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Apelação Cível Nº 5026991-18.2020.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: PAULO LEONEL MOURA WIATROSCKI (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
PAULO LEONEL MOURA WIATROSCKI ajuizou ação de procedimento comum contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando a concessão de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição desde 18/12/2018 (DER) mediante o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas no período de 08/07/1993 a 18/12/2018.
Processado o feito, sobreveio sentença com o seguinte dispositivo (
):Ante o exposto, julgo IMPROCEDENTE o pedido da parte autora, extinguindo o feito com resolução de mérito, nos termos do art. 487, inciso I, do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, ao procurador da parte adversa, fixados nos percentuais mínimos dos incisos do § 3º, sobre o valor da causa atualizado, considerando o § 4º, III e a determinação dos §§ 2º e 5º todos do art. 85 do CPC, cuja execução fica suspensa, nos termos do disposto no art. 98, §3º do CPC.
Custas pela parte autora, ficando suspenso o seu pagamento tendo em vista a concessão do benefício da justiça gratuita.
Intimem-se.
Sentença não sujeita a reexame necessário.
Havendo recurso(s) voluntário(s) tempestivo(s), intime(m)-se a(s) parte(s) contrária(s) para apresentação de contrarrazões. Acaso suscitadas em contrarrazões as matérias referidas no artigo 1.009, § 1º, do CPC/2015, dê-se vista a(s) parte(s) contrária pelo prazo de 15 (quinze) dias, nos termos do § 2º do referido dispositivo legal. Juntados os eventuais recursos e as respectivas contrarrazões apresentadas no prazo legal devem ser os autos remetidos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Transcorrido o prazo sem interposição de recursos, certifique-se o trânsito em julgado e, após cumpridas as determinações do julgado, dê-se baixa e arquivem-se.
Foram opostos embargos de declaração pela parte autora (
), que foram rejeitados pelo juízo a quo ( ).Apela a parte autora.
Nas suas razões recursais (
), sustenta a necessidade de realização de prova pericial para comprovação da especialidade, diante das irregularidades do PPP. No mérito, requer o reconhecimento da especialidade do período de 08/07/1993 a 18/12/2018, em razão do contato com agentes biológicos no desempenho do labor junto à FPE.Com contrarrazões (
), vieram os autos a esta Corte.Neste grau de jurisdição, peticiona a parte autora postulando a juntada de atestado de saúde ocupacional emitido pelo empregador (
). Intimado, o INSS não se manifestou acerca do documento.É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Recebo o apelo da parte autora, pois cabível, tempestivo e isento de preparo por força da AJG concedida (
).Preliminar: cerceamento de defesa
A produção de provas visa à formação do juízo de convicção do Juiz, a quem compete "de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias à instrução do processo, indeferindo as diligências inúteis ou meramente protelatórias", nos termos do art. 370 do CPC. Assim, sendo a prova dirigida ao Juízo, não se configurará cerceamento de defesa se ele entender que o conjunto probatório dos autos é suficiente à formação de seu convencimento, permitindo o julgamento da causa.
Importa destacar, outrossim, que o afastamento da alegação de cerceamento de defesa não pressupõe o automático reconhecimento da especialidade do período requerido.
O retorno dos autos à origem somente se justifica na medida em que inexista nos autos documentação suficiente para esclarecer as condições de trabalho vivenciadas pela parte autora; mas desde que haja um lastro probatório mínimo a respeito das atividades efetivamente desempenhadas no período.
Na petição inicial, postula a parte autora o reconhecimento da especialidade do período de 08/07/1993 a 18/12/2018, laborado na Fundação Estadual do Bem Estar do Menor (atual FASE/RS), alegando a exposição a "acidente, umidade, pressão psicológica, penosidade, perigoso".
A sentença julgou improcedente o pedido, pontuando inexistir indicação da exposição a agentes nocivos físicos, químicos ou biológicos a determinar o reconhecimento da especialidade no PPP, bem como que, tendo o segurado desempenhado suas atividades junto à Fundação de Proteção Especial - FPE/RS e não junto à FASE/RS, não há possibilidade de enquadramento pela periculosidade do labor.
Observo, inicialmente, que o vínculo do autor iniciou-se em 08/07/1993 junto à originária Fundação Estadual do Bem Estar do Menor - FEBEM. Após a extinção dessa fundação, passou a trabalhar junto à Fundação de Proteção Especial - FPE (
).A Fundação de Proteção Especial do Rio Grande do Sul – FUNDAÇÃO PROTEÇÃO - integra o Governo do Estado, através da Secretaria da Igualdade, Cidadania, Direitos Humanos e Assistência Social (SICDHAS), e realiza o acolhimento de forma não seletiva, de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. Oferece cuidado e proteção em espaço de desenvolvimento para crianças e adolescentes afastados dos cuidados familiares - de forma excepcional e provisória - em razão de situação de vulnerabilidade e riscos sociais: abandono, abusos, maus tratos, negligência e/ou violências1.
