Apelação Cível Nº 5021224-66.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: IRIS MARIA DE OLIVEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença, que assim dispôs:
Em face do exposto,
a) com fulcro no artigo 485, inciso V, do Código de Processo Civil, JULGO EXTINTO o processo, sem resolução do mérito, reconhecendo ocorrência de coisa julgada em relação à pretensão pelo reconhecimento da qualidade de segurado especial da autora até 10/03/2009; e
b) com espeque no art. 487, I, do Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE o pedido de reconhecimento da qualidade de segurado especial da requerente no interregno posterior a 10/03/2009 até a DER (23/11/2016), e, por conseguinte, a pretensão de obtenção do benefício de aposentadoria rural por idade.
Condeno a autora ao pagamento das custas processuais e de honorários advocatícios ao procurador do requerido, que arbitro em R$ 800,00 (oitocentos reais). Resta suspensa a exigibilidade dos ônus sucumbenciais, em razão da gratuidade da justiça que já foi deferida à demandante.
A parte autora apelou sustentando não haver coisa julgada na espécie, por se tratar de nova DER e novas provas. No mérito, aduziu que restou comprovada atividade rural pelo período de carência, fazendo jus ao beneficio.
Com contrarrazões, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos legais de admissibilidade.
Da aposentadoria por idade rural
A apreciação de pedido de concessão de aposentadoria por idade, no caso do trabalhador rural qualificado como segurado especial (inciso VII do artigo 11 da Lei n.º 8.213/91), deve ser feita à luz do disposto nos artigos 48, §§1º e 2º, 25, II, 26, III e 39, I, da Lei n.º 8.213/91. Assim, necessária a comprovação do implemento da idade mínima (sessenta anos para o homem e de cinquenta e cinco anos para a mulher), e do exercício de atividade rural, ainda que de forma descontínua, por tempo igual ao número de meses correspondentes à carência exigida nas aposentadorias em geral, sendo, porém, dispensável o recolhimento de contribuições.
O artigo 143 da Lei n.º 8.213/91, tratando genericamente do trabalhador rural que passou a ser enquadrado como segurado obrigatório no Regime Geral de Previdência Social (na forma da alínea "a" do inciso I, ou do inciso IV ou VII do Art. 11), assegurou-lhe o direito de requerer aposentadoria por idade, no valor de um salário mínimo, durante quinze anos, contados a partir da data de sua vigência, desde que comprove o exercício de atividade rural, ainda que descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, em número de meses idêntico à carência exigida. Complementando o artigo 143 na disciplina da transição de regimes, o artigo 142 da Lei n.º 8.213/91 estabeleceu que para o segurado inscrito na Previdência Social Urbana até 24 de julho de 1991, bem como para o trabalhador e o empregador rural cobertos pela Previdência Social Rural, a carência das aposentadorias por idade, por tempo de serviço e especial deve obedecer a uma tabela que prevê prazos menores no período de 1991 a 2010.
Quanto ao ano a ser utilizado para verificação do tempo de atividade rural necessário à obtenção do benefício, nos termos da tabela prevista no artigo 142 da Lei n.º 8.213/91, como regra deverá ser aquele em que o segurado completa a idade mínima, desde que até então já disponha de tempo rural suficiente para o deferimento do benefício, sendo irrelevante, neste caso, que o requerimento tenha sido efetuado em anos posteriores, ou que na data do requerimento o segurado não esteja mais trabalhando, em homenagem ao princípio do direito adquirido (Constituição Federal, art. 5º, XXXVI, e Lei de Benefícios, art. 102, §1º).
