APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000994-56.2013.4.04.7107/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | CHARLES SILVINO PILLAR ROSA |
ADVOGADO | : | GELSON DOS REIS |
: | EDUARDO MAZZOTTI DOS REIS | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. EXTINÇÃO DO FEITO SEM JULGAMENTO DE MÉRITO.
Havendo identidade de partes, pedido e causa de pedir, e havendo o trânsito em julgado em ação anterior, é de ser mantida a sentença que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, face ao reconhecimento de existência de coisa julgada.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 6a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de outubro de 2016.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8570108v3 e, se solicitado, do código CRC 28233E85. | |
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000994-56.2013.4.04.7107/RS
RELATOR | : | JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
APELANTE | : | CHARLES SILVINO PILLAR ROSA |
ADVOGADO | : | GELSON DOS REIS |
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APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação interposta contra sentença que julgou extinto o processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, V, do CPC (coisa julgada), condenando a parte autora ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios de seis mil reais, suspensa a exigibilidade em razão da AJG.
Recorre a parte autora, sustentando, em suma, que na presente ação postula a averbação de tempo de contribuição, que só foi possível após ajuizamento de reclamatória trabalhista, fazendo jus ao restabelecimento do auxílio-doença.
Com contrarrazões, subiram os autos a este TRF.
É o relatório.
VOTO
A controvérsia cinge-se ao acerto ou não da decisão que extinguiu o processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, V, do CPC (coisa julgada).
Da sentença recorrida, extraio a seguinte fundamentação:
1. Da coisa julgada
Ainda que o INSS somente tenha ventilado a questão referente à coisa julgada no evento nº 72, não há óbice ao exame do ponto, notadamente por se tratar de matéria de ordem pública, reconhecível de ofício.
A fim de bem delinear a questão, impende tecer um breve relato sobre as vicissitudes ocorridas no presente processo e no de nº 5002883-16.2011.404.7107.
Pois bem, em 02/06/2011 a parte autora ajuizou contra o INSS o processo nº 5002883-16.2011.404.7107. Seu pedido naquela demanda era o restabelecimento do benefício nº 31/357.234.769-0, cessado em 21/02/2010 (fl. 01 do CONBAS35 do evento nº 01). Ao passo que a justificativa para a cessação do benefício era a fixação da DII em 01/01/2006, ou seja, antes de seu ingresso no RGPS, a parte autora sustentava que o início da incapacidade ocorreu em agosto de 2009, quando detinha qualidade de segurado.
Após a produção das provas cabíveis, foi proferida em 07/02/2013 sentença no seguinte sentido:
De acordo com o laudo pericial acima transcrito e os demais documentos acostados ao feito, verifica-se que o demandante é portador de patologia psiquiátrica que o incapacita para o exercício de suas atividades habituais. Entretanto, tal fato não é suficiente, por si só, para a deflagração da medida postulada, sendo necessário verificar se a parte autora implementou os demais requisitos para a concessão da prestação vindicada.
Com efeito, malgrado as conclusões do perito judicial, verifica-se que o autor já era portador da moléstia incapacitante acima relatada antes mesmo de reingressar ao RGPS em maio de 2009 (doc. CNIS2, evento 22), tanto que foi 'julgado incapaz definitivamente para o serviço da Brigada Militar, após avaliação da Junta Militar de Saúde, com diagnóstico F 31.4 (CID 10)' (doc. OFIC42), ou seja, em decorrência de transtorno afetivo bipolar, episódio atual depressivo grave sem sintomas psicóticos, sendo reformado (aposentado) na data 23/04/2007.
