Apelação Cível Nº 5013321-14.2018.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0302502-38.2015.8.24.0010/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: IVONETE VANDRESEN MARQUES
ADVOGADO: HÉLIA KULKAMP PEREIRA VOLPATO (OAB SC019860)
ADVOGADO: SANDRO VOLPATO (OAB SC011749)
ADVOGADO: EDITE KULKAMP PEREIRA WARMLING (OAB SC032003)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
A sentença assim relatou o feito:
I. Relatório
Ivonete Vandresen Marques, devidamente qualificada e por meio de procurador habilitado, ajuizou a presente ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, objetivando a concessão do benefício auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, com o pagamento das prestações vencidas e vincendas.
Aduz que se encontra incapacitada para o trabalho em razão das enfermidades narradas na peça vestibular. Teceu considerações legais acerca dos benefícios e consignou os pleitos de estilo, inclusive a concessão da Justiça Gratuita. Juntou documentos.
Devidamente citado, o réu apresentou contestação (fls. 73/82), alegando, em síntese, que não estão presentes os requisitos legais, razão pela qual não há se falar em concessão dos benefícios almejados.
A parte autora apresentou manifestação à resposta (fl. 141).
O feito foi saneado às fls. 142/143, oportunidade em que houve determinação de realização de audiência integrada.
Realizada a perícia médica à fl. 147.
O INSS acostou documentos a fim de comprovar a existência de idêntico processo que tramitou na Justiça Federal, do que houve manifestação pela parte autora (fls. 209/212).
Vieram os autos conclusos.
É o breve relatório.
Decido.
Seu dispositivo tem o seguinte teor:
III. Dispositivo
DIANTE DO EXPOSTO, sem resolução de mérito (art. 485, V, do CPC), JULGO EXTINTA a ação formulada por Ivonete Vandresen Marques contra o Instituto Nacional do Seguro Social INSS.
Condeno a parte demandante ao pagamento das custas e despesas processuais, além dos honorários advocatícios do patrono da parte adversa, arbitrados estes em 10% (dez por centro) sobre o valor da causa, nos termos do artigo 85, §§3º e 4º, do Código de Processo Civil, devendo-se observar, contudo, que a promovente litiga sob o pálio da gratuidade judiciária.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Transitada em julgado, arquivem-se os autos.
Irresignada, a autora apelou.
Sustenta, em suas razões de insurgência, que inexiste coisa julgada, uma vez que se trata de requerimentos administrativos distintos. Requer a concessão de benefício por incapacidade.
Sem contrarrazões, vieram os autos a este Tribunal.
Determinou-se a baixa do feito em diligência para produção de prova acerca da condição de segurada especial da autora (Evento 65).
Retornaram os autos para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Coisa Julgada
Na ação ajuizada perante a Justiça Federal de Tubarão (Evento 2, OUT33 e OUT34), em 06/05/2015, processo nº 5002240-10.2015.4.04.7207, a autora requereu benefício por incapacidade em razão de moléstias ortopédicas na coluna, desde a DER, em 26/01/2015, NB 6093281586.
A perícia realizada naquele processo (Evento 2, OUT49) concluiu que a autora apresenta CID 10 M51 - Outros transtornos de discos intervertebrais, porém sem incapacidade laboral. Assim, o pedido foi julgado improcedente (Evento 2, OUT52).
Conforme consulta à tramitação processual, o feito transitou em julgado em 27/07/2015.
Na presente ação, proposta em 01/10/2015, a autora requer a concessão de benefício por incapacidade desde 10/07/2015, NB 611.147.906-0, em virtude das mesmas moléstias que ensejaram o ajuizamento da ação anterior.
Acerca da coisa julgada, dispõe o Novo Código de Processo Civil:
Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar:
(...)
§ 1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.
§ 2º Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
Este Tribunal, debruçando-se acerca da coisa julgada, firmou convicção, consoante precedente da Corte Especial, no que tange à sua ocorrência em casos de benefícios previdenciários por incapacidade.
