Apelação Cível Nº 5030618-34.2018.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: TERESINHA PILATTI POL
ADVOGADO: Eglae Teresinha Pagotto (OAB RS057879)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de ação previdenciária ajuizada em 01/03/2016 contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS, postulando a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, na condição de trabalhadora rural em regime de economia familiar, desde a DER (09/10/2015).
Da decisão que determinou a oitiva de testemunhas por meio de produção de Justificação Administrativa, a autora interpôs agravo de instrumento, o qual não foi conhecido (ev.3-AGRAVO15).
O juízo a quo, em sentença publicada em 28/08/2018, julgou extinto o processo, quanto ao pleito de cômputo do período de 10/11/1961 a 31/12/1982, face à existência de coisa julgada; e improcedente o pedido de concessão de aposentadoria rural por idade. Condenou a autora ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, cuja exigibilidade restou suspensa em virtude de gratuidade da justiça (ev.1, SENT 25).
Apelou a autora requerendo, preliminarmente, a reabertura da instrução processual para produção de prova em juízo, em substituição à Justificação Administrativa. Sustentou que desenvolveu atividade agrícola de subsistência pelo período necessário à concessão do benefício e que a aposentadoria recebida por seu esposo não descaracteriza sua condição de segurada especial.
Com contrarrazões remissivas, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Preliminar de nulidade
Não procedem as alegações da parte autora com relação ao cerceamento de defesa, em vista da não realização da prova testemunhal. Nos termos do art. 370 do Novo CPC, como já previa o CPC/1973 no art. 130, cabe ao julgador, inclusive de ofício, determinar a produção das provas necessárias ao julgamento de mérito. Portanto, se entender encontrar-se munido de suficientes elementos de convicção, é dispensável a produção de outras.
A procedência ou não dos pedidos é matéria de mérito e será analisada em tópico oportuno.
Da coisa julgada
A parte autora ajuizou ação previdenciária, perante o Juizado Especial Cível (n. 2007.71.04.000207-9/RS), pretendendo a concessão do benefício de aposentadoria rural por idade, frente a pedido administrativo que indeferiu o benefício, com DER em 15/12/2006. A sentença proferida julgou improcedente o pedido por comprovado labor rural em período imediatamente anterior ao requerimento administrativo ou à data que implementou o requisito etário (ev.3-CONTES8, fls. 28-34). Pretendia a concessão de aposentadoria rural por idade, mediante o reconhecimento do labor rural no período de 10/11/1961 a 31/12/1982.
Posteriormente, em 01/03/2016, a demandante ajuizou a presente ação, postulando a concessão de aposentadoria rural por idade, a partir da data do novo requerimento administrativo, agora, em 09/10/2015. O juízo a quo julgou extinto o processo quanto ao pleito de cômputo do período de 10/11/1961 a 31/12/1982, em virtude da coisa julgada.
Embora a causa de pedir declinada neste feito, inclua em parte a anterior, não se identifica com ela por completo. O novo pedido de aposentadoria é feito com base nas condições presentes à data do novo requerimento administrativo e o termo inicial do benefício não se identifica com o anterior.
Na ação anteriormente ajuizada e julgada no mérito, a atividade rural no período postulado constitui-se na causa de pedir do pedido de aposentadoria a partir de data determinada. Verifico que a sentença não examinou a comprovação do labor rural no período pleiteado, tendo o pedido sido considerado improcedente em virtude da inaplicabilidade da tese aventada pela autora. Sustentava ela que para a concessão de aposentadoria por idade rural não era necessária comprovação da qualidade de segurado especial no momento do requerimento administrativo. Deste modo, concluiu que na ocasião a parte não implementava os requisitos e denegou o benefício.
De acordo com o art. 504, I e II do CPC, não fazem coisa julgada os motivos e a verdade dos fatos, ainda que importantes para determinar a extensão da parte dispositiva da sentença.
Na presente ação, ademais, a causa de pedir inclui outro período de labor rural, não se podendo tomá-la como idêntica às anteriores, seja em decorrência do pedido, seja em decorrência da causa de pedir. A relação jurídica previdenciária é de natureza continuativa. O não atendimento de requisitos em determinada data não obsta ao reconhecimento posterior, acrescidas novas condições.