Pode acontecer, todavia, que o segurado complete a idade mínima, mas não tenha o tempo de atividade rural exigido pela lei, observada a tabela do artigo 142 da Lei n.º 8.213/91. Neste caso, a verificação do tempo de atividade rural necessário ao deferimento do benefício não poderá mais ser feita com base no ano em que implementada a idade mínima, devendo ser verificado o implemento do requisito "tempo equivalente à carência" progressivamente, nos anos subseqüentes ao implemento do requisito etário, de acordo com a tabela do mencionado artigo 142 da Lei de Benefícios. Assim, se ao completar a idade no ano de 2006 o segurado precisava de 150 meses de tempo/carência e, nessa data, ainda lhe faltavam 12 meses, deve-se posicioná-lo na tabela a partir do ano em que completaria os 150 meses, ou seja, 2007. Neste ano, a carência será de 156 meses (6 meses além do período inicial), de forma que o segurado implementa os requisitos em 2008. (TRF4, APELREEX 5008945-59.2012.404.7100, Quinta Turma, Relatora p/ Acórdão Dês. Cláudia Cristina Cristofani, julgado em 08/08/2012)
A disposição contida no art. 143 da Lei n.º 8.213, no sentido de que o exercício da atividade rural deve ser comprovado no período imediatamente anterior ao requerimento do benefício, deve ser interpretada em favor do segurado. Ou seja, tal regra atende àquelas situações em que ao segurado é mais fácil ou conveniente a comprovação do exercício do labor rural no período imediatamente anterior ao requerimento administrativo, mas sua aplicação deve ser temperada em função do disposto no art. 102, §1º, da Lei de Benefícios e, principalmente, em atenção ao princípio do direito adquirido, como visto acima (TRF4, AC 0006711-23.2015.404.9999, 5º Turma, Relator Des. Rogério Favreto, julgado em 30/06/2015).
Nos casos em que o requerimento administrativo e o implemento da idade mínima tenham ocorrido antes de 31-08-1994, data da publicação da Medida Provisória n.º 598 (posteriormente convertida na Lei n.º 9.063/95), que alterou o art. 143 da Lei de Benefícios, o segurado deve comprovar o exercício de atividade rural, anterior ao requerimento, por um período de 5 anos (60 meses), não se aplicando a tabela do art. 142 da Lei n.º 8.213/91, e sim a redação original do art. 143, II da mesma lei, em respeito ao direito adquirido (STF, RE 168.191, Segunda Turma, Rel. Ministro Marco Aurélio, julgado em 01/04/1997).
Em qualquer caso, desde que implementados os requisitos, o benefício de aposentadoria por idade rural será devido a partir da data do requerimento administrativo ou, inexistente este, e desde que caracterizado o interesse processual para a propositura da ação judicial, da data do respectivo ajuizamento (STF, RE 631.240, com repercussão geral, Plenário, Rel. Ministro Luís Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014).
Quanto aos segurados especiais que implementarem os requisitos para concessão do benefício após 31 de dezembro de 2010, não deve ser aplicado o limite temporal a que se refere o art. 143, com as alterações promovidas pela Lei 11.718/2008, destinadas, exclusivamente, aos trabalhadores rurais não enquadrados ou equiparados a segurados especiais. A estes últimos, aplica-se o disposto no art. 39, I, sem limite de data.
Da comprovação do tempo de atividade rural
Com relação à prova do exercício da atividade rural, na condição de segurado especial, como regra geral, exige-se, pelo menos, início de prova material (documental), complementado por prova testemunhal idônea (STJ - REsp 1.348.633/SP, Primeira Seção, Rel.Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 28/08/2013).
O Superior Tribunal de Justiça, em regime de recurso especial repetitivo, assentou definitivamente que a prova exclusivamente testemunhal é insuficiente para comprovação da atividade laborativa do trabalhador rural, inclusive o informal (STJ, REsp 1.321.493/PR, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
Além disso, o início de prova material não precisa abranger todo o período cujo reconhecimento é postulado. Em decisão proferida no Recurso Especial 1.348.633/SP, que seguiu o rito dos recursos repetitivos, o STJ firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para complementar o início de prova material do tempo de serviço rural.
Aliás, a relação de documentos referida no art. 106 da Lei n.º 8.213/1991 é apenas exemplificativa, sendo admitidos, como início de prova material, quaisquer documentos que indiquem, direta ou indiretamente, o exercício da atividade rural, inclusive em nome de outros membros do grupo familiar (STJ, AgRg no AREsp 31.676/CE, Quinta Turma, Rel.Ministro Gilson Dipp, julgado em 28/08/2012).
