APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002664-81.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VERIANA KUNTZ |
ADVOGADO | : | EVERTON SILVEIRA DOS REIS |
: | Alcemir da Silva Moraes |
EMENTA
DIREITO PREVIDENCIÁRIO. TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. LABOR URBANO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. CONCESSÃO. DIB NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. LEI Nº 11.960/09. CRITÉRIOS DE ATUALIZAÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE PRÓPRIA (EXECUÇÃO). CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO.
1. É devido o reconhecimento do tempo de serviço rural, em regime de economia familiar, quando comprovado mediante início de prova material corroborado por testemunhas.
2. Em função das inovações trazidas pela Lei nº 11.718/08, já não tão recentes, nem mais cabe indagar sobre a natureza jurídica da denominada aposentadoria mista ou híbrida, pois se pode afirmar que se trata de uma modalidade de aposentadoria urbana. Digo isso, pois nessa modalidade o que ocorre, na verdade, é o aproveitamento do tempo de labor rural para efeitos de carência, mediante a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo. A reforçar isso, o § 4º, para efeitos do § 3º, do aludido artigo, dispõe que o cálculo da renda mensal do benefício será apurado em conformidade com o disposto no inciso II do artigo 29 da mesma Lei. Ora, ao fazer remissão a este artigo, e não ao artigo 39 da Lei de Benefícios, somente vem a confirmar que se trata de modalidade de aposentadoria urbana, ou, no mínimo, equiparada.
3. Com efeito, conferindo-se o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, não importa o preenchimento simultâneo da idade e carência. Vale dizer: a implementação da carência exigida, antes mesmo do preenchimento do requisito etário, não constitui óbice para o seu deferimento; da mesma forma, a perda da condição de segurado.
4. Computando a parte autora carência suficiente e cumprido o requisito etário, é possível a concessão da aposentadoria por idade híbrida com a soma do tempo rural com o urbano, independente da categoria profissional em que se encontrava quando do requerimento administrativo ou último contrato de trabalho, seja rural ou urbano. O termo inicial para os efeitos financeiros é a data do requerimento administrativo, pois juntados os documentos referentes ao labor rurícola e urbano, incumbindo ao INSS realizar as inspeções, diligências e instruções necessárias para o deferimento da Aposentadoria por Idade.
5. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso, enquanto pendente, no Supremo Tribunal Federal, decisão sobre o tema com caráter geral e vinculante. Precedentes do STJ e do TRF da 4ª Região.
6.Mantida a antecipação de tutela, pois presentes os requisitos exigidos para o deferimento da tutela de urgência seja na forma do CPC/73 ou no NCPC/2015
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao Apelo do INSS e à remessa oficial e tornar definitiva a liminar deferida, por presentes os requisitos ensejadores da tutela de urgência, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de abril de 2017.
Ezio Teixeira
Relator
| Documento eletrônico assinado por Ezio Teixeira, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8877699v3 e, se solicitado, do código CRC A845D56. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Ezio Teixeira |
| Data e Hora: | 24/04/2017 18:10 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002664-81.2016.4.04.9999/PR
RELATOR | : | ÉZIO TEIXEIRA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VERIANA KUNTZ |
ADVOGADO | : | EVERTON SILVEIRA DOS REIS |
: | Alcemir da Silva Moraes |
RELATÓRIO
Cuida-se de recurso de Apelação e Remessa Oficial, contra a Sentença que decidiu a causa no sentido de:
"Ante o exposto, presente neste momento a verossimilhança das alegações do autor e indiscutível o perigo da demora do provimento jurisdicional final, nos termos do artigo 273 do Código de Processo Civil, ANTECIPO OS EFEITOS DA TUTELA e DETERMINO que a autarquia ré implante o benefício de Aposentadoria por idade no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de incidência e multa diária no valor de R$ 300,00 (trezentos reais).
DIANTE DO EXPOSTO, resolvendo o mérito na forma do artigo 269, I do CPC, JULGO PROCEDENTE o pedido deduzido pela parte autora, CONDENANDO o requerido a CONCEDER o benefício de APOSENTADORIA POR IDADE à parte autora, sendo que a renda mensal inicial do benefício apresentará coeficiente de 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. As parcelas em atraso devem ser computadas, com efeito retroativo, a partir do eventual indeferimento administrativo do benefício pela autarquia ré.
Atualização monetária e juros moratórios ficam estipulados com base nos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 1.º-F da Lei 9.494/97, na redação dada pela Lei 11.960/09.
Condeno ainda a requerida ao pagamento das custas processuais, por não se aplicar à jurisdição delegada as regras da Lei Federal nº 9.289/96.
Deverá o vencido pagar honorários advocatícios a parte autora, fixados em 10% sobre o valor atualizado (Súmula 14 do STJ) das prestações vencidas até a presente data (Súmula 111 do STJ).
(...)Sentença sujeita ao reexame necessário, na forma do artigo 475, § 2º, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela Lei n.º 10.352/2001."
No Apelo do INSS, alegou que a autora: 1) não preenche a carência de 180 contribuições da aposentadoria por idade urbana (art. 142 da Lei nº 8.213/91); 2) não pode se valer da regra dos §§ 3º e 4º do art. 48 da Lei nº 8.213/91, uma vez que é segurada urbano, desde pelo menos 2003, e atualmente, conforme evidencia o anexo extrato do CNIS. Fez prequestionamento.