Confira-se, a propósito, a respectiva ementa que ora se colaciona:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. COISA JULGADA. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO POR INCAPACIDADE LABORAL. REPETIÇÃO DE AÇÃO. CAUSA DE PEDIR DISTINTA. MODIFICAÇÃO DA SITUAÇÃO DE FATO. OBSERVÂNCIA DOS LIMITES DA COISA JULGADA. IMPOSSIBILIDADE, NO CASO CONCRETO, DE RETROAÇÃO DO BENEFÍCIO A DATA ANTERIOR AO TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA DO PRIMEIRO PROCESSO. 1. As ações de concessão de benefício previdenciário por incapacidade para o trabalho caracterizam-se por terem como objeto relações continuativas e, portanto, as sentenças nelas proferidas se vinculam aos pressupostos do tempo em que foram formuladas, sem, contudo, extinguir a própria relação jurídica, que continua sujeita à variação de seus elementos. Tais sentenças contêm implícita a cláusula rebus sic stantibus, de forma que, modificadas as condições fáticas ou jurídicas sobre as quais se formou a coisa julgada material, tem-se nova causa de pedir próxima ou remota. 2. Não obstante uma decisão que julgou improcedente determinada ação previdenciária versando sobre benefício por incapacidade não impeça uma segunda ação pelo mesmo segurado, pleiteando o mesmo (ou outro) benefício por incapacidade desde que ocorra o agravamento da mesma doença ou a superveniência de uma nova doença incapacitante, o termo inicial do benefício a ser deferido na segunda ação, segundo já decidido pela Corte Especial do TRF4, não poderia ser, em princípio, anterior à data do trânsito em julgado da primeira ação. 3. Ainda que possa haver um agravamento da doença do segurado entre a data da perícia da primeira ação e a data do trânsito em julgado da decisão de improcedência, há de se considerar alguns pontos. 4. O primeiro é a possibilidade de o fato superveniente (nova doença ou agravamento da doença anterior) vir a ser analisado tanto pelo juiz de primeiro grau, na sentença, quanto pelo Tribunal (em caso de recurso), por aplicação do art. 493 do CPC, ainda na primeira ação. Isso ocorre muitas vezes, desde que a parte autora faça juntar aos autos documentação médica posterior à perícia realizada. É claro que se essa primeira ação foi improcedente, provavelmente não houve tal juntada e, portanto, eventual alteração das condições de trabalho não puderam ser analisadas, à época. 5. O segundo ponto são os motivos de se estabelecer o trânsito em julgado da primeira ação como a data antes da qual, em princípio, não poderia ser fixado o termo inicial do benefício previdenciário concedido na segunda ação. O primeiro motivo é o óbvio: evitar colisão de entendimentos entre julgadores relativamente a uma mesma situação jurídica, ainda que continuativa. O segundo motivo é a coerência com outra posição consagrada neste Tribunal em situação similar, mas inversa: o âmbito de abrangência temporal da decisão concessiva de um benefício por incapacidade, salvo exceções ou determinação em contrário na própria decisão, é a data do seu trânsito em julgado, o que não poderia ser desrespeitado pela autarquia previdenciária unilateralmente, mesmo que tenha procedido a uma nova perícia administrativa; em contrapartida, na outra via, entende-se que até o trânsito em julgado da decisão judicial que indeferiu o benefício, em princípio, o segurado permaneceu capaz. Em assim entendendo, garante-se um certo paralelismo e coerência na análise da capacidade do segurado no transcurso da primeira ação, haja vista a dificuldade em se estabelecer, muitas vezes, durante todo o período de tramitação da ação, a real situação da doença ou da incapacidade. 6. O terceiro ponto a ser considerado nesta análise é o de que embora o estabelecimento da data do trânsito em julgado da ação anterior possa não corresponder precisamente ao momento do início da incapacidade, também é verdade que dificilmente a incapacidade iniciou-se exatamente no dia posterior à data da perícia realizada na primeira ação e que atestou a capacidade do segurado. 