APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001378-11.2011.4.04.7003/PR
RELATOR | : | LORACI FLORES DE LIMA |
APELANTE | : | ATAIR RICOLDI |
ADVOGADO | : | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA |
: | ALEXANDRE DA SILVA | |
: | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA | |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS LEGAIS. NÃO COMPROVAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR RECONHECIDO DESDE OS 12 ANOS DE IDADE. RECONHECIMENTO DO EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM. NÃO INCLUSÃO NA REGRA E TRANSIÇÃO PREVISTA NO ART. 142 DA LEI Nº 8.213/91
1. Fixada pelo STJ a obrigatoriedade do reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público na REsp 1101727/PR, a previsão do art. 475 do CPC torna-se regra, admitido o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos.
2. É possível o aproveitamento do tempo de serviço rural desde os 12 (doze) anos de idade até 31-10-1991, independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência.
3. Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal.
4. Comprovado o exercício de atividade especial, conforme os critérios estabelecidos na lei vigente à época do exercício, o segurado tem direito adquirido ao cômputo do tempo de serviço como tal, e ao acréscimo decorrente da sua conversão em tempo comum, utilizado o fator de conversão previsto na legislação aplicada na data da concessão do benefício.
5. Até 28.4.1995, é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29.4.1995, necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; e, a contar de 6.5.1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
6. O período em que o autor laborou como rurícola, em regime de economia familiar, não pode ser computado para fins de carência e tampouco para utilização da regra de transição insculpida no art. 142 do Lei nº 8.213/91, visto que o referido dispositivo legal atinge apenas aqueles que já eram segurados inscritos na Previdência Social Urbana ou Rural na data da publicação da referida Lei (24/07/91). O autor não se enquadra no perfil dos destinatários da regra, uma vez que não era filiado à Previdência Social Urbana ou Rural na referida data, pois a atividade por ele exercida passou a ser de filiação obrigatória somente após a referida lei.
7. Não satisfeitos os requisitos tempo de contribuição e carência (180 contribuições, art. 142 da Lei nº 8.213/91), não possui o autor o direito à concessão da aposentadoria por tempo de contribuição.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo do autor e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 22 de novembro de 2016.
Loraci Flores de Lima
Relator
Documento eletrônico assinado por Loraci Flores de Lima, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8644548v5 e, se solicitado, do código CRC D180EDD. | |
Informações adicionais da assinatura: | |
Signatário (a): | Loraci Flores de Lima |
Data e Hora: | 01/12/2016 17:37 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001378-11.2011.4.04.7003/PR
RELATOR | : | LORACI FLORES DE LIMA |
APELANTE | : | ATAIR RICOLDI |
ADVOGADO | : | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA |
: | ALEXANDRE DA SILVA | |
: | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA | |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de remessa necessária e recurso de apelação interposto pelo autor em face de sentença que julgou parcialmente procedente o pedido inicial, reconhecendo o exercício de atividades agrícolas pela parte autora, o direito à averbação de tempo urbano e o trabalho sob condições especiais, com a respectiva conversão em tempo comum.
O autor, em suas razões recursais, defendeu o direito ao reconhecimento do tempo rural anterior aos 14 anos de idade, bem como sua inclusão na regra de transição disposta no art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Sem contrarrazões pelo recorrido.
É o relatório.
VOTO
Da remessa oficial
O Colendo Superior Tribunal de Justiça (STJ), seguindo a sistemática dos recursos repetitivos, regulada pelo art. 543-C, do CPC, decidiu que é obrigatório o reexame de sentença ilíquida proferida contra a União, Estados, Distrito Federal e Municípios e as respectivas autarquias e fundações de direito público. (REsp 1101727/PR, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/11/2009, DJe 03/12/2009).
Assim, o reexame necessário, previsto no art. 475 do CPC, é regra, admitindo-se o seu afastamento somente nos casos em que o valor da condenação seja certo e não exceda a sessenta salários mínimos.
Como o caso dos autos não se insere nas causas de dispensa do reexame, dou por interposta a remessa oficial.
Do novo CPC (Lei 13.105/2015)
Consoante a norma inserta no art. 14 do atual CPC, Lei 13.105, de 16/03/2015, "a norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada". Portanto, apesar da nova normatização processual ter aplicação imediata aos processos em curso, os atos processuais já praticados, perfeitos e acabados não podem mais ser atingidos pela mudança ocorrida a posteriori.
Nesse sentido, serão examinados segundo as normas do CPC de 2015 tão somente os recursos e remessas em face de sentenças/acórdãos publicado(a)s a contar do dia 18/03/2016.
Da ordem cronológica dos processos
Dispõe o art. 12 do atual CPC (Lei nº 13.105/2015, com redação da Lei nº 13.256/2016) que "os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão", estando, contudo, excluídos da regra do caput, entre outros, "as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça" (§2º, inciso VII), bem como "a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada" (§2º, inciso IX).