Sem contrarrazões, subiram estes autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
REMESSA NECESSÁRIA
O art. 14 do CPC/2015 prevê a irretroatividade da norma processual a situações jurídicas já consolidadas. A partir disso, verifico que a sentença foi publicada na vigência do CPC/1973, de modo que não é aplicável o art. 496 do CPC/2015, em relação à remessa necessária, em razão da irretroatividade.
De acordo com a decisão do Superior Tribunal de Justiça, por sua Corte Especial (EREsp 934642/PR), em matéria previdenciária, as sentenças proferidas contra o INSS só não estarão sujeitas ao duplo grau obrigatório se a condenação for de valor certo (líquido) inferior a sessenta salários mínimos.
Não sendo esse o caso dos autos, admito como interposta a remessa necessária.
APOSENTADORIA POR IDADE DOS TRABALHADORES RURAIS
O benefício de aposentadoria por idade aos trabalhadores rurais está previsto no art. 48, § 1º da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher.
§ 1º Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Parágrafo incluído pela Lei nº 9.032, de 28.4.95 e alterado pela Lei nº 9.876, de 26.11.99)".
Já o art. 39, inciso I, da Lei nº 8.213/91, estabelece a concessão do benefício no valor de um salário-mínimo, desde que comprovado o desempenho da atividade rural em regime de economia familiar no período de carência, nos seguintes termos:
"Art. 39. Para os segurados especiais, referidos no inciso VII do art. 11 desta Lei, fica garantida a concessão:
I - de aposentadoria por idade ou por invalidez, de auxílio-doença, de auxílio-reclusão ou de pensão, no valor de 1 (um) salário mínimo, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período, imediatamente anterior ao requerimento do benefício, igual ao número de meses correspondentes à carência do benefício requerido;"
A partir da redação dos dispositivos supra, retira-se que os requisitos necessários à concessão do benefício são a qualidade de segurado, o preenchimento do período de carência e a idade. O legislador, sensível às condições mais dificultosas do trabalhador do campo, reduziu a idade mínima exigida em cinco anos, para ambos os sexos.
Anoto que não é necessária a carência em si, ou seja, as contribuições referentes ao período, mas apenas o lapso temporal da carência. Para verificar-se qual o número de meses necessários utiliza-se o art. 142, quando o segurado especial tenha iniciado suas atividades em período anterior à Lei nº 8.213/91, bem como sua tabela de transição. O segurado deverá, por conseguinte, comprovar a atividade rural pelo número de meses correspondente ao ano de implemento das condições.
Caso o segurado tenha iniciado o desempenho de suas atividades em período posterior à Lei nº 8.213/91, aplica-se a carência de 180 meses de atividade rural, conforme o art. 25, II da Lei nº 8.213/91.
Seguindo o entendimento do STJ, a atividade rural para preenchimento do período de carência não deve, necessariamente, ser contínua e ininterrupta. Em decorrência disso, o exercício de trabalho urbano intercalado ou concomitante ao labor campesino, por si só, não retira a condição de segurado especial do trabalhador rural. (AgRg no REsp 1342355/SP, DJe 26/08/2013; AgRg no AREsp 334.161/PR, DJe 06/09/2013).
ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR
Inicialmente, entende-se por "regime de economia familiar" nas palavras da Lei nº 8.213/91, através de seu art. 11, § 1°, "a atividade em que o trabalho dos membros da família é indispensável à própria subsistência e é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados".
No que concerne à prova do tempo de serviço exercido nesse tipo de atividade, deve-se observar a regra art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, que dispõe que "a comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento".
Para a análise do início de prova material, filio-me aos seguintes entendimentos sumulados:
Súmula nº 73 do TRF da 4ª Região: Admite-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental.
Súmula nº 149 do STJ: A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de beneficio previdenciário.
Súmula nº 577 do STJ: É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório.
Quanto à contagem do tempo de serviço rural em regime de economia familiar prestado por menor de 14 anos, entendo ser devida. Conforme o STJ, a legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção, tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (AR nº 3.629/RS, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 9/9/2008; EDcl no REsp nº 408.478/RS, Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 5/2/2007; AgRg no REsp nº 539.088/RS, Ministro Felix Fischer, DJ 14/6/2004). No mesmo sentido é a Sumula nº 05 da TNU dos JEF.
Esclareço ser possível a formação de início razoável de prova material sem a apresentação de notas fiscais de produtor rural em nome próprio. Com efeito, a efetiva comprovação da contribuição é flexibilizada pelo fato de o art. 30, inciso III, da Lei nº 8.212/91, atribuir a responsabilidade de recolher à empresa que participa da negociação dos produtos referidos nas notas fiscais de produtor, seja na condição de adquirente, consumidora, consignatária ou se trate de cooperativa. Nesse caso, a contribuição especificada não guarda relação direta com a prestação de serviço rural em família, motivo pelo qual se pode reconhecer o tempo de serviço rural, ainda que ausentes notas fiscais de produtor rural como início de prova material.
A existência de início de prova material, todavia, não é garantia de obtenção do tempo de serviço postulado. A prova testemunhal é de curial importância para que se confirme a atividade e seu respectivo lapso temporal, complementando os demais elementos probatórios.
No que respeita à não exigência de contribuições para a averbação do tempo de serviço do segurado especial, a questão deve ser analisada sob o prisma constitucional, eis que em seu texto foi prevista a unificação da Previdência Social, outorgando a qualidade de segurado do RGPS aos trabalhadores rurais.