Frise-se, por oportuno, que o perito judicial afirmou que a doença teve início em abril de 2007 e a incapacidade em maio de 2011, o que concluiu a partir de um atestado subscrito por profissional ligado à Brigada Militar e datado em 04/05/2011 (doc. OUT8, evento 01). Ora, o fato de o autor ter sido reformado em abril de 2007 em razão de patologia similar à diagnosticada pelo perito do juízo, porém com contornos mais graves, leva a conclusão de que a incapacidade remonta àquela data e não ao momento em que foi firmado o atestado anexado à inicial (doc. OUT8). Impende registrar, outrossim, que o demandante permanece em acompanhamento psiquiátrico em razão da patologia incapacitante que levou à sua inativação, a qual, reitere-se, tem contornos mais severos que aquela diagnosticada pelo perito judicial, bem como que apenas no último ano - ou seja, em 2010 - não houve necessidade de internação, como faz prova atestado acima citado e o Ofício encaminhado a este Juízo pela Secretaria de Segurança Pública do Rio Grande do Sul (doc. OFIC1, evento42).
Referidos documentos também levam à conclusão de que o acompanhamento psiquiátrico (realizado com profissional vinculado a BM) e o tratamento medicamentoso que vem sendo ministrado desde a inativação (2007) estão surtindo efeitos, já que o autor, naquela oportunidade, foi diagnosticado como sendo portador de transtorno afetivo bipolar, episódio atual depressivo grave sem sintomas psicóticos (CID 10 F31.4), enquanto que em junho de 2011(doc. LAU1, evento 14) o diagnóstico foi de transtorno afetivo bipolar atualmente em episódio depressivo moderado (CID 10 F31.3).
Dessarte, conclui-se que o demandante já padecia do mal incapacitante antes de ser reformado pela BM e, consequentemente, antes reingressar ao sistema previdenciário, o que impede o acolhimento da pretensão veiculada nesta contenda, uma vez que a LBPS é bastante clara ao vedar a concessão dos benefícios em tela quando o segurado reingressar ao RGPS já portador da moléstia invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento, o que não se verifica na hipótese em apreço. Em outras palavras, os documentos anexados aos autos demonstram que o quadro mórbido incapacitante tinha contornos mais graves quando o autor foi reformado - em 23/04/2007 - do que quando reingressou ao Regime Geral em maio de 2009. Outrossim, indicam que o demandante continua tendo acompanhamento psiquiátrico - em razão da mesma patologia incapacitante - desde que foi reformado, o que permite afirmar que a incapacidade é preexistente ao seu reingresso ao Regime Geral e não sobreveio de progressão ou agravamento da doença.
(...)
Isso posto, julgo improcedente o pedido, nos termos do art. 269, I, 2ª parte, do CPC.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor atribuído à causa, cuja execução fica suspensa em virtude do benefício da assistência judiciária gratuita.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Na hipótese de interposição de recurso de apelação, o qual será recebido no duplo efeito, intime-se a parte contrária para contrarrazoar, querendo, no prazo legal.
Verificadas as condições de admissibilidade e cumpridos os procedimentos de estilo, remetam-se os autos ao egrégio TRF da 4ª Região.
Em síntese, concluiu-se que o autor encontra-se incapaz desde abril de 2007, o que inviabilizou a concessão da benesse.
Houve apelação, tendo a Corte Recursal mantido na íntegra a sentença guerreada. Cumpre, aliás, citar trecho do julgado:
Mantenho a sentença por seus próprios fundamentos. Com efeito, entendo, tal como o MPF em seu parecer, que se trata de incapacidade preexistente ao reingresso do autor no RGPS, em razão do que não faz jus à concessão do benefício por incapacidade postulado. Conforme bem analisado pelo magistrado 'a quo' não se trata de agravamento, ao contrário, seu quadro clínico era mais grave em 2007 quando foi reformado, sendo atualmente moderado.
Após, ocorreu o trânsito em julgado.
Ocorre que em 28/01/2013 a parte autora ajuizou o presente feito, contra o INSS novamente. Na inicial, ela deduz novamente pedido de restabelecimento do benefício de incapacidade nº 31/357.234.769-0 a contar de 21/02/2010. Desta vez, todavia, escorado em sua alegada incapcaidade, sustenta que, na esfera trabalhista, foi reconhecido vínculo laboral a contar de 04/12/2007, o que lhe confere direito ao benefício diante do agravamento da doença.
