APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000315-56.2013.4.04.7010/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LUIS CARLOS RANGEL |
ADVOGADO | : | DAVID CAMARGO |
: | Werner Schumann Junior |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. DENTISTA. AGENTES NOCIVOS BIOLÓGICOS. APOSENTADORIA ESPECIAL. DIB NA DATA DE AJUIZAMENTO DA AÇÃO. CONCESSÃO. LEI Nº 11.960/09. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO.
1. Reconhecido o exercício da atividade como dentista autônomo, a contagem do respectivo tempo de contribuição depende do prévio recolhimento indenizado das contribuições.
2. Comprovado o exercício da atividade de dentista com exposição habitual e permanente a agentes biológicos, a atividade especial deve ser reconhecida. Outrossim, até 28/04/1995, a atividade de dentista comporta enquadramento como especial por categoria profissional.
3. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades.
4. Preenchidos os requisitos legais da carência e 25 anos de atividade especial, o direito à aposentadoria especial é adquirido.
5. Nos casos em que implementadas as condições à jubilação em data posterior à DER, deve ser fixada a DIB, bem como a decorrência dos efeitos financeiros, a partir da data do ajuizamento da ação, nos termos do entendimento deste Regional.
6. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
7. Determinado o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias, nos termos do artigo 497, caput, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao Apelo da parte ré, dar parcial provimento à remessa oficial e determinar o cumprimento imediato do Acórdão, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de março de 2017.
Ezio Teixeira
Relator
Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8859809v6 e, se solicitado, do código CRC 1C774145. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ezio Teixeira |
Data e Hora: | 23/03/2017 14:10 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000315-56.2013.4.04.7010/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LUIS CARLOS RANGEL |
ADVOGADO | : | DAVID CAMARGO |
: | Werner Schumann Junior |
RELATÓRIO
Luis Carlos Rangel ajuizou esta ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social pleiteando a concessão do benefício de aposentadoria especial ou, alternativamente, aposentadoria por tempo de contribuição. Para tanto, requer, o reconhecimento do tempo especial de 01/04/1985 a 31/07/2010, como dentista contribuinte individual. Se necessário, pede a reafirmação da DER com o aproveitamento das contribuições posteriores. Por fim, requer a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, caso seja concedida durante o curso do processo e, ainda, lhe seja assegurado o direito de continuar exercendo sua atividade laboral de cirurgião dentista mesmo após a implantação de aposentadoria especial.
A sentença (evento 16, SENT1) julgou procedente o pedido, cujo dispositivo possui o seguinte teor:
"DISPOSITIVO.
Ante o exposto, com fundamento no art. 269, inciso I, do Código de Processo Civil, JULGO PROCEDENTE o pedido formulado na inicial, para o fim de:
a) DECLARAR ter o autor exercido atividades sob condições especiais nos períodos compreendidos entre 01/04/1985 e 30/09/1988, entre 01/11/1988 e 31/05/1990, entre 01/07/1990 e 31/01/1991, entre 01/08/1991 e 28/02/1994, entre 01/04/1994 e 30/06/2006, entre 01/11/2006 e 31/07/2010, entre 01/08/2010 e 31/01/2011 e entre 01/03/2011 e 28/05/2011, totalizando 25 anos;
b) CONDENAR o INSS a conceder ao autor o benefício previdenciário aposentadoria especial (NB 152.837.033-0), com data do início do benefício (DIB) na data em que implementou os 25 anos de tempo de contribuição exigidos, ou seja, em 28/05/2011, devendo a renda mensal ser calculada conforme legislação vigente;
d) CONDENAR o INSS, ainda, ao pagamento das verbas vencidas, entre a data de início do benefício e o início do efetivo pagamento (DIP) com juros e correção monetária, conforme índices dispostos no Novo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Os valores atrasados serão oportunamente executados, na forma de requisição, consoante determinado pelo Conselho da Justiça Federal.
Sem custas (art. 4º, inciso I, da Lei n.º 9.289/96).
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios ao patrono do autor, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas (Súmula nº 111/STJ), assim entendidas para tanto aquelas ocorridas posteriormente à prolação da sentença (RESP nº 284575/SP - STJ/5ª Turma - Rel. Min. Gilson Dipp - j. 19.06.2001 - DJ 27.08.2001, p. 388 e RESP nº 310433/SP - STJ/5ª Turma - Rel. Min. Jorge Scartezzini - j. 08.05.2001 - DJ 18.06.2001, p. 182).
Tratando-se de processo eletrônico a sentença torna-se pública no ato da assinatura e fica registrada em meio eletrônico. Intimem-se.
