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PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS). INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS POR INC...

Data da publicação: 21/12/2020, 07:00:56

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS). INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. TEORIA DA CAUSA MADURA. CONDIÇÃO DE DEFICIENTE E IMPEDIMENTO A LONGO PRAZO NÃO COMPROVADOS. TRANSTORNO AFETIVO BIPOLAR. LAUDO PERICIAL. 1. A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região consagrou a fungibilidade dos benefícios previdenciários de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e benefício assistencial ao deficiente, uma vez que todos possuem como requisito a redução ou supressão da capacidade laboral. Logo, cabe ao INSS, administrativamente, ou ao magistrado, conceder o benefício adequado a cada situaç?o, ainda que tenha sido formulado pedido diverso, sem incorrer em julgamento extra petita. Portanto, o requerimento administrativo de auxílio-doença é suficiente para que seja configurado o interesse de agir da parte autora. 2. À luz do art. 1.013 do Código de Processo Civil, da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o mérito do pedido pode ser examinado diretamente em segundo grau de jurisdição quando a causa está em condições de imediato julgamento, mesmo que envolva questões de fato. 3. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741/2003 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família). 4. Somente contexto probatório muito relevante, constituído por exames que conclusivamente apontem para a incapacidade do segurado, pode desfazer a credibilidade que se deve emprestar a laudo pericial elaborado por profissional qualificado a servir como auxiliar do juízo. 5. Não havendo prova da deficiência ou impedimento a longo prazo, é imprópria a concessão de benefício assistencial. (TRF4, AC 5018129-91.2020.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 13/12/2020)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5018129-91.2020.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: GABRIELA CAMILA DA SILVA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Gabriela Camila da Silva ajuizou ação ordinária em face do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão de benefício assistencial.

Sentenciando, o magistrado a quo reconheceu a ausência de interesse processual diante da falta de requerimento administrativo para a concessão de benefício assistencial, tendo em vista que o pedido realizado na esfera administrativa visava à concessão de auxílio-doença. Por essa razão, declarou extinto o feito, sem julgamento de mérito, com fulcro no art. 485, VI, do Código de Processo Civil. A parte autora foi condenada ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, arbitrados em R$ 1.500,00. O INSS, por sua vez, foi isento do recolhimento das custas e despesas processuais (Evento 2 - DEC39).

Inconformada, a autora apelou, sustentando que a jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região consagrou entendimento acerca da fungibilidade dos benefícios por incapacidade. Diante disso, argumentou que há interesse processual e que, conforme demonstrado pelos elementos probatórios, estão presentes os requisitos do impedimento de longo prazo, por ser portadora de transtorno afetivo bipolar, e da situação de vulnerabilidade social. Requereu, por fim, sejam julgados procedentes os pedidos deduzidos na inicial (Evento 2 - APELAÇÃO41).

Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal.

VOTO

Benefício Assistencial ao Idoso ou Portador de Deficiência

Trata-se de demanda previdenciária na qual a parte autora objetiva a concessão de benefício assistencial previsto no artigo 203, inciso V, da Constituição Federal, e regulamentado pelo artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pelas Leis nº 12.435, de 06 de julho de 2011, e nº 12.470, de 31 de agosto de 2011.

O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: a) condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, de acordo com a redação original do art. 20 da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, conforme redação atual do referido dispositivo) ou idoso (neste caso, considerando-se, desde 1º de janeiro de 2004, a idade de 65 anos); e b) situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.

Quanto à condição de deficiente, deve ficar comprovada a incapacidade para a vida independente, conforme disposto no artigo 20, da Lei 8.742/93, em sua redação original, esclarecendo que este Tribunal consolidou entendimento segundo o qual a interpretação que melhor se coaduna ao princípio da dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III) é a que garante o benefício assistencial à maior gama possível de pessoas portadoras de deficiência. Cumpre ao julgador, portanto, ao analisar o caso concreto, observar que a incapacidade para a vida independente (a) não exige que a pessoa possua uma vida vegetativa ou que seja incapaz de locomover-se; (b) não significa incapacidade para as atividades básicas do ser humano, tais como alimentar-se, fazer a higiene e vestir-se sozinho; (c) não impõe a incapacidade de expressar-se ou de comunicar-se; e (d) não pressupõe dependência total de terceiros (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).