Dessa forma, deverão ter preferência de julgamento em relação àqueles processos que estão conclusos há mais tempo, aqueles feitos em que esteja litigando pessoa com mais de sessenta anos (idoso, Lei n. 10.741/2013), pessoas portadoras de doenças indicadas no art. 6º, inciso XIV, da Lei n. 7.713/88, as demandas de interesse de criança ou adolescente (Lei n. 8.069/90) ou os processos inseridos como prioritários nas metas impostas pelo CNJ.
Observado que o caso presente se enquadra em uma das hipóteses referidas (idoso), justifica-se seja proferido julgamento fora da ordem cronológica de conclusão.
Do tempo de serviço rural
O aproveitamento do tempo de atividade rural exercido até 31 de outubro de 1991 - independentemente do recolhimento das respectivas contribuições previdenciárias e exceto para efeito de carência - está expressamente autorizado e previsto pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91, e pelo art. 127, inc. V, do Decreto n.º 3.048/99. Quando exercido em regime de economia familiar, aproveita tanto ao arrimo de família quanto aos demais membros do grupo familiar que com ele laboram, porquanto a todos estes integrantes foi estendida a condição de segurado, nos termos do art. 11, inc. VII, da lei previdenciária (STJ, REsp 506.959/RS, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, DJU de 10/11/2003).
Pode o exercício do labor rural ser comprovado mediante a produção de início de prova material, complementada por prova testemunhal idônea - quando necessária ao preenchimento de eventuais lacunas - não sendo esta admitida exclusivamente, a teor do disposto no art. 55, § 3º, da Lei n.º 8.213/91, e na Súmula n.º 149 do STJ ("A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário).
Cabe salientar que, embora o art. 106 da Lei de Benefícios relacione os documentos aptos a essa comprovação, tal rol não é exaustivo; ademais, não se exige prova documental plena da atividade rural em relação a todos os anos integrantes do período correspondente à carência, mas um documento que, juntamente com a prova oral, criando um liame com a circunstância fática que se quer demonstrar, possibilite um juízo de valor seguro.
Também não é necessário que o início de prova material seja contemporâneo à época dos fatos que se pretende comprovar, conforme se vê do § 3º, do art. 55 da Lei 8.213. Tal exigência implicaria introdução indevida em limites não estabelecidos pelo legislador, e que devem ser de pronto afastados.
Observa-se que as certidões da vida civil são hábeis a constituir início probatório da atividade rural da parte autora, nos termos na jurisprudência pacífica do Superior Tribunal de Justiça (REsp n.º 980.065/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, j. em 20-11-2007, DJU, Seção 1, de 17-12-2007, p. 340, e REsp n.º 637.437/PB, Relatora Ministra Laurita Vaz, Quinta Turma, j. em 17-08-2004, DJU, Seção 1, de 13-09-2004, p. 287, REsp n.º 1.321.493-PR, Primeira Seção, Relator Ministro Herman Benjamim, DJe em 19-12-2012, submetido à sistemática dos recursos repetitivos.).
De outro lado, nada impede que sejam considerados os documentos emitidos em período próximo ao controverso, desde que levem a supor a continuidade da atividade rural.
Em relação aos boias-frias, cujo trabalho rural é caracterizado por sua notória informalidade, comprometendo a prova da atividade e, por conseguinte, a obtenção do benefício previdenciário, a jurisprudência pacificada por esta Corte era no sentido de abrandar a exigência relativa ao início de prova material, admitindo, até mesmo, em situações extremas, a comprovação da atividade exclusivamente por meio de prova testemunhal. Todavia, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento, em 10-10-2012, do REsp nº 1.321.493/PR, representativo de controvérsia, firmou o entendimento de que se aplica também aos trabalhadores boias-frias a Súmula 149 daquela Corte.
No regime de economia familiar (§1º do art. 11 da Lei de Benefícios) em que os membros da família trabalham "em condições de mútua dependência e colaboração", os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal:"Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR não tem o condão, por si só, de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois o mero fato dessa anotação constar nos referidos documentos não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não), enquadrando-se assim na previsão do art. 11, VII da Lei 8.213/91, que define o segurado especial. Mesmo o fato de constar a qualificação empregador II b nos respectivos recibos de ITR não implica a condição de empregador rural . Ocorre que a simples qualificação no documento não desconfigura a condição do trabalho agrícola em regime de economia familiar, como se pode ver da redação do artigo 1º, II, "b", do Decreto-Lei 1166, de 15.04.71.
Importante ainda ressaltar que o fato de o cônjuge exercer atividade outra que não a rural também não é "per se stante" para descaracterizar automaticamente a condição de segurado especial de quem postula o benefício, pois, de acordo com o que dispõe o inciso VII do art. 11 da Lei nº 8.213/91, é segurado especial o produtor, o parceiro, o meeiro e o arrendatário rurais, o pescador artesanal e o assemelhado, que exerçam suas atividades, individualmente ou em regime de economia familiar, ainda que com o auxílio eventual de terceiros, bem como seus respectivos cônjuges ou companheiros e filhos maiores de 14 anos ou a eles equiparados, desde que trabalhem, comprovadamente, com o grupo familiar respectivo; ou seja, ainda que considerado como trabalhador rural individual, sua situação encontra guarida no permissivo legal referido, sendo certo também que irrelevante a remuneração percebida pelo cônjuge, que não se comunica ou interfere com os ganhos oriundos da atividade agrícola.
