Apelação Cível Nº 5024046-62.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: ANELISE ALF BITENCOURT
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária, ajuizada em 17/03/2014, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou o restabelecimento do benefício de auxílio-doença nº 31/508.134.947-6, concedido por decisão judicial, e que perdurou pelo período de 31/10/2003 a 01/08/2013.
Na sentença, proferida na vigência do CPC/2015, acolhendo os embargos de declaração opostos pela parte autora, o Julgador monocrático julgou procedente o pedido de concessão do benefício de auxílio-doença a contar de 01/08/2013 (DCB), condenando o INSS ao pagamento das despesas judiciais e de honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor das parcelas vencidas até a data da publicação da sentença.
Irresignada, recorre a autora pretendendo a concessão da aposentadoria por invalidez.
O INSS, por sua vez, sustenta a ocorrência de coisa julgada em relação ao processo nº 0054861-90.2010.8.21.0044, requerendo a extinção do feito sem julgamento do mérito. Na eventualidade, pugna pela aplicação de juros e correção monetária conforme o art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, bem como pela isenção das custas e despesas processuais. Por fim, requer o prequestionamento da matéria.
Oportunizadas as contrarrazões, vieram os autos ao Tribunal.
É o relatório.
VOTO
O Código de Processo Civil, em seu artigo 337, §§ 1º a 4º, assim regula a respeito da litispendência e da coisa julgada:
Art. 337. Incumbe ao réu, antes de discutir o mérito, alegar:
(...)
§ 1º Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.
§ 2º Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido.
§ 3º Há litispendência quando se repete ação que está em curso.
§ 4º Há coisa julgada quando se repete ação que já foi decidida por decisão transitada em julgado.
Conforme se extrai da análise dos autos, a parte autora ajuizou ação anterior, protocolizada sob o nº 044/1.10.0005486-3 (0054861-90.2010.8.21.0044), a qual tramitou perante a 2ª Vara Judicial da Comarca de Encantado/RS, em que postulava a concessão de aposentadoria por invalidez ou o restabelecimento do benefício de auxílio-doença nº 31/508.134.947-6 a contar de 31/03/2010 (Evento 1, INIC1, p. 72). A prova produzida naqueles autos foi examinada, tendo sido julgado improcedente o pedido. No julgamento da Apelação Cível nº 0003433-48.2014.404.9999, a sentença foi reformada por esta Turma, na composição anterior, em acórdão já transitado em julgado em 18/08/2016, nos seguintes termos (Evento 25, CERTACORD3):
"Anelise Alf Bitencourt ajuizou, em 17 de novembro de 2010, ação ordinária contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS postulando o direito ao recebimento do benefício de aposentadoria por invalidez ou de auxílio-doença, desde o requerimento administrativo, em virtude de incapacidade para o exercício de suas atividades habituais.
Em 13 de novembro de 2013 foi proferida a sentença de improcedência (fls. 81-85).
A parte autora, no recurso, sustentou, em síntese, estar incapacitada para o trabalho, razão pela qual requer a reforma da sentença, para que sejam julgados procedentes os pedidos formulados na inicial (fls. 89-91).
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos para julgamento.
O tribunal, em 17 de julho de 2014, determinou o retorno dos autos à vara de origem para fins de realização de nova perícia, preferencialmente com médico especialista na área da patologia que acomete a parte autora (fls. 98-99).
Realizada a perícia, retornaram os autos para julgamento.
VOTO
Nos termos do artigo 1.046 do Código de Processo Civil (CPC), em vigor desde 18 de março de 2016, com a redação que lhe deu a Lei 13.105, de 16 de março de 2015, suas disposições se aplicarão desde logo aos processos pendentes, ficando revogada a Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973.
Com as ressalvas feitas nas disposições seguintes a este artigo 1.046 do CPC, compreende-se que não terá aplicação a nova legislação para retroativamente atingir atos processuais já praticados nos processos em curso e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada, conforme expressamente estabelece seu artigo 14.
Qualidade de segurado e carência mínima
São incontroversos no processo a qualidade de segurado e a carência mínima exigíveis para a concessão dos benefícios por incapacidade.
Conforme consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS (em anexo), o Instituto Nacional da Seguridade Social concedeu o auxílio-doença à parte autora, nos períodos de 31 de outubro de 2003 a 31 de julho de 2013 e de 24 de abril de 2014 a 04 de novembro de 2014, o que evidencia o preenchimento dos requisitos necessários à concessão do benefício ora postulado.
Incapacidade laboral
No caso concreto, da produção da prova pericial por especialista em cirurgia cardiovascular, em 12 de maio de 2015 (fls. 112-117), resultou conclusivo diagnóstico no sentido de que a autora está total e permanentemente incapacitada para o trabalho.
Respondendo aos quesitos, o perito afirmou que a parte autora, 50 anos, profissão calçadista, é portadora de trombose venosa profunda (CID I 82.9), insuficiência venosa crônica (CID I 87.2), síndrome pós-flebite (CID I 87.0), embolia e trombose de artéria de membro superior (CID I 74.2), embolia e trombose de membro inferior (CID I 74.3), hipertensão arterial (CID I 10), diabete mellitus com complicações circulatórias (CID E 11.5), hiperlipidemia (CID L 99.8) e depressão (CID F 33 e F 32).
O auxiliar do juízo referiu, ainda, que a autora está totalmente incapacitada para o exercício de suas atividades laborais (resposta ao quesito 4 do juízo), sendo que "a julgar pelo somatório de patologias, muitas destas progressivas e irreversíveis, a incapacidade pode ser considerada definitiva" (resposta ao quesito 6 da parte autora, fl. 114).