Sentença sujeita ao reexame necessário.
Nos termos do item 2.2 defiro pedido da parte autora de permanecer exercendo sua atividade habitual de cirurgião dentista mesmo recebendo o benefício de aposentadoria especial.
Oportunamente, nada sendo requerido, sejam feitas as anotações necessárias e remeta-se ao arquivo."
A parte ré apelou (evento 21, APELAÇÃO1). Postulou a reforma da sentença monocrática para que seja afastada a especialidade do período de labor especial da parte autora alegando que não houve exposição a agentes nocivos, nem provas do fato no período posterior a 18/08/2010. Em caso de procedência, pede o afastamento da parte autora da atividade especial.
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
ATIVIDADE ESPECIAL
O reconhecimento da atividade especial em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física do segurado deve observar a legislação vigente à época do desempenho da atividade, com base na qual passa a compor o patrimônio jurídico previdenciário do segurado, como direito adquirido. Significa que a comprovação das condições adversas de trabalho deve observar os parâmetros vigentes na época de prestação, não sendo aplicável retroativamente legislação nova que estabeleça restrições à análise do tempo de serviço especial.
Esse é o entendimento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial repetitivo 1.115.363/MG, precedente de observância obrigatória, de acordo com o art. 927 do CPC/2015. Ademais, essa orientação é regra expressa no art. 70, § 1º, do Decreto 3.048/99, na redação dada pelo Decreto 4.827/2003.
A partir dessas premissas, associadas à sucessão de leis no tratamento da matéria, é necessário definir qual a legislação em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Nesse prisma, a análise do tema deve observar a seguinte evolução legislativa:
1) Até 28/04/1995, com base na Lei nº 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original, havia presunção legal da atividade especial, de acordo com o enquadramento por ocupações ou grupos profissionais (ex.: médico, engenheiro, motorista, pintores, soldadores, bombeiros e guardas), ou por agentes nocivos químicos, físicos ou biológicos, demonstrado o desempenho da atividade ou da exposição a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído, frio e calor, para os quais é necessária a mensuração dos níveis de exposição por perícia técnica ou formulário emitido pela empresa;
2) A partir de 29/04/1995, não subsiste a presunção legal de enquadramento por categoria profissional, excepcionadas aquelas referidas na Lei 5.527/68, cujo enquadramento por categoria pode ser feito até 13/10/1996, dia anterior à MP 1.523, que revogou expressamente a Lei 5.527/68. No período compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, diante das alterações que a Lei 9.032/95 realizou no art. 57 da Lei 8.213/91, o enquadramento da atividade especial depende da efetiva exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, sendo suficiente a apresentação de formulário padrão do INSS preenchido pela empresa (SB-40, DSS-8030), sem a exigência de embasamento em laudo técnico, exceto quanto aos agentes nocivos ruído, frio e calor, que dependem da mensuração conforme visto acima;
3) A partir de 06/03/1997, o enquadramento da atividade especial passou a depender da demonstração da efetiva exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física, através de formulário padrão (DSS-8030, PPP) baseado em laudo técnico da empresa ou perícia técnica judicial demonstrando as atividades em condições especiais de modo: permanente, não ocasional, nem intermitente, por força da Lei nº 9.528/97, que convalidou a MP nº 1.523/96, modificando o artigo 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91. O Decreto nº 2.172/97 é aplicável de 06/03/1997 a 05/05/1999, sendo substituído pelo Decreto nº 3.048/99, desde 06/05/1999.
4) A partir de 01/01/2004, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) passou a ser documento indispensável para análise da atividade especial postulada (art. 148 da IN 99 do INSS, publicada no DOU de 10/12/2003). Esse documento substitui os antigos formulário e exime a apresentação de laudo técnico em juízo, desde que adequadamente preenchido, com a indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais e pela monitoração biológica.
O enquadramento das categorias profissionais deve observar os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79 somente até 28/04/1995. A partir dessa data a Lei 9.032/95 extinguiu o reconhecimento da atividade especial por presunção legal, exceto para as profissões previstas na Lei 5.527/68, que permaneceram até 13/10/1996, por força da MP 1.523.