Assim, seja por não haver total identidade de pedidos ou de causas de pedir, seja por incidência do art. 504, I e II do CPC, não há que se falar em coisa julgada.
Da aposentadoria por idade rural
A apreciação de pedido de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei n.º 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher), e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida nas aposentadorias em geral, sendo, porém, dispensável o recolhimento de contribuições.
O artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei n.º 8.213/91 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completa a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios. Assim, se ao completar a idade no ano de 2006 o segurado precisava de 150 meses de tempo/carência e, nessa data, ainda lhe faltavam 12 meses, deve-se posicioná-lo na tabela a partir do ano em que completaria os 150 meses, ou seja, 2007. Neste ano, a carência será de 156 meses (6 meses além do período inicial), de forma que o segurado implementa os requisitos em 2008. (TRF4, APELREEX 5008945-59.2012.404.7100, Quinta Turma, Relatora p/ Acórdão Dês. Cláudia Cristina Cristofani, julgado em 08/08/2012)
A disposição contida no art. 143 da Lei n.º 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima (TRF4, AC 0006711-23.2015.404.9999, 5º Turma, Relator Des. Rogério Favreto, julgado em 30/06/2015).
Nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994, data da publicação da Medida Provisória n.º 598 (posteriormente convertida na Lei n.º 9.063/95), que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91, e sim a redação original do art. 143, II da mesma lei, em respeito ao direito adquirido (STF, RE 168.191, Segunda Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio, julgado em 01/04/1997).
Em qualquer caso, desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).
Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I, sem limite de data.
Da comprovação do tempo de atividade rural
Com relação à prova do exercício da atividade rural, na condição de segurado especial, como regra geral, exige-se, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (STJ - REsp 1.348.633/SP, Primeira Seção, Rel.Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 28/08/2013).
O Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive o informal (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
Além disso, o início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
Aliás, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).
No entanto, segundo precedente do Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo, embora possível para fins de comprovação da atividade rural, a extensão de prova material em nome de um dos membros do núcleo familiar a outro, a extensibilidade da prova fica prejudicada no caso de o cônjuge em nome do qual o documento foi emitido passar a exercer labor incompatível com o trabalho rural, como no meio urbano (STJ, RESP 1.304.479/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
Por outro lado, comprovado o desempenho de atividade rural por meio de documentos em nome do segurado ou de ente familiar que permaneça na lida rural, corroborado por prova testemunhal, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. Assim, o fato por si só do cônjuge ter exercido labor urbano e hoje perceber aposentadoria de origem urbana ou permanecer trabalhando em atividade que não a rural, não afasta a condição de segurado especial, da parte interessada, desde que esta disponha de início de prova material independente do cônjuge.
Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.
Ressalte-se que não constituem início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando não tiverem a homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), pois equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo (STJ- EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Quinta Turma, Rel.Ministro Marco Aurélio Bellize, julgado em 06/11/2012; STJ, AgRg no REsp 1.291.466/MG, Quinta Turma, Rel. Ministro Newton Trisotto, julgado em 18/11/2014; STJ, AR 3.202/CE, Terceira Seção, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 23/04/2008).
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR também não tem o condão de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não).
A circunstância de a propriedade ser superior a quatro módulos rurais ou de haver a utilização de maquinário agrícola, não retiram, isoladamente, a condição de segurado especial, nem descaracterizam o regime de economia familiar. Não há lei, inclusive, que exija que o segurado desenvolva a atividade manualmente (STJ, REsp 1.403.506/MG, Segunda Turma, Rel. Ministra Eliana Calmon, julgado em 03/12/2013, e TRF4-APELREEX 0005826-82.2010.404.9999/PR, 6º Turma, Rel. Des. Celso Kipper, julgado em 06/04/2011).
É de se ressaltar ainda que o exercício de pequenos períodos de labor urbano, não retira do interessado a condição de trabalhador rural. O exercício da atividade rural pode ser descontínuo (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 297.322/PB, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 13/08/2013).
