| D.E. Publicado em 04/04/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001650-84.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | JOSÉ LEMES DA SILVA |
ADVOGADO | : | Carla Fabiana Wahldrich |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ
1. Hipótese em que mantida a sentença que extinguiu o processo sem julgamento de mérito, pelo reconhecimento da coisa julgada.
2. Honorários em favor do INSS fixados em 10% sobre o valor da causa
3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de que somente as partes (autor, réu ou interveniente) podem praticar o ato que se repute de má-fé processual, sendo que os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser apurados em ação própria, vedado ao magistrado condenar, nos próprios autos em que supostamente praticada a conduta temerária, o advogado da parte nas penas do artigo 81 do Código de Processo Civil.
4. Manutenção da gratuidade da justiça incompatível com a punição por litigância de má-fé.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento a ambas às apelações, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 20 de março de 2018.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Juíza Federal Gisele Lemke, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9315650v14 e, se solicitado, do código CRC 844AFE2C. | |
| Informações adicionais da assinatura: | |
| Signatário (a): | Gisele Lemke |
| Data e Hora: | 20/03/2018 17:51 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001650-84.2015.4.04.9999/RS
RELATORA | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
APELANTE | : | JOSÉ LEMES DA SILVA |
ADVOGADO | : | Carla Fabiana Wahldrich |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
RELATÓRIO
JOSÉ LEMES DA SILVA, nascido em 15/09/1956, ajuizou ação previdenciária contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, objetivando o restabelecimento de benefício previdenciário (auxílio-doença) ou a sua conversão em aposentadoria por invalidez.
Foram realizadas perícias nas áreas de Medicina do Trabalho (fls. 77/80), Neurologia (fls. 146/149) e Ortopedia (fls. 183/187).
A perícia da área de ortopedia, realizada em 01/09/2014, constatou a incapacidade parcial e permanente do demandante, decorrente de redução da capacidade funcional em 12,5% (repercussão média). A moléstia incapacitante verificada - Transtorno de Disco Intervertebral com Radiculopatia (CID M 51.1). O perito-ortopedista certificou "a existência de nexo causal trabalho/doença/lesão, indícios que somados convergem para a incapacidade laborativa" (fl. 184v).
A sentença, prolatada em 20/08/2014 (fls. 178/180), ou seja, em momento anterior à realização da perícia deferida pelo mesmo juízo em momento pretérito (decisão de 27/02/2014 - fl. 154 - defere a perícia na área de ortopedia), julgou extinto o feito, sem resolução do mérito, com fundamento no art. 267, inc. V e VI, do CPC.
Diante disso, a parte autora e seus procuradores foram condenados ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios aos patronos do demandado, os quais foram fixados em R$ 724,00, com fundamento no art. 20 do CPC, restando revogado o benefício da AJG. Tanto o autor quanto seus procuradores foram condenados às penas de litigância de má-fé processual (razão de 1% sobre o valor da causa para cada um, bem como indenização em 1% sobre o valor da causa, igualmente para ambos, tudo na forma do art. 18 do CPC).
A parte autora opõe embargos de declaração requerendo a manifestação do juízo a quo acerca da prolação da sentença apenas uma semana após a aceitação do encargo pelo perito ortopedista (fls. 186/187).
Rejeitados embargos (fl. 202), foi interposta apelação por ambas as partes.
A parte demandante (fls. 188/200) insurge-se contra a extinção do feito sem apreciação da perícia ortopédica (realizada após a prolação da sentença). Informa que, à fl. 154 houve nomeação do perito ortopedista, com designação de perícia em 13/08/2014, mas que tal laudo médico foi acostado aos autos em 01/09/2014 (fl. 182), momento posterior à prolação da sentença (20/08/2014). Reitera os termos da inicial quanto à incapacidade laborativa que permanece, ainda que tenha sido cessado o benefício previdenciário em 12/2010. Refere que o presente feito, ação ajuizada posteriormente à sentença proferida em outro processo (2010.71.50.010248-8) foi instruída com novos documentos, a saber: prontuário da Secretaria Municipal de Gravataí (fl. 08) e exame de ecografia de cotovelo direito e esquerdo. Pede a cassação da sentença, com o retorno dos autos à origem para prosseguimento da instrução. Requer o afastamento das penas de litigância de má-fé. Pugna pela concessão da AJG.