O enquadramento dos agentes nocivos, por sua vez, deve seguir os Decretos 53.831/64, 72.771/73 e 83.080/79, até 05/03/1997, e os Decretos 2.172/97 e 3.048/99, a partir de 06/03/1997, com incidência do Decreto 4.882/2003, quanto ao agente nocivo ruído. Ainda, tais hipóteses de enquadramento não afastam a possibilidade de reconhecimento da atividade especial no caso concreto, por meio de perícia técnica, ainda que não prevista a atividade nos Decretos referidos. Esse entendimento encontra amparo na Súmula 198 do TFR, segundo a qual "atendidos os demais requisitos, é devida aposentadoria especial, se a perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em regulamento".
Para fins de reconhecimento da atividade especial, a caracterização da habitualidade e permanência, nos termos do art. 57, § 3º, da Lei 8.213/91, não exige que a exposição ocorra durante toda a jornada de trabalho. É suficiente para sua caracterização o contato cujo grau de nocividade ou prejudicialidade à saúde ou integridade física fique evidenciado pelas condições em que desenvolvida a atividade.
É perfeitamente possível o reconhecimento da especialidade da atividade, mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre. Necessário, apenas, restar demonstrado que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde.
A permanência não pode ter aplicação restrita, como exigência de contato com o agente nocivo durante toda a jornada de trabalho do segurado, notadamente quando se trata de nocividade avaliada de forma qualitativa. A exposição permanente depende de constatação do grau e intensidade no contato com o agente, com avaliação dos riscos causados à saúde do trabalhador, embora não seja por todas as horas da jornada de trabalho.
Quanto ao agente nocivo ruído, a sucessão dos decretos regulamentares indica a seguinte situação:
- Até 05.03.97: Anexo do Decreto n.º 53.831/64 (Superior a 80 dB) e Anexo I do Decreto n.º 83.080/79 (Superior a 90 dB).
- De 06.03.97 a 06.05.99: Anexo IV do Decreto n.º 2.172/97 (Superior a 90 dB).
- De 07.05.99 a 18.11.2003 Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99, na redação original (Superior a 90 dB).
- A partir de 19.11.2003: Anexo IV do Decreto n.º 3.048/99 com a alteração introduzida pelo Decreto n.º 4.882/2003 (Superior a 85 dB).
Desse modo, até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto 53.831/64. Já a partir de 06/03/1997, deve ser observado o limite de 90 dB até 18/11/2003. O nível de 85 dB somente é aplicável a partir de 19/11/2003, pois o Superior Tribunal de Justiça, em precedente de observância obrigatória (art. 927 do CPC/2015) definiu o entendimento segundo o qual os estritos parâmetros legais relativos ao nível de ruído, vigentes em cada época, devem limitar o reconhecimento da atividade especial (REsp repetitivo 1.398.260/PR), nos seguintes termos:
"O limite de tolerância para configuração da especialidade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, sendo impossível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ." (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014)
Por fim, destaco que os níveis de pressão sonora devem ser aferidos por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
Em relação aos agentes químicos, a caracterização da atividade especial não depende da análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, pois são avaliados de forma qualitativa. Os Decretos que regem a matéria não exigem patamares mínimos, para tóxicos orgânicos e inorgânicos, ao contrário do que ocorre com os agentes físicos ruído, calor, frio ou eletricidade. Nesse sentido a exposição habitual, rotineira a agentes de natureza química são suficientes para caracterizar a atividade prejudicial à saúde ou à integridade física, conforme entendimento desta Corte (TRF4, APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10/05/2010).
Quanto aos agentes biológicos a exposição deve ser avaliada de forma qualitativa, não sendo condicionada ao tempo diário de exposição do segurado. O objetivo do reconhecimento da atividade especial é proporcionar ao trabalhador exposto a agentes agressivos a tutela protetiva, em razão dos maiores riscos que o exercício do labor lhe ocasiona, sendo inerente a atividade profissional a sujeição a esses agentes insalubres.
Com relação às perícias por similaridade ou por aferição indireta das condições de trabalho, destaco que esse procedimento tem sido admitido, nos casos em que a coleta de dados in loco se mostrar impossível para a análise da atividade especial. Nesse sentido cito os seguintes precedentes desta Corte:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. [...] A jurisprudência pátria reconhece a validade da perícia técnica por similaridade para fins de comprovação do tempo de serviço especial nos casos de impossibilidade de aferição direta das circunstâncias de trabalho. (TRF4, APELREEX 0009499-10.2015.404.9999, QUINTA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, D.E. 25/08/2016)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. [...] LAUDO EXTEMPORÂNEO. SIMILARIDADE. [...] 5. A perícia técnica deve ser realizada de forma indireta, em empresa similar àquela em que laborou o segurado, quando não há meio de reconstituir as condições físicas do local de trabalho em face do encerramento das suas atividades. (TRF4 5030892-81.2012.404.7000, SEXTA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 06/07/2016)
No que tange ao uso de equipamentos de proteção individual (EPI), somente a partir de 03/12/1998 é relevante a sua consideração na análise da atividade especial. Nessa data entrou em vigor a MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/98, que alterou o art. 58, § 2º, da Lei 8.213/91, estipulando a exigência de o laudo técnico conter informações sobre a existência de tecnologia de proteção individual eficaz para diminuir a intensidade do agente nocivo a limites de tolerância e recomendação do empregador para o uso. Logo, antes dessa data é irrelevante o uso de EPI, sendo adotado esse entendimento pelo próprio INSS (IN 77/2015, art. 268, inciso III).
