Apelação Cível Nº 5007085-22.2014.4.04.7110/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: LEONEL VERGARA TELECHI (AUTOR)
ADVOGADO: MAURÍCIO SANT ANNA DA ROSA (OAB RS076457)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de apelação em face de sentença, proferida na vigência do CPC/2015, que julgou improcedente a ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez, e condenou a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, restando suspensa a exigibilidade em razão do benefício da AJG concedido.
Sustenta o autor, em síntese, que preenche os requisitos necessários à concessão do benefício de aposentadoria por invalidez desde a DER (20-5-2014). Requer, ainda, a fixação da verba honorária em 20% sobre o valor da condenação.
Com as contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
Primeiramente, considerando que os peritos não referiram o nexo causal objetivo e direto com a atividade profissional do autor, não há falar em acidente do trabalho, razão pela qual remanesce a competência da Justiça Federal para examinar o pedido de concessão de aposentadoria por invalidez deduzido na apelação.
Importa destacar, outrossim, que o próprio INSS reconheceu a incapacidade laboral definitiva da parte autora quando converteu administrativamente o benefício de auxílio-doença, NB 5319577296 - concedido no período de 30-8-2008 a 4-4-2017 por motivo de "Cervicalgia" e "Melanoma maligno da pele" (CID-10: M54.2 e C43) -, em aposentadoria por invalidez, NB 6182333662, a contar de 5-4-2017 (Eventos 22 e 23 do originário).
Como se pode observar, houve o reconhecimento parcial da procedência do pedido pelo INSS no curso da ação, no que tange ao pedido de aposentadoria por invalidez a partir de 5-4-2017, razão pela qual deve ser parcialmente extinto o feito, nos termos do artigo 487, inciso III, letra a, do CPC.
A controvérsia restringe-se, portanto, à verificação da incapacidade laboral definitiva da parte autora desde a DER (20-5-2014).
A perícia médica judicial (Evento 14 do originário, DESP4, fls. 7-11), realizada em 28-9-2016, por especialista em ortopedia e traumatologia, apurou que o autor, serviços gerais na indústria arrozeira, nascido em 10-12-1969, é portador de Cervicalgia e Dor lombar baixa (CID-10: M54.2 e M54.5), estando em tratamento quimioterápico para melanoma maligno desde 2009, e concluiu que, em decorrência da cervicalgia, ele apresenta incapacidade total e permanente para o exercício das atividades habituais (serviços braçais), devendo ser submetido à reabilitação profissional. Referiu, ainda, o expert que o demandante, "do ponto de vista ortopédico, pode trabalhar em administrativo", bem como que "há necessidade de restringir posturas viciosas com a cabeça, evitar a flexão ou extensão máxima da mesma, o uso de computador deve ser intermitente e deve ser estimulada a alternância de posições". Fixou a data de início da incapacidade em setembro de 2008.
Já a perícia judicial, realizada em 5-7-2018 e complementada em 25-7-2019 (Evento 14 do originário - LAUDOPERIC10, fls. 40-55, e DESP11, fls. 1-4), por médica do trabalho, apurou que o demandante é portador de Neoplasia maligna de pele - Melanoma Maligno em membro inferior direito (CID-10: C43.7), e concluiu que ele está total e permanentemente incapacitado para o trabalho, "por conta do melanoma metastático" (quesito 7 da parte autora - Evento 14 do originário, LAUDOPERIC10, fl. 51). Em novo laudo complementar (Evento 34 do originário), a perita afirmou não ser possível precisar a data de início da incapacidade definitiva, porém afirmou que na data de realização da perícia o demandante estava aposentado por invalidez.
Cumpre registrar, ainda, que a perícia administrativa examinou o autor, em 13-2-2013, e concluiu pelo seu encaminhamento ao programa de reabilitação profissional, tendo feito as seguintes considerações: "Trabalhador braçal em período de acompanhamento oncológico após retirada de melanoma do membro inferior D. Há incapacidade para atividades que exijam ortostatismo por longos períodos de tempo. Segurado possui ensino médio completo. Entendo que há potencial para reabilitação profissional". Entretanto, no laudo da perícia administrativa datado de 17-2-2014, consta que o requerente foi "desligado do NRP por intercorrência médica" relacionada ao agravamento da patologia oncológica (Evento 23 do originário).
