| D.E. Publicado em 25/08/2016 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002839-63.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | NOELI ELISABETE SCHNEIDER MARCHIOTTI |
ADVOGADO | : | Neusa Ledur Kuhn |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. SUSPENSÃO ADMINISTRATIVA. PRORROGAÇÃO OU RECONSIDERAÇÃO NA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. REPERCUSSÃO GERAL. RE 631240. SENTENÇA ANULADA.
1. A suspensão ou o indeferimento do benefício pelo INSS são suficientes para caracterizar o interesse de agir do segurado que ingressa com demanda judicial, não sendo necessário - muito menos exigível - o exaurimento da via administrativa.
2. O requerimento administrativo de auxílio-doença posteriormente suspenso configura o interesse de agir na ação de restabelecimento, sendo desnecessária a prova de pedido de prorrogação ou reconsideração junto ao INSS, ou, ainda, que a decisão administrativa impugnada seja contemporânea à propositura da ação, para o regular processamento do feito.
3. Sentença de extinção sem julgamento do mérito anulada, a fim de ser regularmente processado e julgado o feito, na esteira do entendimento firmado pelo STF, em sede de Repercussão Geral, no RE 631240.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso, para anular a sentença, determinando o regular processamento do feito, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 10 de agosto de 2016.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002839-63.2016.4.04.9999/RS
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária objetivando o restabelecimento de auxílio-doença desde a suspensão (21/08/2015), a ser convertido em aposentadoria por invalidez se constatada a incapacidade total e permanente.
Pela decisão da fl. 26 foi determinada a intimação da parte autora para comprovar indeferimento atualizado do benefício.
Manifestou-se a parte autora (petições das fls. 28, 32 e 34), informando que a prova requerida já se encontra nos autos, e, caracterizada a pretensão resistida requereu a citação do INSS.
Sobreveio sentença que extinguiu o feito, sem julgamento do mérito, por falta de interesse processual (CPC, art. 267, I e VI), ante a ausência de comprovação atual de pretensão resistida, condenando a parte autora em custas processuais, cuja exigibilidade foi suspensa por ser beneficiária da assistência judiciária gratuita.
Apelou a parte autora, alegando, em síntese, que a pretensão resistida está caracterizada pela suspensão do benefício sem que houvesse recuperado sua capacidade laboral; que tem interesse de agir, pois o objeto da ação é a prorrogação ou restabelecimento do auxílio-doença, suspenso indevidamente, mas também sua conversão em aposentadoria por invalidez; e que não sendo exigível o esgotamento da via administrativa, não há óbice ao regular processamento do feito. Requer a anulação da sentença e o retorno dos autos à vara de origem, a fim de ser regularmente processada e julgada a ação.
É O RELATÓRIO.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente voto está sendo apreciado por essa Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, referente ao apelo em face de sentença exarada na vigência da Lei n.º 5.869/73, código processual anterior, necessária se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que "o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código"; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada"; e em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que "ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973." (sublinhei)
Nesse contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, o qual estabelece que "a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada".
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista que o processo é constituído por um conjunto de atos dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, que, por sua vez, será aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado, de acordo com o princípio tempus regit actum.
Por conseqüência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Feitos esses esclarecimentos, passo ao exame do recurso.
Mérito
A regra geral é que o Judiciário não substitui, mas apenas controla a legalidade dos atos praticados pela Administração. Havendo procedimento administrativo específico e regulado em lei para a sua pretensão, o postulante obriga-se a percorrê-lo e somente em face do indeferimento é que pode bater às portas do Judiciário. E isso porque não há lide sem pretensão resistida, caracterizadora de lesão ou ameaça a direito (CF/ 88, art. 5º, XXXV).
O caso em análise, entretanto, permite solução diversa.
E isso porque a parte autora permaneceu em auxílio-doença desde 07/08/2015, por problemas ortopédicos, até a suspensão do benefício, por decisão médica contrária, em 21/08/2015, tendo ajuizado a presente ação em 15/10/2015.
Nesse contexto, não há dúvidas quanto ao interesse de agir da parte autora, estando plenamente caracterizada a pretensão resistida a justificar a propositura da ação e o regular prosseguimento do feito.
A suspensão ou o indeferimento do benefício pelo INSS são suficientes para caracterizar o interesse de agir do segurado que ingressa com demanda judicial, não sendo necessário - muito menos exigível - o exaurimento da via administrativa.
E no caso dos autos a pretensão resistida se dá pela suspensão do benefício, comprovada pelos documentos das fls. 22 e 29.
Assim, e considerando que a demanda versa justamente sobre a suspensão alegadamente indevida, tenho que o cancelamento antecipado do benefício caracteriza inequívoca resistência à pretensão da parte autora, sendo desnecessário, neste caso, exigir-se prévio pleito de prorrogação do benefício ou mesmo pedido de reconsideração da decisão administrativa para o ingresso em juízo, ou que a decisão administrativa impugnada seja contemporânea à propositura da ação ou, ainda, que o benefício seja suspenso antes de realizada a perícia médica de revisão.