Com relação à idade mínima para exercício de atividade laborativa, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que é possível o cômputo de tempo de atividade rural a partir dos doze anos, em regime de economia familiar, visto que a lei ao vedar o trabalho infantil do menor de 14, visou estabelecer a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo (STJ, REsp 573.556/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 16/02/2006; STJ, AR 3629/RS, Terceira Seção, Rel.Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 23/06/2008).
Quanto à classificação da atividade como urbana ou rural é questão de apreciação da prova material produzida pelo interessado, não decorrendo de prévia definição ou categorização legal. Conforme a prova que foi produzida, pode-se reconhecer trabalho rural na cidade, bem como trabalho urbano no meio rural. (Trf-4 - apelreex 2005.71.00.044110-9, 5º Turma, Rel. Juiz Artur César de Souza, julgado em 10/02/2009).
Do caso concreto
A parte autora preencheu o requisito etário (55 anos) em 10/11/2004, pois nascida em 10/11/1949 (ev.3-ANEXOSPET4, fl. 13). O requerimento administrativo foi apresentado em 10/09/2015 (ev.3-CONTES8, fl. 14). Dessa forma, deve comprovar o exercício de atividade rural no período de 138 meses ainda que de forma descontínua, devendo estar em atividade no período imediatamente anterior ao implemento do requisito etário, ou no período de 180 meses (contínuos ou intercalados) imediatamente anterior ao requerimento administrativo, o que lhe for mais favorável.
No caso concreto a requerente alega ter laborado em regime de economia familiar.
Para fazer prova do exercício de atividade rural, foram acostados os seguintes documentos:
- documento fornecido pela Secretaria da Fazenda de Passo Fundo/RS, em nome do pai da autora certificando sua inscrição como produtor rural, nos anos de 1956, 1971 e 1976 (ev.3-ANEXOSPET44, fl. 6);
- matrícula de imóvel rural com área de 121.000 m², recebida em doação em favor do pai da autora, datada de 1992 (ev.3-ANEXOSPET4, fl. 15);
- ficha de cadastro junto a Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Marau, em nome do pai da autora, com registros nos anos de 1973 a 1986 (ev.3-ANEXOSPET4, fls. 16-17);
- notas de produtor rural em nome do pai da autora, datadas de 1973 a 1982 (ev. 3-ANEXOSPET4, fls. 32-51);
- matrícula de imóvel rural em nome do pai da autora, com área de 363.000 m², datada de 1976 (ev.3-ANEXOSPET4, fl. 19);
- matrícula de propriedade rural em usufruto, com área de 42.336,50 m², em nome do marido da autora, datada de 1996 (ev. 3-ANEXOSPET4, fl. 18);
- notas de produtor rural em nome do marido da autora, datadas de 2009 a 2015 (ev. 3-ANEXOSPET4, fls. 20-31);
Os documentos juntados aos autos constituem início razoável de prova material.
Quanto ao fato da prova ser extemporânea, em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, o qual seguiu o rito dos recursos repetitivos, firmou-se entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
Em justificação administrativa, realizada em 03/11/2017, foram ouvidas as testemunhas Cláudia Sampaio e Isac Vitório Santin (ev.3-PET21).
A testemunha Cláudia Sampaio declarou que conhece a autora há aproximadamente 3 anos, que coordena um centro de idosos que a autora frequenta. Declarou que a autora mora na cidade de Marau/RS e que realiza atividade rural no interior, tendo levado algumas vezes alimentos para o centro de idosos.
A testemunha Isac Vitório Santin, por seu turno, declarou que conhece a autora há 15 anos, quando a autora morava em Taquari, no interior de Marau/RS. Asseverou que, embora a autora resida na cidade, possui terras próprias em Taquari, com aproximadamente 3 ha, onde exercia atividade rural, produzia soja e produtos para ao consumo, sem contratação de empregados. Declarou ainda que moram na propriedade do interior a filha da autora e um neto, que todos exercem atividade rural. Asseverou que vê a autora trabalhando na propriedade e eventualmente a ajuda na colheita, sendo ela quem realiza o acerto do pagamento.