Ainda, é pacífico o entendimento deste Tribunal e também do Colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 462.858/RS, Relator Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, DJU de 08-05-2003) no sentido de que esses dispositivos não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovados, por meio de perícia técnica especializada, o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho e a sua real efetividade.
Quando se trata de ruído, há precedente de aplicação obrigatória, nos termos do art. 927, do CPC/2015, o qual firmou a tese de que a utilização de EPI não impede a caracterização da atividade especial por exposição ao agente ruído. Trata-se do ARE 664.355 (Tema 555 reconhecido com repercussão geral), no qual o STF firmou a tese de que a utilização de Equipamento de Proteção Individual - EPI não ilide de modo eficaz os efeitos nocivos do agente físico ruído, porquanto não se restringem aos problemas relacionados às funções auditivas, restando assentado que mesmo na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no PPP, no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
No caso de exposição a hidrocarbonetos, "o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais" (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011).
FONTE DE CUSTEIO
Não deve ser acolhida a tese comumente apresentada pelo INSS, a respeito da ausência de fonte de custeio para o reconhecimento da atividade especial, em razão do fornecimento de equipamentos de proteção individual pelo empregador e ausência de indicação do código de recolhimento no campo GFIP do PPP.
De acordo com o art. 195 da Constituição Federal de 1988, a seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, com base numa pluralidade de fontes de custeio. Nesse sentido a previsão de fonte de financiamento nas contribuições a cargo da empresa (art. 57, § 6º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 22, II, da Lei 8.212/91) não configura óbice à análise da aposentadoria especial e da conversão de tempo especial em comum, na medida em que o RGPS é regime de repartição e não de capitalização, no qual a cada contribuinte corresponde um fundo específico de financiamento do seguro social.
Ademais, o benefício de aposentadoria especial foi estipulado pela própria Constituição Federal (art. 201, § 1º, c/c art. 15 da EC 20/98), o que implica a possibilidade de sua concessão independente da identificação da fonte de custeio (STF, AI 553.993). Logo, a regra à específica indicação legislativa da fonte de custeio é dirigida à legislação ordinária posterior que venha a criar novo benefício ou a majorar e estender benefício já existente.
Da mesma forma, se estiver comprovado o trabalho em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, a ausência do código ou indicação equivocada no campo GFIP do PPP não impede o reconhecimento da atividade especial. Isso porque o INSS possui os meios necessários para fiscalizar irregularidades na empresa, não podendo ser o segurado responsabilizado por falha do empregador.
Por fim, o recolhimento das contribuições previstas nos arts. 57, §§ 6º e 7º, da Lei 8.213/91 e art. 22, II, da Lei 8.212/91, compete ao empregador, de acordo com o art. 30, I, da Lei 8.212/91, motivo pelo qual a ausência do recolhimento não pode prejudicar o segurado.
Assim, a tese do INSS não deve ser acolhida.
TEMPO DE ATIVIDADE ESPECIAL NO CASO CONCRETO
No ponto, assim decidiu o magistrado a quo:
"A pretensão do autor consubstancia-se no reconhecimento do tempo de serviço especial compreendido no período de 01/04/1985 a 31/07/2010, período em que verteu contribuições ao RGPS como contribuinte individual, exercendo a função de cirurgia dentista.
Importante registrar que, dentro desse período, há alguns meses nos quais não houve recolhimento, de forma que não é possível computar como tempo de contribuição todo o período, devendo ser deduzidos aqueles meses sem contribuição, conforme especificado na planilha anexa.
Sobre o reconhecimento da atividade do dentista como especial, não resta dúvida, conforme colhe-se da jurisprudência do TRF4:
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES BIOLÓGICOS. DENTISTA. PROVA. APOSENTADORIA ESPECIAL. CONCESSÃO. 1. A 3ª Seção desta Corte fixou o entendimento de que não há necessidade de exposição permanente ao risco decorrente de agentes infecto-contagiosos para a caracterização do direito à aposentadoria especial (EINF 2007.71.00.046688-7). 2. Adoção do entendimento do TRF/4ª Região de que o art. 57, § 8º, da Lei 8.213/91, é inconstitucional.