De sua vez, o INSS (fls. 223/224), requerendo a majoração da pena por litigância de má-fé e dos honorários de sucumbência.
Foram ofertadas contrarrazões a ambos os recursos.
Em petição juntada em 19/12/2017, o demandante requer a tutela de urgência, alegando situação de miserabilidade e piora considerável em seu estado clínico (fls. 238/239).
É o relatório.
VOTO
Coisa Julgada
Para a consubstanciação da coisa julgada material deve ser ajuizada ação com partes, causas de pedido e pedido idênticos, sendo que deve haver decisão de mérito imutável e indiscutível não mais sujeita a recurso, nos termos do art. 467 do CPC/1973 e do art. 502 do CPC/2015. Igualmente, tão-somente as questões de mérito efetivamente decididas têm força de lei, consoante o disposto no art. 468 do CPC/1973 e no caput do art. 503 do CPC/2015.
A sentença solveu a questão posta em julgamento nos seguintes termos:
[...] Houve sentença de mérito, com trânsito em julgado, em processo que tramitou na 1ª Vara Federal de Gravataí/RS (nº 2010.71.50.010248-8), no qual figuraram as mesmas partes e que teve o mesmo objeto - concessão de benefício de auxílio-doença - e a mesma causa de pedir.
É sabido, pois, que a coisa julgada material impede o julgamento de questão já decidida por sentença anterior transitada em julgado. Naquela oportunidade, o Juízo Federal reconheceu "a inexistência de incapacidade para o trabalho" (fls. 177).
Não obstante, além de a parte autora nada mencionar acerca do aludido feito em sua petição inicial, a qual, gize-se, absolutamente idêntica à utilizada na Justiça Federal (fls. 171-171v.), ajuiza a presente demanda menos de 02 (dois) meses após sua intimação da sentença (fls. 169v.), contra o mesmo indeferimento administrativo proferido em 02/02/2010 (fls. 05 e 171v.) como causa de pedir, e objetivando a condenação do réu ao pagamento das parcelas vencidas "desde a data do indevido cancelamento em 02/02/2010" (fls. 05), o que é absolutamente descabido e se encontra abarcado pela coisa julgada material.
E não se diga que eventual "agravamento do quadro clínico" do segurado autorizaria o ajuizamento desarrazoado de sucessivas ações previdenciárias.
Isso porque a ausência de requerimento administrativo formulado posteriormente ao aludido julgamento conduz à inevitável ausência de interesse processual da parte autora, cuja existência depende da "a) recusa de recebimento do requerimento ou b) negativa de concessão do benefício previdenciário, seja pelo concreto indeferimento do pedido, seja pela notória resistência da autarquia à tese jurídica esposada [...] (fls. 178/180).
Pois bem.
Em consulta ao Sistema de Acompanhamento Processual da JFRS, verifica-se que o segurado, ajuizou em 31/03/2010, o processo 201071500102488, o qual tramitou na Primeira Vara Federal de Gravataí/RS.
Naquele feito, o pedido da parte autora era o restabelecimento do auxílio-doença, desde o cancelamento em 02/02/2010, com pagamento de parcelas pretéritas e a conversão do mesmo em aposentadoria por invalidez, caso aferida a incapacitação. Ou seja, o pedido guarda identidade com o pleito destes autos.
A sentença, de 27/07/2010, julgou improcedente o pedido:
Vistos etc
Dispensado o relatório, na forma do art. 38 da Lei nº 9.099/95, passo a decidir.