Este relato torna evidente que se está diante de COISA JULGADA.
Senão, vejamos.
Os §§ 1º e 2º do artigo 301 do CPC estabelecem que:
§ 1o Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada.
§ 2o Uma ação é idêntica à outra quando temas mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido
De pronto, se visualiza que se está diante de duas ações com as mesmas partes e pedidos. Em ambas o autor busca junto ao INSS o restabelecimento do mesmo benefício de incapacidade, cessado em 21/02/2010.
Resta avaliar a questão envolvendo a causa de pedir.
A causa de pedir é composta dos fatos e dos fundamentos jurídicos do pedido. Os fatos são versados como a causa remota, erigidos a partir da relação fático-jurídica havida entre as partes, enquanto que os fundamentos jurídicos coadunam com a causa denominada "próxima", em que há a inserção da situação concreta na previsão abstrata da lei. É a causa de pedir, enfim, o que fundamenta o pleito do demandante, tanto no aspecto fático quanto jurídico.
De conseguinte, o ordenamento jurídico pátrio, com espeque no art. 282, III, do CPC, adota a teoria da substanciação da causa de pedir, mormente porque incumbe ao autor descrever, na inicial, os fatos e os fundamentos jurídicos do pedido, vinculando-se a tais argumentações, inclusive para efeito de apreciação judicial. Há, portanto, um papel fundamental do autor de explicitar com precisão o que compõe o seu pleito, tanto no aspecto fático quanto jurídico. Sinalo, a respeito da questão jurídica, que a incumbência do demandante centra-se não na prova da lei, que deve ser conhecida de ofício pelo Juízo, mas no encaixe dos fundamentos jurídicos no ambiente fático relatado.
Aliás, a diferenciação entre causa de pedir remota e próxima advém da própria fixação da teoria da substanciação na órbita do direito processual civil pátrio, tanto que a posição contrária, escorada na teoria da individualização, centra-se no fato de que a causa de pedir é formada unicamente pela relação jurídica, de modo que os fatos jurídicos ganham um viés acessório. Conclui-se que a divergência entre as teorias está no fato de que para a individualização os fundamentos jurídicos são suficientes para preencher o conteúdo da causa de pedir e, para a teoria da substanciação, necessita-se ainda dos fatos jurídicos.
Como conclui Calmon de Passos, "para os adeptos da substanciação, a causa de pedir é representada pelo fato ou complexo de fatos aptos a suportar a pretensão do autor, pois são eles que constituem o elemento de onde deflui a conclusão" (Comentários ao Código de Processo Civil, Lei n. 5869, de 11 de janeiro de 1973, vol. III: arts. 270 a 331. 8. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 160) Cândido Dinamarco, além disso, preconiza que "na teoria da substanciação acatada pelo sistema processual brasileiro, o juiz está vinculado aos fatos narrados na petição inicial, não podendo decidir com fundamento em outros, mas é sempre livre para aplicar o direito conforme seu entendimento - porque iura novit cúria" (Vocabulário do Processo Civil, SP: Malheiros, 2009, p. 352).