Obedecendo a tais mandamentos, o § 2º, do art. 55, da Lei nº 8.213/91 previu a possibilidade de que o tempo de serviço rural dos segurados especiais fosse computado independentemente do recolhimento de contribuições ou indenização:
"O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência conforme dispuser o Regulamento."
Tal entendimento foi esposado pelo Supremo Tribunal Federal na decisão liminar da ADIN 1664-4-DF. Assim, desde que devidamente comprovado, o tempo de serviço que o segurado trabalhou em atividade rural poderá ser utilizado para fins de qualquer aposentadoria por tempo de serviço independentemente de contribuições.
Também devem ser observados os precedentes vinculantes, conforme estipula o art. 927 do CPC/2015. Do STJ, temos as seguintes teses firmadas:
Tema 644 - Concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição a trabalhador urbano mediante o cômputo de atividade rural
"Não ofende o § 2º do art. 55 da Lei 8.213/91 o reconhecimento do tempo de serviço exercido por trabalhador rural registrado em carteira profissional para efeito de carência, tendo em vista que o empregador rural, juntamente com as demais fontes previstas na legislação de regência, eram os responsáveis pelo custeio do fundo de assistência e previdência rural (FUNRURAL). (REsp 1352791/SP)
Tema 554 - Abrandamento da prova para configurar tempo de serviço rural do "boia-fria"
"o STJ sedimentou o entendimento de que a apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for complementada por idônea e robusta prova testemunhal. (REsp 1321493/PR)
Temas 532, 533 - Repercussão de atividade urbana do cônjuge na pretensão de configuração jurídica de trabalhador rural previsto no art. 143 da Lei 8.213/1991
"3.O trabalho urbano de um dos membros do grupo familiar não descaracteriza, por si só, os demais integrantes como segurados especiais, devendo ser averiguada a dispensabilidade do trabalho rural para a subsistência do grupo familiar, incumbência esta das instâncias ordinárias (Súmula 7/STJ).
4. Em exceção à regra geral fixada no item anterior, a extensão de prova material em nome de um integrante do núcleo familiar a outro não é possível quando aquele passa a exercer trabalho incompatível com o labor rurícola, como o de natureza urbana." (REsp 1304479/SP)
No caso concreto, para comprovar o alegado tempo de serviço rural, a fim de preencher o requisito do início de prova material, juntou a parte autora a cópia de sua certidão de casamento(1970) e nascimento dos filhos (1971, 1972 e 1977), as quais qualificam seu marido e seu pai como "agricultor" e ainda, na certidão, sendo que no nascimento da filha Haide (1977), comprova que os pais moravam na Linha Belmonte, cópias de sua CTPS com registro no cargo de agricultora por determinado período.
Aliado a isto, em que pese não estar juntado na inicial, nos documentos que acompanharam o pedido administrativo, que a Autarquia Ré anexou junto da contestação do mov. 15, verifica-se que houveram compras de milho na Cooperativa Copagril em nome do seu marido nos anos de 1986 e 1987 (mov. 15.4), bem como, Contrato de Compra e Venda de Maquinários agrícolas e gado no ano de 1988, na Cidade de Pato Branco, bem como existe declaração em que o Sr. Ari Thober afirma que a Requerente trabalhou na agricultura entre 1990 e 2003. Essa declaração não se reveste de conteúdo probatório, dado o caráter unilateral da sua emissão.
Assim, é notório que os referidos documentos conferem, ainda que de modo perfunctório, presunção de veracidade às alegações do autor, inclusive corresponde com os depoimentos colhidos em juízo.
Quanto a prova testemunhal, para corroborar o registro nos documentos do labor rurícola, foram favoráveis ao pleito da parte autora, conforme segue transcrito (Evento 34 e 53).
Afirmou Silvana Sorge que conhece a autora desde 1975 pois eram vizinhos na Linha Belmonte, que ela morava com o marido no sitio, que antes ela e o marido moravam na terra do sogro, pode ser que seja um pouco antes de 1975 pois faz muito tempo e não lembra direito, que ela trabalhava na colônia junto com o marido plantando milho, mandioca e soja. Que via a autora trabalhando quando ia visita-la, que acha que ela trabalhou com o marido uns 10 anos, depois foram morar em Pato Branco, não sabe bem o lugar, e não teve mais contato, depois eles voltaram para Rondon, trabalharam em uma chácara, sempre trabalharam na roça junto com o marido. [...] Que a Requerente comentou que as vezes limpava a casa para o outros para entrar um dinheiro e ajudar o marido. [...] Na linha Belmonte a Requerente só trabalhou na roça, plantando verduras, mas não viu ela trabalhando em Pato Branco, quando voltou trabalhou em uma chácara aqui, mas não lembra onde. Que tinha 03 filhos quando moravam na Linha Belmonte, que não tinham funcionários para trabalhar para eles. Trocavam serviços com eles, que eles não tinham maquinário na terra deles, só no braço, os filhos chamavam Jair, Edson e Haidi".