7. O quarto e último ponto a ser analisado é a possibilidade de ocorrência de uma injustiça flagrante com a adoção deste entendimento, especialmente quando há um lapso temporal muito grande entre a prova pericial em que se baseou a decisão na primeira ação e o seu trânsito em julgado. Em casos assim, dada a possibilidade, já consagrada, de flexibilização de institutos processuais em demandas previdenciárias, se atendidos determinados pressupostos, variáveis conforme as hipóteses [vide, a título de exemplo, o decidido no REsp n. 1.840.369/RS, 2ª Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. em 12-11-2019, DJe de 19-12-2019], poder-se-ia flexibilizar a coisa julgada parcial para fazer retroagir a data do início do benefício previdenciário por incapacidade deferido na segunda ação para momento anterior ao trânsito em julgado da primeira ação, sempre que (a) exista prova categórica para se atestar que a incapacidade tenha iniciado, realmente, em momento anterior e (b) haja transcorrido um tempo muito longo entre a perícia ou outra documentação médica que tenha embasado a decisão que indeferiu o benefício na primeira ação e o seu trânsito em julgado. No entanto, realizar tal flexibilização em todos os casos não soa razoável nem prudente, frente a todas as considerações anteriores. 8. No presente caso, a diferença entre a data da perícia e a do trânsito em julgado é de 10 meses. Além do mais, inexiste, no caso, um evento marcante (um acidente, um enfarto, um AVC ou uma internação hospitalar, por exemplo) que pudesse, categoricamente, demonstrar o início da incapacidade a partir dele e que sugerisse, em razão disso, a flexibilização da coisa julgada. (TRF4, ARS 5045966-19.2018.4.04.0000, CORTE ESPECIAL, Relator para Acórdão CELSO KIPPER, juntado aos autos em 08/01/2021)
No caso, o perito judicial concluiu que houve agravamento do quadro de saúde da autora, inclusive com o surgimento de nova moléstia, assim não há que se falar em coisa julgada.
Nessas condições, com base na conclusão do aludido precedente, devem ser observados os limites da coisa julgada, a fim de que, caso reconhecido o direito ao benefício, seu marco inicial não retroaja a momento anterior ao do trânsito em julgado do processo ajuizado previamente (Processo nº 5002240-10.2015.4.04.7207), o que ocorreu em 27/07/2015, consoante consulta realizada em suas respectivas tramitações.
Incapacidade
A autora, atualmente com 47 anos de idade, agricultora, ensino fundamental incompleto, objetiva a concessão de benefício por incapacidade em razão de moléstias ortopédicas na coluna.
Conforme consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (Evento 2, OUT47), a autora recebeu benefício por incapacidade de 06/12/2010 a 30/01/2011.
O benefício requerido em 26/01/2015, NB 6093281586, objeto do primeiro processo, apesar de parecer favorável da perícia médica (Evento 2, OUT46), foi indeferido em razão da perda da qualidade de segurado (Evento 2, OUT38).
O benefício requerido em 10/07/2015, NB 6111479060, objeto deste processo, foi indeferido em razão da perda da qualidade de segurado (Evento 2, OUT5).
A autora trouxe aos autos o seguinte documento médico (Evento 2, OUT5, Página 6):
26/03/2015: Atestado médico afirmando que a autora é portadora de CID 10 M54.1, M53 e M51, com dor persistente, contraindicando atividades que demandem esforços físicos e sugerindo o afastamento das atividades laborais por 120 dias;
A perícia judicial (Evento 37, VIDEO2), realizada em 07/12/2016, por médico especialista em medicina legal e perícia médica, concluiu que a autora apresenta hérnia discal póstero-lateral e discopatia na região cervical, com incapacidade total, multiprofissional e temporária. Afirma que a incapacidade é temporária porque é questão passível de estabilização, considerando-se a idade da autora e a ausência de comorbidades, o que leva a um prognóstico favorável.