Trata-se de demanda na qual a parte autora postula a concessão/restabelecimento de benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez). A prestação foi indeferida/cessada pelo INSS em razão da conclusão contrária da perícia médica.
Estes os fatos relevantes para o julgamento.
Do julgamento de improcedência com base no art. 285-A do CPC
A Lei n. 11.277, de 07/02/2006, introduziu no CPC o art. 285-A, que dispõe:
Art. 285-A. Quando a matéria controvertida for unicamente de direito e no juízo já houver sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, poderá ser dispensada a citação e proferida sentença, reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada. (Incluído pela Lei nº 11.277, de 2006).
§ 1º- Se o autor apelar, é facultado ao juiz decidir, no prazo de 5 (cinco) dias, não manter a sentença e determinar o prosseguimento da ação. (Incluído pela Lei nº 11.277, de 2006).
§ 2º- Caso seja mantida a sentença, será ordenada a citação do réu para responder ao recurso. (Incluído pela Lei nº 11.277, de 2006).
Assim, de acordo com o disposto no artigo 285-A do CPC, tornou-se possível o julgamento de improcedência, do mérito, portanto, sem a prévia citação e oitiva da parte contrária, desde que a matéria controvertida seja unicamente de direito e que no juízo já tenha sido proferida sentença de total improcedência em outros casos idênticos, "reproduzindo-se o teor da anteriormente prolatada".
Penso que a regra do art. 285-A também permite que o juiz profira sentença de improcedência nas hipóteses previstas no art. 557, "caput", do CPC, ainda que não tenha proferido sentença de improcedência em outros casos idênticos ao que está sendo julgado, pois o sentido da norma processual foi o de abreviar o trâmite procedimental de demandas em que já se sabe, de forma antecipada, qual será o seu resultado final. A modificação visou, portanto, a economia processual. Atende os princípios da simplicidade, informalidade e economia processual, os quais regem o processo nos Juizados Especiais.
Efetivamente não faz sentido manter-se a tramitação de um processo no qual é formulado pedido manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante das Turmas Recursais, da Turma Nacional de Uniformização dos JEF's, dos Tribunais Regionais Federais, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal. Ora, nesses casos também (e até mesmo com mais razão do que a hipótese prevista no art. 285-A do CPC) é plenamente justificável a prolação de sentença de improcedência de plano, pois ao receber a inicial já se sabe qual será o resultado final do processo.
Note-se que as hipóteses previstas no art. 557, "caput", do CPC, amparam com mais razão um julgamento de improcedência do que a hipótese prevista no art. 285-A do CPC, pois lá se fala em pedido manifestamente improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou jurisprudência dominante de tribunais de segundo grau, de tribunais superiores e do Supremo Tribunal Federal, enquanto aqui se exige apenas que o próprio juiz já tenha julgado a mesma matéria mais de uma vez.
Não há nenhum prejuízo às partes, pois a solução preconizada somente pode ser adotada em casos em que a matéria seja unicamente de direito (compreendendo também aquelas hipóteses em que a situação fática resta inequívoca e remanesce a análise somente do seu enquadramento nos dispositivos legais discutidos) e quando o julgamento for de improcedência, ou seja, não haverá cerceamento de defesa, pois não é necessária a produção de outras provas, além da documental que acompanha a inicial e da pericial eventualmente já confeccionada por força da antecipação da instrução no JEF, e a decisão é recorrível. Ademais, tampouco ocorrerá prejuízo ao réu que não apresentou contestação, pois a sua tese de defesa foi acolhida na sentença e, em havendo apelação, haverá necessidade de realização de citação para responder ao recurso (§2º do art. 285-A do CPC).
Dessa forma, é cabível o julgamento de improcedência de plano, sem a necessidade de ouvir a parte contrária, nas hipóteses previstas no art. 557, "caput", do CPC, combinado com o art. 285-A do CPC, introduzido pela Lei nº 11.277/06.