No tocante ao trabalho do segurado especial em regime de economia familiar a partir dos 12 anos de idade, a Terceira Seção desta Corte ao apreciar os Embargos Infringentes em AC n.º 2001.04.01.025230-0/RS, Rel. Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira, na sessão de 12-03-2003, firmou entendimento no sentido da possibilidade de seu cômputo, na esteira de iterativa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tendo a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar o AI n.º 529.694/RS, da relatoria do Ministro Gilmar Mendes, com decisão publicada no DJU de 11-03-2005, reconhecido o tempo de serviço agrícola ao menor de quatorze anos, não merecendo a questão maiores digressões.
No presente caso, para a comprovação material do trabalho rural, foram carreados os seguintes documentos ao processo originário:
- Certidão expedida pelo 2º Registro de Imóveis de Arapongas, onde o pai do autor (Elzio Ricoldi) está qualificado como 'lavrador', em 1969 (Ev. 24, PROCADM2, p. 13-14);
- Certidão expedida pelo 1º Serviço Registral de Arapongas, onde o pai do autor (Elzio Ricoldi) figura como adquirente e está qualificado como 'agricultor', em 1969 (Ev. 24, PROCADM3, p. 1);
- Certidão expedida pelo 1º Serviço Registral de Arapongas, onde o pai do autor (Elzio Ricoldi) figura como transmitente e está qualificado como 'lavrador', em 1975 (Ev. 24, PROCADM3, p. 2);
- Declaração expedida pela Secretaria Municipal de Educação, Esporte e Cultura de Sabaúdia, atestando que o autor estudou na Escola Rural Estadual Almirante Barroso, no ano de 1968 (Ev. 24, PROCADM3, p. 3);
- Título de eleitor do autor, do ano de 1974, onde está qualificado como 'lavrador' (Ev. 24, PROCADM3, p. 8);
- Certidão de casamento do autor, do ano de 1975, onde está qualificado como 'lavrador' (Ev. 24, PROCADM3, p. 9);
- Ficha de inscrição do autor no Sindicado dos Trabalhadores Rurais de Sabaúdia do autor, datada de 1976 e informando o pagamento de mensalidades até 1991, na qual é ele qualificado como 'lavrador' (Ev. 24, PROCADM3, p. 10-13);
- Certidão de nascimento do filho Evandro, do ano de 1980, onde o autor está qualificado como 'lavrador' (Ev. 24, PROCADM3, p. 15);
- Notas fiscais de comercialização de produtos agrícolas em nome do autor, datadas de 1978, 1982, 1983, 1984, 1985, 1987, 1988, 1990 (Ev. 24, PROCADM4, p. 1-4, 6-8 e 11-14);
- Certidão de nascimento da filha Angélica, do ano de 1987, onde o autor está qualificado como 'lavrador' (Ev. 24, PROCADM3, p. 5).
Ademais, a sentença analisou resumida e suficientemente os depoimentos colhidos na esfera administrativa (evento 34):
"Quanto à prova testemunhal, por ocasião da Justificação Administrativa, o autor apresentou duas testemunhas (Evento 20, INF1). Ambas confirmaram as alegações do autor no sentido de que teria trabalhado juntamente com sua família em propriedade rural até o início de sua atividade urbana, junto à Prefeitura de Sabáudia."
Logo, em exame do conjunto probatório, conclui-se que os documentos juntados constituem prova material da atividade rural do autor que, juntamente com seus familiares, buscava seu sustento nas lides campesinas. Tal fato foi devidamente corroborado pelos depoimentos colhidos na esfera administrativa, que confirmaram o exercício de trabalho rural pelo autor até o início de suas atividades na Prefeitura de Sabáudia.
No entanto, o juízo "a quo" não reconheceu o trabalho rural do autor desde os 12 anos de idade, somente a contar dos 14 anos. Tal entendimento, conforme expendido alhures, está superado, porquanto a idade mínima a ser considerada como início do labor rural em regime de economia familiar é 12 anos. Ademais, segundo já exposto, o termo final para cômputo do tempo rural é 31/10/1991, e não 30/11/1991, conforme concedido na sentença.
É devido, pois, o reconhecimento do exercício de atividades agrícolas pelo demandante no lapso compreendido entre 06/05/1968 (momento em que o segurado implementou 12 anos de idade) e 30/10/1991, em acolhimento ao apelo do autor e à remessa necessária.
Merece reparo, no ponto, a sentença prolatada.
Tempo de serviço/contribuição urbano
A sentença assim expôs:
"Pretende o autor a averbação do trabalho por ele prestado à Prefeitura Municipal de Sabáudia, nos períodos de 01/06/94 a 31/05/96 e 01/06/96 a 26/01/2009.