No entanto, segundo precedente do Superior Tribunal de Justiça em recurso repetitivo, embora possível para fins de comprovação da atividade rural, a extensão de prova material em nome de um dos membros do núcleo familiar a outro, a extensibilidade da prova fica prejudicada no caso de o cônjuge em nome do qual o documento foi emitido passar a exercer labor incompatível com o trabalho rural, como no meio urbano (STJ, RESP 1.304.479/SP, Primeira Seção, Rel. Ministro Herman Benjamin, julgado em 10/10/2012).
Por outro lado, comprovado o desempenho de atividade rural por meio de documentos em nome do segurado ou de ente familiar que permaneça na lida rural, corroborado por prova testemunhal, o fato de eventualmente um dos membros do respectivo núcleo possuir renda própria não afeta a situação dos demais. Assim, o fato por si só do cônjuge ter exercido labor urbano e hoje perceber aposentadoria de origem urbana ou permanecer trabalhando em atividade que não a rural, não afasta a condição de segurado especial, da parte interessada, desde que esta disponha de início de prova material independente do cônjuge.
Em se tratando de aposentadoria por idade rural do segurado especial, tanto os períodos posteriores ao advento da Lei n.º 8.213/91 como os anteriores podem ser considerados sem o recolhimento de contribuições.
Ressalte-se que não constituem início de prova material as declarações emitidas por sindicato de trabalhadores rurais quando não tiverem a homologação do INSS (art. 106, inc. III, da Lei nº 8.213/91), pois equivalem a meros testemunhos reduzidos a termo (STJ- EDcl nos EDcl no AgRg no REsp 1.010.725/MS, Quinta Turma, Rel.Ministro Marco Aurélio Bellize, julgado em 06/11/2012; STJ, AgRg no REsp 1.291.466/MG, Quinta Turma, Rel. Ministro Newton Trisotto, julgado em 18/11/2014; STJ, AR 3.202/CE, Terceira Seção, Rel. Ministro Hamilton Carvalhido, julgado em 23/04/2008).
Da prova da atividade em regime de economia familiar
O §1º do art. 11 da Lei de Benefícios define como sendo regime de economia familiar aquele em que os membros da família o exercem "em condições de mútua dependência e colaboração", sendo que os atos negociais da entidade respectiva, via de regra, serão formalizados não de forma individual, mas em nome daquele considerado como representante do grupo familiar perante terceiros. Assim, os documentos apresentados em nome de algum dos integrantes da mesma família consubstanciam início de prova material do labor rural, conforme preceitua a Súmula 73 deste Tribunal: "Admitem-se como início de prova material do efetivo exercício de atividade rural, em regime de economia familiar, documentos de terceiros, membros do grupo parental".
A existência de assalariados nos comprovantes de pagamento de ITR também não tem o condão de descaracterizar a atividade agrícola em regime individual ou mesmo de economia familiar, pois não significa, inequivocamente, regime permanente de contratação, devendo cada caso ser analisado individualmente de modo a que se possa extrair do conjunto probatório dos autos, a natureza do auxílio de terceiros (se eventual ou não).
A circunstância de a propriedade ser superior a quatro módulos rurais ou de haver a utilização de maquinário agrícola, não retiram, isoladamente, a condição de segurado especial, nem descaracterizam o regime de economia familiar. Não há lei, inclusive, que exija que o segurado desenvolva a atividade manualmente (STJ, REsp 1.403.506/MG, Segunda Turma, Rel. Ministra Eliana Calmon, julgado em 03/12/2013, e TRF4-APELREEX 0005826-82.2010.404.9999/PR, 6º Turma, Rel. Des. Celso Kipper, julgado em 06/04/2011).
É de se ressaltar ainda que o exercício de pequenos períodos de labor urbano, não retira do interessado a condição de trabalhador rural. O exercício da atividade rural pode ser descontínuo (STJ, EDcl no AgRg no AREsp 297.322/PB, Segunda Turma, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 13/08/2013).