Declarou então Ervino Sorge que conheceu a Requerente quando ela casou e foi morar ao lado de sua propriedade, era uma área pequena, que foi doada pelo sogro, não tinham empregado e nem maquinário, plantavam milho, mandioca e soja, de tudo um pouco, tinha criação. Via a Requerente trabalhando na roça, ela ficou nessa propriedade uns 15 anos. De 1970 até 1985 ela trabalhou nessa propriedade. Depois foram embora para outra cidade que ficaram uns 05 anos e voltaram para Rondon, depois de novo trabalharam na Chácara do Tuba, no terreno que era da Faville, continuou trabalhando mais uns 10 anos do mesmo jeito na chácara só em família com o marido e os filhos. Que daí o marido também trabalhava fora de casa para complementar a renda.
Nestes termos também relatou Ivete Kremer Oviedo, declarando que conhece a autora uns 30 anos, mais ou menos desde 1985, que ela sempre trabalhou na roça, na terra do sogro que faleceu e o maridou herdou ¼ do imóvel, que foi dividido entre os irmãos dele, então não era muito grande, que ela sempre trabalhou na terra, ajudando o marido, plantavam mandioca, milho, soja, só a família, não tinha funcionário e nem maquinário, lavraram com boi mesmo e se precisassem de ajuda eram os vizinhos que ajudavam trocando o serviço. Ela ficou ali uns 15 anos, desde 1985. Ela foi Embora para Pato Branco, que eles compraram uma terra lá perto, mas não lembra o ano, e voltaram porque venderam as terras lá, e aí foram morar na chácara do Ali, onde era a antiga Faville, sempre trabalhando na roça. Que ficou uns 10 anos ali nesse terreno, que ela sabe que só trabalhou na roça, depois que saíram dessa última cachara não sabe pois não tinha mais muito contato. [...] Que lá em Pato Branco eles também trabalhavam na roça, nunca nada diferente disso, plantavam mandioca, milho e soja, não era diferente daqui. Que dava para o sustento deles, depois eles voltaram porque venderam a terra e depositaram o dinheiro e o Plano Collor pegou esse dinheiro, daí eles voltaram sem nada, uns 05 (cinco) anos depois, estavam nessa chácara aqui. Que sabia porque tinha contato com a filha dela e sempre via a autora trabalhando na roça. Que eles ficaram uns 06 ou 10 anos trabalhando nessa última chácara, e que depois casei e não tive mais contato com ela.
Ainda a testemunha Rogério Enedir Kremer, declarou que conhece a Requerente uns 20, 25 anos, que ela morava na Linha Belmonte, na zona rural, na terra do sogro dela e trabalhava com o marido dela, que viu ela trabalhando, plantando milho, mandioca, soja, que a terra era pequena daí não tinham funcionário e nem maquinário, tinham criação de vacas e frango. Que viu ela trabalhando, quando ia visitar a irmã que morava próximo da Requerente. Que ela foi um tempo embora para Renascença perto de Pato Branco, ficando lá em torno de 05 anos, e voltaram para uma chácara ali perto, que eles trabalhavam ali na roça de funcionário, que eu era amigo dos filhos dele, que era onde é a Faville hoje. Que ela e o marido que cuidava, ficaram ali em torno de 08 a 10 anos, depois não teve mais muito contato com eles, não sei dizer o que eles fazem hoje. Em Belmonte tem certeza que trabalhou na roça, em Pato Branco não tem como saber e quando voltou também tem certeza que trabalhou na roça no período de 08 a 10 anos.
Nesse passo, analisando-se a prova produzida, verifica-se que a autora exerceu atividade rural no período desde o casamento (1970) até o ano de 1987, inexistindo início de prova material idôneo a partir de então, a denotar que teria transferido residência para o meio urbano. Ocorre que o preenchimento do requisito etário aconteceu em 2003 para a aposentadoria por idade rural (55 anos de idade), exigindo-se 132 meses de tempo de serviço rural em regime de economia familiar, porém não restou demonstrado que tenha desempenhado labor rurícola no período de carência anterior ao preenchimento do requisito etário e muito menos do requerimento administrativo, tendo perdido a qualidade de segurado especial.
Assim, não é possível a concessão do benefício de aposentadoria por idade rural.
DO TEMPO DE SERVIÇO PARA EFEITO DE CARÊNCIA
A parte autora busca somar o tempo de atividade rural trabalhado em regime de economia familiar aos períodos em que trabalhou em atividade urbana, para que seja deferido o benefício de aposentadoria por idade.
Considerando esse quadro, verifico que a Lei nº 11.718, de 20/06/2008, conferiu nova redação ao art. 48 da Lei nº 8.213/91, introduzindo em seu conteúdo significativa alteração:
Art. 48. A aposentadoria por idade será devida ao segurado que, cumprida a carência exigida nesta Lei, completar 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta), se mulher. (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)
§ 1o Os limites fixados no caput são reduzidos para sessenta e cinqüenta e cinco anos no caso de trabalhadores rurais, respectivamente homens e mulheres, referidos na alínea a do inciso I, na alínea g do inciso V e nos incisos VI e VII do art. 11. (Redação dada pela Lei nº 9.876, de 1999)
§ 2o Para os efeitos do disposto no § 1o deste artigo, o trabalhador rural deve comprovar o efetivo exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, por tempo igual ao número de meses de contribuição correspondente à carência do benefício pretendido, computado o período a que se referem os incisos III a VIII do § 9o do art. 11 desta Lei. (Redação dada pela Lei nº 11,718, de 2008)
§ 3o Os trabalhadores rurais de que trata o § 1o deste artigo que não atendam ao disposto no § 2o deste artigo, mas que satisfaçam essa condição, se forem considerados períodos de contribuição sob outras categorias do segurado, farão jus ao benefício ao completarem 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, e 60 (sessenta) anos, se mulher. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)
§ 4o Para efeito do § 3o deste artigo, o cálculo da renda mensal do benefício será apurado de acordo com o disposto no inciso II do caput do art. 29 desta Lei, considerando-se como salário-de-contribuição mensal do período como segurado especial o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. (Incluído pela Lei nº 11,718, de 2008)
As alterações operadas introduziram, de maneira inequívoca, a fungibilidade entre os benefícios de aposentadoria por idade urbana e rural, à medida que, a partir de 20/06/2008, abriu-se a possibilidade de o segurado computar tempo de serviço, na condição de segurado especial, para fins de concessão de aposentadoria por idade urbana. Contudo, essa medida somente se aplica caso o segurado preencha o requisito etário para esta exigido, ou seja, 60 anos para mulheres e 65 anos para homens.
