| D.E. Publicado em 04/04/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000220-34.2014.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | SALVADOR JOSE AMADO |
ADVOGADO | : | Claudio Sidiney de Lima |
: | Micheli de Lima Rodrigues |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMPO RURAL. COMPROVAÇÃO. PERÍODO POSTERIOR A 31/10/1991. NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO. CARÊNCIA. REQUISITO. NÃO CUMPRIMENTO.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.
2. O cômputo do tempo de serviço rural posterior a 31/10/1991 depende do aporte contributivo na qualidade de segurados facultativos, a teor dos artigos 39, II, da LBPS, e 25, § 1º, da Lei n. 8.212/91.
3. Não cumprido o requisito da carência, a parte autora tem direito à averbação dos períodos reconhecidos, para fins de obtenção de futura aposentadoria.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre/RS, 29 de março de 2017.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8790030v5 e, se solicitado, do código CRC F225B893. | |
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| Signatário (a): | Salise Monteiro Sanchotene |
| Data e Hora: | 30/03/2017 09:27 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000220-34.2014.4.04.9999/PR
RELATORA | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | SALVADOR JOSE AMADO |
ADVOGADO | : | Claudio Sidiney de Lima |
: | Micheli de Lima Rodrigues |
RELATÓRIO
Salvador José Amado propôs ação ordinária contra o Instituto Nacional de Seguro Social - INSS, em 24/8/2010 (fl. 2), postulando a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, a contar da data de entrada do requerimento administrativo, formulado em 4/1/2011 (fl. 24), mediante o reconhecimento do exercício de labor rural no período compreendido entre os anos de 1964 a 2010. Subsidiariamente, pleiteia a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
Em 25/4/2013 sobreveio sentença (fls. 113/115) que julgou procedente o pedido formulado na inicial, reconhecendo o exercício de labor rural, em regime de economia familiar, no período compreendido entre 1/1/1964 a 1/1/2010 e concedendo o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição a contar da DER. Ao final, condenou a autarquia ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios arbitrados em R$ 1.000,00 (um mil reais).
Inconformada a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação (fls. 120/129) defendendo a impossibilidade de proceder à concessão do benefício uma vez que não foi preenchido o requisito da carência. Destacou também, que após 1991 se faz necessária a comprovação da efetiva indenização dos períodos de labor rural. Salientou ainda, a ausência de provas materiais, corroboradas por prova testemunhal idônea, capazes de demonstrar o efetivo desempenho de atividade rural, em regime de economia familiar, na integralidade do período que restou reconhecido na sentença. Ao final buscou, em caso de manutenção da sentença, a necessidade de reconhecimento da ocorrência da prescrição e a modificação dos índices de correção monetária e juros de mora aplicados.
Com contrarrazões ao recurso (fls. 132/140), vieram os autos a este Tribunal para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições aplicar-se-ão, desde logo, aos processos pendentes, ficando revogada a Lei 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Remessa oficial
À luz do que preconiza o artigo 475 do CPC/1973 e atual artigo 496 do CPC/2015 é cabível a remessa necessária contra as pessoas jurídicas de direito público. Excepciona-se a aplicação do instituto, quando por meros cálculos aritméticos é possível aferir-se que o montante da condenação imposta à Fazenda Pública é inferior àquele inscrito na norma legal (v.g. o artigo 475, § 2º, do CPC/1973 e artigo 496, § 3º, do CPC). Todavia, não sendo possível verificar, de plano, se o valor da condenação excede ou não o limite legal, aplica-se a regra geral do reexame necessário.
Na hipótese, tenho por interposta a remessa oficial.
Prescrição
O prazo prescricional de cinco anos está previsto no artigo 103, parágrafo único, da Lei 8.213/1991, conforme redação dada pela Lei 9.528/1997.
No caso dos autos, não constitui objeto do pedido nenhuma parcela atingida pela prescrição, uma vez que o requerimento administrativo foi protocolado em 4/1/2011 (fl. 24), e esta ação foi ajuizada em 24/8/2011 (fl. 2), restando improvido o apelo do INSS, no tópico.