Conclui que na DER, em 10/07/2015, a autora já encontrava-se incapacitada para o labor. Sugere 1 ano de afastamento das atividades laborais a contar da data da perícia.
Ademais, o perito afirmou que houve um agravamento do quadro de saúde da autora, com surgimento de nova moléstia. Na ressonância magnética de 2015 apresenta hérnia discal póstero-lateral. Já naquela realizada em 2016 "comprovou além da questão lombar, a questão cervical, discopatia na região cervical, foi orientada pelo uso de colete cervical".
Qualidade de segurado e carência
O serviço rural, em regime de economia familiar, pode ser comprovado mediante a produção de prova material, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea (sobretudo quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas).
Faz-se necessário o início de prova material, não bastando apenas a prova testemunhal (artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91 e Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça).
Sabe-se que, via de regra, os trabalhadores rurais não guardam registros de suas atividades, o que dificulta a prova do período trabalhado. Por essa razão, a Lei nº 8.213/91 - artigo 106 - traz um rol aberto de documentos comprobatórios.
Registra-se, ainda, que os documentos emitidos em nome do chefe do grupo familiar aproveitam a todos os seus membros, como início de prova material, e, mais, os documentos apresentados não precisam necessariamente abranger cada ano do período de exercício da agricultura.
No caso, a autora juntou aos autos os seguintes documentos para comprovar a qualidade de segurada especial (Evento 2, OUT5, página 9 e ss., OUT6, OUT7, Evento 74, DEC3, DEC4, DEC5 e DEC6):
Certidões de nascimento dos filhos, em que ela e o marido constam como agricultores;
Notas fiscais de produtor de 2012, 2013, 2014, 2017, 2018 e 2019;
Escritura pública de compra e venda de imóvel rural, de 2012, em que a autora e seu marido constam como compradores;
Escritura pública de compra e venda de imóvel rural, de 2007, em que a autora e seu marido constam como compradores;
Declaração de exercício de atividade rural emitida em 2015 pelo Sindicato dos trabalhadores na agricultura familiar de Rio Fortuna e região;
Registro de compra de animais pelo marido da autora em 2018 e 2019;
Guia de trânsito de animais de 2013;
Inventário de animais de 2006, 2009 e 2010;
A prova testemunhal corrobora a documentação juntada aos autos (Evento 102, VIDEO1).
Dessa forma, restou comprovada a condição de segurada especial da autora.
Benefício e termo inicial
Reconhecida a existência de incapacidade laboral temporária, não se pode exigir que a autora permaneça desempenhando atividades que exigem esforços e movimentos incompatíveis com as patologias que apresenta.
Nesse sentido os seguintes julgados:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. LAUDO PERICIAL. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO DO JUIZ. AGRICULTOR. INCAPACIDADE PERMANENTE. CONDIÇÕES PESSOAIS DO SEGURADO. 1. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial. 2. A circunstância de ter o laudo pericial registrado a possibilidade, em tese, de serem desempenhadas pelo segurado funções laborativas que não exijam esforço físico não constitui óbice ao reconhecimento do direito ao benefício de aposentadoria por invalidez quando, por suas condições pessoais, aferidas no caso concreto, em especial a idade e a formação acadêmico-profissional, restar evidente a impossibilidade de reabilitação para atividades que dispensem o uso de força física, como as de natureza burocrática. 3.Implantação do auxílio-doença desde o requerimento administrativo, com conversão em aposentadoria por invalidez, desde a data do laudo pericial. (TRF4, AC 5019785-20.2019.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 18/12/2019)
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ REQUISITOS. INCAPACIDADE. LAUDO PERICIAL. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. QUALIDADE DE SEGURADO. RURAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS MORATÓRIOS. LEI 11.960/2009. DIFERIMENTO PARA EXECUÇÃO. 1. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter definitivo ou temporário da incapacidade. 2. A incapacidade laboral é comprovada através de exame médico-pericial e o julgador, via de regra, firma sua convicção com base no laudo, entretanto não está adstrito à sua literalidade, sendo-lhe facultada ampla e livre avaliação da prova. 3. Termo inicial do benefício de aposentadoria por invalidez na data do requerimento administrativo. 4. Deliberação sobre índices de correção monetária e taxas de juros diferida para a fase de cumprimento de sentença, a iniciar-se com a observância dos critérios da Lei 11.960/2009, de modo a racionalizar o andamento do processo, permitindo-se a expedição de precatório pelo valor incontroverso. (TRF4, AC 5016137-32.2019.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ALTAIR ANTONIO GREGÓRIO, juntado aos autos em 12/12/2019)
Então, a confirmação da existência de moléstias ortopédicas incapacitantes, corroborada pela documentação clínica, associada às suas condições pessoais, demonstram a existência de incapacidade total e temporária para o labor, o que enseja a concessão de auxílio-doença.