Os períodos estão anotados em sua CTPS (Evento 24, PROCADM2, p. 9).
O período de 01/06/94 a 31/05/96 foi devidamente computado pelo INSS. O período de 01/06/96 a 26/01/2009 foi desconsiderado, diante da falta de recolhimento de contribuições (v. planilha de cálculos anexada ao Evento 24, PROCADM6, p. 22).
Ainda em sede administrativa, o segurado apresentou Certidão de Tempo de Serviço, emitida pela Prefeitura de Sabáudia, confirmando o exercício de atividade remunerada nos períodos pleiteados. A referida Certidão informa, também, que o autor trabalhou vinculado à CLT no período de 01/06/94 a 30/06/96, passando ao regime estatutário após 01/07/96. Em 24/05/2002, o RPPS foi extinto pela Lei Municipal n. 07/2002 (Evento 24, PROCADM6, p. 26).
Nada obstante todas essas informações, a autarquia previdenciária negou a averbação ao argumento de que 'não ficou claro o(s) período(s) contribuído(s) para o Regime Geral de Previdência Social - RGPS e Regime Próprio de Previdência Social - RPPS após 01/07/96; visto que, na CTC, é informado que foi nomeado no regime estatuário em 01/07/96; houve a extinção do Regime Próprio de Previdência Social pela Lei Municipal n. 07/2002 de 24/05/2002; há contribuições no sistema CNIS em vínculo estatutário - ESTA; não foi possível computar o(s) período(s) após 01/07/96' (Evento 24, PROCADM7, p. 8).
A negativa não se sustenta.
Dispõe o art. 94 da Lei n. 8.213/91:
Art. 94. Para efeito dos benefícios previstos no Regime Geral de Previdência Social ou no serviço público é assegurada a contagem recíproca do tempo de contribuição na atividade privada, rural e urbana, e do tempo de contribuição ou de serviço na administração pública, hipótese em que os diferentes sistemas de previdência social se compensarão financeiramente.
Se há inconsistências no CNIS acerca do recolhimento de contribuições, essas não podem prejudicar o direito do segurado à contagem recíproca do tempo de serviço prestado perante a Administração Pública.
A autarquia previdenciária só poderia obstar a averbação caso o tempo de serviço já tivesse sido utilizado para a concessão de aposentadoria no Regime Próprio de Previdência Social, por força do disposto no art. 96, III, da Lei n. 8.213/91, o que não é o caso.
Procede, assim, o pedido de averbação do tempo de serviço urbano no período de 01/06/96 a 26/01/2009, que deverá ser acrescido ao período de 01/06/94 a 31/05/96, já computado administrativamente."
Correta a sentença, uma vez que os documentos carreados são incontestáveis e demonstram o real exercício de atividades sob o regime estatutário e celetista no período, devendo o tempo de serviço ser devidamente computado para efeito de aposentadoria. Ademais, as medidas necessárias para a compensação entre os regimes competem à autarquia previdenciária, não devendo ser prejudicado o segurado por medidas que não lhe incumbem.
Das atividades especiais
A natureza da atividade é qualificada pela lei vigente à época da prestação do serviço, sem aplicação retroativa de norma ulterior que nesse sentido não haja disposto (RE 174.150-3/RJ, Rel. Min. Octávio Gallotti, DJ 18/08/2000). Também por força do princípio tempus regit actum, o modo de comprovação da atividade especial é orientado pela lei vigente ao tempo da prestação do serviço. A partir dessa premissa geral, articulam-se as seguintes diretrizes para o presente julgado:
a) Para as atividades exercidas até 28/04/1995, véspera da vigência da Lei nº 9.032/95, é possível o reconhecimento do tempo de atividade especial pelo pertencimento a determinada categoria profissional ou pela exposição aos agentes nocivos, nos termos previstos pelos decretos regulamentares. Por outro lado, em razão do caráter protetivo do trabalhador, é de ser reconhecida a natureza qualificada da atividade ainda que as condições que prejudicam sua saúde ou integridade física não se encontrem expressas em determinado regulamento (inteligência da Súmula 198 do extinto TFR).
b) Após a vigência da Lei nº 9.032/95, em 29/04/1995, a concessão da aposentadoria especial pressupõe a comprovação pelo segurado, do tempo de trabalho permanente, não ocasional nem intermitente, em condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (Lei 8.213/91, art. 57, § 3º). Sem embargo, "Para a caracterização da especialidade não se reclama exposição às condições insalubres durante todos os momentos da prática laboral, sendo suficiente que o trabalhador, em cada dia de labor, esteja exposto a agentes nocivos em período razoável da jornada (salvo exceções,v.g., periculosidade)" (TRF4, EINF 0010314-72.2009.404.7200, 3ª Seção, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
c) Para as atividades desempenhadas a partir de 06/03/1997, com a vigência do Decreto nº 2.172, a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos se dá mediante formulário, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho (Lei 8.213/91, art. 58, §1º) (TRF4, AC 2002.71.07.001611-3, 5ª Turma, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/07/2008).