No que diz respeito ao requisito etário, em se tratando de benefício requerido na vigência do Estatuto do Idoso, é considerada idosa a pessoa com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção nem de tê-la provida por sua família. O requisito é objetivo, ou seja, comprovado o atributo etário, a análise da condição incapacitante é desnecessária, bastando apenas verificar a situação de vulnerabilidade socioeconômica a que submetido o idoso.

A situação de risco social, por sua vez, deve ser analisada inicialmente sob o ângulo da renda per capita do núcleo familiar, que deverá ser inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo. Registro, no ponto, que o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no bojo do Tema 185 esclarecendo que a limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, de modo a se presumir absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior a 1/4 do salário mínimo (REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009).

Posteriormente, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao julgar a Reclamação n. 4374 e o Recurso Extraordinário n. 567985 (este com repercussão geral), estabeleceu que o critério legal de renda familiar per capita inferior a um quarto do salário mínimo encontra-se defasado para caracterizar a situação de miserabilidade, não se configurando, portanto, como a única forma de aferir a incapacidade da pessoa para prover sua própria manutenção ou tê-la provida por sua família.

Na mesma oportunidade, o Plenário do STF, ao julgar o Recurso Extraordinário 580.963/PR, também declarou a inconstitucionalidade do parágrafo único do art. 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), o qual estabelece que o benefício assistencial já concedido a qualquer idoso membro da família não será computado para fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a LOAS, com base nos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana e da isonomia, bem como no caráter de essencialidade de que se revestem os benefícios de valor mínimo, tanto previdenciários quanto assistenciais, concedidos a pessoas idosas e também àquelas portadoras de deficiência. De acordo com o STF, portanto, não se justifica que, para fins do cálculo da renda familiar per capita, haja previsão de exclusão apenas do valor referente ao recebimento de benefício assistencial por membro idoso da família, quando verbas de outra natureza (benefício previdenciário), bem como outros beneficiários de tais verbas (membro da família portador de deficiência), também deveriam ser contemplados.

Mais recentemente, a Primeira Seção do STJ, com fundamento nos princípios da igualdade e da razoabilidade, firmou entendimento segundo o qual, também nos pedidos de benefício assistencial feitos por pessoas portadoras de deficiência, deve ser excluído do cálculo da renda familiar per capita qualquer benefício, no valor de um salário mínimo, recebido por maior de 65 anos, independentemente se assistencial ou previdenciário, aplicando-se, analogicamente, o disposto no parágrafo único, do art. 34, do Estatuto do Idoso. Confira-se:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA. AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA. IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO. 1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício de prestação mensal continuada a pessoa deficiente. 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93. 3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.(REsp 1355052/SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 25/02/2015, DJe 05/11/2015).

Assim, em regra, integram o cálculo da renda familiar per capita os rendimentos auferidos pelo cônjuge ou companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art. 20, § 1º, da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei n.º 12.435/2011).

Devem ser excluídos do cálculo, todavia, o valor auferido por idoso com 65 anos ou mais a título de benefício assistencial ou benefício previdenciário de renda mínima (TRF4, EINF 5003869-31.2010.404.7001, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Roger Raupp Rios, juntado aos autos em 10 de fevereiro de 2014), bem como o valor auferido a título de benefício previdenciário por incapacidade ou assistencial em razão de deficiência, independentemente de idade (TRF4, APELREEX 2006.71.14.002159-6, Sexta Turma, Relatora Vânia Hack de Almeida, D.E. 10 de setembro de 2015), ressaltando-se que tal beneficiário, em decorrência da exclusão de sua renda, também não será considerado na composição familiar, para efeito do cálculo da renda.

Demais disso, os cuidados necessários com a parte autora, em decorrência de sua deficiência, incapacidade ou avançada idade, que acarretarem gastos - notadamente com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis, tratamento médico, psicológico e fisioterápico, entre outros -, configuram despesas a ser consideradas na análise da condição de risco social da família do demandante (TRF4, APELREEX 5002022-24.2011.404.7012, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, juntado aos autos em 27 de junho de 2013).

Em relação à percepção do benefício instituído pelo Programa Bolsa Família, não só não impede o recebimento do benefício assistencial do art. 203, V, da Constituição Federal, como constitui forte indicativo de que a unidade familiar encontra-se em situação de risco social (TRF4, APELREEX 2009.71.99.006237-1, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 07 de outubro de 2014).

