| D.E. Publicado em 06/04/2017 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000632-91.2016.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | MARIA SALETE MACHADO DA SILVA |
ADVOGADO | : | Edson Vieira Schel |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. COISA JULGADA. OCORRÊNCIA. SENTENÇA DE EXTINÇÃO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO MANTIDA. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONFIGURAÇÃO. RETIFICAÇÃO DO VALOR DA CAUSA. EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À OAB.
1. Para o reconhecimento da coisa julgada é necessário que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade" - de partes, de pedido e de causa de pedir -, sendo que a variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
2. A litigância de má-fé não se presume, devendo ser comprovada pelo dolo processual que, na espécie, restou configurado pela propositura de ação com mesmo pedido e causa de pedir, pelo mesmo procurador, em juízo diverso, o que dificulta a identificação da existência de litispendência ou coisa julgada, após ciência da sentença de improcedência proferida na ação anterior.
3. O valor da causa deve corresponder ao conteúdo econômico da demanda, podendo inclusive ser corrigido de ofício.
4. Determinada a expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS), para as providências que entender cabíveis.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao recurso de apelação do INSS a fim de levantar a suspensão da exigibilidade dos ônus de sucumbência; condenar a parte autora ao pagamento de multa por litigância de má-fé; bem como, de ofício, retificar o valor atribuído à causa e determinar a expedição de ofício à OAB/RS para as providências que entender cabíveis no que tange à conduta do causídico da autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 29 de março de 2017.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8837601v6 e, se solicitado, do código CRC AEB8B911. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000632-91.2016.4.04.9999/RS
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RELATÓRIO
Trata-se de ação ordinária objetivando a concessão do benefício de auxílio-doença desde a data de seu requerimento administrativo, 16/09/2013, e sua conversão em aposentadoria por invalidez. Requereu a parte autora a antecipação dos efeitos da tutela e, ao final, o pagamento das parcelas atrasadas.
Intimada para que acostasse aos autos comprovante atualizado de seu domicílio e declaração de renda para fins de análise do pedido de concessão do benefício de gratuidade de justiça, a parte autora não se manifestou nos autos (fl. 28).
Sobreveio defesa do INSS, na qual o mesmo trouxe a notícia da existência de ação anterior com trânsito em julgado envolvendo a mesma causa de pedir, pedido e partes, pleiteando em razão disto o reconhecimento da coisa julgada.
A sentença, reconhecendo a ocorrência da coisa julgada, julgou extinta a ação nos termos dos art. 267, V, do CPC/1973, condenando a parte autora ao pagamento de custas e de honorários advocatícios, os quais foram fixados em R$ 700,00, sendo determinada a suspensão de tais verbas "pela gratuidade de justiça".
O INSS apresentou recurso de apelação postulando a reforma da decisão prolatada para que o benefício da gratuidade de justiça seja revogado, para que os honorários de sucumbência sejam majorados para o valor de R$ 5.000,00, e para que sejam a parte autora e seu procurador condenados ao pagamento de pena em razão da litigância de má-fé.
Oportunizadas as contrarrazões, subiram os autos.
É o relatório.
VOTO
Do Direito Intertemporal
Considerando que o presente processo está sendo apreciado por esta Turma após o início da vigência da Lei n.º 13.105/15, novo Código de Processo Civil, necessário se faz a fixação, à luz do direito intertemporal, dos critérios de aplicação dos dispositivos processuais concernentes ao caso em apreço, a fim de evitar eventual conflito aparente de normas.
Para tanto, cabe inicialmente ressaltar que o CPC/2015 procurou estabelecer, em seu CAPÍTULO I, art. 1º que 'o processo civil será ordenado, disciplinado e interpretado conforme os valores e as normas fundamentais estabelecidos na Constituição da República Federativa do Brasil, observando-se as disposições deste Código'; em seu CAPÍTULO II, art. 14, que 'a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada'; bem como, em suas DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS, art. 1.046, caput, que 'ao entrar em vigor este Código, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973' (grifo nosso).