Pelas razões expostas, portanto, infere-se que em ambos os feitos está-se diante da mesma causa de pedir, que é a incapacidade laboral. A data do início da incapacidade, a qualidade de segurado, a carência, entre tantos outros pontos, são elementos relevantes para a argumentação das partes, não se constituindo como os fatos essenciais que embasam a causa de pedir. Neste sentido:
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA. DOENÇA DIVERSA. COISA JULGADA. EFICÁCIA PRECLUSIVA.1 - Há coisa julgada que impede o rejulgamento da lide em relação ao mesmo requerimento administrativo, porque se cuida de mesmas partes, de mesmo pedido (concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez) e de mesma causa de pedir (existência de incapacidade para o trabalho, porque fato essencial ao efeito jurídico pretendido), o que leva à aplicação do art. 301, §§ 1º e 2º, do CPC.2 - A modificação da doença indicada como geradora da incapacidade, por se cuidar de fato não essencial, não induz à alteração da causa de pedir nem, consequentemente, afasta a identidade de ações.3 - Aplica-se o art. 474 do CPC, que prevê a eficácia preclusiva da coisa julgada, norma que decorre do princípio processual da eventualidade, que impõe a dedução pelas partes, de uma só vez, de todos os meios de ataque e de defesa em relação ao pedido.4 - O instituto da coisa julgada é garantia constitucional e tem incidência uniforme seja qual for o campo do direito, de modo que se manifesta nas relações jurídicas previdenciárias. (TRF4, AC 5000246-40.2012.404.7113, Sexta Turma, Relatora p/ Acórdão Luciane Merlin Clève Kravetz, juntado aos autos em 27/09/2013)
Dessarte, não se pode olvidar o teor do art. 474 do CPC, que prevê que "passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido", ou seja, ocorre a chamada eficácia preclusiva da coisa julgada.
Ora, foi uma opção da parte autora pleitear judicialmente o benefício sob o argumento exclusivo de equívoco na fixação da DII, com os riscos e bônus daí inerentes, de modo que contestada a ação e prolatada a sentença, ou seja, não mais sendo possível a alteração do pedido e causa de pedir, "reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido". A lógica do dispositivo é simples e escora-se na segurança jurídica. Com efeito, a estabilização das relações jurídicas é medida que norteia o Estado Democrático de Direito. Pensar diferente autorizaria o ajuizamento de dezenas de ações com a mesma finalidade.
Não há falar também que não tinha o autor como alegar o vínculo com o Hotel e Restaurante Villa Borghese Ltda, iniciado em 04/12/2007, quando do primeira ação por ter o acordo sido entabulado apenas em 10/09/2012 (DEC10 do evento nº 01), pois, além do reconhecimento do vínculo na esfera previdenciária não pressupor decisão da Justiça do Trabalho, o artigo 265 do CPC estabelece de forma cristalina a ferramenta a ser utilizada em casos como o presente:
Art. 265. Suspende-se o processo:
(...)
IV - quando a sentença de mérito:
a) depender do julgamento de outra causa, ou da declaração da existência ou inexistência da relação jurídica, que constitua o objeto principal de outro processo pendente;
Nesta linha, não se pode admitir que uma segunda demanda infirme uma decisão transitada em julgado.
Creio que a lição do atual Ministro do STF Luiz Fux sobre o tema é bem elucidativa:
Isto significa dizer que a eventual discussão incompleta da causa não autoriza a sua reabertura tampouco infirma o julgado. A idéia da estabilidade da decisão convive com as lacunas deixadas ao longo da discussão da causa: tantum iudicatum quantum disputatum vel quantum disputari debebat. Em conseqüência, nenhuma das partes pode valer-se de argumento que poderia ter sido suscitado anteriormente para promover nova demanda com o escopo de destruir o resultado a que se chegou no processo onde a decisão passou em julgado. Assim, v.g., se em ação de cobrança a parte deixou de alegar o pagamento e a condenação transitou em julgado, não pode pretender a posteriori promover ação de repetição do indébito, porque a isso equivaleria negar o julgado trânsito; no mesmo sentido, a ação que pretendesse a repetição de pagamento de aluguel legitimado em ação de despejo por falta de pagamento onde o locatário requereu a purga de mora. Mesmo na hipótese de a parte obter um documento novo que, malgrado existente à época da sentença, ela desconhecia, tanto que o obteve após a prolação da decisão, ela deve primeiramente rescindir a sentença para, após, recolher nova decisão que, nesse caso, não infirmará o julgado, posto que desconstituído. (Curso de Direito Processual Civil", Forense, 2001, Rio de Janeiro).