Assim, em que pese o perito ortopedista tenha concluído pela possibilidade de reabilitação profissional e a perita médica do trabalho não tenha precisado a data de início da incapacidade permanente, o restante do conjunto probatório demonstra que o autor já estava definitivamente incapacitado para o trabalho em data anterior. Entendo que, com relação à incapacidade, sua análise deverá ser feita de acordo com critérios de razoabilidade e observando-se aspectos circunstanciais, tais como a idade, a qualificação pessoal e profissional do segurado, tipo de trabalho exercido (burocrático/braçal), entre outros, os quais permitam aferir o grau prático (e não meramente teórico) da incapacidade.
Na hipótese, as condições pessoais do segurado, como a sua idade (46 anos na data da perícia ortopédica), as comorbidades apresentadas (cervicalgia e melanoma maligno da pele metastático), a limitada experiência laborativa (sempre foi trabalhador braçal) e a realidade do mercado de trabalho atual, já exíguo até para pessoas jovens e que estão em perfeitas condições de saúde, não havia chances práticas de ser a parte autora readaptada para trabalho que não lhe exigisse os esforços físicos descritos pelos peritos judicial e administrativo. Assim, não resta dúvida de que o autor encontrava-se incapacitado de forma total e permanente para o labor, sem condições de integrar qualquer processo de reabilitação profissional, o que justifica a concessão da aposentadoria por invalidez.
No que tange ao termo inicial do benefício, registro que os exames e atestados médicos anexados à inicial (Evento 1 do originário - OUT6; ATESTMED7; ATESTMED9; ATESTMED11, fls. 4-5; OUT16; EXMMED21; LAUDO34; PRONT41) demonstram que o requerente era portador das mesmas patologias diagnosticadas nas perícias e indicam a incapacidade laboral definitiva já à época do requerimento administrativo, em 20-5-2014 (Evento 1 do originário, OUT12, fl. 1).
Desse modo, tenho que a parte autora faz jus à concessão da aposentadoria por invalidez no período de 20-5-2014 a 5-4-2017, devendo ser descontados os valores já pagos na via administrativa a título de auxílio-doença no interregno.
Correção monetária e juros de mora
Após o julgamento do RE n. 870.947 pelo Supremo Tribunal Federal (inclusive dos embargos de declaração), a Turma tem decidido da seguinte forma.
A correção monetária incide a contar do vencimento de cada prestação e é calculada pelos seguintes índices oficiais: [a] IGP-DI de 5-1996 a 3-2006, de acordo com o artigo 10 da Lei n. 9.711/1998 combinado com os §§ 5º e 6º do artigo 20 da Lei n. 8.880/1994; e, [b] INPC a partir de 4-2006, de acordo com a Lei n. 11.430/2006, que foi precedida pela MP n. 316/2006, que acrescentou o artigo 41-A à Lei n. 8.213/1991 (o artigo 31 da Lei n. 10.741/2003 determina a aplicação do índice de reajustamento do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A incidência da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública foi afastada pelo Supremo naquele julgamento. No recurso paradigma foi determinada a utilização do IPCA-E, como já o havia sido para o período subsequente à inscrição do precatório (ADI n. 4.357 e ADI n. 4.425).
O Superior Tribunal de Justiça (REsp 149146) - a partir da decisão do STF e levando em conta que o recurso paradigma que originou o precedente tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza não previdenciária (benefício assistencial) - distinguiu os créditos de natureza previdenciária para estabelecer que, tendo sido reconhecida a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização, deveria voltar a incidir, em relação a eles, o INPC, que era o índice que os reajustava à edição da Lei n. 11.960/2009.
É importante registrar que os índices em questão (INPC e IPCA-E) tiveram variação praticamente idêntica no período transcorrido desde 7-2009 até 9-2017 (mês do julgamento do RE n. 870.947): 64,23% contra 63,63%. Assim, a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
A conjugação dos precedentes acima resulta na aplicação, a partir de 4-2006, do INPC aos benefícios previdenciários e o IPCA-E aos de natureza assistencial.