No que se refere ao marco inicial do benefício, este deve ser fixado de acordo com a data do início da incapacidade, sendo que, no caso de não haver elementos aptos a especificarem aludida data, deve-se utilizar a data da cessação ou indeferimento do benefício na esfera administrativa.
Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ CONVERSÃO. INVIABILIDADE. INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. TERMO INICIAL. ALTERAÇÃO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. RE Nº 870.947/SE. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. EFEITO SUSPENSIVO. INDEFINIÇÃO. DIFERIMENTO PARA A FASE DE CUMPRIMENTO. TUTELA ANTECIPADA. 1. São três os requisitos para a concessão dos benefícios por incapacidade: 1) a qualidade de segurado; 2) o cumprimento do período de carência de 12 contribuições mensais; 3) a incapacidade para o trabalho, de caráter permanente (aposentadoria por invalidez) ou temporário (auxílio-doença). 2. O segurado portador de enfermidade que o incapacita total e temporariamente para a sua atividade habitual, com chance de recuperação e reabilitação para o trabalho, tem direito à concessão do benefício de auxílio-doença. 3. Em relação ao termo inicial, o entendimento que vem sendo adotado é no sentido de que, evidenciado que a incapacidade laboral já estava presente quando da cessação do auxílio-doença na via administrativa, mostra-se correto o estabelecimento do termo inicial do benefício previdenciário em tal data. Hipótese em que deve ser fixada a DIB na data atestada pelo perito judicial como a DII, tendo em vista que ausente a comprovação de permanência da incapacidade entre a DCB e a realização do procedimento cirúrgico. 4. Diferida para a fase de cumprimento de sentença a definição sobre os consectários legais da condenação, cujos critérios de aplicação da correção monetária e juros de mora ainda estão pendentes de definição pelo STF, em face da decisão que atribuiu efeito suspensivo aos embargos de declaração opostos no RE nº 870.947/SE, devendo, todavia, iniciar-se com a observância das disposições da Lei nº 11.960/09, possibilitando a requisição de pagamento do valor incontroverso. 5. Mantida a antecipação de tutela, pois presentes os requisitos exigidos para o deferimento da tutela de urgência seja na forma do CPC/73 ou no CPC/15. (TRF4 5014634-73.2019.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MARCELO MALUCELLI, juntado aos autos em 02/10/2019) (grifei)
Veja-se que, no caso dos autos, conforme conclusão do laudo pericial judicial, existia incapacidade na DER, em 10/07/2015.
Considerando-se que o processo anterior transitou em julgado em 27/07/2015, inexiste coisa julgada parcial.
Assim, o auxílio-doença deve ser concedido a partir da DER, em 10/07/2015.
Duração do benefício
A Lei nº 8.213/91 assim dispõe:
Art. 60. (...)
§ 8o Sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação de auxílio-doença, judicial ou administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício.
(Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)
§ 9o Na ausência de fixação do prazo de que trata o § 8o deste artigo, o benefício cessará após o prazo de cento e vinte dias, contado da data de concessão ou de reativação do auxílio-doença, exceto se o segurado requerer a sua prorrogação perante o INSS, na forma do regulamento, observado o disposto no art. 62 desta Lei.
(Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)
§ 10. O segurado em gozo de auxílio-doença, concedido judicial ou administrativamente, poderá ser convocado a qualquer momento para avaliação das condições que ensejaram sua concessão ou manutenção, observado o disposto no art. 101 desta Lei.
(Incluído pela Lei nº 13.457, de 2017)
Como visto, a regra que trata da fixação do prazo estimado para a duração do auxílio-doença não é absoluta.
Ela estabelece que isso deve ser feito "sempre que possível".
Ora, em se tratando de benefício concedido por meio de decisão judicial, o exame dessa possibilidade (ou não) cabe ao magistrado que a profere, que deve fazê-lo com base na livre apreciação do acervo probatório.
Sucede que, ordinariamente, não é possível prever, com razoável grau de segurança, quanto tempo irá perdurar a incapacidade laborativa de um segurado, seja por se tratar de um juízo acerca de evento futuro, seja porque isso depende, muitas vezes, de fatores incertos e imprevisíveis.
Quanto ao prazo subsidiário de 120 (cento e vinte) dias (Lei nº 8.213/91, artigo 60, § 9º), teço as considerações que se seguem.
O que autoriza a aplicação desse prazo subsidiário (de 120 dias), literalmente, é a ausência de fixação do prazo de duração do benefício, conforme previsto no artigo 65, § 8º, da Lei nº 8.213/91.
Todavia, não sendo possível fixar o prazo estimado de duração do benefício, também não é possível estimá-lo em 120 (cento e vinte) dias.
Logo, havendo esse juízo (de impossibilidade de fixação do prazo estimado de duração do benefício), há que ser aplicada, a seguir, a regra contida no artigo 60, § 10, da Lei nº 8.213/91, que será adiante abordada.
Na realidade, a regra de aplicação do prazo subsidiário em questão (artigo 60, § 9º, da Lei nº 8.213/91) não vincula o poder judiciário, somente sendo aplicável, na esfera administrativa.
De resto, na esfera judiciária, seria questionável a aplicação do referido prazo a todos os casos, independentemente de circunstâncias como a idade do segurado, o tipo de doença ou de lesão que o incapacita temporariamente para o trabalho etc.
Finalmente, há uma regra (a do artigo 60, § 10, da Lei nº 8.213/91), que permite à administração previdenciária convocar o segurado em gozo de auxílio-doença para a realização de exames periciais, na esfera administrativa, para a reavaliação de seu caso.
Isto significa que há duas possibilidades:
a) a atribuição, ao segurado, do ônus de requerer a prorrogação do benefício, sob pena do cancelamento deste último;
b) a atribuição, à administração previdenciária, do ônus de convocar o segurado em gozo de auxílio-doença para a reavaliação de seu caso.
No presente caso, a última alternativa é a mais recomendada.
Nesses termos, deverá o auxílio-doença da parte autora ser mantido até a recuperação de sua capacidade laborativa, cabendo à administração previdenciária convocá-la para avaliar se permanecem as condições para a manutenção de seu benefício (artigo 60, § 10, da Lei nº 8.213/91).
Consectários legais
A atualização monetária (que fluirá desde a data de vencimento de cada prestação) e os juros de mora (que fluirão desde a data da citação) seguirão os parâmetros estabelecidos pelo Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do tema repetitivo nº 905, os quais são os seguintes:
3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.
(...)
3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária.