Neste contexto, percebe-se claramente ter o legislador pátrio adotado o princípio da irretroatividade da norma processual, em consonância com o art. 5º, inc. XXXVI da Constituição Federal, o qual estabelece que 'a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada'.
Desta forma, a fim de dar plena efetividade às referidas disposições normativas, e tendo em vista ser o processo constituído por um conjunto de atos, dirigidos à consecução de uma finalidade, qual seja, a composição do litígio, adoto, como critério de solução de eventual conflito aparente de normas, a Teoria dos Atos Processuais Isolados, segundo a qual cada ato deve ser considerado separadamente dos demais para o fim de se determinar a lei que o rege, a qual será, segundo o princípio tempus regit actum, aquela que estava em vigor no momento em que o ato foi praticado.
Por consequência, para deslinde da antinomia aparente supracitada, deve ser aplicada no julgamento a lei vigente:
(a) Na data do ajuizamento da ação, para a verificação dos pressupostos processuais e das condições da ação;
(b) Na data da citação (em razão do surgimento do ônus de defesa), para a determinação do procedimento adequado à resposta do réu, inclusive quanto a seus efeitos;
(c) Na data do despacho que admitir ou determinar a produção probatória, para o procedimento a ser adotado, inclusive no que diz respeito à existência de cerceamento de defesa;
(d) Na data da publicação da sentença (entendida esta como o momento em que é entregue em cartório ou em que é tornado público o resultado do julgamento), para fins de verificação dos requisitos de admissibilidade dos recursos, de seus efeitos, da sujeição da decisão à remessa necessária, da aplicabilidade das disposições relativas aos honorários advocatícios, bem como de sua majoração em grau recursal.
Da coisa julgada
No caso dos autos, a presente ação foi ajuizada em 09/05/2014 tendo por causa de pedir as lesões sofridas pelo fato de ter sido vítima de disparos de arma de fogo quando da tentativa de roubo ocorrida em 10/11/2012, de acordo com o respectivo boletim de ocorrência juntado à fl. 13. Assim, buscava a demandante a concessão do benefício 31/603.324.864-7, requerido em 16/09/2013.
Ocorre que, consoante os documentos apresentados pelo réu em sua peça defensiva, em 10/01/2014 a parte autora distribuiu perante a 12ª Vara Federal de Porto Alegre - RS ação com os mesmos elementos desta, o que se pode comprovar pela comparação das respectivas petições iniciais (fls. 2-3 e 36). Em razão das conclusões contrárias a sua pretensão estabelecidas pela perícia médica (fls. 37-41), a ação foi julgada improcedente em 22/04/2014, sendo certificado o trânsito em julgado em 21/05/2014.
Para o reconhecimento da coisa julgada é necessário que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade", ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada. Nesse sentido, apenas para exemplificar, o precedente a seguir transcrito:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. COISA JULGADA. ALEGAÇÃO DE MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO SOCIOECONÔMICA. NECESSIDADE DE REALIZAÇÃO DE PERÍCIA SOCIOECONÔMICA. CERCEAMENTO DE DEFESA. ANULAÇÃO DA SENTENÇA.
1. Para a admissão da existência de coisa julgada é necessário, nos termos do § 2º do artigo 301 do CPC, que entre uma e outra demanda seja caracterizada a chamada "tríplice identidade", ou seja, que haja identidade de partes, de pedido e de causa de pedir. A variação de quaisquer desses elementos identificadores afasta a ocorrência de coisa julgada.
2. É possível o ajuizamento de nova ação pelo segurado contra o INSS (com o mesmo pedido) sempre que houver modificação da situação fática, o que não infringirá a coisa julgada, pois a causa de pedir será diferente. Precedentes da Corte.
(...)
(AC nº 0019677-86.2013.404.9999, Rel. Juiz Federal Roger Raupp Rios, 6ª T., dec. un. em 26/03/2014, D.E. de 03/04/2014)
Inegável, portanto, a ocorrência da coisa julgada.