Nesse sentido é o entendimento desta Corte, como se vê, apenas para exemplificar, nas ementas a seguir transcritas:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CANCELAMENTO ADMINISTRATIVO. INTERESSE DE AGIR. SENTENÇA ANULADA.
1. Evidente o interesse de agir do segurado que ingressa com a ação judicial após o cancelamento administrativo de seu benefício por incapacidade. 2. Sentença de extinção do feito sem julgamento do mérito anulada e determinado o prosseguimento do processo.
(AC nº 0003266-02.2012.404.9999, 6ª T., Rel. Des. Federal João Batista Pinto Silveira. Dec. un. em 18/07/2012, D.E. de 27/07/2012)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. interesse DE agir. SUSPENSÃO ADMINISTRATIVA. PRETENSÃO RESISTIDA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. AUSÊNCIA DE CITAÇÃO.
1. Tendo o INSS cancelado administrativamente o benefício de auxílio-doença, há pretensão resistida, fazendo certa a necessidade do provimento judicial para dirimir a lide posta, uma vez que o ingresso em juízo não se condiciona ao prévio exaurimento da via administrativa.
2. Sentença anulada para que os autos voltem à vara de origem, onde dar-se-á o regular processamento do feito.
(AC nº 0002288-25.2012.404.9999, 6ª T., Rel. Des. Federal Celso Kipper, D.E. 17/05/2012)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. EXAURIMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA. DESNECESSIDADE. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA. REQUISITOS.
1. O cancelamento de benefício anteriormente concedido pela autarquia denota o interesse de agir do segurado, não se exigindo o exaurimento da via administrativa para o ingresso em juízo. Inteligência da Súmula 213 do extinto TFR.
2. (...).
(AI nº 2006.04.00.031717-4, 6ª T., Rel. Juiz Federal Sebastião Ogê Muniz, D.E. 13/12/2006)
E o mesmo ocorre com relação à aposentadoria por invalidez, pois eventual pedido na via administrativa certamente seria indeferido pela mesma decisão médica contrária que ensejou o cancelamento do auxílio-doença, e mais ainda quanto ao auxílio-acidente - que não exige prévio requerimento administrativo quando precedido de auxílio-doença - não havendo que se falar, da mesma forma, em falta de interesse processual por ausência de pretensão resistida.
Por fim, a partir do julgamento do RE 631240, em sede de repercussão geral, o STF assentou o entendimento no sentido da indispensabilidade do prévio requerimento administrativo de benefício previdenciário como pressuposto para que se possa acionar legitimamente o Poder Judiciário, ressaltando ser prescindível o exaurimento daquela esfera.
No voto condutor, o e. Relator, Ministro Luís Roberto Barroso, dividiu as ações previdenciárias em dois grupos, de acordo com o objeto da demanda, esclarecendo a interpretação a ser dada em cada caso:
1) demandas que pretendem obter uma prestação ou vantagem inteiramente nova ao patrimônio jurídico do autor (concessão de benefício, averbação de tempo de serviço e respectiva certidão, etc.)
2) ações que visam ao melhoramento ou à proteção de vantagem já concedida ao demandante (pedidos de revisão, conversão de benefício em modalidades mais vantajosa, restabelecimento, manutenção, etc.)
No primeiro grupo, como regra, "exige-se a demonstração de que o interessado já levou sua pretensão ao conhecimento da Autarquia e não obteve a resposta desejada", sendo que a falta de prévio requerimento administrativo de concessão deve implicar na extinção do processo judicial sem resolução de mérito, por ausência de interesse de agir.
No segundo grupo, "porque já houve a inauguração da relação entre o beneficiário e a Previdência", não se faz necessário, de forma geral, que o autor provoque novamente o INSS para ingressar em juízo.
Tenho, deste modo, que a suspensão antecipada do benefício caracteriza pretensão resistida suficiente ao ingresso da ação que objetiva o restabelecimento ou prorrogação do auxílio-doença e sua conversão em aposentadoria por invalidez, razão pela qual impõe-se a anulação da sentença e o retorno dos autos à origem a fim de ser regularmente processado e julgado o feito.
ANTE O EXPOSTO, voto por dar provimento ao recurso, para anular a sentença, determinando o regular processamento do feito.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 10/08/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002839-63.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00026115820158210124
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | NOELI ELISABETE SCHNEIDER MARCHIOTTI |
ADVOGADO | : | Neusa Ledur Kuhn |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 10/08/2016, na seqüência 393, disponibilizada no DE de 26/07/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PROVIMENTO AO RECURSO, PARA ANULAR A SENTENÇA, DETERMINANDO O REGULAR PROCESSAMENTO DO FEITO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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