d) Em relação aos agentes nocivos físicos ruído, frio e calor, é necessária a apresentação de laudo técnico independentemente do período de prestação da atividade, dada a necessidade de medição da intensidade desses agentes nocivos. De qualquer modo, a partir de 01/01/2004, é suficiente a apresentação de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, elaborado conforme as exigências legais (TRF4, EINF 0010314-72.2009.404.7200, 3ª Seção, Rel. Des. Celso Kipper, D.E. 07/11/2011).
e) A extemporaneidade do laudo pericial não lhe retira a força probatória, em face da presunção de conservação do anterior estado de coisas, que deve operar desde que não evidenciada a alteração das condições de trabalho. A rigor, dada a evolução das normas de proteção ao trabalhador e em face das inovações tecnológicas, é plausível a tese de que, à época da prestação do serviço, as condições ambientais eram ainda mais ofensivas à saúde do trabalhador (TRF4, EINF 0031711-50.2005.404.7000, 3ª Seção, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon, D.E. 08/08/2013).
f) O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C).
g) Quanto aos efeitos da utilização de equipamento de proteção individual, "Se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional àaposentadoria especial". Todavia, "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria" (ARE 664335, Rel. Min. Luiz Fux, Tribunal Pleno, j. 04/12/2014, DJ 12/02/2015). Deve-se observar, contudo, que a adoção de EPI não deve ser considerada para fins de caracterização da atividade especial em tempo anterior a 03/12/1998, visto que esta exigência apenas foi disposta pela MP 1.729/98, convertida na Lei 9.732/89 (IN INSS/PRES 77/2015, art. 279, §6º).
h) A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço (STJ, EDcl no R Esp 1310034/PR, Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJ 02/02/2015, julgamento proferido de acordo com a sistemática de representativo de controvérsia - CPC, art. 543-C). Dessa forma, é possível a conversão do tempo especial em comum mesmo para as atividades exercidas anteriormente à vigência da Lei 6.887/80, ao passo que a conversão do tempo comum em especial é apenas possível para o segurado que cumpriu os requisitos para aposentadoria especial até a vigência da Lei 9.032/95.
i) Cabe destacar, no que tange aos agentes químicos constantes no anexo 13 da NR-15, que os riscos ocupacionais gerados não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa. Ao contrário do que ocorre com alguns agentes agressivos, como, v.g., o ruído, calor, frio ou eletricidade, que exigem sujeição a determinados patamares para que reste configurada a nocividade do labor, no caso dos tóxicos orgânicos e inorgânicos, a exposição habitual, rotineira, a tais fatores insalutíferos é suficiente para tornar o trabalhador vulnerável a doenças ou acidentes. (APELREEX 2002.70.05.008838-4, Quinta Turma, Relator Hermes Siedler da Conceição Júnior, D.E. 10/05/2010; EINF 5000295-67.2010.404.7108, Terceira Seção, Relator p/ Acórdão Luiz Carlos de Castro Lugon, 04/02/2015).
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Acerca da conversão do tempo especial em comum, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1151363, em 23-03-2011, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, pacificou o entendimento de que é possível a conversão mesmo após 28-5-1998, nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91.
2. Precedentes do STF e do STJ.
Assim, considerando que o parágrafo 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 não foi revogado nem expressa, nem tacitamente pela Lei nº 9.711/98 e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional nº 20, de 15-12-1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1.º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28-05-1998.
O fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é o previsto na legislação aplicada na data concessão do benefício, e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A propósito, a questão já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp 1151363/MG, Rel. Min. Jorge Mussi, Terceira Seção, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011).
Assim, implementados os requisitos para aposentadoria na vigência da Lei nº 8.213/91 o fator de conversão deverá ser 1,4 (homem - 25 anos de especial para 35 anos de comum) ou 1,2 (mulher - 25 anos de especial para 30 de comum).
Do caso concreto
Na hipótese vertente, o período controverso de atividade laboral exercido em condições especiais foi assim especificado na sentença:
a) de 01/06/94 a 30/06/96, como motorista de ônibus para a Prefeitura Municipal de Sabáudia.
O item 2.4.4 do Anexo ao Decreto n. 53.831/64 qualifica como especial o trabalho desenvolvido por 'motoristas e cobradores de ônibus, motoristas e ajudantes de caminhão', enquanto que o item 2.4.2 do Anexo ao Decreto n. 83.080/79 qualifica como especial o trabalho desenvolvido por 'motorista de ônibus e de caminhões de cargas (ocupados em caráter permanente)'.
Portanto, não é qualquer motorista que goza do benefício legal. Apenas os motoristas de ônibus e caminhão, ocupados em caráter habitual e permanente, é que fazem jus à conversão pretendida.
O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP) anexado ao processo administrativo (Evento 24, PROCADM4, p. 15-16) informa, expressamente, que o autor era motorista de ônibus, transportando estudantes residentes na zona rural do Município.
Essa informação é suficiente para conferir-lhe direito ao reconhecimento da especialidade, visto que, para tanto, basta o simples exercício da atividade, até 28/04/95, e a comprovação até 05/03/97 não depende de laudo técnico.
b) de 01/07/96 a 26/01/2009, como motorista de ambulância, também para a Prefeitura Municipal de Sabáudia.