Do benefício da gratuidade de justiça
Quanto à AJG a Corte Especial deste Tribunal uniformizou o entendimento acerca da questão referente aos parâmetros a serem observados por ocasião da concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita nos seguintes termos:
INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. LEI 1.060/50. ART. 4ª. ESTADO DE MISERABILIDADE. PRESUNÇÃO PELA SIMPLES AFIRMAÇÃO. ÔNUS DA PROVA. PARTE CONTRÁRIA.
1. Para a concessão da assistência judiciária gratuita basta que a parte declare não possuir condições de arcar com as despesas do processo sem prejuízo do próprio sustento ou de sua família, cabendo à parte contrária o ônus de elidir a presunção de veracidade daí surgida - art. 4º da Lei nº 1060/50.
2. Descabem critérios outros (como isenção do imposto de renda ou renda líquida inferior a 10 salários mínimos) para infirmar presunção legal de pobreza, em desfavor do cidadão.
3. Uniformizada a jurisprudência com o reconhecimento de que, para fins de Assistência Judiciária Gratuita, inexistem critérios de presunção de pobreza diversos daquela constante do art. 4º da Lei nº 1060/50.
(TRF4, Incidente de Uniformização de Jurisprudência na Apelação Cível nº 5008804-40.2012.404.7100, Corte Especial, Relator Desembargador Federal Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, Relator para Acórdão Desembargador Federal Néfi Cordeiro, por maioria, julgado em 22-11-2012)
Assim, passo a adequar meu entendimento à decisão proferida pela Corte Especial deste Regional no sentido de que, para o deferimento dos benefícios da assistência judiciária gratuita basta a declaração da parte requerente no sentido de que não possui condições de arcar com os ônus processuais, restando à contraparte a comprovação em sentido contrário.
Na mesma linha, aliás, o novo Código de Processo Civil passou a disciplinar a concessão da gratuidade da justiça em seu art. 98 e seguintes, estabelecendo, em relação à pessoa física, uma presunção iuris tantum de veracidade da alegação de insuficiência de recursos, a qual pode ser ilidida pela parte contrária.
Ocorre que na presente ação, em virtude de constar no registro do boletim de ocorrência ser a demandante proprietária de um veículo Kia/Sportage EX 2.0 2008/2009 (fl. 14), foi ela intimada pelo juízo a quo para que acostasse aos autos a última declaração de renda entregue à receita federal sob pena de indeferimento da AJG (fl. 28), sendo que, apesar de intimada (fl. 29), a requerente não apresentou qualquer tipo de manifestação nos autos.
Não obstante, na decisão terminativa prolatada por magistrado diverso (fl. 48), foi determinada a suspensão dos ônus da sucumbência em virtude da gratuidade de justiça, a qual, todavia, como visto, não foi deferida à parte autora.
Vê-se, portanto, situação distinta daquela retratada no julgamento referido na ementa acima transcrita. Não houve, pelo juízo a quo, um condicionamento prima facie à concessão do benefício de gratuidade, mas sim a constatação da existência de indícios que afastariam a presunção de necessidade reconhecida pela lei e ratificada pela jurisprudência.
Neste cenário, forçoso concluir que ao silêncio da autora foi atribuído efeito jurídico na medida em que expressamente consignado que a não apresentação do documento exigido importaria no indeferimento do benefício. Reitera-se que, não obstante ter sido regularmente intimada, a parte requerente não apresentou qualquer tipo de oposição à decisão prolatada pelo juízo a quo.
Dessarte, entendo que a sentença proferida, ao determinar a suspensão dos ônus de sucumbência, incorreu em erro na medida em que não houve anterior deferimento do benefício requerido, tampouco impugnada a decisão da fl. 28 que intimou a autora para que fizesse prova de sua necessidade.
Assim, não há se falar na revogação pleiteada pela apelante, eis que não houve decisão judicial de conteúdo positivo sobre a matéria. Acolho, portanto, o pedido da apelante para retificar a decisão prolatada relativamente à suspensão dos ônus de sucumbência, uma vez que, como já dito, à demandante não foi concedido o benefício que dá amparo à suspensão determinada.