Concluindo, em linhas gerais, para efeito de concessão do benefício de prestação continuada, a situação de risco social a que se encontra exposta a pessoa idosa ou portadora de deficiência e sua família deve ser analisada em cada caso concreto (TRF4, EINF 0016689-58.2014.404.9999, Terceira Seção, Relator Ricardo Teixeira do Valle Pereira, D.E. 29 de maio de 2015).

Caso concreto

Com a finalidade de contextualizar a situação ora em análise, cumpre observar que, em 19/05/2017, a autora formulou requerimento administrativo para a concessão de auxílio-doença (NB 618.654.681-4), por ser portadora de transtorno afetivo bipolar, o qual foi indeferido em razão de a incapacidade ser anterior ao seu ingresso no RGPS (Evento 2 - VOL2, fl.15). Diante disso, ajuizou a presente ação em 11/07/2017, pleiteando a concessão do benefício assistencial.

Controverte-se, inicialmente, em relação ao acerto da decisão recorrida que extinguiu o feito sem julgamento de mérito. Entendeu o magistrado sentenciante pela ausência de interesse processual, em razão da falta de requerimento administrativo para a concessão de benefício assistencial, tendo em vista que o pedido realizado na esfera administrativa visava à concessão de auxílio-doença.

Em relação à desnecessidade de prévio requerimento administrativo do benefício assistencial, entendo que assiste razão à apelante. O fato não ter postulado tal benefício em sede administrativa não impede que se reconheça eventual direito, porquanto fungíveis os benefícios previdenciários por incapacidade.

A jurisprudência deste Tribunal Regional Federal da 4ª Região consagrou a fungibilidade dos benefícios previdenciários de auxílio-doença, de aposentadoria por invalidez e do benefício assistencial ao deficiente, uma vez que todos possuem como requisito a redução ou supressão da capacidade para o trabalho. Logo, cabe ao INSS, administrativamente, ou ao magistrado, em juízo, conceder o benefício mais adequado à situação fática, ainda que tenha sido formulado pedido diverso, sem incorrer em julgamento extra petita. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO AUSENTE. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. FUNGIBILIDADE. INDEFERIMENTO DO PEDIDO DE PRODUÇÃO DE LAUDO SOCIOECONÔMICO. NECESSIDADE DE REABERTURA DA INSTRUÇÃO. SENTENÇA ANULADA. 1. Ausente a qualidade de segurado, improcede o pedido de concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez. 2. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família. 3. Hipótese em que ausente a produção de prova de carência financeira. Anulada a sentença e reaberta a instrução para a realização de prova pericial de laudo socioeconômico. Precedentes. (TRF4, AC 0012108-63.2015.4.04.9999/RS, QUINTA TURMA, Relatora Juíza Federal GISELE LEMKE, D.E. 07/05/2018)

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO AUSENTE. SENTENÇA CASSADA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. FUNGIBILIDADE. DEFICIENTE (INCAPACIDADE PARA O TRABALHO E PARA A VIDA INDEPENDENTE). INCAPACIDADE DE PROVER A PRÓPRIA MANUTENÇÃO OU TÊ-LA PROVIDA DE OUTRA FORMA. COMPROVAÇÃO. CONVERSÃO DA APOSENTADORIA POR INVALIDEZ EM BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. SISTEMÁTICA DE ATUALIZAÇÃO DO PASSIVO. TEMA Nº 810 DO STF. HONORÁRIOS. CUSTAS.1. Ausente a qualidade de segurado, não é possível a concessão de auxílio-doença/aposentadoria por invalidez, devendo ser cassada a sentença.2. Por outro lado, encontrando-se a autora em situação de vulnerabilidade social, na linha da jurisprudência dessa Corte, à luz da natureza pro misero do direito previdenciário, bem como dos princípios da proteção social e fungibilidade dos pedidos e por não consistir julgamento extra ou ultra petita o fato de conceder-se benefício diverso do pedido, possível a concessão de benefício assistencial.3. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente ou idoso (65 anos ou mais); e situação de risco social (estado de miserabilidade, hipossuficiência econômica ou situação de desamparo) da parte autora e de sua família.4. O Supremo Tribunal Federal já decidiu que o critério definido pelo art. 20, § 3º, da Lei 8.742/1993 é apenas um indicativo objetivo, o qual não exclui a possibilidade de verificação da hipossuficiência econômica dos postulantes do benefício assistencial de prestação continuada.5. Comprovada a condição de pessoa deficiente (incapaz para o trabalho e para a vida independente) e de vulnerabilidade social, converte-se a aposentadoria por invalidez em benefício assistencial. 6. Sistemática da atualização do passivo observará a decisão do STF consubstanciada no seu Tema 810.7. Honorários devidos no percentual de 10% sobre parcelas vencidas até a sentença (Súmulas 111 STJ e 76 do TRF4).8. Não se aplica isenção das custas quando o INSS é demandado na Justiça Estadual do Paraná (Súmula 20 do TRF4). (TRF4, AC 5044948-07.2016.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator LUIZ CARLOS CANALLI, juntado aos autos em 22/02/2018)