Antes de tudo, é preciso atentar para o fato de que, de 01/07/96 a 24/05/2002, o autor trabalhou sob regime estatuário, vertendo contribuições para Regime Próprio de Previdência Social. A averbação desse tempo de serviço junto ao INSS, determinada no item 2 desta sentença, inclusive, fundamentou-se na admissibilidade da contagem recíproca do tempo de contribuição a regimes diversos de previdência.
Sendo assim, não se pode ignorar a regra contida no inc. I do art. 96 da Lei n. 8.213/91, in verbis:
Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:
I - não será admitida a contagem em dobro ou em outras condições especiais;
A averbação do período de 01/07/96 a 24/05/2002 como especial, portanto, não é possível.
Para o período de 25/05/2002 a 26/01/2009, o óbice não se aplica, visto que voltou o segurado a ficar vinculado ao RGPS. A comprovação da especialidade, porém, deve estar fundamentada em laudo técnico, conforme acima explanado.
O PPP informa como único agente nocivo a justificar a especialidade o fator de risco 'biológico'. O laudo técnico necessário à comprovação dessa exposição foi anexado ao processo administrativo (Evento 25, PROCADM5 e 6).
Nesse laudo, o responsável técnico considera insalubre a atividade de motorista de ambulância, por exposição permanente a agentes biológicos (Evento 25, PROCADM5, p. 10-11), o que é suficiente para autorizar o reconhecimento da especialidade.
Conclusão: podem ser considerados especiais apenas os períodos de 01/06/94 a 30/06/96 e 25/05/2002 a 26/01/2009.
Correta a sentença, pois em perfeita harmonia com o entendimento exposto nesta fundamentação.
Assim, reconhecida a especialidade no interregno supramencionado, deve ser devidamente convertido o período de labor especial para tempo de serviço comum, pelo fator de conversão 1,4.
Da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
A aposentadoria por tempo de serviço, extinta pela Emenda Constitucional nº 20, de 15.12.1998 e transformada em aposentadoria por tempo de contribuição, foi garantida (art. 3º) aos segurados da previdência social que, até a data da publicação da Emenda, em 16.12.98, tivessem cumprido os requisitos para sua obtenção, com base nos critérios da legislação então vigente (arts. 29, caput, e 52 a 56 da Lei nº 8.213/91, na sua redação original), quais sejam: a) 25 anos de tempo de serviço, se mulher, ou 30 anos, se homem e b) carência (conforme a tabela do art. 142 da Lei nº 8.213/91, inscritos até 24-7-1991, ou conforme o art. 25, II, da Lei, para os inscritos posteriormente). O valor da aposentadoria corresponde a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 6% por ano para cada ano completo de atividade até o máximo de 100% (aposentadoria integral), o que se dá aos 30 anos de tempo de serviço para as mulheres, e 35 para os homens.
Oportuno enfatizar que o direito adquirido a tal modalidade de benefício exige a satisfação de todos os requisitos até a data da EC nº 20/98, já que, a partir de então, passa a viger a aposentadoria por tempo de contribuição, consoante previsão do art. 201, §7º, da Constituição Federal, para a qual se exigem 35 anos de contribuição, se homem, ou 30, se mulher, e carência de 180 contribuições mensais.
Em caráter excepcional, para os segurados filiados até a data da publicação da Emenda, foi estabelecida regra de transição no art. 9º, §1º, possibilitando aposentadoria proporcional quando, o segurado I) contando com 53 anos de idade, se homem, e 48 anos, se mulher e, atendido o requisito da carência, II) atingir tempo de contribuição igual, no mínimo, à soma de: a) 30 anos, se homem, e 25, se mulher; e b) um período adicional de contribuição (pedágio) equivalente a 40% do tempo que, na data da publicação da Emenda, faltaria para atingir o mínimo de tempo para a aposentadoria proporcional. O valor da aposentadoria proporcional será equivalente a 70% do salário-de-benefício, acrescido de 5% por ano de contribuição que supere a soma a que se referem os itens a e b supra, até o limite de 100%).
De qualquer modo, o disposto no art. 56 do Decreto n.º 3.048/99 (§3º e 4º) expressamente ressalvou, independentemente da data do requerimento do benefício, o direito à aposentadoria pelas condições legalmente previstas à época do cumprimento de todos os requisitos, assegurando sua concessão pela forma mais benéfica, desde a entrada do requerimento.
No caso concreto, a sentença reconheceu como efetivo tempo de contribuição do autor, até a DER, o total de 14 anos, 7 meses e 26 dias, considerando-o insuficiente para atender o requisito carência.
O autor, em seu apelo, defendeu sua inclusão na regra de transição disposta no art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Sem razão o autor.
É que o período em que o autor laborou como rurícola, em regime de economia familiar, não pode ser computado para fins de carência e tampouco para utilização da regra de transição insculpida no art. 142 do Lei nº 8.213/91, visto que o referido dispositivo legal atinge apenas aqueles que já eram segurados inscritos na Previdência Social Urbana ou Rural na data da publicação da referida Lei (24/07/91).