Da pena por litigância de má-fé
Considerando que o pedido veiculado nesta ação é idêntico ao que já havia sido formulado em demanda ajuizada anteriormente, e que esta só foi ajuizada pela autora, patrocinada pelo mesmo advogado, quando já prolatada sentença de improcedência na ação anterior, merece prosperar o pedido de condenação em pena de litigância de má-fé.
Reputo suficiente, para superar a presunção de boa-fé, o fato de que a parte autora propôs a presente ação em juízo estadual no exercício de competência delegada quando a anterior foi ajuizada perante a justiça federal, configurando nisso a intenção de dificultar a identificação da existência de litispendência ou coisa julgada. Tal propósito é ratificado pela conduta da parte demandante, a qual, além de nada referir em sua petição inicial, permaneceu silente nos momentos posteriores, aquiescendo, portanto, com as impugnações apresentadas pelo INSS e com o conteúdo das decisões proferidas até então.
O percentual da pena de litigância de má-fé, por sua vez, deve se adequar aos termos do art. 18 do CPC, que prevê:
"Art. 18. O juiz ou tribunal, de ofício ou a requerimento, condenará o litigante de má-fé a pagar multa não excedente a um por cento sobre o valor da causa e a indenizar a parte contrária dos prejuízos que esta sofreu, mais os honorários advocatícios e todas as despesas que efetuou".
Nesses termos, ausente prova dos prejuízos sofridos pelo apelante, condeno a parte autora tão somente ao pagamento de multa no valor correspondente a um por cento sobre o valor da causa.
Contudo, conforme precedente desta Corte, a responsabilidade dos advogados da parte autora deve ser apurada em processo autônomo, devendo, pois, ser excluída a condenação em face daqueles:
PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. REPETIÇÃO DO MESMO PEDIDO DE AÇÃO ANTERIOR. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.
1. Se já houve pronunciamento judicial com trânsito em julgado acerca da pretensão veiculada na presente demanda, com identidade de partes, de pedido e de causa de pedir, a questão não mais pode ser discutida, visto que existente coisa julgada.
2. Ao ajuizar uma segunda ação, renovando pedido que já fora objeto de apreciação judicial, a parte autora procedeu de forma temerária, razão pela qual deve ser condenada ao pagamento de multa por litigância de má-fé, nos termos dos arts. 17 e 18 do CPC.
3. Impossibilidade de condenação do procurador da parte autora ao pagamento da multa por litigância de má-fé, nos termos de precedentes do STJ (RMS 27.868/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011; REsp 1.194.683/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 17-08-2010; Resp 1.173.848/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20-04-2010) no sentido de que o advogado não pode ser penalizado no processo em que supostamente atua de má-fé, devendo eventual conduta desleal ser apurada em processo autônomo.
4. Determinada a expedição de ofício à Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, para as providências que entender cabíveis.
(TRF4, AC 5010934-57.2013.404.7200, Sexta Turma, Relator p/ Acórdão (auxílio João Batista) Paulo Paim da Silva, juntado aos autos em 28/08/2014)
De qualquer forma, em decorrência da ação temerária do causídico, e na linha do entendimento desta Turma, determino seja oficiado à OAB/RS, para as providências que entender apropriadas:
PREVIDENCIÁRIO. COISA JULGADA. REPETIÇÃO DO MESMO PEDIDO DE AÇÃO ANTERIOR. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.
1. Se já houve pronunciamento judicial com trânsito em julgado acerca da pretensão veiculada na presente demanda, com identidade de partes, de pedido e de causa de pedir, a questão não mais pode ser discutida, visto que existente coisa julgada.
2. Ao ajuizar uma segunda ação, renovando pedido que já fora objeto de apreciação judicial, a parte autora procedeu de forma temerária, razão pela qual deve ser condenada ao pagamento de multa por litigância de má-fé, nos termos dos arts. 17 e 18 do CPC.
3. Impossibilidade de condenação do procurador da parte autora ao pagamento da multa porlitigância de má-fé, nos termos de precedentes do STJ (RMS 27.868/DF, Rel. Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, julgado em 25/10/2011, DJe 11/11/2011; REsp 1.194.683/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 17-08-2010; REsp 1.173.848/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20-04-2010) no sentido de que o advogado não pode ser penalizado no processo em que supostamente atua de má-fé, devendo eventual conduta desleal ser apurada em processo autônomo.