Do caso concreto
Realizada a prova pericial (evento 12 LAU1), a conclusão contida no laudo foi de que, não obstante a parte examinada apresente dor em membro, inexiste incapacidade para o trabalho habitualmente desempenhado por ela.
Quanto ao pedido de nova perícia com especialista em neurologia (evento 13 - PET1), impende referir que a perícia médica administrativa identificou apenas moléstia de natureza fisiátrica (evento 2 - INFBEN1, pg. 4). Ademais, os documentos anexados no evento 1 referem-se à doença dessa natureza. Desse modo, caso a parte autora esteja acometida por doença de outra natureza que implique a sua incapacidade para o trabalho, deverá postular, na esfera administrativa, mediante a apresentação da documentação médica correspondente, novo benefício por incapacidade (auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez), não incumbindo ao Judiciário substituir-se à Administração em tal avaliação. Assim, indefiro a diligência solicitada.
Nesse contexto, embora o Juiz não esteja vinculado às conclusões do laudo pericial, verifica-se que, no caso, não há na ação prova robusta que firme a convicção no sentido oposto ao da prova pericial.
Assim, considerando que a perícia médica apresentou a mesma conclusão que a perícia realizada na esfera administrativa, ou seja, constatou a inexistência de incapacidade para o trabalho, o pedido da parte autora é manifestamente improcedente, podendo ser julgado de plano, com fundamento no art. 285-A do CPC.
EM FACE DO EXPOSTO, julgo improcedente o pedido e extingo o processo, com a resolução do mérito, com fundamento no art. 285-A c/c o art. 557, "caput", do CPC.
Não há condenação em custas e honorários advocatícios (art. 1.º da Lei n.º 10.259/01 c/c arts. 54 e 55 da Lei n.º 9.099/95). Requisite-se o pagamento dos honorários periciais.
Havendo recurso, cite-se o INSS para apresentar resposta no prazo de 30 dias, nos termos do §2º do art. 285-A do CPC. Transcorrido o prazo, remetam-se os autos à Turma Recursal.
Não havendo recurso, certifique-se o trânsito em julgado e, após, dê-se baixa e arquivem-se os autos.[...]
Como visto, o pedido aqui formulado (em outubro de 2010) foi anteriormente apresentado e analisado por meio de sentença com resolução do mérito (julho de 2010 e trânsito em julgado em 31/08/2010).
Dessa forma, cuidando-se de demandas idênticas (mesmas partes, mesma causa de pedir e mesmo pedido), e havendo decisão de mérito transitada em julgado quanto à ação anteriormente proposta, caracteriza-se a existência de coisa julgada material, nos moldes previstos nos artigos mencionados alhures.
Laudo Pericial acostado após a sentença
Ainda que se verifique a existência de deferimento de perícia, realizada por ortopedista, cujo laudo foi acostado aos autos após a sentença de mérito, tal circunstância não tem o condão de provocar a cassação da decisão ora recorrida, justamente porque, em tendo sido verificada pelo julgador singular a ocorrência da coisa julgada, configurou-se obstáculo processual à apreciação do pedido deduzido neste feito.
Nessa linha de raciocínio, o laudo pericial juntado aos autos sequer poderia ser analisado. E, exatamente por isso, houve prolação de sentença sem que se aguardasse pelo laudo do perito.