(TRF4, APELREEX 5005914-86.2012.404.7114, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz, D.E. 25/10/2013).
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL POSTERIOR A 28-04-95. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL: DENTISTA. VIABILIDADE DO RECONHECIMENTO. CARACTERIZAÇÃO DA NATUREZA ESPECIAL DO TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM TELA. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. O contribuinte individual não está excluído do conjunto de segurados que têm direito à aposentadoria especial. Comprovado, mediante perícia, o exercício, em caráter habitual e permanente, de atividades prejudiciais à saúde do segurado, impõe-se o reconhecimento da natureza especial de seu tempo de contribuição. Comprovado que, na data de concessão de sua aposentadoria por tempo de contribuição, o segurado tinha direito à aposentadoria especial, mais vantajosa, impõe-se a implantação desta, em substituição àquela.
(TRF4, AC 5017379-80.2011.404.7000, Quinta Turma, Relator p/ Acórdão Sebastião Ogê Muniz, D.E. 15/10/2013).
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADES NOCIVAS À SAÚDE HUMANA. PROFISSIONAL DENTISTA. CONTATO COM MICROORGANISMOS VIVOS E SUAS TOXINAS. POSSIBILIDADE REAL DE CONTRAIR MOLÉSTIAS INFECTO-CONTAGIOSAS DE ALTO PODER DESTRUTIVO. CUMPRIDOS OS DEMAIS REQUISITOS PREVISTOS NO ART. 57 DA LEI Nº 8.213/1991 E ALTERAÇÕES, JUSTIFICADA A CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. Do simples contato com um paciente portador de moléstia infecto-contagiosa, pode o profissional dentista adquirir doenças de cura improvável. Afinal, o cirugião-dentista labora diretamente na cavidade oral de seus clientes, em todos os procedimentos que realiza, estando em contato direto com microorganismos vivos e suas toxinas. Nem mesmo a utilização dos equipamentos de proteção, ainda que altamente recomendável, é capaz de eliminar os riscos inerentes à referida atividade profissional. Reconhecimento do direito à aposentadoria especial, em todas as conseqüências jurídicas e financeiras. (TRF4, AC 5027391-56.2011.404.7000, Quinta Turma, Relatora p/ Acórdão Maria Isabel Pezzi Klein, D.E. 25/04/2013)
Lembre-se que até 28/04/1995 era permitido o reconhecimento da atividade especial pelo mero enquadramento da atividade profissional e, a função de dentista estava prevista nos Anexos dos Decretos 53.831/64 (item 1.3.2) e 83.080/79 (item 1.3.4).
Depois dessa data necessária a prova da efetiva sujeição do segurado a algum agente nocivo. Para tanto, o autor apresentou já no processo administrativo Laudo Técnico das Condições Ambientais de Trabalho (LTCAT) (fls. 35/42, evento 1 - PROCADM16), demonstrando que durante todo o período pleiteado ele exerceu a atividade de dentista, o que é corroborado por vários outros documentos como, por exemplo, diploma universitário, fichas individuais de vários pacientes, alvará expedido pela Prefeitura de Campo Mourão referente a atividade exercida etc.
A propósito do laudo técnico apresentado, chegou-se à conclusão que o autor (...) exerce suas atividades exposto em caráter habitual e permanente, não ocasional nem intermitente ao agente gerador de RiscoOcupacional: Riscos Biológicos e em caráter ocasional ao agente: Risco Químico (...)
Portanto, nada há que pudesse impedir o reconhecimento da atividade especial do autor durante todo o período pleiteado. Nem mesmo o fato de ser contribuinte individual. Aliás, de tão debatida essa questão, a TNU sumulou a matéria nos seguintes termos:
Súmula 62. O segurado contribuinte individual pode obter reconhecimento de atividade especial para fins previdenciários, desde que consiga comprovar exposição a agentes nocivos à saúde ou à integridade física.
Nesse contexto, considerando a documentação apresentada, entendo ser possível reconhecer como especial os seguintes períodos, nos quais houve efetiva contribuição como contribuinte individual:
(...)
Esses períodos somam, até 31/07/2010, o total de 24 anos, 3 meses e 1 dia. Assim, pelo menos até a DER (04/08/2010) não é possível conceder aposentadoria especial, para a qual a legislação exige 25 anos de efetiva exposição a agentes nocivos.