A fim de viabilizar a nova regulação jurídica, o § 4º do art. 48 da LOPS determinou que, no caso de o segurado fazer uso de tempo de segurado especial, para fins de concessão de aposentadoria por idade urbana, os salários-de-contribuição mensais atinentes ao período devem ser considerados no valor de um salário mínimo.
Nesse sentido, a Lei nº 11.718/08 não pode ser aplicada somente ao trabalhador que esteja exercendo atividade rural quando do implemento da idade (60 anos para mulher e 65 para homens). Para afastar quaisquer dúvidas quanto à interpretação da inovação legislativa, o Decreto nº 6.722/08 conferiu nova redação ao art. 51 do Decreto nº 3.048/99, nos seguintes termos:
"Art. 51. [...]
§ 4º Aplica-se o disposto nos §§ 2º e 3º ainda que na oportunidade do requerimento da aposentadoria o segurado não se enquadre como trabalhador rural. (Incluído pelo Decreto nº 6.722,de 30/12/2008)" (Grifei)
A possibilidade de preenchimento do período de carência com tempo de serviço rural somado à contribuição correspondente a tempo de serviço urbano, por aplicação do § 4º do art. 51 do Decreto nº 3.048/99, é permitida independentemente da condição de trabalhador rural na data de entrada do requerimento administrativo. Significa que o dispositivo regulamentar acompanha a realidade social, que demonstra ser o êxodo rural decorrente do processo de constituição e expansão das cidades, fenômeno reconhecido como urbanização.
Além disso, entender em sentido contrário violaria, inclusive, a Constituição Federal de 1988, que impõe, em seu art. 194, parágrafo único, inciso II a uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais. No mesmo sentido, o art. 7º, caput, da Magna Carta, que trata dos direitos sociais, dispõe que "são direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social...", com nítido objetivo de igualar os direitos entre essas classes de trabalhadores.
Não se está dizendo que o valor dos benefícios pagos aos trabalhadores urbanos e rurais deverá ser o mesmo, mas sim que deve haver identidade de benefícios e serviços; os eventos cobertos devem ser os mesmos; e, consequentemente, o acesso aos benefícios e serviços deve, tanto quanto possível, ser equiparado para as duas classes de trabalhadores.
Os mencionados dispositivos constitucionais sinalizam que as barreiras existentes entre operários urbanos e rurais deverão ser derrubadas, impondo-se ao legislador e ao julgador a tarefa de reduzir as discrepâncias. O legislador, ainda que timidamente, já caminha nesse sentido, tanto que editou a Lei nº 11.718/08. Já o julgador deve interpretar a Constituição Federal e a legislação ordinária da maneira mais alinhada ao objetivo constitucional de reduzir as diferenças previdenciárias entre os trabalhadores urbanos e rurais.
Observo que a doutrina constitucionalista aponta como princípios interpretativos da Constituição Federal, dentre outros, o Princípio da Máxima Efetividade e o Princípio da Força Normativa da Constituição. Esses postulados impõem, basicamente, ao operador do direito - juiz e legislador - o dever de considerar a Lei Maior como um todo integrado, sem antinomias, dando a maior eficácia social possível aos princípios e regras nela insculpidos. Assim, se a Constituição Federal determinou que a busca de equiparação entre trabalhadores rurais e urbanos, a legislação infraconstitucional deve ser interpretada desta maneira, sob pena de grave vício de inconstitucionalidade.
Além disso, o entendimento de que se pode aplicar a Lei nº 11.718/08 somente para trabalhadores rurais que estejam desempenhando atividade rural quando do preenchimento da idade contraria as próprias tendências sociais. Uma vez tendo migrado do campo para a cidade, o trabalhador dificilmente retornará às atividades rurais, quando alcançar a idade necessária para se aposentar. No Brasil e, de forma geral, no mundo, o êxodo rural é um fenômeno de grandes dimensões, e seu revés é de improvável ocorrência - migração da cidade para o campo. Por isso, as disposições legais previdenciárias devem ser interpretadas da maneira que reduzam as desigualdades existentes entre os trabalhadores rurais e urbanos.
Assim, entendo possível o somatório de tempo de serviço urbano com tempo de serviço rural em regime de economia familiar para fins de concessão de aposentadoria por idade após o advento da Lei nº 11.718/08, desde que conte a segurada mulher com 60 anos de idade e o segurado homem com 65 anos de idade.