4. Determinada a expedição de ofício à ordem dos advogados do brasil - oab, para as providências que entender cabíveis.
(AC 5010934-57.2013.404.7200, Sexta Turma, Rel. Juiz Federal Paulo Paim da Silva. Dec. unânime em 27/08/2014). grifei
Do valor da causa
Observo que, a despeito de a parte autora ter, na petição inicial da ação anteriormente ajuizada, regularmente atribuído valor à causa (R$ 40.680,00 - fl. 36v), nesta deu à causa o valor de alçada, o que encontra amparo nas ações de competência da justiça estadual, mas inexistente no foro da justiça federal.
O valor da causa, nos termos dos arts. 258 e seguintes do CPC vigente à época da propositura desta, é requisito essencial da petição inicial, tendo como critérios para sua atribuição aqueles indicados nos incisos do art. 259, bem como no art. 260 do estatuto processual civil. Desta forma, não cabe às partes disporem sobre as regras de fixação do valor da causa, pela sua característica de norma cogente (AI n.º 93.04.30442-3, TRF/4, 4ª T., rel. Juíza Maria Lúcia Luz Leiria, DJ. 07.06.95, p. 35629), devendo tal quantum, sempre que possível, apresentar correlação com o benefício pretendido pela parte. Neste sentido, cito o seguinte precedente:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. VALOR DA CAUSA. IMPROVIMENTO.
1. O valor da causa deve guardar compatibilidade com a pretensão deduzida, inocorrente na espécie.
2. Decisão exarada em impugnatória mantida, negando-se provimento ao recurso.
(AI n.º 10357-6, TRF/4, 2ª T., rel. Juiz Osvaldo Alvarez, DJ. 05.12.90, p. 29439).
A toda evidência, em nosso ordenamento jurídico, o valor da causa vai além do mero interesse particular dos litigantes, porquanto tem reflexos na própria relação processual - relação essa que, mesmo na hipótese de versar sobre interesses exclusivamente privados, possui inquestionável natureza pública. É assim que o valor da causa, em certas hipóteses, pode implicar inclusive na fixação da competência absoluta. Da mesma forma, é com base no valor da causa que pode ser arbitrada eventual indenização por perdas e danos, no caso de litigância de má-fé, nos termos do art. 18, § 2º, do CPC. Por outro lado, além dessa indenização, também a multa a ser cominada em desfavor da parte que inobservar os deveres processuais terá por limites o valor atribuído à causa, conforme dispõe o art. 14, parágrafo único, daquele mesmo diploma legal.
Por essas razões, pode o magistrado, em nosso sistema, determinar de ofício a correção do valor da causa. A propósito, consulte-se recente jurisprudência desta Corte:
PROCESSO CIVIL. SINDICATO. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. VALOR DA CAUSA.
1. A concessão de Assistência Judiciária Gratuita é devida às pessoas jurídicas, sejam elas com ou sem fins lucrativos. Todavia, é indispensável que se comprove a impossibilidade de arcar com as custas processuais sem prejudicar a sua manutenção.
2. Hipótese em que não restou comprovado o pagamento das custas processuais põe em risco a manutenção das atividades do sindicato.
3. As disposições do CDC relativas à isenção de custas não se aplicam às hipóteses em que o sindicato pleiteia em juízo direitos da categoria que representa.
4. O valor da causa deve corresponder ao benefício econômico perseguido na demanda. Evidenciada a incorreção desse valor, o juiz deve determinar a emenda à inicial ou, se tiver condições, corrigir de ofício, não havendo nisso ofensa ao parágrafo único do art. 261 do CPC.
5. Hipótese em que o valor atribuído à causa é claramente irreal com relação ao benefício econômico almejado, havendo condições do autor indicar valor aproximado, mesmo que por estimativa (...).
(TRF da 4ª Região, AG 200804000144501/RS, Terceira Turma, Rel. Marcelo De Nardi, pub. no DE em 23/07/2008).