Passo ao exame do mérito.
Atividade rural
Para a comprovação do tempo de atividade rural com vista à obtenção de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, é preciso existir início de prova material, não sendo admitida, em regra, prova exclusivamente testemunhal (artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91 e Súmula 149 do STJ).
A respeito do assunto, encontra-se longe de mais alguma discussão, no âmbito dos tribunais, a necessidade de que o período de tempo de atividade seja evidenciado por documentos que informem, a cada ano civil, o seu exercício (TRF4: AC 2003.04.01.009616-5, 3ª Seção, Relator Desembargador Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 19/11/2009; EAC 2002.04.01.025744-2, 3ª Seção, Relator para o Acórdão Desembargador Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, julgado em 14/6/2007; EAC 2000.04.01.031228-6, 3ª Seção, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, DJU 9/11/2005). Também já está fora de qualquer dúvida, a possibilidade de que os documentos civis, como certificado de alistamento militar, certidões de casamento e de nascimento, em que consta a qualificação, como agricultor, do autor da ação, assim como de seu cônjuge ou de seus pais (Súmula 73 deste Tribunal), constituem início de prova material (STJ, AR 1166/SP, 3ª Seção, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 26/2/2007; TRF4: AC 2003.71.08.009120-3/RS, 5ª Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 20/5/2008; AMS 2005.70.01.002060-3, 6ª Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, DJ 31/5/2006).
A prova material, conforme o caso pode ser suficiente à comprovação do tempo de atividade rural, bastando, para exemplificar, a existência de registro contemporâneo em Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS de contrato de trabalho como empregado rural. Em tal situação, em tese, não haveria necessidade de inquirir testemunhas para a comprovação do período registrado.
Na maioria dos casos, porém, a documentação apresentada é insuficiente à comprovação do tempo de atividade rural, do que resulta a habitual complementação por meio do depoimento de testemunhas.
Em razão disso, a qualidade do início de prova material não pode ser isoladamente avaliada sem que seja compreendido o contexto probatório, a que se aduz, em regra, a produção da prova oral. Decorre dessa orientação, que a diversidade de documentos que podem constituir início de prova material impõe conclusões judiciais igualmente distintas, sem que para tanto deva existam premissas invariáveis como, aparentemente, poderia constituir a obrigatoriedade de presença nos autos de documentos relacionados ao começo do período a ser comprovado, ou, ainda, a retroação da eficácia temporal, de modo fixo, a um número restrito de anos.
A irradiação temporal dos efeitos do início de prova material dependerá do tipo de documento, das informações nele contidas (havendo distinções conforme digam respeito ao próprio autor da ação, ou a terceiros) e das circunstâncias que envolvem o quadro fático descrito no processo.
Por fim, registre-se que os documentos apresentados em nome de terceiros, sobretudo quando relacionados à respectiva titularidade dos pais ou do cônjuge, consubstanciam admitido início de prova material do trabalho rural.
Com efeito, como o artigo 11, §1º, da Lei 8.213/1991, define regime de economia familiar como a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes, deverá ser cauteloso o exame da prova, na medida em que, no mais das vezes, os atos negociais do grupo parental são formalizados, não individualmente, mas em nome do pai da família ou cônjuge masculino, que naturalmente representa a todos.
Essa compreensão está sintetizada na Súmula 73 do Tribunal Regional Federal da 4ª Região: Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Por fim, a respeito do trabalhador rurícola boia-fria, o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.321.493-PR, recebido pela Corte como recurso representativo da controvérsia, traçou as seguintes diretrizes:
RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. SEGURADO ESPECIAL. TRABALHO RURAL. INFORMALIDADE. BOIAS-FRIAS. PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL. ART. 55, § 3º, DA LEI 8.213/1991. SÚMULA 149/STJ. IMPOSSIBILIDADE. PROVA MATERIAL QUE NÃO ABRANGE TODO O PERÍODO PRETENDIDO. IDÔNEA E ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA. NÃO VIOLAÇÃO DA PRECITADA SÚMULA.