Com relação à idade mínima para exercício de atividade laborativa, o Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento no sentido de que é possível o cômputo de tempo de atividade rural a partir dos doze anos, em regime de economia familiar, visto que a lei ao vedar o trabalho infantil do menor de 14, visou estabelecer a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo (STJ, REsp 573.556/RS, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, julgado em 16/02/2006; STJ, AR 3629/RS, Terceira Seção, Rel.Ministra Maria Thereza de Assis Moura, julgado em 23/06/2008).
Quanto à classificação da atividade como urbana ou rural é questão de apreciação da prova material produzida pelo interessado, não decorrendo de prévia definição ou categorização legal. Conforme a prova que foi produzida, pode-se reconhecer trabalho rural na cidade, bem como trabalho urbano no meio rural. (Trf-4 - apelreex 2005.71.00.044110-9, 5º Turma, Rel. Juiz Artur César de Souza, julgado em 10/02/2009).
Do caso concreto
A parte autora preencheu o requisito etário em 06/03/2009 e o requerimento administrativo foi apresentado em 23/11/16.
A sentença assim resolveu a lide:
...
Passo, assim, ao exame da preliminar de coisa julgada suscitada em contestação.
Relata, a parte ré, a existência de ação anterior, que tramitou neste juízo sob n° 148/1.09.0001259-0, em relação à qual há identidade de partes, pedido e causa de pedir com a presente demanda.
Com efeito, por meio de consulta processual unificada, realizada através do site do TRF da 4ë Região, constatei que o acórdão de julgamento da apelação interposta naqueles autos foi prolatado em 15/06/2011, tendo sido lavrado o trânsito em julgado em 01/08/2012 da sentença de improcedência, fundada na convicção de que a qualidade de segurada especial da autora, em regime de economia familiar, não restou caracterizada.
Note-se que o julgamento originário não fora de improcedência por falta de provas. Foi, sim, julgamento de improcedência diante da conclusão de que restou descaracterizada a condição de segurado especial. Não há, nessas conjunturas, qualquer viabilidade de acolhimento do pedido de reconhecimento da qualidade de segurado especial até 10/03/2009, ante a coisa julgadal em sentido diverso.
Em apoio, cito os seguintes precedentes, oriundos do Egrégio TRF4 e do STJ:
...
Nesse diapasão, no que pertine `a pretensão pelo reconhecimento da qualidade de segurado especial até 10/03/2009, impõe-se a extinção do feito, sem resolução de mérito, nos termos do art. 485, inciso V e § 39, do Código de Processo Civil.
Relativamente às atividades desempenhadas pela autora no interregno de 10/03/2009 até 23/11/2016 (DER - fl.09), ressalto que os Tribunais Pátrios sedimentaram o entendimento acerca dos elementos necessários para a comprovação do exercício da .atividade rural. o qual pode ser assim sintetizado: a) o rol do art. 106 da Lei 8.213 é meramente exemplificativo, podendo o.juiz considerar outros meios de prova, nos termos do princípio do livre convencimento motivado; b) podem ser considerados como início de prova material documentos em nome de terceiros, pertencentes ao mesmo grupo familiar; c) pode ser considerada a prestaçao de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213/91, pois as normas que proíbem o trabalho infantil não podem ser invocadas para prejudicá-los, diante do caráter protetivo; d) a prova material não precisa abranger todo o período, sendo possível presumir a continuidade da atividade agrícola.
No caso, a título de início de prova material, a parte autora juntou cópia da averbação de compra e venda constante na matrícula do imóvel rural adquirido pelo seu esposo (fl.16), escritura pública de compra e venda de imóvel de fls.18/19 e notas fiscais de produtor rural das fls.56/66.