O documento denominado ALV8, contido no evento 1 (certidão de inteiro teor nº 495/2011), expedido pela Prefeitura de Campo Mourão, mais precisamente pela Secretaria de Fazenda, datada de 14/07/2011, informa que até aquela data o autor continuava exercendo o ramo de atividade 'Consultório Odontológico'.
Significa dizer que, pelo menos até a data desse documento, o autor continuou exercendo a função de dentista e, presumivelmente, submetendo-se às mesmas condições de trabalho do que aquelas atestadas pelo LTCAT já referido.
Assim, mesmo sendo aludido laudo datado de 18/08/2010 entendo, na específica hipótese dos autos, ser possível reconhecer como especial o tempo de serviço laborado até a data da certidão referida no parágrafo anterior (14/07/2011).
Entretanto, considerando que para fechar os 25 anos de tempo de serviço especial o autor precisa apenas de mais 8 meses e 29 dias, estendo essa presunção apenas até a data de 28/05/2011.
Observe-se que, conforme consta do CNIS do autor - consultado por ocasião da prolação desta sentença - ele tem contribuições - depois da competência julho/2010 - até a competência outubro/2013, com exceção do mês de fevereiro/2012, de sorte que o período posterior ao mês de julho de 2010 pode, efetivamente, ser contabilizado em seu favor. Veja-se a nova contagem:
Data inicial | Data Final | Fator | Conta p/ carência ? | Tempo |
01/04/1985 | 30/09/1988 | 1,00 | Sim | 3 anos, 6 meses e 0 dia |
01/11/1988 | 31/05/1990 | 1,00 | Sim | 1 ano, 7 meses e 1 dia |
01/07/1990 | 31/01/1991 | 1,00 | Sim | 0 ano, 7 meses e 1 dia |
01/08/1991 | 28/02/1994 | 1,00 | Sim | 2 anos, 6 meses e 28 dias |
01/04/1994 | 30/06/2006 | 1,00 | Sim | 12 anos, 3 meses e 0 dia |
01/11/2006 | 31/07/2010 | 1,00 | Sim | 3 anos, 9 meses e 1 dia |
01/08/2010 | 31/01/2011 | 1,00 | Sim | 0 ano, 6 meses e 1 dia |
01/03/2011 | 28/05/2011 | 1,00 | Sim | 0 ano, 2 meses e 28 dias |
Até 28/05/2011 | 25 anos, 0 meses e 0 dias |
Como se vê, na condição de cirurgião dentista, o autor sempre esteve exposto a agentes nocivos de natureza biológica, constituídos por microorganismos vivos e suas toxinas o que, nos termos da jurisprudência colacionada, constitui-se numa real possibilidade de contrair doenças infecto-contagiosas, sendo esse risco potencial suficiente para atribuir-lhe direito à aposentadoria especial.
Assim, o autor faz jus à aposentadoria especial pleiteada.
Considerando que o autor faz pedido 'alternativo' de aposentadoria por tempo de contribuição, este só seria analisado caso a aposentadoria especial não fosse concedida."
Mantenho a Sentença, pelos seus fundamentos, pois de acordo com o entendimento desse Juizo, pelo reconhecimento do tempo de serviço especial pelo segurado autônomo, e a exposição indissociável ao labor do Dentista de agentes danosos a saúde de origem biológica (Microorganismos e parasitas infecciosos vivos e suas toxinas). Além, disso até a vigência da Lei n. 9.032/95 deve ser admitido o tempo de serviço especial com base na categoria profissional inserida no código 2.1.3 do Decreto n. 53.831/64 e código 2.1.3 do Decreto n. 83.080/79.
Pode-se admitir que algumas das funções não estivessem expostas a agentes insalubres, porém, no conjunto era indissociável a sujeição a agentes insalutíferos biológicos.
Quanto à tese do INSS de ausência de habitualidade e permanência, o autor trabalhava como dentista autônomo, prestando serviços odontológicos que o expunham, diuturnamente, ao contato com agentes biológicos, o que é suficiente para caracterizar exposição habitual e permanente. O risco de contágio é indissociável das atividades diárias do autor, que efetivamente atuava na prestação dos serviços como dentista, à medida que os pacientes atendidos poderiam estar acometidos de doenças infectocontagiosas. Logo, o contato habitual e permanente faz parte da rotina de trabalho do autor como dentista.
Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades.