Deste modo, formulado pedido de auxílio-doença, benefício por incapacidade fungível com o benefício assistencial, resta cumprido o requisito necessário para a configuração do interesse de agir. Considerando que o INSS tem o dever de orientar o segurado e conceder o benefício a que faz jus, ainda que diverso do requerido, entende-se que houve, no caso, a recusa tácita.

Dito isso, passo ao exame do mérito propriamente dito, com fundamento na teoria da causa madura (art. 1.013 do Código de Processo Civil), segundo a qual o mérito do pedido pode ser examinado diretamente por este Tribunal quando a causa estiver em condições de imediato julgamento. No presente caso, a instrução se deu de forma regular e o feito encontra-se apto para julgamento, destacando-se que foram realizadas as provas necessárias para o deslinde da controvérsia, in casu, a perícia médica e o estudo social, além de terem sido apresentadas as alegações necessárias (Evento 2 - PET28 e Evento 2 - PET34).

De acordo com as informações extraídas da perícia médica, realizada em 15/06/2018 por especialista em psiquiatria (Evento 2 - LAUDO25), a autora, atualmente com 21 anos de idade (nascida em 29/05/1999), relatou que trabalhou como atendente de lanchonete durante um ano e seis meses, mas encontra-se afastada de suas atividades desde 30/04/2017, em virtude de problemas psiquiátricos (conforme declaração do empregador analisada pela perita).

Após exame do estado mental e análise da documentação complementar apresentada, o diagnóstico foi de transtorno afetivo bipolar, episódio misto (CID F31.6) e transtornos mentais e comportamentais devido ao uso de múltiplas drogas - uso nocivo para a saúde (CID F19.1).

A perita esclareceu que, durante a perícia, a autora apresentava episódio de descompensação da doença, destacando que, nessas ocasiões, há risco de auto e heteroagressão, bem como de exposição moral. Fixou o início da incapacidade laborativa em 24/03/2017, com base em atestado médico comprovando internação hospitalar psiquiátrica.

Percebe-se que, entre a data de início de incapacidade (24/03/2017) e a data do laudo pericial (15/06/2018), não transcorreu o período de dois anos exigido pela LOAS para caracterizar o impedimento a longo prazo necessário à concessão do amparo assistencial. Embora a perita tenha estimado um prazo de 12 meses para a recuperação (a contar da data do laudo), não é possível antever os efeitos prospectivos da doença, devendo-se dar destaque para o fato de que a autora não juntou aos autos qualquer atestado médico atualizado comprovando a persistência do quadro incapacitante.

Ressalte-se que a autora realiza acompanhamento ambulatorial regular e faz uso de medicação contínua. Em resposta aos quesitos, a perita esclareceu que, mediante adequação do tratamento, não se espera que o impedimento para o labor seja de longa duração. Confira-se:

3) O(s) impedimento(s) apresentado(s) é(são) de longa duração, ou seja, pelo prazo mínimo de dois anos conforme Lei nº 12.470/2011?

Resposta: Não é o esperado com o tratamento correto.

Assim sendo, embora tenha sido confirmado o diagnóstico de transtorno afetivo bipolar, verifica-se que a incapacidade decorrente da doença possui caráter temporário, uma vez que o quadro é passível de tratamento.

Portanto, no que se refere ao critério da deficiência ou impedimento a longo prazo, as conclusões do laudo médico demonstram que a autora não preenche os requisitos para a concessão do amparo assistencial. Os documentos anexados ao processo, de igual modo, não são suficientes para afastar tal conclusão, pois não há prova de que esteja acometida por moléstia incapacitante a longo prazo ou qualquer espécie de deficiência que justifique a concessão do benefício assistencial.