Em relação ao período de 10/11/1961 a 31/12/1982 (dos 12 anos da autora até seu casamento), restou comprovado o labor rural da demandante juntamente com seus pais, em terras próprias.Contudo, o período não foi reconhecido na sentença ao fundamento de existência de coisa julgada.
Pela análise das notas fiscais juntadas aos autos, verifica-se que os períodos de produção e as quantidades de grãos comercializados são compatíveis com o tamanho da terra utilizada e com o número de pessoas que nela trabalha na lida campesina, sendo reconhecido, assim, a realização do cultivo em regime de economia familiar.
Também não há nos autos, qualquer referência de uso de empregados ou maquinário para cultivo das atividades rurais desempenhadas pela autora e pela família.
Apesar de as testemunhas, durante a Justificação Administrativa nada terem referido quanto ao labor rural da autora no período, verifica-se que em pesquisa realizada pelo INSS em 06/11/2015, os depoimentos colhidos asseveraram que a autora residia e trabalhava na agricultura na localidade de Taquari, antes de mudar-se para a cidade, o que ocorreu no ano de 1993 (ev.3-ANEXOSPET4, fl. 52).
Sendo assim, impõe-se a averbação da atividade rural da autora no período de 10/11/1961 a 31/12/1982, modificando-se a sentença, no ponto.
Quanto ao período de 2009 a 2015, no qual a autora postula o reconhecimento da atividade rural exercida conjuntamente com seu marido, a sentença deixou de reconhecer o período por não ter sido comprovado que o exercício da atividade rural era exercido em regime de economia familiar.
Embora as testemunhas tenham declarado que a autora, apesar de residir na cidade, exerceu atividade rural em regime de economia familiar em sua propriedade no interior, suas informações são contraditória com os demais documentos juntados nos autos.
Em consulta ao Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, observa-se que o cônjuge da autora, Benjamin Emilio Pol, trabalhou como empregado urbano junto à Companhia Estadual de Geração e Transmissão de Energia, pelo período de 1974 a 1994 (ev. 3- CONTES8, fls. 17). Há documentação, ainda, que demonstra a percepção, a partir de 30/07/1993, de aposentadoria por tempo de contribuição como servidor público em valor que ultrapassa 2,7 salários-mínimos (ev. 3- CONTES8, fl. 18).
O trabalho urbano do marido da autora, com rendimentos significativamente superiores a dois salários mínimos, afasta a possibilidade do reconhecimento do trabalho rural em regime de economia familiar.
A propósito, confira-se recente julgado da Terceira Seção desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. ELEVADOS RENDIMENTOS PERCEBIDOS PELO CÔNJUGE. 1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 2. Indicando o conjunto probatório a descaracterização do regime de economia familiar em que exercido o labor rural da requerente, por remuneração incompatível com a condição de segurado especial, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, não é devida a concessão da aposentadoria por idade rural. (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018188-14.2013.404.9999, 3ª SEÇÃO, Des. Federal CELSO KIPPER, POR MAIORIA, D.E. 17/03/2015, PUBLICAÇÃO EM 18/03/2015)
Verifico ainda que, para o período postulado, a autora não apresentou documentos em nome próprio. De modo que fica prejudicada a extensibilidade da prova em nome do marido, em razão da renda advinda da aposentadoria deste. Neste sentido, o labor rural, ainda que eventualmente realizado, é complementar à renda de natureza urbana.
Assim, embora a autora tenha atingido a idade mínima necessária à concessão do benefício pleiteado em 2015, não comprovou o exercício da atividade rural, em regime de economia familiar pelo período de carência exigido à concessão do benefício.
Em que pese se deva reconhecer direito à averbação de tempo de serviço rural reconhecido, independentemente do recolhimento de contribuições, no período que foi comprovado, para fins de futura aposentadoria por idade rural ou híbrida, ou mesmo para integralização de tempo (não para carência) para eventual aposentadoria por tempo de serviço, a autora não faz jus, neste momento, à aposentadoria por idade rural.