1. Trata-se de Recurso Especial do INSS com o escopo de combater o abrandamento da exigência de produção de prova material, adotado pelo acórdão recorrido, para os denominados trabalhadores rurais boias-frias.
2. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC.
3. Aplica-se a Súmula 149/STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeitos da obtenção de benefício previdenciário") aos trabalhadores rurais denominados "boias-frias", sendo imprescindível a apresentação de início de prova material.
4. Por outro lado, considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal.
5. No caso concreto, o Tribunal a quo, não obstante tenha pressuposto o afastamento da Súmula 149/STJ para os "boias-frias", apontou diminuta prova material e assentou a produção de robusta prova testemunhal para configurar a recorrida como segurada especial, o que está em consonância com os parâmetros aqui fixados.
6. Recurso Especial do INSS não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ.
No referido julgamento, o STJ manteve decisão proferida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região que concedeu aposentadoria por idade rural a segurado que, havendo completado a idade necessária à concessão do benefício em 2005 (sendo, portanto, o período equivalente à carência de 1993 a 2005), apresentou, como prova do exercício da atividade agrícola, sua carteira de trabalho (CTPS), constando vínculo rural no intervalo de 01 de junho de 1981 a 24 de outubro de 1981, entendendo que o documento constituía início de prova material.
Conquanto o acórdão acima transcrito aprecie benefício diverso do postulado na presente demanda, as diretrizes fixadas pelo Superior Tribunal de Justiça em relação ao início de prova material também devem ser observadas para os casos de cômputo de tempo rural como boia-fria para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
O autor, nascido em 31/12/1950, filho de Izaias José Amado e Laurentina Maria amado (fl. 26), buscou o reconhecimento do exercício de trabalho rural no período compreendido entre os anos de 1964 a 2010, o qual restou reconhecido na sentença delimitado ao interregno de 1/1/1964 a 1/1/2010.
Cumpre referir que de acordo com o Resumo de documentos para cálculo do tempo de contribuição (fls. 57/63) a parte autora efetuou recolhimentos, na qualidade de pedreiro autônomo (fls. 46/49), nos interregnos de 1/1/1980 a 31/10/1980, 1/4/1981 a 30/5/1981, 1/9/1983 a 30/3/1983, 1/12/1986 a 31/3/1989, 1/4/2001 a 30/4/2001, 1/6/2007 a 31/8/2008 e de 1/10/2008 a 4/1/2011 em relação aos quais improcede o pedido de averbação como tempo rural, devendo ser provido o apelo do INSS e a remessa oficial, no ponto.
Nestes termos remanesce a controvérsia acerca da possibilidade de reconhecimento como tempo rural exercido nos lapsos de 1/1/1964 a 31/8/1980, 1/11/1980 a 31/3/1981, 1/6/1981 a 31/8/1983, 1/4/1983 a 30/11/1986, 1/4/1989 a 31/3/2001, 1/5/2001 a 31/5/2007 e de 1/9/2008 a 30/9/2008.
Para comprovar o efetivo trabalho agrícola, foram trazidos aos autos alguns documentos, dentre os quais se destacam:
a) Certidão de casamento do autor, ocorrido em 5/6/1976, na qual ele está qualificado como lavrador (fl. 27);
b) Certidões de nascimento de Elias dos Santos Amado, ocorrido em 24/3/1982, e de William dos Santos Amado, ocorrido em 18/4/1984, filhos do autor, nas quais ele está qualificado como lavrador (fls. 28/29)
c) Cédula rural pignoratícia, expedida em 1980, em nome do autor, referente aos anos de 1981/1982 (fls. 32/33);
d) Contrato de parceria agrícola celebrado pelo autor no ano de 1976, pelo prazo de dois anos (fl. 34);
e) Notas fiscais de entrada de produtos rurais expedidas em nome do pai do autor, referentes ao ano de 1987 (fls. 43/44).