Por tais razões, mantenho a sentença monocrática, reconhecendo o tempo de serviço especial de 01/04/1985 a 30/09/1988, 01/11/1988 a 31/05/1990, 01/07/1990 a 31/01/1991, 01/08/1991 a 28/02/1994, 01/04/1994 a 30/06/2006, 01/11/2006 a 31/07/2010, 01/08/2010 a 31/01/2011 e 01/03/2011 a 28/05/2011.
DIREITO À CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL
A Aposentadoria Especial é modalidade de aposentadoria por tempo de serviço, apenas com a diminuição do período a ser laborado, tendo em vista o acréscimo de risco à saúde do trabalhador que exerce seu labor em condições insalubres, perigosas ou penosas. Encontra previsão no art. 201, § 1º, da Constituição Federal de 1988:
"Art. 201. § 1º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos beneficiários do regime geral de previdência social, ressalvados os casos de atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e quando se tratar de segurados portadores de deficiência, nos termos definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 47, de 2005)"
Para adquirir o direito à aposentadoria especial, a parte autora deverá preencher os requisitos previstos no art. 57 da Lei 8.213/91, quais sejam, a carência prevista nos arts. 25 e 142 da referida lei e o tempo de trabalho sob condições prejudiciais à saúde ou à integridade física, durante 15, 20 ou 25 anos, não cabendo conversão de tempo de serviço especial em comum, pois o requisito exigido é o tempo de trabalho mínimo em atividade especial.
No caso dos autos, considerando o tempo de serviço especial reconhecido nesta ação, somado ao já averbado administrativamente, a parte autora atinge, até 28/05/2011, 25 anos de tempo de serviço sob condições especiais de trabalho, suficientes para a concessão de aposentadoria especial postulada.
De acordo com o art. 29, II, da Lei 8.213/91, não incide o fator previdenciário no benefício de aposentadoria especial.
DA CONTINUIDADE DA ATIVIDADE ESPECIAL APÓS APOSENTADO
A Corte Especial deste Tribunal (Incidente de Arguição de Inconstitucionalidade n.º 5001401-77.2012.404.0000, Rel. Des. Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 24/05/2012) decidiu pela inconstitucionalidade do § 8º do art. 57 da Lei de Benefícios, (a) por afronta ao princípio constitucional que garante o livre exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5.º, XIII, da Constituição Federal de 1988; (b) porque a proibição de trabalho perigoso ou insalubre existente no art. 7.º, XXXIII, da Constituição Federal de 1988, só se destina aos menores de dezoito anos, não havendo vedação ao segurado aposentado; e (c) porque o art. 201, § 1.º, da Carta Magna de 1988, não estabelece qualquer condição ou restrição ao gozo da aposentadoria especial, assegurada, portanto, à parte autora a possibilidade de continuar exercendo atividades laborais sujeitas a condições nocivas após a implantação do benefício.
Ressalta-se que não se desconhece que a questão acerca da possibilidade de percepção do benefício da aposentadoria especial na hipótese em que o segurado permanece no exercício de atividades laborais nocivas à saúde teve a repercussão geral reconhecida pelo STF no julgamento do RE 788092 (Tema 709). Não se desconhece, também, das razões invocados pelo ilustre relator, Min. Dias Toffoli, no sentido da constitucionalidade da referida regra, insculpida no § 8º do art. 57 da Lei 8.213/1991. Entretanto, pelos fundamentos acima declinados, filio-me ao entendimento da Corte Especial deste Tribunal até que haja o pronunciamento definitivo pela Suprema Corte.
Assim, cumpridas as exigências do artigo 57 da Lei n.º 8.213/91, deve o INSS conceder o benefício ora pretendido à parte autora, independente do afastamento do trabalho, no que reformo a sentença monocrática nesse ponto.
TERMO INICIAL DA CONDENAÇÃO
Quanto à data de início do benefício, cumpre referir que esta Corte tem considerado, via de regra, que os efeitos financeiros devem retroagir à data de entrada do requerimento de concessão do benefício, desimportando se naquela ocasião o feito foi instruído adequadamente, ou mesmo se continha, ou não, pleito de reconhecimento do tempo de serviço especial posteriormente admitido na via judicial, sendo relevante para essa disposição o fato de a parte, àquela época, já ter incorporado ao seu patrimônio jurídico o benefício nos termos em que deferido. Saliento que tal não se aplica apenas naquelas hipóteses em que, além de não haver pedido específico de verificação da especialidade quando do requerimento, tampouco juntada de documentação que a pudesse comprovar, for absolutamente inviável, em face da atividade exercida, a consideração prévia da possibilidade de reconhecimento da especialidade. Nesse sentido, o voto do Desembargador Celso Kipper, com ressalva de fundamentação, na AC n. 5015673-92.2012.404.71-08/RS, de que fui Relator, julgada em 03-07-2013.