No caso dos autos, a autora implementou a idade em 2008, pois nascida em 17/07/1948. Verifico que exerceu atividade rural no lapso de 1970 ao ano de 1987, e urbana durante parte desse interregno de 01/03/1980 a 12/1982 e de 01/08/1983 a 04/08/1984 (Evento 15-OUT7), que somados, superam os 174 meses necessários para a carência na DER, ou 162 meses quando completou o requisito etário (60 anos de idade) .
Em função das inovações trazidas pela Lei nº 11.718/08, já não tão recentes, nem mais cabe indagar sobre a natureza jurídica da denominada aposentadoria mista ou híbrida, pois se pode afirmar que se trata de uma modalidade de aposentadoria urbana. Digo isso, pois nessa modalidade o que ocorre, na verdade, é o aproveitamento do tempo de labor rural para efeitos de carência, mediante a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo. A reforçar isso, o § 4º, para efeitos do § 3º, do aludido artigo, dispõe que o cálculo da renda mensal do benefício será apurado em conformidade com o disposto no inciso II do artigo 29 da mesma Lei. Ora, ao fazer remissão a este artigo, e não ao artigo 39 da Lei de Benefícios, somente vem a confirmar que se trata de modalidade de aposentadoria urbana, ou, no mínimo, equiparada.
Com efeito, conferindo-se o mesmo tratamento atribuído à aposentadoria por idade urbana, não importa o preenchimento simultâneo da idade e carência. Vale dizer: a implementação da carência exigida, antes mesmo do preenchimento do requisito etário, não constitui óbice para o seu deferimento; da mesma forma, a perda da condição de segurado. Isso se torna irrelevante!
A respeito dessa questão, o § 1º do artigo 3º da Lei nº 10.666/03, assim dispõe:
Art. 3º. A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial.
§ 1º Na hipótese de aposentadoria por idade, a perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão desse benefício, desde que o segurado conte com, no mínimo, o tempo de contribuição correspondente ao exigido para efeito de carência na data do requerimento do benefício.
Conclui-se, pois, que o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício, nos termos do já decidido pela 3ª Seção desta Corte, nos Embargos Infringentes nº 0008828-26.2011.404.9999 (Relator p/ Acórdão Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 10/01/2013).
Em suma, o que importa é contar com tempo de contribuição correspondente à carência exigida na data do requerimento do benefício, além da idade mínima. E esse tempo, tratando-se de aposentadoria híbrida ou mista, poderá ser preenchido com períodos de labor rural e urbano.
Esse entendimento, aliás, está em conformidade com a jurisprudência mais recente do STJ, conforme se extrai dos seguintes precedentes:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA HÍBRIDA POR IDADE. ART. 48, § 3º, DA LEI N. 8213/91. EXEGESE. MESCLA DOS PERÍODOS DE TRABALHO URBANO E RURAL. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE RURAL NO MOMENTO QUE ANTECEDE O REQUERIMENTO. DESNECESSIDADE. CÔMPUTO DO TEMPO DE SERVIÇO RURAL ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI N. 8.213/91 PARA FINS DE CARÊNCIA. POSSIBILIDADE. 1. A Lei 11.718/2008, ao alterar o art. 48 da Lei 8.213/91, conferiu ao segurado o direito à aposentadoria híbrida por idade, possibilitando que, na apuração do tempo de serviço, seja realizada a soma dos lapsos temporais de trabalho rural com o urbano. 2. Para fins do aludido benefício, em que é considerado no cálculo tanto o tempo de serviço urbano quanto o de serviço rural, é irrelevante a natureza do trabalho exercido no momento anterior ao requerimento da aposentadoria. 3. O tempo de serviço rural anterior ao advento da Lei n. 8.213/91 pode ser computado para fins da carência necessária à obtenção da aposentadoria híbrida por idade, ainda que não tenha sido efetivado o recolhimento das contribuições. 4. O cálculo do benefício ocorrerá na forma do disposto no inciso II do caput do art. 29 da Lei n. 8.213/91, sendo que, nas competências em que foi exercido o labor rurícola sem o recolhimento de contribuições, o valor a integrar o período básico de cálculo - PBC será o limite mínimo de salário-de-contribuição da Previdência Social. 5. A idade mínima para essa modalidade de benefício é a mesma exigida para a aposentadoria do trabalhador urbano, ou seja, 65 anos para o homem e 60 anos para a mulher, portanto, sem a redução de 5 anos a que faria jus o trabalhador exclusivamente rurícola. 6. Recurso especial improvido. (REsp 1476383/PR, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 01/10/2015, DJe 08/10/2015)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE HÍBRIDA. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO. CÔMPUTO DE TEMPO RURAL ANTERIOR À LEI N. 8.213/1991. ART. 48, §§ 3º E 4º, DA LEI N. 8.213/1991, COM A REDAÇÃO DADA PELA LEI N. 11.718/2008. OBSERVÂNCIA. SÚMULA N. 83/STJ. 1. Os trabalhadores rurais que não satisfazem a condição para a aposentadoria do art. 48, §§ 1° e 2°, da Lei n. 8.213/91 podem computar períodos urbanos, pelo art. 48, § 3°, da mesma lei, que autoriza a carência híbrida. 2. No caso dos autos o Tribunal de origem, com amparo nos elementos fático-probatórios dos autos, concluiu que o segurado especial que comprove a condição de rurícola, mas não consiga cumprir o tempo rural de carência exigido na tabela de transição prevista no art. 142 da Lei n. 8.213/1991 e que tenha contribuido sob outras categorias de segurado, poderá ter reconhecido o direito ao benefício aposentadoria por idade híbrida, desde que a soma do tempo rural com o de outra categoria implemente a carência necessária contida na Tabela. 