Veio aos autos, ainda, a declaração prestada por José Leite da Silva (fls. 35/39) dando conta que o autor trabalhou como bóia-fria, juntamente com sua família, em sua propriedade, entre os anos de 1989 e 1998. Igualmente, Elita Macedo Rocha (fls. 40/42) declarou que o autor trabalhou como bóia-fria, juntamente com sua família, em terras de sua propriedade, entre os anos de 1999 e 2010. Tais declarações, contudo, não consubstanciam início de prova material, uma vez que constituem mera manifestação unilateral, reduzida a termo, não sujeita ao crivo do contraditório.
No que se refere à prova oral, na Justificação Administrativa (fls. 51/52) foi tomado o depoimento pessoal do autor no qual ele declarou, em suma, que trabalhou como parceiro entre os anos de 1976 e 1978 e como bóia-fria no restante do período e que se mantém laborando no campo até agora, nunca tendo se afastado destas lides, informou que tocou roça uns dois anos na propriedade do senhor Antônio Tino, na estrada do Pavão e Juruna e que ainda trabalhou vários anos para José Leite da Silva e para Elita Macedo Rocha como bóia-fria, sendo que ia trabalhar a pé, de bicicleta ou de carroça com tração animal, informou que sempre trabalhou juntamente com sua esposa, no lote do senhor Antônio Tino lidava com algodão, milho e manmona e na condição de bóia-fria lidava nos serviços de capina, colheita e outros, a produção se destinava ao comércio e ao consumo próprio, não possuía outra fonte de renda.
Além disso, na esfera judicial foi tomado novo depoimento do autor e foram ouvidas testemunhas (mídia juntada na fl. 97), de cujos depoimentos se extrai, em suma, o seguinte:
O autor declarou que sempre trabalhou sem carteira assinada, fazendo diária para várias pessoas até 2010, mais ou menos, tinha carnê do INSS por alguns períodos, morava até 1971 na Bahia, onde plantava mandioca e fazia farinha, quando chegou aqui foi trabalhar na fazenda do Paulistinha, junto com os pais, em 1976 casou e foi trabalhou por dois anos no Paraná, depois voltou e seguiu trabalhando como diarista, geralmente no algodão, em diversas propriedades da região, sempre morou na região de Ouro Verde, hoje trabalha fazendo bicos com pedreiro na cidade e eventualmente na roça como diarista.
João Ferreira dos Santos afirmou que conhece o autor há bastante tempo, sabe que ele é lavrador desde que o conhece, é vizinho do autor desde 1980, sabe que autor parou de trabalhar por volta do ano de 2010, hoje trabalha bem pouco, sabe que ele trabalhou em diversas propriedades da região, nunca trabalhou na cidade, o autor mora em Ouro Verde em uma casa de tamanho médio, não tem propriedade rural, a esposa do autor trabalha na prefeitura como cozinheira, os filhos trabalham em São Paulo.
Alcides Marcionado, por sua vez, disse que é vizinho do autor, o autor trabalha na roça a mais de trinta anos, via o autor trabalhando na roça em roças de café, moram no Ouro Verde a mais de trinta anos, plantavam café, feijão, milho, mandioca, o autor nunca trabalhou na cidade, a esposa do autor trabalha na escola de Ouro Verde, o autor sobrevive do trabalho como volante e com a ajuda da esposa, hoje ele trabalha pouco porque tem a pressão alta.
Os documentos apresentados constituem início razoável de prova material do labor rural nos períodos indicados porque denotam a vinculação do autor e de sua família ao meio rural e, para complementá-los, foram ouvidas testemunhas, cujos depoimentos confirmaram de modo coerente e seguro o desempenho de atividade agrícola, na condição de bóia-fria, nos lapsos temporais em questão.
De resto, não se exige comprovação documental ano a ano do período que se pretende comprovar, tampouco se exige que os documentos apresentados estejam todos em nome do próprio autor, vez que a atividade rural pressupõe a idéia de continuidade e não de eventualidade, sendo ilógico exigir um documento para cada ano trabalhado.