Cito, ainda, o que ele disse em julgado na época que era Ministro do STJ, repetindo ensinamento de Barbosa Moreira:
A eficácia preclusiva da coisa julgada manifesta-se no impedimento que surge, com o trânsito em julgado, à discussão e apreciação das questões suscetíveis de incluir, por sua solução, no teor do pronunciamento judicial, ainda que não examinadas pelo juiz. Essas questões perdem, por assim dizer, toda a relevância que pudessem ter em relação à matéria julgada. Posto que se conseguisse demonstrar que a conclusão seria diversa, caso elas houvessem sido tomadas em consideração, nem por isso o resultado ficaria menos firme; para evitar, pois, dispêndio inútil de atividade processual, simplesmente, se exclui que possam ser suscitadas com escopo de atacar a res judicata. Se a decisão é das que só produzem coisa julgada formal, o efeito preclusivo restringe-se ao interior do processo em que foi proferida; se é das que geram coisa julgada material, como a sentença definitiva, o efeito preclusivo projeta-se ad extra, fazendo sentir-se nos eventuais processos subsequentes. Daí qualificar-se de pan-processual a eficácia preclusiva da coisa julgada material. REsp 1152174/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/02/2011, DJe 22/02/2011).
Noto que a parte em negrito coaduna perfeitamente com os fatos versados nestes autos.
Sobre a eficácia preclusiva da coisa julgada, cito o seguinte precedente do TRF4:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA E APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. RENOVAÇÃO DO PEDIDO. COISA JULGADA. 1. Na dicção dos arts. 267, inciso V, e 301, do CPC, a coisa julgada é a eficácia que torna imutável e indiscutível a decisão não mais sujeita a recurso ordinário ou extraordinário (CPC, art. 467), impedindo o reexame da causa no mesmo processo (coisa julgada formal) ou em outra demanda judicial (coisa julgada material). Tal eficácia preclusiva - que visa a salvaguardar a segurança nas relações sociais e jurídicas, conferindo-lhes estabilidade - projeta-se para além do conteúdo explícito do julgado, alcançando todas as alegações e defesas que poderiam ter sido suscitadas e não o foram pelas partes, nos termos do art. 474 do Código de Processo Civil. 2. Ainda que se admita, em tese, que, havendo alteração do quadro fático a justificar a concessão do benefício por incapacidade, resta superado o comando sentencial que se tornará inoperante em relação à nova situação (artigo 471, inciso I, do CPC), a renovação do pleito só é admissível se demonstrada a existência de modificação da realidade fática, o que não ocorreu na espécie. (TRF4, AC 0002768-37.2011.404.9999, Sexta Turma, Relatora Vivian Josete Pantaleão Caminha, D.E. 18/11/2011
O entendimento do STJ também tem se mostrado de acordo com o exposto nestes autos:
PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. SUPOSTA OFENSA AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. ALEGADA AFRONTA AOS ARTS. 165, I, 168, I, E 169 DO CTN E AO ART. 6º, § 1º, DA LICC. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. ÓBICE DA SÚMULA 211/STJ. EXECUÇÃO CONTRA A FAZENDA. SENTENÇA EXEQUENDA QUE SE LIMITOU A FIXAR O PRAZO PRESCRICIONAL APLICÁVEL AO CASO. PRETENSÃO DE SE DEMONSTRAR A EXISTÊNCIA DE EVENTUAIS CAUSAS SUSPENSIVAS E INTERRUPTIVAS DA PRESCRIÇÃO, EM SEDE DE EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. EFICÁCIA PRECLUSIVA DA COISA JULGADA (ART. 474 DO CPC). 1. Não havendo no acórdão recorrido omissão, obscuridade ou contradição, não fica caracterizada ofensa ao art. 535 do CPC. 2. "Inadmissível recurso especial quanto à questão que, a despeito da oposição de embargos declaratórios, não foi apreciada pelo tribunal a quo." (Súmula 211/STJ). 