Contudo, nos casos em que implementadas as condições à jubilação em data posterior à DER, deve ser fixada a DIB, bem como a decorrência dos efeitos financeiros, a partir da data do ajuizamento da ação, nos termos do entendimento deste Regional:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE RURAL. CONTAGEM A PARTIR DOS 12 ANOS DE IDADE. INÍCIO DE PROVA MATERIAL CORROBORADO POR TESTEMUNHAS. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO POR CATEGORIA PROFISSIONAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REGRAS PERMANENTES. REQUISITOS IMPLEMENTADOS ATÉ O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. ART. 462 DO CPC. TUTELA ESPECÍFICA. 1. O tempo de serviço rural para fins previdenciários, a partir dos 12 anos de idade, pode ser demonstrado através de início de prova material, complementado por prova testemunhal idônea. Precedentes da Terceira Seção desta Corte e do egrégio STJ. 2. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em comum. 3. Quanto à atividade de vigia/vigilante, a Terceira Seção desta Corte firmou entendimento no sentido de que se trata de função idêntica a de guarda (Código 2.5.7 do Quadro Anexo ao Decreto 53.831/64), razão pela qual é devido o enquadramento dessa atividade como especial, por categoria profissional, até 28-04-1995. Somente a partir de 29-04-1995 passou a ser necessária a demonstração de efetiva exposição a agentes prejudiciais à integridade física, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, para fins de reconhecimento da especialidade dessa atividade. 4. Constando dos autos a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais pela parte autora em parte dos períodos postulados, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho, deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 5. Levando-se em conta o disposto no art. 462 do CPC, tem-se que o tempo de serviço após a data do requerimento administrativo de aposentadoria pode ser considerado para fins de provimento jurisdicional, devendo a data de início do benefício (DIB), todavia, ser fixada na data do ajuizamento da ação. No caso, implementados os requisitos de tempo de contribuição e carência, tem direito a parte autora à aposentadoria por tempo de contribuição, nos termos dos artigos 56 e seguintes do Dec. n.º 3.048/99, a contar da data do ajuizamento da presente demanda (DIB). 6. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 461 do CPC, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, APELREEX 5052632-23.2011.404.7100, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão João Batista Pinto Silveira, D.E. 28/02/2013) (grifei)
Nessas condições, o benefício de aposentadoria especial é devido à parte autora desde a data de ajuizamento da ação, no caso, desde 28/01/2013.
CONSECTÁRIOS. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016)
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrondevem ser fixados em 10% sobre o valor da condenação, excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência".
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
TUTELA ESPECÍFICA
O CPC/2015 aprimorou a eficácia mandamental das decisões que tratam de obrigações de fazer e não fazer e reafirmou o papel da tutela específica. Enquanto o art. 497 do CPC/2015 trata da tutela específica, ainda na fase cognitiva, o art. 536 do CPC/2015 reafirma a prevalência da tutela específica na fase de cumprimento da sentença. Ainda, os recursos especial e extraordinário, aos quais está submetida a decisão em segunda instância, não possuem efeito suspensivo, de modo que a efetivação do direito reconhecido pelo tribunal é a prática mais adequada ao previsto nas regras processuais civis. Assim, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora (NB 155.472.721-6), a ser efetivada em 45 dias.
Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
CONCLUSÃO
Negado provimento ao Apelo da parte ré.
Parcialmente provida a remessa oficial.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao Apelo da parte ré, dar parcial provimento à remessa oficial e determinar o cumprimento imediato do Acórdão.
Ezio Teixeira
Relator
Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8859808v13 e, se solicitado, do código CRC 8FA37C45. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Ezio Teixeira |
Data e Hora: | 23/03/2017 14:10 |
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/03/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5000315-56.2013.4.04.7010/PR
ORIGEM: PR 50003155620134047010
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | Dr. Davi Camargo (Videoconferência de Campo Mourão) |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | LUIS CARLOS RANGEL |
ADVOGADO | : | DAVID CAMARGO |
: | Werner Schumann Junior |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/03/2017, na seqüência 995, disponibilizada no DE de 08/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DA PARTE RÉ, DAR PARCIAL PROVIMENTO À REMESSA OFICIAL E DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8901106v1 e, se solicitado, do código CRC D1167DE8. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
Data e Hora: | 23/03/2017 09:43 |