Deve ser ressaltado que já foi decidido pela Terceira Seção desta Corte, que "é possível o cômputo da atividade agrícola em todo o período anterior ao primeiro documento juntado nos autos" (Embargos Infringentes 2004.71.00.045760-5, 3ª Seção, Desembargador Federal Celso Kipper, por unanimidade, D.E. 15/12/2011), mormente nos casos em que, como o dos autos, há prova testemunhal confirmando o labor rural no período em questão.
Destaco que os períodos em que efetuou recolhimentos na condição de autônomo não são capazes de inviabilizar o reconhecimento do labor rural nos períodos em questão uma vez que em famílias de tradição rurícola, na medida em que os filhos vão atingindo a idade adulta, eles vão procurando colocar-se no mercado de trabalho, uma vez que a vida no campo é dura e o retorno financeiro é pequeno. Ocorre que a adaptação à realidade urbana e a própria inserção no mercado de trabalho dos indivíduos egressos do meio rural, de regra, não se dá de forma imediata, sendo casuística a situação em que se abandone as lidas rurícolas em um dia para, no dia seguinte, assumir posto como empregado urbano. No mais das vezes, dada a pouca escolaridade, suas tentativas de trabalho formal são inexitosas, o que os obriga a retornar para o campo, até que nova oportunidade de trabalho lhes seja propiciada.
De mais a mais, a prova testemunhal produzida, permite o reconhecimento da presunção de continuidade de labor na época pleiteada, ainda que interrompida por pequenos lapsos temporais.
Assim, considerando-se o elenco probatório produzido, julgo comprovado o exercício da atividade rural nos períodos de 1/1/1964 a 31/8/1980, 1/11/1980 a 31/3/1981, 1/6/1981 a 31/8/1983, 1/4/1983 a 30/11/1986, 1/4/1989 a 31/3/2001, 1/5/2001 a 31/5/2007 e de 1/9/2008 a 30/9/2008, devendo ser mantida a sentença monocrática no ponto.
Por fim, registro que não há que se falar em recolhimento de contribuições para tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei 8.213/1991, pois há expressa determinação legal nesse sentido, conforme o artigo 55, § 2º da LOPS:
§ 2º O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento.
Por outro lado, a partir de 1/11/1991, ainda que comprovado o labor agrícola, não é possível a contagem do período para fins de concessão de benefício de aposentadoria por tempo de serviço sem que haja, antes, o recolhimento das contribuições devidas.
É que com o advento da Lei 8.213/1991, passaram os trabalhadores rurais, nos termos do artigo 11, inciso VII, a serem considerados segurados obrigatórios do RGPS. Em razão disso, passaram a possuir os mesmos direitos de qualquer segurado obrigatório, assim como as mesmas obrigações, ou seja, é imprescindível a contribuição a partir da data de entrada em vigor da referida lei.
Assim, a partir de 1/11/1991 a inclusão do período ora reconhecido para o fim de concessão de aposentadoria por tempo de contribuição fica condicionado à comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias ou a respectiva indenização, fato inocorrente nestes autos, nos termos do artigo 55, §2º, da Lei 8.213/1991 c/c artigo 45, §§ 1º, 2º e 4º, da Lei 8.212/1991 e artigo 15, II, da IN 45/2010, caso em que poderá o autor pleitear nova concessão/revisão a fim de que este interregno seja também computado como tempo de serviço. Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO/SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL. CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. NECESSIDADE PARA EFEITO DE CARÊNCIA. 1. Não se tratando de contagem recíproca, a qual diz com o aproveitamento de tempo laborado em um regime de previdência para obtenção de benefício em regime diverso, o art. 55, § 2º., da LBPS permite o cômputo do tempo de serviço rural independentemente de aporte contributivo à Previdência, desde que tenha sido exercido anteriormente à vigência da Lei ou, mais especificamente, em época precedente à competência novembro de 1991, forte no art. 192 do Dec. n. 357/91, repetido nos posteriores Regulamentos da Previdência Social, em obediência ao art. 195, § 6º., da Carta Magna. (TRF4, AC 2009.72.99.000390-3, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 20/05/2010).