3. Nos termos do art. 474 do CPC, "passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido". Na linha dos precedentes desta Corte, "o art. 474 do CPC reflete a denominada eficácia preclusiva da coisa julgada, pela qual todas as questões deduzidas que poderiam sê-lo e não o foram encontram-se sob o manto da coisa julgada, não podendo constituir novo fundamento para discussão da mesma causa, mesmo que em ação diversa" (REsp 1.264.894/PR, 2ª Turma, Rel. Min. Humberto Martins, DJe de 9.9.2011), ou seja, "a coisa julgada é tutelada pelo ordenamento jurídico não só pelo impedimento à repropositura de ação idêntica após o trânsito em julgado da decisão, mas também por força da denominada "eficácia preclusiva do julgado" (artigo 474, do CPC), que impede seja infirmado o resultado a que se chegou em processo anterior" com decisão transitada em julgado, ainda que "a ação repetida seja outra, mas que, por via oblíqua, desrespeita o julgado adredemente proferido" (REsp 1.039.079/MG, 1ª Turma, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 17.12.2010). 4. No caso dos autos, se a sentença exequenda, ao julgar procedente o pedido de repetição de indébito, tratou apenas do prazo prescricional aplicável ao caso, não é possível, em sede de execução, discutir a existência de eventuais causas suspensivas ou interruptivas da prescrição, sob pena de ofensa à coisa julgada. Nesse sentido: REsp 1.009.614/DF, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJe de 21.5.2008. 5. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. (REsp 938.617/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 11/10/2011, DJe 18/10/2011)
Portanto, não me parece haver dúvida sobre o fato de que o restabelecimento do benefício nº 31/357.234.769-0 encontra obstáculo na coisa julgada.
Como obiter dictum, entendo prudente um outro esclarecimento. O ponto controverso suscitado pela parte autora quando instada a falar sobre a coisa julgada nestes autos, foi a questão envolvendo a comprovação do seu vínculo empregatício. Ainda que se acolhesse sua irresignação, ter-se-ia a mesma conclusão colhida no processo anterior, já que a DII foi fixada em abril de 2007, enquanto que o início do vínculo foi em dezembro de 2007.
E isso é preciso deixar claro. Não obstante o esforço argumentativo da parte autora, não há como não concluir que, nos autos do processo nº 5002883-16.2011.404.7107, existe uma decisão imutável que fixou a data do início da incapacidade em abril de 2007. Sentido, portanto, nenhum há em se realizar, por exemplo, nova prova pericial nestes autos, a não ser aferir o quadro de saúde do autor no período posterior à perícia realizada no processo anterior. Uma nova perícia não terá o condão de alterar a DII judicialmente fixada, não se prestando como elemento para revisar a coisa julgada.
Por tudo isso, não há como acolher minimamente a argumentação lançada no evento nº 16. Esta ação busca tão somente a concessão de benefício por incapacidade já rejeitado judicialmente, sendo o cômputo de determinado vínculo laborar questão incidente que visa, em linhas transversas, infirmar o instituto da coisa julgada. Aliás, fica claro que o autor pinça somente alguns pontos da decisão transitada em julgado, os que lhe interessam. Diz ele:
A sentença proferida naquela ação reconheceu a incapacidade do autor, ratificando-se assim as conclusões do perito judicial (evento 51 dos autos 5002883-16.2011.404.7107).
Aquela ação foi julgada improcedente por ausência da qualidade de segurado. No entanto, a qualidade de segurado do autor só foi afastada naquela ação em razão da anotação fraudulenta do contrato de trabalho na CTPS do autor. Após o autor buscar a retificação judicial da situação, viu desfeita a anotação inverídica de seu contrato de trabalho, passando a CTPS ostentar a data de admissão correta.