O próprio autor afirma, em suas razões recursais, que "sempre exerceu suas atividades de monitor em abrigos e centros de acolhimento de crianças e adolescentes em vulnerabilidade social, tais como Centro Infanto Juvenil Plínio Gilberto Kroeff, Abrigo Juvenil Feminino e alguns Núcleos de Abrigos Residenciais – NAR, o que se diferencia dos casos conhecidos da FASE, mas não significa que também não há a incidência de agentes nocivos".
Com efeito, para verificação da especialidade das atividades exercidas decorrente de exposição a agente nocivo, via de regra, levam-se em consideração as informações contidas em formulários e laudos técnicos das empresas, sendo que os formulários devem ter base em laudo produzido por profissional tecnicamente competente. Em caso de dúvida sobre a fidedignidade ou suficiência de tal documentação, é plausível até mesmo a produção de laudo pericial em juízo.
No caso dos autos, o PPP fornecido (
) apresenta lacunas que o tornam insuficiente à avaliação das condições de trabalho experimentadas pelo autor.Inicialmente, observo que indica inexistir registros acerca da exposição a fatores de risco no período de 08/07/1993 a 05/12/2006. Além disso, a partir de 2018 a descrição das atividades e a listagem dos fatores de risco parece ser mais completa que em períodos anteriores, embora a função desempenhada fosse essencialmente a mesma.
Observo, outrossim, que alguns dos laudos periciais acostados aos autos, como o elaborado na reclamatória trabalhista nº 0000366-19.2013.5.04.0011, ajuizada em face da FPE/RS (
), constatam a exposição dos trabalhadores (inclusive dos agentes educadores, como o autor) a agentes biológicos em razão da atividade de cuidar de pacientes com doenças infecto-contagiosas no setor de isolamento. Ainda que a avaliação pericial tenha sido realizada em unidade diversa daquela em que o autor desempenhou suas atividades, é indício de que os documentos fornecidos pelo empregador não refletem - para todo o período - a realidade da atividade desempenhada.Destaco, por fim, ser de conhecimento a existência de determinação judicial, proferida em sede de Ação Civil Pública movida pelo MPE/RS, para que o FPE, conjuntamente com o Estado do Rio Grande do Sul, "implemente Serviço de Acolhimento Institucional destinado a crianças e adolescentes egressos do regime de internação da FASE, bem como para os menores ameaçados de morte." (nº 70081394272 nº CNJ: 0111336-38.2019.8.21.7000)
Assim, embora em regra a FPE/RS não se preste ao abrigamento de menores infratores, acusados de delitos graves, é possível que ocorresse tal situação.
Portanto, entendo que a não realização de prova pericial cerceia seu direito de defesa por não lhe permitir produzir a prova que, com insistência, considera a mais importante para o acatamento de seu argumento. Especialmente quando os documentos constantes dos autos revelam-se tão divergentes quanto às reais condições em que exercido o trabalho.
Forçoso considerar, portanto, que a instrução probatória restou efetivamente comprometida, impondo-se a decretação de nulidade da sentença, por cerceamento de defesa, para que, restabelecida a fase instrutória, se determine a complementação da prova, inclusive com realização de perícia judicial.
Conclusão
O apelo da parte autora foi parcialmente provido para acolher a preliminar de cerceamento de defesa e determinar o retorno dos autos à origem para reabertura da instrução probatória, nos termos da fundamentação.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5026991-18.2020.4.04.7100/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: PAULO LEONEL MOURA WIATROSCKI (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CERCEAMENTO DE DEFESA. PROVA DEFICIENTE. NECESSIDADE DE PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL. SENTENÇA ANULADA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO PROCESSUAL.
1. Sendo a prova dirigida ao Juízo, não se configurará cerceamento de defesa se ele entender que o conjunto probatório dos autos é suficiente à formação de seu convencimento, permitindo o julgamento da causa.
2. No caso dos autos, constatou-se que a instrução probatória foi insuficiente a demonstrar as reais condições em que desenvolvidas as atividades pela parte autora, especialmente diante de discrepâncias existentes nos documentos fornecidos pela empresa.
3. O julgamento, afastando a especialidade do período, sem oportunizar a produção da prova que a parte entende indispensável à comprovação do direito alegado configura cerceamento de defesa; impondo-se a decretação da nulidade da sentença, de modo a reabrir a instrução probatória.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de fevereiro de 2023.
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 07/02/2023
Apelação Cível Nº 5026991-18.2020.4.04.7100/RS
RELATOR: Juiz Federal RODRIGO KOEHLER RIBEIRO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): RICARDO LUÍS LENZ TATSCH
SUSTENTAÇÃO ORAL POR VIDEOCONFERÊNCIA: OSWALDO DE BEM BORBA por PAULO LEONEL MOURA WIATROSCKI
APELANTE: PAULO LEONEL MOURA WIATROSCKI (AUTOR)
ADVOGADO(A): OSWALDO DE BEM BORBA (OAB RS079381)
ADVOGADO(A): BRUNO MESKO DIAS (OAB RS072493)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária do dia 07/02/2023, na sequência 5, disponibilizada no DE de 26/01/2023.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal RODRIGO KOEHLER RIBEIRO
Votante: Juiz Federal RODRIGO KOEHLER RIBEIRO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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