era proprietário de imóvel rural e com a sua qualificação de agricultor;
* notas de comercialização da produção rural em nome do marido da autora datadas de 1977 e 1978, 1979, 1980, 1989 e 1990.
Não há necessidade de que o início de prova material abarque todo o período de trabalho rural, desde que todo o contexto probatório permita a formação de juízo seguro de convicção: está pacificado nos Tribunais que não é exigível a comprovação documental, ano a ano, do período pretendido (TRF4, EINF 0016396-93.2011.404.9999, Terceira Seção, Relator Celso Kipper, D.E. 16/04/2013).
Segundo a súmula 73, do TRF/4a R, admite-se como início de prova material do exercício de atividade rural em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
O início de prova material a que alude a lei não passa de um sinal deixado no tempo acerca dos fatos que se pretende agora comprovar, não se exigindo que seja exaustivo, mesmo porque depende de sua confirmação pela prova oral.
Está consolidado o entendimento, na jurisprudência, de que, ainda que a Lei 8.213/91 haja estabelecido uma idade mínima para o reconhecimento da qualidade de segurado especial, mantendo coerência com a proibição de trabalho a menores feita pela Constituição, o exercício de atividade rural em período anterior ao implemento da idade, pelo menor, consiste em situação irregular que gera efeitos previdenciários. E que se cuida de uma norma de caráter protetivo que não deve prejudicar aquele que trabalhou quando menor. Neste sentido: comprovado o exercício da atividade rural, em regime de economia familiar, no período anterior aos 14 anos, é de ser reconhecido para fins previdenciários o tempo de serviço respectivo (TRF4, APELREEX 0002552-76.2011.404.9999, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 14/05/2013).
As testemunhas confirmaram as alegações da autora no tocante ao período anterior ao seu casamento, afirmando o labor agrícola juntamente com os pais, para a própria subsistência, sem auxílio de empregados e sem maquinário.
A sentença assim sintetizou a prova oral produzida na Justificação Administrativa:
Com efeito, relativamente ao período anterior ao casamento, as testemunhas esclareceram que a autora residia com os pais na Linha Braguinha, interior do Município de Frederico Westphalen, e todos trabalhavam na agricultura, sem empregados, sem maquinários, cultivando feijão, arroz, milho, batata, batata doce, milho, mandioca e miudezas em geral, permanecendo ali até o casamento, quando foi residir com o marido na Linha Zanatta.
Sem embargo da prova material apontar a vinculação da autora à atividade rurícola com seus pais é mister observar que, ao se casar em 1977, a parte autora formou novo núcleo familiar, o que torna imperativo trazer documentos em nome próprio ou de seu cônjuge. A autora colacionou documentos em nome do esposo, todavia, este exercia atividade urbana à época do casamento e, portanto, não há prova do exercício de atividade rural da autora, após o casamento.
Em regra, os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando dos pais ou cônjuge, consubstanciam início de prova material do labor rural (Súmula 73 desta Corte). Entretanto, não é possível a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
Logo, nem seria possível estender a eficácia probatória dos documentos do marido à esposa, titular da prova e vivendo em novo núcleo familiar.
Sobre o tema cito os seguintes julgados:
PREVIDENCIÁRIO. TRABALHADOR RURAL. BOIA-FRIA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. DOCUMENTOS EM NOME DO MARIDO. POSTERIOR VÍNCULO URBANO. 1. Os documentos em que o marido da parte autora é qualificado como "lavrador" não servem para a comprovação da atividade rural quando ele, posteriormente, passou a desempenhar atividade urbana. 2. Não comprovado o exercício de atividade rural correspondente ao período de carência relativo ao ano em que cumprido o requisito etário, julga-se improcedente a ação. (TRF4, APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001841-37.2012.404.9999, 5ª TURMA, Des. Federal ROGERIO FAVRETO, POR UNANIMIDADE, D.E. 19/07/2012, PUBLICAÇÃO EM 20/07/2012)
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TRABALHO RURAL. ARTS. 11, VI, E 143 DA LEI 8.213/1991. SEGURADO ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO JURÍDICA. TRABALHO URBANO DE INTEGRANTE DO GRUPO FAMILIAR. REPERCUSSÃO. NECESSIDADE DE PROVA MATERIAL EM NOME DO MESMO MEMBRO. EXTENSIBILIDADE PREJUDICADA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de desfazer a caracterização da qualidade de segurada especial da recorrida, em razão do trabalho urbano de seu cônjuge, e, com isso, indeferir a aposentadoria prevista no art. 143 da Lei 8.213/1991.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não evidencia ofensa ao art. 535 do CPC.
3. O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com labor rurícola, como o de natureza urbana.
5. No caso concreto, o Tribunal de origem considerou algumas prova em
nome do marido da recorrida, que passou a exercer atividade urbana mas estabeleceu que fora juntada prova material em nome desta e período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário e em lapso suficiente ao cumprimento da carência, o que está e conformidade com os parâmetros estabelecidos na presente decisão.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
Assim, há início de prova material corroborada por prova testemunhal, nos termos exigidos pelo art. 55, §3º, da Lei nº 8.213/1991, em relação ao período de atividade rural de 14/05/1968 a 01/06/1977.
Com relação ao direito ao benefício, a sentença apurou que:
No caso dos autos, verifica-se que, somando ao tempo de serviço/contribuição já reconhecido administrativamente pelo INSS, o tempo de labor rural e especial reconhecidos nesta sentença, tem-se a seguinte situação:
Até 16.12.1998: 09 anos 18 dias.
Até 28.11.1999: 09 anos 18 dias.
Até 02.06.2011 (DER): 24 anos e 18 dias
Nesse contexto, verifico que no primeiro e segundo casos o Autor não faz jus à concessão de aposentadoria proporcional.
Por fim, o tempo computado na DER (02.06.2011), da mesma forma, não é suficiente à concessão de aposentadoria integral por tempo de contribuição, uma vez que a autora apenas implementou 24 anos e 18 dias de serviço.
Portanto, não cumprindo com todos os requisitos necessários, a parte autora tem direito à averbação do período ora reconhecido, para fins de obtenção de futura aposentadoria.
Mantenho os ônus sucumbenciais como estabelecidos na sentença.
Prequestionamento
Para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores dou por prequestionadas as matérias constitucionais e legais alegadas em recurso pelas partes, nos termos das razões de decidir já externadas no voto, deixando de aplicar dispositivos constitucionais ou legais não expressamente mencionados e/ou tidos como aptos a fundamentar pronunciamento judicial em sentido diverso do declinado.
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação da parte autora e à remessa oficial.
Juiz Federal Hermes Siedler da Conceição Júnior
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/06/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000349-25.2014.4.04.7130/RS
ORIGEM: RS 50003492520144047130
RELATOR | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Adriana Zawada Melo |
APELANTE | : | EUDES MARIA MARION |
ADVOGADO | : | SAMIR JOSÉ MENEGATT |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/06/2016, na seqüência 1079, disponibilizada no DE de 08/06/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal HERMES S DA CONCEIÇÃO JR |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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