3. Ficou consignado também que "o fato de não estar desempenhando atividade rural por ocasião do requerimento administrativo não pode servir de obstáculo à concessão do benefício. A se entender assim, o trabalhador seria prejudicado por passar contribuir, o que seria um contrassenso. A condição de trabalhador rural, ademais, poderia ser readquirida com o desempenho de apenas um mês nesta atividade. Não teria sentido se exigir o retorno do trabalhador às lides rurais por apenas um mês para fazer jus à aposentadoria por idade. O que a modificação legislativa permitiu foi, em rigor, o aproveitamento do tempo rural para fins de carência, com a consideração de salários-de-contribuição pelo valor mínimo, no caso específico da aposentadoria por idade aos 60 (sessenta) ou 65 (sessenta e cinco) anos (mulher ou homem)". 4. Das razões acima expendidas, verifica-se que o Tribunal a quo decidiu de acordo com jurisprudência desta Corte, de modo que se aplica à espécie o enunciado da Súmula n. 83/STJ. Precedentes. Agravo regimental desprovido. (AgRg no REsp 1531534/SC, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/06/2015, DJe 30/06/2015)
Assim, deve ser concedido o benefício de aposentadoria por idade híbrida, no valor de um salário mínimo, desde a data da entrada do requerimento administrativo(30/09/2010), pois preenchidos os requisitos carência e idade mínima, não interferindo a perda da qualidade de segurada na data da postulação administrativa. O termo inicial é a DER pois juntados os documentos referentes ao labor rurícola e urbano, incumbindo ao INSS realizar as inspeções, diligências e instruções necessárias para o deferimento da Aposentadoria por Idade.
CONSECTÁRIOS. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
A questão da atualização monetária das quantias a que é condenada a Fazenda Pública, dado o caráter acessório de que se reveste, não deve ser impeditiva da regular marcha do processo no caminho da conclusão da fase de conhecimento.
Firmado em sentença, em apelação ou remessa oficial o cabimento dos juros e da correção monetária por eventual condenação imposta ao ente público e seus termos iniciais, a forma como serão apurados os percentuais correspondentes, sempre que se revelar fator impeditivo ao eventual trânsito em julgado da decisão condenatória, pode ser diferida para a fase de cumprimento, observando-se a norma legal e sua interpretação então em vigor. Isso porque é na fase de cumprimento do título judicial que deverá ser apresentado, e eventualmente questionado, o real valor a ser pago a título de condenação, em total observância à legislação de regência.
O recente art. 491 do NCPC, ao prever, como regra geral, que os consectários já sejam definidos na fase de conhecimento, deve ter sua interpretação adequada às diversas situações concretas que reclamarão sua aplicação. Não por outra razão seu inciso I traz exceção à regra do caput, afastando a necessidade de predefinição quando não for possível determinar, de modo definitivo, o montante devido. A norma vem com o objetivo de favorecer a celeridade e a economia processuais, nunca para frear o processo.
E no caso, o enfrentamento da questão pertinente ao índice de correção monetária, a partir da vigência da Lei 11.960/09, nos débitos da Fazenda Pública, embora de caráter acessório, tem criado graves óbices à razoável duração do processo, especialmente se considerado que pende de julgamento no STF a definição, em regime de repercussão geral, quanto à constitucionalidade da utilização do índice da poupança na fase que antecede a expedição do precatório (RE 870.947, Tema 810).
Tratando-se de débito, cujos consectários são totalmente definidos por lei, inclusive quanto ao termo inicial de incidência, nada obsta a que seja diferida a solução definitiva para a fase de cumprimento do julgado, em que, a propósito, poderão as partes, se assim desejarem, mais facilmente conciliar acerca do montante devido, de modo a finalizar definitivamente o processo.
Sobre esta possibilidade, já existe julgado da Terceira Seção do STJ, em que assentado que "diante a declaração de inconstitucionalidade parcial do artigo 5º da Lei n. 11.960/09 (ADI 4357/DF), cuja modulação dos efeitos ainda não foi concluída pelo Supremo Tribunal Federal, e por transbordar o objeto do mandado de segurança a fixação de parâmetros para o pagamento do valor constante da portaria de anistia, por não se tratar de ação de cobrança, as teses referentes aos juros de mora e à correção monetária devem ser diferidas para a fase de execução. 4. Embargos de declaração rejeitados". (EDcl no MS 14.741/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 08/10/2014, DJe 15/10/2014).
Na mesma linha vêm decidindo as duas turmas de Direito Administrativo desta Corte (2ª Seção), à unanimidade, (Ad exemplum: os processos 5005406-14.2014.404.7101 3ª Turma, julgado em 01-06-2016 e 5052050-61.2013.404.7000, 4ª Turma, julgado em 25/05/2016).
Portanto, em face da incerteza quanto ao índice de atualização monetária, e considerando que a discussão envolve apenas questão acessória no contexto da lide, à luz do que preconizam os art. 4º, 6º e 8º do novo Código de Processo Civil, mostra-se adequado e racional diferir-se para a fase de execução a solução em definitivo acerca dos critérios de correção, ocasião em que, provavelmente, a questão já terá sido dirimida pelo tribunal superior, o que conduzirá à observância, pelos julgadores, ao fim e ao cabo, da solução uniformizadora.