Em tais condições, para obter a concessão do benefício pleiteado, a requerente deveria ter comprovado o seu labor rural por 180 meses, o que não ocorreu no caso dos autos.
Por tais razões, entendo que a autora não faz jus ao benefício de aposentadoria por idade rural, mas apenas à averbação do período reconhecido para as finalidades acima descritas e nos limites correspondentes.
Dessa forma, resta parcialmente provido o apelo para determinar a averbação do intervalo de labor rural de 10/11/1961 a 31/12/1982.
Honorários advocatícios
Tendo havido modificação da sucumbência, são aplicáveis as normas do novo CPC.
Considerando que as partes sucumbiram em parcelas equivalentes, fixo os honorários advocatícios em 10% sobre o valor atualizado da causa, distribuídos na proporção de 50% para cada, vedada a compensação, nos termos dos artigos 85, §4º, inciso III c/c o art. 86, ambos do CPC.
Tutela específica - averbação de tempo de serviço
Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados nos artigos 497 e 536 do NCPC, quando dirigidos à Administração Pública, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determino o cumprimento do acórdão no tocante à averbação dos períodos ora reconhecidos, para fins de futura obtenção de benefício previdenciário, especialmente diante da necessidade de efetivação imediata dos direitos sociais fundamentais.
Requisite a Secretaria da 6ª Turma, à CEAB-DJ-INSS-SR3, o cumprimento da decisão e a comprovação nos presentes autos, no prazo de 30 (trinta) dias.
Conclusão
Parcialmente provido o apelo da autora para, afastando a coisa julgada, reconhecer o período de labor rural de 10/11/1961 a 31/12/1982 e determinar sua averbação.
Alterados os honorários advocatícios conforme fundamentação supra. Nos demais pontos resta mantida a sentença.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento à apelação da autora e determinar a averbação do tempo de serviço.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002415961v46 e do código CRC 5ef275b9.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5030618-34.2018.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: TERESINHA PILATTI POL
ADVOGADO: Eglae Teresinha Pagotto (OAB RS057879)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. cOISA JULGADA. INOCORRÊNCIA. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. comprovação em parte do período postulado. RENDIMENTOS ELEVADOS PERCEBIDOS PELO CÔNJUGE. DESCARACTERIZAÇÃO DO REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. REQUISITOS NÃO PREENCHIDOS. AVERBAÇÃO DOS PERÍODOS RURAIS RECONHECIDOS.
1. Não afronta a coisa julgada o pedido de concessão de aposentadoria, quando há pretensão de cômputo de período não analisado em demanda precedente. No sistema processual brasileiro, especialmente nas ações individuais típicas, não fazem coisa julgada a verdade dos fatos e os motivos, ainda que importantes para determinar a parte dispositiva da sentença.
2. Resta descaracterizado o regime de economia familiar quando demonstrado que o labor rural não é essencial ao sustento da família, em razão dos elevados rendimentos percebidos pelo cônjuge, em vínculo urbano, nos termos do art. 11, VII, § 9º, da Lei nº 8.213/1991.
3. Não preenchidos os requisitos cumulativos para a concessão da aposentadoria por idade rural, não tem a autora direito ao benefício.
4. Nos limites em que comprovado o labor rural em regime de economia familiar, mediante a produção de início de prova material, corroborada por prova testemunhal idônea, o segurado faz jus ao cômputo do respectivo tempo de serviço.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação da autora e determinar a averbação do tempo de serviço, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de julho de 2021.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002415962v7 e do código CRC 5f356ae2.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 23/7/2021, às 17:25:54
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 14/07/2021 A 21/07/2021
Apelação Cível Nº 5030618-34.2018.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES
APELANTE: TERESINHA PILATTI POL
ADVOGADO: Eglae Teresinha Pagotto (OAB RS057879)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 14/07/2021, às 00:00, a 21/07/2021, às 14:00, na sequência 556, disponibilizada no DE de 05/07/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO DA AUTORA E DETERMINAR A AVERBAÇÃO DO TEMPO DE SERVIÇO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 31/07/2021 04:01:20.