Litigância de má-fé
A parte autora foi condenada por litigância de má-fé. Entendeu o magistrado que a pretensão da parte autora implica lide temerária, haja vista a repetição de processos nos quais a autora, representada pelo mesmo procurador, deduz perante a Justiça Estadual demanda idêntica a outra já julgada improcedente na Justiça Federal (aproveitando-se da falta de compartilhamento de informações), sem que haja sequer a formulação de pedido administrativo posterior. Veja-se excerto da sentença a esse respeito:
Não obstante, além de a parte autora nada mencionar acerca do aludido feito em sua petição inicial, a qual, gize-se, absolutamente idêntica à utilizada na Justiça Federal (fls. 171-171v.), ajuiza a presente demanda menos de 02 (dois) meses após sua intimação da sentença (fls. 169v.), contra o mesmo indeferimento administrativo proferido em 02/02/2010 (fls. 05 e 171v.) como causa de pedir, e objetivando a condenação do réu ao pagamento das parcelas vencidas "desde a data do indevido cancelamento em 02/02/2010" (fls. 05), o que é absolutamente descabido e se encontra abarcado pela coisa julgada material.
E não se diga que eventual "agravamento do quadro clínico" do segurado autorizaria o ajuizamento desarrazoado de sucessivas ações previdenciárias.
Isso porque a ausência de requerimento administrativo formulado posteriormente ao aludido julgamento conduz à inevitável ausência de interesse processual da parte autora, cuja existência depende da "a) recusa de recebimento do requerimento ou b) negativa de concessão do benefício previdenciário, seja pelo concreto indeferimento do pedido, seja pela notória resistência da autarquia à tese jurídica esposada".
Em verdade, diante da situação retratada nos autos, entendo ser caso de lide temerária, intentando a parte demandante contra a boa-fé processual, em afronta às diretrizes traçadas pelo art. 14 do Código de Processo Civil (como, ex vi, "expor os fatos em juízo conforme a verdade", "não formular pretensões, nem alegar defesa, cientes de que são destituídas de fundamento", entre outras), incidindo, também, o disposto no art. 17, inc. I, II e III, do CPC. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA. AUXÍLIO-ACIDENTE. FEITO IDÊNTICO AJUIZADO ANTERIORMENTE. COISA JULGADA. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. MANUTENÇÃO. INDENIZAÇÃO AO INSS. AFASTAMENTO. I. Verificada a existência de outra demanda de natureza previdenciária, em que as partes, a causa de pedir e o pedido são idênticos ao presente feito, transitada em julgado, resta configurada a coisa julgada, mostrando-se correta a extinção da ação sem resolução de mérito, com fulcro no art. 267, V, do CPC. II. A condenação da demandante ao pagamento de multa por litigância de má-fé é medida que se impõe, pois agiu de modo temerário ao ajuizar ação, cuja questão controversa é a mesma que já foi discutida em demanda anteriormente ajuizada. III. Afastada indenização no valor de 15% do valor da causa. (TRF4, AC 0017407-89.2013.404.9999, Quinta Turma, Relator Rogerio Favreto, D.E. 27/05/2014)
De se consignar que o presente caso, infelizmente, não é isolado nesta Comarca, compondo um acervo de dezenas de processos nos quais a parte autora, representada pelo mesmo procurador, deduz perante esta Justiça Estadual a mesma pretensão já julgada improcedente na Justiça Federal (provavelmente por inexistir o compartilhamento das informações acerca da distribuição processual), sem formular qualquer pedido administrativo posterior ou mesmo informar nos autos a existência da demanda anterior, buscando deslealmente melhor sorte do que aquela obtida na Justiça Especializada.
Em verdade, o simples ajuizamento de duas demandas idênticas pelo mesmo causídico já é considerado suficiente para a caracterização da má-fé processual segundo o Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO. ART. 267, V, DO CPC. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONFIGURAÇÃO. 1. Havendo identidade de partes, pedido e causa de pedir, e havendo o trânsito em julgado em ação anterior, é de ser mantida a sentença que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, face ao reconhecimento de existência de coisa julgada. 2. A litigância de má-fé não se presume, deve ser comprovada pelo dolo processual, que, in casu, restou demonstrado pelo ajuizamento da primeira ação e da presente pela mesma procuradora. (TRF4, AC 0005856-78.2014.404.9999, Sexta Turma, Relator João Batista Pinto Silveira, D.E. 03/06/2014)
Sendo assim, a pena de litigância de má-fé processual (art. 14, inc. I, II e III e 17, inc. I, II e III, ambos do CPC) deve ser aplicada em desfavor da parte autora e dos procuradores do mesmo escritório que firmaram as iniciais de ambas as ações - Dra. CARLA FABIANA WAHLDRICH, OAB/RS 79.400 e Dr. JORGE VIDAL DOS SANTOS, OAB/RS 31.850 -, haja vista "a conduta ilícita adotada com extrema intensidade e estratagema do profissional do direito, em sonegar ao julgador as informações sobre o ajuizamento de ações em Comarcas diversas", visando a captação de benefícios previdenciários indevidamente em ações repetidas.