A prova testemunhal produzida em sede de justificação Administrativa (fls. 125/126), por seu turno, retratou o seguinte:
TESTEMUNHA [ ...] NOME - JOSÉ LOPES ESCOBAR [ ...] A testemunha informa que de 1998 a 2016 morava na Linha Sta. Lucia em Ronda AIta›RS. A testemunha informa que a justificante morava na Linha São Sebastião - Ronda Alta-RS. A testemunha informa que a terra onde a justificante morava ficava em torno de 4 a 5 km de distância da casa da testemunha. A testemunha informa que as vezes ia visitar a casa da Sra. Iris, mas a Iris não ia visitar a casa da testemunha. A testemunha não sabe informar quando a Sra. Iris saiu da Linha São Sebastião e foi morar na Linha Dona Clara. A testemunha informa que a Sra. Iris trabalhava na lavoura, informa que morava ela 0 esposo e duas filhas. Informa que a terra era deles. A terra media em torno de 18 a 20 ha. Plantavam soja, mandioca, milho e miudezas. Tinham animais pro gasto, porcos, vaca de leite e galinhas. A testemunha informa que viu a Sra. Iris trabalhando na lavoura, que estava plantando miudezas. Não sabe informar se faziam troca de serviço com os vizinhos. Informa que não tinham maquinários. A testemunha informou que acha que vendia alguma coisa que sobrava, acredita que vendiam para o comércio. Informa que depois que a justificante foi embora para a Linha Dona Clara, não sabe informar mais nada.
[ ...]. TESTEMUNHA [ ...] NOME -JACY PEDROSO [ ...] A testemunha informa que de 1998 a 2016 morava na Linha Sta. Lucia em Ronda Alta-RS. A testemunha informa que a justificante morava na Linha São Sebastião - Ronda Alta-RS. A testemunha informa que a terra onde a justificante morava ficava em torno de 4 a 5 km de distância da casa da testemunha. A testemunha informa que as vezes ia visitar a casa da Sra. Iris, mas a Iris não ia visitar a casa da testemunha. A testemunha não sabe informar quando a Sra. Iris saiu da Linha São Sebastião e foi morar ntestemunha informa que a Sra. Iris trabalhava na lavoura, informa que morava ela o esposo e duas filhas. Informa que a terra era deles. A terra media em torno de 18 a 20 ha. Plantavam soja. mandioca, milho e miudezas. Tinham animais pro gasto, porcos, vaca de leite e galinhas. A testemunha informa que viu a Sra. Iris trabalhando na lavoura, que estava plantando miudezas. Não sabe informar se faziam troca de serviço com os vizinhos. Informa que não tinham maquinários. A testemunha informou que acha que vendia alguma coisa que sobrava, acredita que vendiam para o comércio. Informa que depois que a justificante foi embora para a Linha Dona Clara, não sabe informar mais nada.
[ ...]. 352 TESTEMUNHA [ ...] PEDRO JOAO DOS SANTOS [___] Informa que a Sra. Iris morou na Linha São Sebastião de 1998 a 2006, e que depois ela foi embora para a Linha Dona Clara- Ronda Alta-RS. A testemunha informa que de 1998 a 2016, sempre morou na Linha São Sebastião. A testemunha que a distância de onde a Sra. Iris morava e a casa dele era em torno de 1,5 km. informou que Sra. Iris morava com o esposo, e que o marido trabalhava na Corsan, não sabendo precisar o periodo, moravam também duas filhas. Informa que a terra era deles. A testemunha informa que a Sra. Iris trabalhava na lavoura. A terra era em torno de 17 a 18 HA. Plantavam feijão, milho, mandioca. trigo e um pouco de soja, a terra era dobrada. Acredita que tinham animais pro gasto, porcos. vaca de leite e galinhas, uma vez eles tiveram até gado de corte. Iris nunca teve maquinário (trator, colheitadeira). Não sabe informar se faziam troca de serviço com os vizinhos, algum pouco era trocado, mas bem pouco, eles que faziam o serviço. A testemunha informou que um pouco era vendido, alguma coisa que sobrava. Acredita que vendiam para a Cooperativa. [ ...].
Esse é o substrato probatório colacionado aos autos com a finalidade de embasar o pedido inicial.