PROCESSO CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA.VALOR DA CAUSA. CORRESPONDÊNCIA COM O CONTEÚDO ECONÔMICO DA DEMANDA. EMENDA À INICIAL. POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DEOFÍCIO.
1. O valor da causa deve corresponder ao seu conteúdo econômico, não ficando ao livre arbítrio da parte a fixação deste valor, por se tratar de tributo, receita indisponível da União.
2. Não havendo correspondência entre o total pecuniário perseguido e o valor atribuído à causa, pode o juiz, de ofício, requerer a retificação desse valor. Caso não atendida a determinação, deve ser extinto o feito, sem julgamento do mérito, com fulcro no art. 267, I, do CPC.
3. Apelação improvida.
(TRF da 4ª Região, AMS 200670020023460/PR, Primeira Turma, Rel. Des. Álvaro Eduardo Junqueira, pub. no DE em 13/11/2007).
No caso concreto, considerando que a pretensão da demandante nesta ação é idêntica àquela retratada na ação anteriormente distribuída, reputo necessária a correção, de ofício, do valor atribuído à causa para fixá-lo no montante de R$ 40.680,00 (quarenta mil seiscentos e oitenta reais), valor que foi atribuído pela requerente naquela demanda.
Da majoração dos honorários advocatícios de sucumbência
A apelante requereu em suas razões a majoração da verba honorária ao argumento de ter sido demonstrado o zelo adotado pelos procuradores da autarquia ao "desvendar a prática de uma grande fraude processual", a dificuldade em identificá-la na medida em que as ações foram distribuídas em sedes diversas ao local que funciona a Procuradoria Seccional Federal, e a importância da causa para a proteção do patrimônio público, indo ao encontro, pois, dos critérios definidos no §3º do art. 20 como norteadores à fixação da verba honorária.
Não há dúvidas de que o diligente trabalho dos procuradores federais concorreu para a correta aferição da situação fática, indo ao encontro de seu papel institucional e do intrínseco dever republicano daqueles que ocupam cargos públicos.
Contudo, a repercussão extraprocessual de sua atividade não há de ser adotada como parâmetro exclusivo a fim de impor punição à parte em vista de sua conduta maliciosa através da fixação de vultuosos honorários advocatícios de sucumbência. Isto porque é certo que a punição por tais aspectos comporta procedimentos e sanções próprios, já sendo objeto, inclusive, da imposição da multa por litigância de má-fé.
Diante destas razões, não vejo motivos para alterar o quantum fixado pelo juízo a quo.
Rejeito, no ponto, o recurso da parte ré.
Dispositivo
Em face do exposto, voto por dar parcial provimento ao recurso de apelação do INSS a fim de levantar a suspensão da exigibilidade dos ônus de sucumbência; condenar a parte autora ao pagamento de multa por litigância de má-fé; bem como, de ofício, retificar o valor atribuído à causa e determinar a expedição de ofício à OAB/RS para as providências que entender cabíveis no que tange à conduta do causídico da autora.
Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 29/03/2017
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0000632-91.2016.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00064460820148210086
RELATOR | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Marcus Vinícius de Aguiar Macedo |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | MARIA SALETE MACHADO DA SILVA |
ADVOGADO | : | Edson Vieira Schel |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 29/03/2017, na seqüência 122, disponibilizada no DE de 14/03/2017, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO DO INSS A FIM DE LEVANTAR A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA; CONDENAR A PARTE AUTORA AO PAGAMENTO DE MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ; BEM COMO, DE OFÍCIO, RETIFICAR O VALOR ATRIBUÍDO À CAUSA E DETERMINAR A EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À OAB/RS PARA AS PROVIDÊNCIAS QUE ENTENDER CABÍVEIS NO QUE TANGE À CONDUTA DO CAUSÍDICO DA AUTORA.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE | |
: | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
| Documento eletrônico assinado por Gilberto Flores do Nascimento, Diretor de Secretaria, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8913445v1 e, se solicitado, do código CRC A5B6534D. | |
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| Signatário (a): | Gilberto Flores do Nascimento |
| Data e Hora: | 30/03/2017 07:53 |