O autor, a seu turno, não se enquadra no perfil dos destinatários da regra, uma vez que não era filiado à Previdência Social Urbana ou Rural na referida data. Ao contrário do que afirma em seu recurso, o autor não se encontrava inscrito na Previdência Social Rural, pois a atividade por ele exercida passou a ser de filiação obrigatória somente após a referida lei.
Não é outro o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE URBANA. CARÊNCIA. UTILIZAÇÃO. REGRA DE TRANSIÇÃO. ART. 142 DA LEI N.º 8.213/91. IMPOSSIBILIDADE.
1. O exercício de labor rural em regime de economia familiar antes da Lei n.º 8.213/91 não autoriza a aplicação da regra de transição do art. 142 da referida lei.
2. Atividade que passou a ser de filiação obrigatória tão-somente após a edição da legislação hoje vigente.
3. Aproveitamento para fins de carência vedado pelo art. 55, § 2º, da Lei n.º 8.213/91.
4. Recurso especial não conhecido.
(REsp 538.618/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 20/11/2003, DJ 15/12/2003, p. 382; grifei)
Importante destacar o voto da Ministra Relatora, que assim se pronunciou:
"Para os trabalhadores urbanos e rurais que já eram filiados à Previdência nos moldes da legislação pretérita, surgia o direito à aposentadoria por idade pelo cumprimento da carência, medida em número de contribuições mensais.
Quanto aos rurícolas que passaram a ser segurados da Previdência tão-somente com o advento da Lei n.º 8.213/91, exigiu-se que fosse comprovado o exercício da atividade nos 5 (cinco) anos anteriores à data do requerimento administrativo do benefício.
A Recorrente não se amolda à hipótese do art. 143, uma vez que passou a
laborar em atividade urbana.
Resta aferir se faz jus à utilização do tempo de serviço rural prestado em regime de economia familiar, antes da Lei n.º 8.213/91, para fins de utilização da regra de transição do art. 142.
Tenho para mim que não.
Primeiramente, o artigo foi claro ao dizer que a regra nele prevista dizia respeito àqueles que já eram segurados da Previdência Social Urbana ou Rural na data da edição da promulgação da Lei.
Outrossim, estabeleceu-se regra distinta para a concessão da aposentadoria por idade para aqueles obreiros rurais que passaram a elencar o rol de filiados obrigatórios da previdência social.
E, por derradeiro, a própria lei exclui a utilização do tempo de serviço rural, a ela anterior, para fins de carência, nos termos do art. 55, § 2º, litteris :
"O tempo de serviço do segurado trabalhador rural, anterior à data
de início da vigência desta Lei, será computado independentemente do
recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de
carência , conforme dispuser o regulamento." (grifo nosso)" (grifei)
Posto isso, o autor não pode ser inserido na regra de transição do art. 142 da Lei nº 8.213/91, devendo satisfazer, pois, a carência mínima de 180 contribuições, na DER, para fazer jus ao benefício de aposentadoria por tempo de contribuição.
Tendo em conta que a carência mínima não foi satisfeita pelo autor, na DER, não possui direito ao benefício vindicado.
Do prequestionamento
Sobre o prequestionamento dos dispositivos legais relacionados, creio não haver voz dissonante nesta Corte, bem assim naquelas superiores, do entendimento de que importa é que o acórdão debata, discuta e adote entendimento explícito sobre a questão federal ou constitucional, desnecessária a individualização numérica dos artigos em que se funda o decisório. Isso porque, sendo a missão constitucional da jurisdição recursal extraordinária julgar as causas decididas em única ou última instância (art. 102, III e 105, III, ambos da Carta da República), a só referência a normas legais ou constitucionais, dando-as por prequestionadas, não significa decisão a respeito dos temas propostos; imprescindível que as teses desenvolvidas pelas partes, importantes ao deslinde da causa, sejam dissecadas no julgamento, com o perfilhamento de posição clara e expressa sobre a pretensão deduzida.
O prequestionamento numérico, então, é dispensado pela jurisprudência, como exemplificam as decisões que seguem:
ADMINISTRATIVO - RECURSO ESPECIAL - SERVIDOR PÚBLICO - DIREITO ADQUIRIDO - AFRONTA À LICC - IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO - APOSENTADORIA - EX-CELETISTA - ATIVIDADE INSALUBRE - AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO - POSSIBILIDADE - PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO.
1 - No tocante ao art. 6º, da LICC, após a Constituição Federal de 1988, a discussão acerca da contrariedade a este dispositivo adquiriu contornos constitucionais, inviabilizando-se sua análise através da via do Recurso Especial, conforme inúmeros precedentes desta Corte (AG.REG. em AG nº 206.110/SP, REsp nº 158.193/AM, AG.REG. em AG nº 227.509/SP).