Por fim, o laudo concluiu que as patologias têm caráter progressivo e que "não há como persistir na atividade laboral sem piora dos sintomas e agravo do quadro geral de saúde da autora" (resposta ao quesito 16 do INSS, fl. 115).
O perito judicial é o profissional de confiança do juízo, cujo compromisso é examinar a parte com imparcialidade. Embora o julgador não fique adstrito às conclusões do perito, a prova em sentido contrário ao laudo judicial, para prevalecer, deve ser suficientemente robusta e convincente, o que não ocorreu no caso presente.
Considerando as conclusões do laudo judicial, à conta da incapacidade da parte autora para o exercício de suas atividades laborais, é devido o benefício de auxílio-doença com conversão em aposentadoria por invalidez.
Termo inicial
O conjunto probatório indicou a existência de incapacidade laboral quando da cessação do benefício NB nº 605.594.775-38, em 04-11-2014, conforme informações constantes no CNIS. Todavia, a incapacidade definitiva somente pode ser atestada quando da perícia judicial, razão pela qual deve ser restabelecido o benefício de auxílio-doença desde a data da cessação administrativa, convertendo-o em aposentadoria por invalidez desde a data da perícia, cumprindo ao INSS pagar à parte autora as respectivas parcelas.
(...)" - Grifei
A presente ação foi ajuizada na Justiça Estadual do RS, na Comarca de Encantado, em 17/03/2014, postulando o restabelecimento do mesmo benefício de auxílio-doença requerido na ação anterior, porém, a contar de 01/08/2013. Quando do ajuizamento deste feito, ainda pendia de julgamento recursal a ação anteriormente proposta (apelação juntada em 30/01/2014, conforme consulta ao site do TJRS), em que pleiteado o restabelecimento desde 31/03/2010.
A teor do art. 301, §§ 1º a 3º do CPC, ocorre a litispendência quando é reproduzida ação idêntica a outra que está em curso, ou seja, quando há identidade de partes, de pedido e de causa de pedir.
Ambas as demandas referem-se ao mesmo benefício (31/508.134.947-6) cessado administrativamente. A parte autora pleiteia em ambas as ações a concessão/restabelecimento de auxílio-doença e/ou aposentadoria por invalidez. Verifica-se, portanto, que há identidade de partes (Anelise Alf Bitencourt x INSS), de pedido (restabelecimento do auxílio-doença NB 508.134.947-6 e/ou concessão de aposentadoria por invalidez) e causa de pedir (incapacidade laboral por doença cardiovascular). Dessa forma, caracterizou-se, no momento do ajuizamento da demanda a existência de litispendência, nos termos dos §§ 1º e 3º do art. 301 do Código de Processo Civil.
No caso dos autos, a demandante ajuizou a presente ação quando já estava tramitando ação com identidade de partes, pedidos e causa de pedir, tendo posteriormente ocorrido o trânsito em julgado.
Cumpre destacar, ademais, que a parte autora não se insurgiu contra o acórdão que fixou o termo inicial do benefício em 04/11/2014, tendo deixado transcorrer in albis o prazo para interposição de recurso.
Desse modo, como a requerente já obteve provimento judicial a respeito da matéria dos autos, resta impossibilitada nova apreciação da questão, tendo em vista o princípio da coisa julgada material (art. 5º, XXXVI, CF).
Assim, deve ser extinto o feito sem resolução do mérito, nos termos do art. 485, V, do CPC.
Reformada a sentença, condeno a parte autora ao pagamento das custas judiciais e dos honorários advocatícios, os quais, com base no art. 85, §§ 2º, 4º, inciso III e § 11º, do CPC/2015, fixo em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa. Resta suspensa a exigibilidade, em face da concessão da gratuidade da justiça.
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação do INSS para julgar extinto o feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, V, do CPC, prejudicado o apelo da parte autora.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000937215v41 e do código CRC c2a7d104.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Data e Hora: 4/4/2019, às 14:12:15
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:34:50.
Apelação Cível Nº 5024046-62.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: ANELISE ALF BITENCOURT
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. benefício por incapacidade. LITISPENDÊNCIA/COISA JULGADA. REPETIÇÃO DO MESMO PEDIDO DE AÇÃO ANTERIOR.
Havendo identidade de partes, pedido e causa de pedir, deve ser extinto o feito sem julgamento do mérito, face ao reconhecimento de existência de litispendência/coisa julgada, nos termos do art. 485, V, do Código de Processo Civil.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação do INSS para julgar extinto o feito sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, V, do CPC, prejudicado o apelo da parte autora, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 27 de março de 2019.
Documento eletrônico assinado por ARTUR CÉSAR DE SOUZA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40000937216v5 e do código CRC 55a02bf9.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Data e Hora: 4/4/2019, às 14:12:15
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:34:50.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 27/03/2019
Apelação Cível Nº 5024046-62.2018.4.04.9999/RS
RELATOR: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
APELANTE: ANELISE ALF BITENCOURT
ADVOGADO: ADRIANO SCARAVONATTI
ADVOGADO: DANIEL NATAL BRUNETTO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 27/03/2019, na sequência 625, disponibilizada no DE de 12/03/2019.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA, DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS PARA JULGAR EXTINTO O FEITO SEM JULGAMENTO DO MÉRITO, NOS TERMOS DO ART. 485, V, DO CPC, PREJUDICADO O APELO DA PARTE AUTORA.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Juiz Federal ARTUR CÉSAR DE SOUZA
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Conferência de autenticidade emitida em 07/07/2020 11:34:50.