Diante da constatação do não preenchimento desse requisito essencial para a concessão do benefício, fica prejudicada a análise dos demais pontos da apelação, incluindo a aferição do requisito econômico. Portanto, uma vez que ausente a condição de deficiente ou impedimento de longo prazo, conclui-se que a parte autora não faz jus ao recebimento de benefício assistencial.

Prequestionamento

O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar junto às instâncias Superiores os dispositivos que as fundamentam. Assim, deixo de aplicar os dispositivos legais ensejadores de pronunciamento jurisdicional distinto do que até aqui foi declinado. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração tão somente para este fim, o que evidenciaria finalidade procrastinatória do recurso, passível de cominação de multa.

Dispositivo

Em face do que foi dito, voto por negar provimento à apelação, nos termos da fundamentação.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002150584v52 e do código CRC 7cd33d4d.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 13/12/2020, às 22:41:26


5018129-91.2020.4.04.9999
40002150584.V52


Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2020 04:00:56.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5018129-91.2020.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

APELANTE: GABRIELA CAMILA DA SILVA

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA (LOAS). INTERESSE DE AGIR CONFIGURADO. FUNGIBILIDADE DOS BENEFÍCIOS POR INCAPACIDADE. TEORIA DA CAUSA MADURA. CONDIÇÃO DE DEFICIENTE E IMPEDIMENTO A LONGO PRAZO NÃO COMPROVADOS. transtorno afetivo bipolar. LAUDO PERICIAL.

1. A jurisprudência do Tribunal Regional Federal da 4ª Região consagrou a fungibilidade dos benefícios previdenciários de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e benefício assistencial ao deficiente, uma vez que todos possuem como requisito a redução ou supressão da capacidade laboral. Logo, cabe ao INSS, administrativamente, ou ao magistrado, conceder o benefício adequado a cada situaçāo, ainda que tenha sido formulado pedido diverso, sem incorrer em julgamento extra petita. Portanto, o requerimento administrativo de auxílio-doença é suficiente para que seja configurado o interesse de agir da parte autora.

2. À luz do art. 1.013 do Código de Processo Civil, da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, o mérito do pedido pode ser examinado diretamente em segundo grau de jurisdição quando a causa está em condições de imediato julgamento, mesmo que envolva questões de fato.

3. O direito ao benefício assistencial pressupõe o preenchimento dos seguintes requisitos: condição de deficiente (incapacidade para o trabalho e para a vida independente, consoante a redação original do art. 20, da LOAS, ou impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir a participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, consoante a redação atual do referido dispositivo) ou idoso (assim considerado aquele com 65 anos ou mais, a partir de 1º de janeiro de 2004, data da entrada em vigor da Lei nº 10.741/2003 - Estatuto do Idoso) e situação de risco social (ausência de meios para a parte autora, dignamente, prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família).

4. Somente contexto probatório muito relevante, constituído por exames que conclusivamente apontem para a incapacidade do segurado, pode desfazer a credibilidade que se deve emprestar a laudo pericial elaborado por profissional qualificado a servir como auxiliar do juízo.

5. Não havendo prova da deficiência ou impedimento a longo prazo, é imprópria a concessão de benefício assistencial.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 19 de novembro de 2020.



Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002150585v8 e do código CRC 4a18ace0.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): OSNI CARDOSO FILHO
Data e Hora: 13/12/2020, às 22:41:26


5018129-91.2020.4.04.9999
40002150585 .V8


Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2020 04:00:56.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 12/11/2020 A 19/11/2020

Apelação Cível Nº 5018129-91.2020.4.04.9999/RS

RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

PROCURADOR(A): THAMEA DANELON VALIENGO

APELANTE: GABRIELA CAMILA DA SILVA

ADVOGADO: JULIA SCHNEIDER FERNANDES (OAB RS098315)

ADVOGADO: JOSE GABRIEL SCHNEIDER FERNANDES (OAB RS086833)

ADVOGADO: DÉBORA SCHNEIDER FERNANDES (OAB RS073789)

ADVOGADO: PAULO ARGEU SARAIVA FERNANDES (OAB RS028408)

APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 12/11/2020, às 00:00, a 19/11/2020, às 14:00, na sequência 290, disponibilizada no DE de 03/11/2020.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Juiz Federal JOSÉ LUIS LUVIZETTO TERRA

Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 21/12/2020 04:00:56.

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