Por fim, haja vista o reconhecimento da má-fé, deve ser revogado o benefício da gratuidade judiciária à parte autora, ante sua incompatibilidade com o instituto da litigância de má-fé, não devendo ser alcançado àqueles que se utilizam da deslealdade processual
Alegou a parte autora em suas razões de apelação que não restou configurada sua litigância de má-fé. Entendo que ficou configurada a litigância de má-fé da parte autora, nos termos da fundamentação apresentada na sentença, que ora adoto como razão de decidir.
Assiste razão, porém, à parte autora, no que diz respeito à condenação dos procuradores da parte por litigância de má-fé.
Com efeito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de que somente as partes (autor, réu ou interveniente) podem praticar o ato que se repute de má-fé processual, como se vê nos seguintes arestos que ora transcrevo:
"CIVIL E PROCESSO CIVIL. LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO SOLIDÁRIA DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE.
(...)
4. Responde por litigância de má-fé (arts. 17 e 18) quem causar dano com sua conduta processual. Contudo, nos termos do art. 16, somente as partes, assim entendidas como autor, réu ou interveniente, em sentido amplo, podem praticar o ato. Com efeito, todos que de qualquer forma participam do processo têm o dever de agir com lealdade e boa-fé (art. 14, do CPC). Em caso de má-fé, somente os litigantes estarão sujeitos à multa e indenização a que se refere o art. 18, do CPC.
5. Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esta finalidade, sendo vedado ao magistrado, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 18, do Código de Processo Civil.
6. Recurso especial conhecido em parte e, nesta parte, provido".
(REsp 1.173.848/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 10/05/2010 - grifou-se)
"PROCESSUAL CIVIL. MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. COMPENSAÇÃO COM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPOSSIBILIDADE.
1. A pena por litigância de má-fé deve ser aplicada à parte, e não ao seu advogado, nos termos dos arts. 14 e 16 do Código de Processo Civil.
2. O advogado não pode ser penalizado nos autos em que supostamente atua como litigante de má-fé, ainda que incorra em falta profissional. Eventual conduta desleal do advogado deve ser apurada em processo autônomo, nos termos do art. 32 do Estatuto da Advocacia (Lei 8906/94).
3. Precedentes: REsp 1.194.683/MG, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, julgado em 17.8.2010, DJe 26.8.2010; REsp 1.173.848/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 20.4.2010, DJe 10.5.2010.
Recurso especial provido, para afastar a litigância de má-fé".
(REsp 1.247.820/AL, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 28/06/2011, DJe 1º/07/2011 - grifou-se)
RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. VIOLAÇÃO DO ART. 535. (...) MULTA POR LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO. IMPOSSIBILIDADE. (...)
5. A jurisprudência desta Corte firmou posicionamento no sentido de que somente as partes (autor, réu ou interveniente) podem praticar o ato que se repute de má-fé, a teor do disposto no artigo 16 do Código de Processo Civil, de modo que os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser apurados em ação própria. (...)
(REsp 1439021/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/08/2015, DJe 26/08/2015)
Trata-se de entendimento já adotado pela colenda 5ª Turma desta Corte, conforme julgado assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. IDENTIDADE ENTRE AÇÕES. EXTINÇÃO DO PROCESSO. LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ. OCORRÊNCIA. CONDENAÇÃO DO ADVOGADO NOS AUTOS. AJG.