2 - Este Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento, mediante sua Corte Especial, no sentido de que a violação a determinada norma legal ou dissídio sobre sua interpretação não requer, necessariamente, que tal dispositivo tenha sido expressamente mencionado no v. acórdão do Tribunal de origem. Cuida-se do chamado prequestionamento implícito (cf. EREsp nº 181.682/PE, 144.844/RS e 155.321/SP). Sendo a hipótese dos autos, afasta-se a aplicabilidade da Súmula 356/STF para conhecer do recurso pela alínea "a" do permissivo constitucional.
3 - O servidor público que, quando ainda celetista, laborava em condições insalubres, tem o direito de averbar o tempo de serviço com aposentadoria especial, na forma da legislação anterior, posto que já foi incorporado ao seu patrimônio jurídico.
4 - Precedentes (REsp nºs 321.108/PB, 292.734/RS e 307.670/PB).5 - Recurso conhecido, nos termos acima expostos e, neste aspecto, provido para, reformando o v. acórdão de origem, julgar procedente o pedido do autor, ora recorrente, invertendo-se o ônus da sucumbência já fixados na r. sentença monocrática.
(RESP 434129 / SC - Relator Min. JORGE SCARTEZZINI - DJ em DJ DATA:17/02/2003)
RECURSO EXTRAORDINÁRIO - PREQUESTIONAMENTO - ALCANCE DO INSTITUTO.
A exigência do prequestionamento não decorre de simples apego a determinada forma. A razão de ser está na necessidade de proceder a cotejo para, somente então, assentar-se o enquadramento do recurso no permissivo legal. Diz-se prequestionado determinado tema quando o órgão julgador haja adotado entendimento explícito a respeito, contando a parte sequiosa de ver o processo guindado a sede extraordinária com remédio legal para compeli-lo a tanto - os embargos declaratórios. A persistência da omissão sugere hipótese de vício de procedimento. Configura-se deficiência na entrega da prestação jurisdicional, o que tem contorno constitucional, pois a garantia de acesso ao judiciário há que ser emprestado alcance que afaste verdadeira incongruência, ou seja, o enfoque de que, uma vez admitido, nada mais é exigível, pouco importando a insuficiência da atuação do estado-juiz no dirimir a controvérsia. Impor para configuração do prequestionamento, além da matéria veiculada no recurso, a referência ao número do dispositivo legal pertinente, extravasa o campo da razoabilidade, chegando às raias do exagero e do mero capricho, paixões que devem estar ausentes quando do exercício do ofício judicante. Recurso extraordinário - violação a lei. Tanto vulnera a lei o provimento judicial que implica exclusão do campo de aplicação de hipótese contemplada, como o que inclui exigência que se lhe mostra estranha. Recurso extraordinário - violação a lei - registro de candidatos ao senado - suplentes - par. 3. Do artigo 45 da constituição federal. Este dispositivo legal não disciplina o registro dos candidatos. Vulnera-o decisão que o tem como pertinente para, de forma peremptória, indeferir o registro de chapa em que apresentado apenas um suplente, pouco importando que a diligência objetivando a complementação respectiva esteja prevista em diploma legal de cunho ordinário. O desrespeito a este não serve à manutenção do esvaziamento dos direitos e garantias constitucionais explícitos e dos que decorrem dos princípios inseridos na lei maior.
(RE 128519/DF - RELATOR MINISTRO MARCO AURELIO - TRIBUNAL PLENO - DJ EM 08-03-91).
De qualquer modo, inclusive para fins de possibilitar o acesso das partes às Instâncias Superiores, dou por prequestionada a matéria legal referida pelo autor em sua apelação (processo originário: evento 39).
Conclusão
Tendo isso em conta, deve ser parcialmente reformada a sentença para reconhecer o início do labor rural do autor em regime de economia familiar a contar de seus 12 anos de idade (06/05/1968), computando-se até 30/10/1991.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo do autor e à remessa oficial, nos termos da fundamentação.
É o voto.
Loraci Flores de Lima
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 22/11/2016
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5001378-11.2011.4.04.7003/PR
ORIGEM: PR 50013781120114047003
RELATOR | : | Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA |
PRESIDENTE | : | Paulo Afonso Brum Vaz |
PROCURADOR | : | Dr. Carlos Eduardo Copetti Leite |
APELANTE | : | ATAIR RICOLDI |
ADVOGADO | : | BRUNO ANDRÉ SOARES BETAZZA |
: | ALEXANDRE DA SILVA | |
: | EVANDRO CESAR MELLO DE OLIVEIRA | |
: | HELDER MASQUETE CALIXTI | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 22/11/2016, na seqüência 401, disponibilizada no DE de 03/11/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO AUTOR E À REMESSA OFICIAL, NOS TERMOS DA FUNDAMENTAÇÃO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA |
VOTANTE(S) | : | Juiz Federal LORACI FLORES DE LIMA |
: | Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ | |
: | Des. Federal ROGERIO FAVRETO |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
Documento eletrônico assinado por Lídice Peña Thomaz, Secretária de Turma, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8725510v1 e, se solicitado, do código CRC 118A0D0A. | |
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