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Dos Honorários Sucumbenciais
Inverto o ônus de sucumbência e condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS a pagar honorários advocatícios, observando-se o seguinte:
a) sua base de cálculo corresponderá ao valor da condenação, observado o enunciado da súmula nº 76, deste Tribunal ("Os honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, devem incidir somente sobre as parcelas vencidas até a data da sentença de procedência ou do acórdão que reforme a sentença de improcedência");
b) será aplicado o percentual mínimo estabelecido para cada uma das faixas de valores previstas no parágrafo 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil;
c) quando mais de uma faixa de valores for aplicável, será observado o disposto no artigo 85, § 5º, do mesmo Código.
Da Implantação do benefício
A 3ª Seção deste Tribunal firmou o entendimento no sentido de que, esgotadas as instâncias ordinárias, faz-se possível determinar o cumprimento da parcela do julgado relativa à obrigação de fazer, que consiste na implantação do benefício concedido ou restabelecido, para tal fim não havendo necessidade de requerimento do segurado ou dependente ao qual a medida aproveita (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, Relator para o acórdão Desembargador Federal Celso Kipper, julgado em 09-08-2007).
Louvando-me no referido precedente e nas disposições do artigo 497 do CPC, determino a implantação do benefício, no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003211822v18 e do código CRC 7be74cb6.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 16:11:49
Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:34:22.
Apelação Cível Nº 5013321-14.2018.4.04.9999/SC
PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0302502-38.2015.8.24.0010/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
APELANTE: IVONETE VANDRESEN MARQUES
ADVOGADO: HÉLIA KULKAMP PEREIRA VOLPATO (OAB SC019860)
ADVOGADO: SANDRO VOLPATO (OAB SC011749)
ADVOGADO: EDITE KULKAMP PEREIRA WARMLING (OAB SC032003)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSO CIVIL. COISA JULGADA. não OCORRÊNCIA. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS. PREENCHIMENTO.
1. Não há que se falar em coisa julgada quando a ação posterior decorre de agravamento do estado de saúde da autora e o benefício é concedido com data posterior ao trânsito em julgado da primeira ação.
2. A confirmação da existência de moléstia incapacitante, corroborada pela documentação clínica, associada às condições pessoais da parte autora, se prestam a demonstrar a incapacidade total e temporária para o exercício da atividade profissional, o que enseja a concessão do benefício de auxílio-doença a partir da DER, uma vez que também comprovada a qualidade de segurado e a carência, devendo ser descontadas as parcelas recebidas administrativamente.
3. O perito, em seu laudo sugeriu uma estimava de prazo para nova avaliação acerca da da capacidade da autora, contado da data da realização da perícia. O referido prazo sugerido pelo perito consiste em uma estimativa, baseada em elementos de observação do expert em casos similares, não em uma certeza absoluta, com precisão matemática, acerca do tempo de duração da incapacidade laboral.
4. Competirá ao INSS, portanto, por meio de avaliação pericial, a ser realizada na seara administrativa, levando-se em conta os pareceres médicos dos profissionais que assistem a autora, examinar a persistência da doença, a fim de que seja dada continuidade ou cessado o pagamento do benefício cuja concessão foi determinada.
5. A cessação deve ser precedida, necessariamente, de avaliação administrativa médica, a fim de que examinada a persistência da incapacidade, ou a eventual recuperação do quadro de saúde do segurado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 17 de maio de 2022.
Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003211823v4 e do código CRC 878815cc.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 19/5/2022, às 16:11:49
Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:34:22.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/05/2022 A 17/05/2022
Apelação Cível Nº 5013321-14.2018.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: IVONETE VANDRESEN MARQUES
ADVOGADO: HÉLIA KULKAMP PEREIRA VOLPATO (OAB SC019860)
ADVOGADO: SANDRO VOLPATO (OAB SC011749)
ADVOGADO: EDITE KULKAMP PEREIRA WARMLING (OAB SC032003)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/05/2022, às 00:00, a 17/05/2022, às 16:00, na sequência 1212, disponibilizada no DE de 29/04/2022.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
ALEXSANDRA FERNANDES DE MACEDO
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 27/05/2022 04:34:22.