A fim de evitar novos recursos, inclusive na fase de cumprimento de sentença, e anteriormente à solução definitiva pelo STF sobre o tema, a alternativa é que o cumprimento do julgado se inicie, adotando-se os índices da Lei 11.960/2009, inclusive para fins de expedição de precatório ou RPV pelo valor incontroverso, diferindo-se para momento posterior ao julgamento pelo STF a decisão do juízo sobre a existência de diferenças remanescentes, a serem requisitadas, acaso outro índice venha a ter sua aplicação legitimada.
Os juros de mora, incidentes desde a citação, como acessórios que são, também deverão ter sua incidência garantida na fase de cumprimento de sentença, observadas as disposições legais vigentes conforme os períodos pelos quais perdurar a mora da Fazenda Pública.
Evita-se, assim, que o presente feito fique paralisado, submetido a infindáveis recursos, sobrestamentos, juízos de retratação, e até ações rescisórias, com comprometimento da efetividade da prestação jurisdicional, apenas para solução de questão acessória.
Diante disso, difere-se para a fase de cumprimento de sentença a forma de cálculo dos consectários legais, adotando-se inicialmente o índice da Lei 11.960/2009, restando prejudicado o recurso e/ou remessa necessária no ponto.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Retificando o comando sentencial, condeno o INSS ao pagamento de honorários advocatícios em favor do patrono da parte autora, que fixo em 10% sobre o valor da condenação (parcelas vencidas até a data da Sentença), excluídas as parcelas vincendas, observando-se a Súmula 76 desta Corte: "Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência", e Sumula n. 111 do STJ. Dessa forma, tenho que o decidido importou em mera correção material do provimento Monocrático.
CUSTAS PROCESSUAIS
O INSS é isento do pagamento no Foro Federal (art. 4º, I, da Lei nº 9.289/96) e na Justiça Estadual do Rio Grande do Sul (art. 11 da Lei nº 8.121/85, com a redação dada pela Lei nº 13.471/2010), isenção esta que não se aplica quando demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4), devendo ser ressalvado, ainda, que no Estado de Santa Catarina (art. 33, p. único, da Lei Complementar estadual 156/97), a autarquia responde pela metade do valor.
DO PREQUESTIONAMENTO
Os fundamentos para o julgamento do feito trazem nas suas razões de decidir a apreciação dos dispositivos citados, utilizando precedentes jurisprudenciais, elementos jurídicos e de fato que justificam o pronunciamento jurisdicional final. Ademais, nos termos do § 2º do art. 489 do CPC/2015, "A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé". Assim, para possibilitar o acesso das partes às instâncias superiores, consideram-se prequestionadas as matérias constitucionais e legais suscitadas nos recursos oferecidos pelas partes, nos termos em que fundamentado o voto.
DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA
Diante das provas reunidas aos autos, é evidente a plausibilidade do direito invocado, o que confere sólida verossimilhança às alegações da parte autora.
Ademais, o perigo da demora também é óbvio, já que, deixado ao desamparo o requerente, até o julgamento de eventual recurso.
Também há que se destacar que a irreversibilidade do provimento, que no caso em tela é certa, não pode se interpor como óbice intransponível à concessão da tutela de urgência, em especial porque se trata de autor de idade avançada que se encontra desempregada. O amparo previdenciário possibilitará ganhos para a subsistência.
Sendo assim, tomando-se por base um juízo de ponderação entre o interesse público secundário, consistente no resguardo do Erário público em razão de uma improvável reforma da sentença de mérito e, de outro turno, a salvaguarda da dignidade da pessoa humana da autora, pessoa idosa e incapaz para o labor, há que se optar pela preponderância deste segundo direito.
Destarte, com fundamento no artigo 273, do Código de Processo Civil, e do teor da súmula n° 729, do Supremo Tribunal Federal, mantenho a antecipação da tutela deferida no Juízo Monocrático, que fica convertida em tutela de urgência na vigência do novo CPC/2015.
CONCLUSÃO
Mantida a Sentença, com o reconhecimento do tempo de serviço rural, somado ao tempo de serviço urbano, concedendo a aposentadoria por idade híbrida desde o requerimento administrativo, prejudicado o exame do critério de aplicação dos juros e correção monetária.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento ao Apelo do INSS e à remessa oficial e tornar definitiva a liminar deferida, por presentes os requisitos ensejadores da tutela de urgência.
Ezio Teixeira
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/04/2017
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5002664-81.2016.4.04.9999/PR
ORIGEM: PR 00002521520158160112
RELATOR | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procuradora Regional da República Solange Mendes de Souza |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
APELADO | : | VERIANA KUNTZ |
ADVOGADO | : | EVERTON SILVEIRA DOS REIS |
: | Alcemir da Silva Moraes |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/04/2017, na seqüência 1382, disponibilizada no DE de 03/04/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO APELO DO INSS E À REMESSA OFICIAL E TORNAR DEFINITIVA A LIMINAR DEFERIDA, POR PRESENTES OS REQUISITOS ENSEJADORES DA TUTELA DE URGÊNCIA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal ÉZIO TEIXEIRA |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA | |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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