1. Há coisa julgada quando se reproduz idêntica ação anterior, com mesmas partes, causa de pedir e pedido.
2. Situação característica de litigância de má-fé, subsumida nas hipóteses dos artigos 79 e 80 do CPC.
3. Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser aferidos em ação própria para esta finalidade, sendo vedado ao magistrado, nos próprios autos do processo em que fora praticada a alegada conduta de má-fé ou temerária, condenar o patrono da parte nas penas a que se refere o art. 80, do CPC.
4. O benefício da assistência judiciária gratuita depende do preenchimento dos requisitos da Lei 1.060/50, não constando a má-fé como causa para revogação. A concessão da AJG, por sua vez, não alcança a condenação por litigância de má-fé.
Os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser apurados em ação própria, sendo vedado ao magistrado condenar, nos próprios autos em que supostamente praticada a conduta temerária, o advogado da parte nas penas do artigo 81 do Código de Processo Civil.
Nada obstante, determino a expedição de ofício à OAB/RS, para que tenha ciência do procedimento do advogado que ajuizou o mesmo pedido, com as mesmas partes e mesma causa de pedir em demanda previdenciária na Justiça Estadual em competência delegada, após o insucesso da demanda no Juizado Especial Federal. (APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO 0025321-73.2014.4.04.9999/RS, rel. Juiz Federal Altair Antonio Gregório, julgado em 22/09/2017)
Compreende-se, assim, que os danos eventualmente causados pela conduta do advogado deverão ser apurados em ação própria, sendo vedado ao magistrado condenar, nos próprios autos em que supostamente praticada a conduta temerária, o advogado da parte nas penas do artigo 81 do Código de Processo Civil.
Nada obstante, cumpre determinar a expedição ofício à OAB/RS, para que tenha ciência do procedimento do advogado que ajuizou o mesmo pedido, com as mesmas partes e mesma causa de pedir em demanda previdenciária na Justiça Estadual em competência delegada, após o insucesso da demanda no Juizado Especial Federal.
Assistência Judiciária Gratuita
A concessão do benefício da assistência judiciária gratuita mostra-se incompatível com a punição por litigância de má-fé, ainda que demonstrada a dificuldade do autor arcar com os custos e as despesas do processo (inclusive a verba honorária).
Mantida a sentença no ponto.
Ônus sucumbenciais
Sucumbente a parte autora, deve arcar com custas processuais e com os honorários advocatícios de 10% do valor atualizado da causa.
Conclusão
Mantida a sentença que extinguiu o feito pelo reconhecimento da coisa julgada. Parcial provimento ao apelo do INSS para majorar a verba honorária em seu favor. Parcial provimento ao apelo da parte autora a fim de afastar a pena por litigância de má-fé de seus procuradores. Mantida a revogação da AJG.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do INSS e parcial provimento ao apelo do autor, com a determinação de expedição de ofício à OAB/RS, nos termos indicados supra.
Juíza Federal Gisele Lemke
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 20/03/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0001650-84.2015.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00809112720108210086
RELATOR | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
PRESIDENTE | : | Luiz Carlos Canalli |
PROCURADOR | : | Dr. Flávio Augusto de Andrade Strapason |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | PRESENCIAL - DR. JORGE VIDAL |
APELANTE | : | JOSÉ LEMES DA SILVA |
ADVOGADO | : | Carla Fabiana Wahldrich |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | (Os mesmos) |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 20/03/2018, na seqüência 62, disponibilizada no DE de 01/03/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO INSS E PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR, COM A DETERMINAÇÃO DE EXPEDIÇÃO DE OFÍCIO À OAB/RS.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal GISELE LEMKE |
: | Des. Federal LUIZ CARLOS CANALLI | |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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