Ora, a sentença reconheceu sim a incapacidade. Mas foi mais além fixando seu início em abril de 2007, de modo que a existência ou não do vínculo alegado em nada interferiria na solução da controvérsia.
Diz ainda o autor que:
Esta data de admissão - 04/12/2007 - é anterior à data de início da incapacidade do autor que, conforme o laudo pericial judicial, é de maio de 2011
Ou seja, guia-se pela sua interpretação do laudo, e não pelo que, de fato, foi decidido naqueles autos.
Em resumo, a questão envolvendo o direito ou não do segurado ao restabelecimento do benefício de auxílio-doença já foi decidida no processo nº 5002883-16.2011.404.7107, sendo incabível sua revisão em processo distinto. Como o reconhecimento do vínculo é questão incidental para a concessão do benefício por incapacidade, sequer é necessário o exame de tal pleito, inclusive porque nem mesmo houve apresentação ao INSS de pedido para averbação do interregno objeto de acordo na Justiça do Trabalho, o que coloca em xeque a própria pretensão resistida.
Por tudo isso, impõe-se a extinção do feito pela coisa julgada.
Mantenho a sentença por seus bem lançados fundamentos. Com efeito, se o requerente já obteve provimento judicial a respeito da matéria dos autos, resta impossibilitada nova apreciação da questão, tendo em vista o princípio da coisa julgada material, a teor do disposto no artigo 5º, inciso XXXVI, da atual Constituição Federal
Nesse sentido, transcreve-se excerto do voto proferido pelo eminente Juiz Federal Ricardo Teixeira do Valle Pereira (AC n.º 2003.04.01.032879-9/RS, Sessão de 09-11-2005, decisão unânime):
(...)
A causa de pedir foi a mesma alegada na presente ação, trabalho rural e negativa do INSS em conceder o benefício, sendo despicienda a questão de haver a autora produzido ou não prova do período de carência no processo anterior, pois a regra insculpida no art. 474, do Código de Processo Civil, determina que "Passada em julgado a sentença de mérito, reputar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e defesas, que a parte poderia opor assim ao acolhimento como à rejeição do pedido".
De acordo com o art. 301, §2º, do Código de Processo Civil, "Uma ação é idêntica à outra quando tem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido", enquanto em seu §1º, define que "Verifica-se a litispendência ou a coisa julgada, quando se reproduz ação anteriormente ajuizada". (...) (negritei)
Observe-se que o parágrafo segundo do art. 337 do NCPC dispõe que: Uma ação é idêntica a outra quando possui as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido e o art. 508 do NCPC dispõe que: Transitada em julgado a decisão de mérito, considerar-se-ão deduzidas e repelidas todas as alegações e as defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à rejeição do pedido.
Infere-se, portanto que, in casu, há identidade de partes, pedido e causa de pedir, razão pela qual, havendo o trânsito em julgado da primeira ação, é de ser mantida a sentença que extinguiu o feito sem julgamento do mérito, em razão do reconhecimento de existência de coisa julgada, nos termos do art. 267, V, do CPC/73 e do art. 485, V, do NCPC, negando-se provimento ao apelo da parte autora.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.
Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Relator
| Documento eletrônico assinado por Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8570107v2 e, se solicitado, do código CRC BD3E6978. | |
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 19/10/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5000994-56.2013.4.04.7107/RS
ORIGEM: RS 50009945620134047107
RELATOR | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
PRESIDENTE | : | Desembargadora Federal Vânia Hack de Almeida |
PROCURADOR | : | Procurador Regional da República Cláudio Dutra Fontela |
APELANTE | : | CHARLES SILVINO PILLAR ROSA |
ADVOGADO | : | GELSON DOS REIS |
: | EDUARDO MAZZOTTI DOS REIS | |
APELADO | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 19/10/2016, na seqüência 287, disponibilizada no DE de 03/10/2016, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 6ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA |
: | Des. Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA | |
: | Des. Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
Gilberto Flores do Nascimento
Diretor de Secretaria
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