Diante desse contexto, afasto a possibilidade de averbação, após 1/11/1991, visto que não foi comprovado o recolhimento das correspondentes contribuições previdenciárias, o qual deverá ser promovido por iniciativa da parte, independentemente de intimação da autarquia, devendo ser provido o recurso do INSS e a remessa oficial, no tópico.
Concluindo o tópico, poderá ser computado, para fins de cálculo do tempo de contribuição do autor, na presente ação, os períodos de atividade rural desenvolvidos de 1/1/1964 a 31/8/1980, 1/11/1980 a 31/3/1981, 1/6/1981 a 31/8/1983, 1/4/1983 a 30/11/1986 e de 1/4/1989 a 31/10/1991.
Requisitos para concessão de Aposentadoria por Tempo de Serviço/Contribuição
Até 16 de dezembro de 1998, quando do advento da EC 20/1998, a aposentadoria por tempo de serviço disciplinada pelos artigos 52 e 53 da Lei 8.213/1991, pressupunha o preenchimento, pelo segurado, do prazo de carência (previsto no artigo 142 da referida Lei para os inscritos até 24 de julho de 1991 e previsto no artigo 25, inciso II, da referida Lei, para os inscritos posteriormente à referida data) e a comprovação de 25 anos de tempo de serviço para a mulher e de 30 anos para o homem, a fim de ser garantido o direito à aposentadoria proporcional no valor de 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano adicional de tempo de serviço, até o limite de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de serviço para as mulheres e aos 35 para os homens.
Com as alterações introduzidas pela EC 20/1998, o benefício passou denominar-se aposentadoria por tempo de contribuição, disciplinado pelo artigo 201, §7º, inciso I, da Constituição Federal. A nova regra, entretanto, muito embora tenha extinto a aposentadoria proporcional, manteve os mesmos requisitos anteriormente exigidos à aposentadoria integral, quais sejam, o cumprimento do prazo de carência, naquelas mesmas condições, e a comprovação do tempo de contribuição de 30 anos para mulher e de 35 anos para homem.
Em caráter excepcional, possibilitou-se que o segurado já filiado ao regime geral de previdência social até a data de publicação da Emenda, ainda se aposente proporcionalmente quando, I) contando com 53 anos de idade, se homem, e com 48 anos de idade se mulher - e atendido ao requisito da carência - II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e de 25 anos, se mulher; e b) e um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a quarenta por cento do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional (artigo 9º, §1º, da EC 20/1998). O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens "a" e "b" supra, até o limite de 100%.
De qualquer modo, o disposto no artigo 56 do Decreto 3.048/1999 (§3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.
Forma de cálculo da renda mensal inicial (RMI)
A renda mensal inicial do benefício será calculada de acordo com as regras da legislação infraconstitucional vigente na data em que o segurado completar todos os requisitos do benefício.
Assim, o segurado que completar os requisitos necessários à aposentadoria antes de 29/11/1999 (início da vigência da Lei 9.876/1999), terá direito a uma RMI calculada com base na média dos 36 últimos salários-de-contribuição apurados em período não superior a 48 meses (redação original do artigo 29 da Lei 8.213/1991), não se cogitando da aplicação do "fator previdenciário", conforme expressamente garantido pelo artigo 6º da respectiva lei.
Completando o segurado os requisitos da aposentadoria já na vigência da Lei 9.876/1999 (em vigor desde 29/11/1999), o período básico do cálculo (PBC) estender-se-á por todo o período contributivo, extraindo-se a média aritmética dos 80% maiores salários-de-contribuição, a qual será multiplicada pelo "fator previdenciário" (Lei 8.213/1991, artigo 29, inciso I e parágrafo 7º), respeitado o disposto no artigo 3º da Lei 9.876/1999.