Os juros de mora devem incidir a partir da citação. Até 29-6-2009 à taxa de 1% ao mês (artigo 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987), aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar (Súmula n. 75 do Tribunal).
A partir de então, deve haver incidência dos juros até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança, de acordo com o artigo 1º-F, da Lei n. 9.494/1997, com a redação que lhe foi conferida pela Lei n. 11.960/2009. Eles devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez".
Honorários advocatícios
Incide, no caso, a sistemática de fixação de honorários advocatícios prevista no art. 85 do NCPC, porquanto a sentença foi proferida após 18-3-2016 (data da vigência do NCPC definida pelo Pleno do STJ em 2-4-2016).
Invertidos os ônus sucumbenciais, estabeleço a verba honorária em 10% (dez por cento) sobre as parcelas vencidas até a data do presente julgado, considerando as variáveis dos incisos I a IV do §2º do artigo 85 do NCPC, assim como já observado o § 11.
Custas e despesas processuais
O INSS é isento do pagamento das custas no Foro Federal (art. 4, I, da Lei nº 9.289/96), devendo, contudo, reembolsar os valores adiantados a título de honorários periciais.
Cumprimento imediato do julgado (tutela específica)
Por fim, ressalto que é despicienda a aplicação da tutela específica no presente caso, tendo em vista que a parte autora já está recebendo o benefício de aposentadoria por invalidez, NB 6182333662, com data de início em 5-4-2017.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por extinguir parcialmente o feito, com resolução do mérito, em face do reconhecimento parcial da procedência do pedido pelo réu, nos termos do art. 487, III, a, do CPC, e, no restante, dar parcial provimento à apelação da parte autora.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002721306v33 e do código CRC c209a011.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5007085-22.2014.4.04.7110/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: LEONEL VERGARA TELECHI (AUTOR)
ADVOGADO: MAURÍCIO SANT ANNA DA ROSA (OAB RS076457)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RECONHECIMENTO PARCIAL DO PEDIDO. INCAPACIDADE DEFINITIVA COMPROVADA DESDE A DER. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. TEMA 810 DO STF.
1. É devida a aposentadoria por invalidez quando a perícia judicial é concludente de que a parte autora está incapacitada para a sua atividade habitual, e, por suas condições pessoais, se mostra impraticável a reabilitação para outra atividade.
2. Tendo havido o reconhecimento parcial da procedência do pedido pelo INSS no curso da ação, deve ser parcialmente extinto o feito, nos termos do art. 487, III, "a", do CPC.
3. O termo inicial da aposentadoria por invalidez deve ser fixado na DER quando o conjunto probatório permite concluir que, a contar de então, a incapacidade já era definitiva.
4. Assim, a parte autora faz jus à concessão do benefício também no período de 20-5-2014 a 5-4-2017.
5. A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, prevista na Lei 11.960/2009, foi afastada pelo STF no julgamento do Tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, o que restou confirmado, no julgamento de embargos de declaração por aquela Corte, sem qualquer modulação de efeitos.
6. O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC, daqueles de caráter administrativo, para os quais deverá ser utilizado o IPCA-E.
7. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-6-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, extinguir parcialmente o feito, com resolução do mérito, em face do reconhecimento parcial da procedência do pedido pelo réu, conforme o art. 487, III, a, do CPC, e, no restante, dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 18 de agosto de 2021.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002721307v7 e do código CRC f1580322.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 10/08/2021 A 18/08/2021
Apelação Cível Nº 5007085-22.2014.4.04.7110/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): CARMEM ELISA HESSEL
APELANTE: LEONEL VERGARA TELECHI (AUTOR)
ADVOGADO: MAURÍCIO SANT ANNA DA ROSA (OAB RS076457)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/08/2021, às 00:00, a 18/08/2021, às 14:00, na sequência 370, disponibilizada no DE de 30/07/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, EXTINGUIR PARCIALMENTE O FEITO, COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO, EM FACE DO RECONHECIMENTO PARCIAL DA PROCEDÊNCIA DO PEDIDO PELO RÉU, CONFORME O ART. 487, III, A, DO CPC, E, NO RESTANTE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 28/08/2021 12:00:58.