Aposentadoria por Tempo de Serviço/Contribuição
Considerado o presente provimento judicial e o tempo reconhecido administrativamente (fls. 57/63), tem-se a seguinte composição do tempo de serviço da parte autora:
Saliento que esta Turma admite a contagem do tempo decorrido entre a data de entrada do requerimento administrativo e a data do ajuizamento da ação para fins de concessão de benefício, todavia, no presente caso, entre a DER (4/1/2011) e o ajuizamento do feito (24/8/2011) não há tempo suficiente para completar o necessário para aposentadoria por tempo de contribuição integral.
Conclui-se assim que o autor alcançou o tempo mínimo necessário para a jubilação de forma proporcional, todavia observo que a carência de 180 meses, necessária à obtenção do benefício de aposentadoria no ano de 2011 (artigo 142 da Lei 8.213/1991) não restou cumprida (fl. 58), restando à parte autora apenas o direito à averbação dos períodos de trabalho rural, ora reconhecidos, para fins de obtenção de futura aposentadoria.
Passo à análise do pedido subsidiário de concessão de aposentadoria por idade rural.
Ocorre que foi decidido pelo Superior Tribunal de Justiça que "o segurado especial tem que estar laborando no campo, quando completar a idade mínima para se aposentar por idade rural, momento em que poderá requerer seu benefício" (Tema STJ nº 642).
Desse modo, como no caso em apreço o autor vinha contribuindo como autônomo - pedreiro desde 2008, e considerando que em seu depoimento pessoal ele afirmou que abandou as lides rurais em 2010, resta inviável a concessão do benefício pretendido.
Registra-se por fim, que fica prejudicada a apreciação da possibilidade de concessão do benefício de aposentadoria por idade, na modalidade híbrida, prevista no artigo 48, §§3º e 4º, da Lei de Benefícios, tendo em vista que, na data do ajuizamento da ação (24/8/2011), o autor ainda não contava com 65 (sessenta e cinco) anos de idade (fl. 26). Entretanto, nada impede que ao completar o requisito etário, aproveite o tempo ora reconhecido para tal fim.
Sucumbência
Deve a parte autora suportar o pagamento das despesas processuais, honorários periciais e honorários advocatícios, estes últimos arbitrados em R$ 880,00 (oitocentos e oitenta reais), cuja exigibilidade permanecerá sobrestada até modificação favorável de sua situação econômica.
Conclusão
Mantida a sentença quanto ao reconhecimento do exercício de labor rural nos períodos de 1/1/1964 a 31/8/1980, 1/11/1980 a 31/3/1981, 1/6/1981 a 31/8/1983, 1/4/1983 a 30/11/1986, 1/4/1989 a 31/3/2001, 1/5/2001 a 31/5/2007 e de 1/9/2008 a 30/9/2008.
Provido, em parte, o apelo da autarquia e a remessa oficial para o fim de: a) afastar a possibilidade averbação, como rural, dos períodos de 1/1/1980 a 31/10/1980, 1/4/1981 a 30/5/1981, 1/9/1983 a 30/3/1983, 1/12/1986 a 31/3/1989, 1/4/2001 a 30/4/2001, 1/6/2007 a 31/8/2008 e de 1/10/2008 a 4/1/2011 em relação aos quais a parte autora efetuou recolhimentos, na qualidade de pedreiro autônomo; b) afastar a possibilidade de averbação dos períodos rurais reconhecidos a partir de 1/11/1991, visto que não foi comprovado o recolhimento das correspondentes contribuições previdenciárias; e c) afastar a possibilidade de concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição em razão do não cumprimento da carência exigida.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS e à remessa oficial.
Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/03/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000220-34.2014.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00017719320118160070
RELATOR | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Marcus Vinícius de Aguiar Macedo |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | SALVADOR JOSE AMADO |
ADVOGADO | : | Claudio Sidiney de Lima |
: | Micheli de Lima Rodrigues |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/03/2017, na seqüência 849, disponibilizada no DE de 14/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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