A pretensão, entretanto, não merece prosperar. Conforme preceitua o art. 11, inciso VII, §l9, da Lei de Benefício (Lei n. 8.213/06), entende-se como regime de economia familiar a atividade em que o trabalho dos membros da familia é indispensável à própria subsistência e ao desenvolvimento socioeconômico do núcleo familiar,é exercido em condições de mútua dependência e colaboração, sem a utilização de empregados permanentes.
Por ocasião do julgamento da ação anteriormente proposta pela requerente, restou afastada a sua qualidade de segurado especial pelo fato de o seu esposo ter se aposentado, em 1997, como servidor público da Companhia Riograndense de Saneamento, auferindo, inicialmente, proventos superiores a seis salários mínimos. Tal circunstância evidentemente descaracteriza a imprescindibilidade da produçao rural da autora à subsistência do núcleo familiar, que se manteria financeiramente hígido apenas com os proventos do cônjuge varão.
Acerca do tema, a Exma. Desembargadora Marisa Ferreira dos Santos leciona que "O trabalho em mútua dependência e colaboração significa que todos os membros do grupo familiar exercem a atividade para garantir a subsistência e o desenvolvimento socioeconômico do próprio grupo. Para que sejam considerados segurados especiais, deverão ter participação ativa nas atividades rurais do grupo familiar. Nesse sentido, a jurisprudência do STJ: “(...) 2. O regime de economia familiar que dá direito ao segurado especial de se aposentar, independentemente do recolhimento de contribuições, é a atividade desempenhada em família, com o trabalho indispensável de seus membros para a sua subsistência. O segurado especial, para ter direito a essa aposentadoria, deve exercer um único trabalho, de cultivo da terra em que mora, juntamente com o seu cônjuge e/ou com os seus filhos, produzindo para o sustento da família. 3. Enquadramento da autora no conceito dado pelo Estatuto do Trabalhador Rural - Lei 5.889/73 -. regulamentado pelo Decreto 73.626/74, segundo o qual trabalhador rural é toda pessoa física que, em propriedade rural ou prédio rústico, presta serviços de natureza não eventual a empregador rural, sob a dependência deste e mediante salário (...)" (3§ Seção, AR 199900473787, Rel. Min. Maria Theresa de Assis Moura, D/e 02.08.2010) (grifos da autora).
Embora não se desconsidere que a aposentadoria do esposo da requerente, de lá para cá, sofreu evidente defasagem em relação ao valor do salário mínimo, entendo que os proventos atuais deste, no patamar de R$ 3.158,40 (fl.108), ainda conferem ao núcleo familiar solidez financeira suficiente para a própria mantença, o que torna o labor rural desenvolvido pela autora fonte de subsistência secundária, descaracterizando-se, a toda evidência, o regime de economia familiar de que trata da Lei de Benefício.
Nessa senda, não se enquadrando a requerente na qualidade de segurado especial da previdência social, a improcedência dos pedidos é medida a se impoõe.
Os argumentos vertidos em apelação não logram infirmar os fundamentos da sentença.
Com efeito, restou configurada a coisa julgada no caso concreto, tendo em vista que, em ação anterior, a autora teve, em seu desfavor, sentença de improcedência que reconheceu descaracterizado o regime de economia familiar até 10/03/09 em razão da renda urbana do marido (p.16, contest).
Assim, ainda que se trate de nova DER com a inclusão de novo período, com relação ao lapso anterior à DER de 10/03/09, não tendo havido a apresentação de novos elementos que informassem a alteração da situação fática anterior, já existindo provimento judicial a respeito da matéria dos autos, resta impossibilitada nova apreciação da questão, em razão da coisa julgada material.
Com relação ao período posterior, melhor sorte não assiste à autora.
Ocorre que, ainda que tenha restado comprovado que a autora desenvolveu atividade agrícola, não restou demonstrado, pela demandante, que, não obstante a renda urbana do marido, os rendimentos do seu labor rural é que eram preponderantes na manutenção do grupo familiar. O que se vê é que a renda de natureza urbana relevante do marido, superior a dois salários mínimos, descaracteriza o regime de economia familiar, sendo a preponderante na manutenção da família, enquanto que a rural era meramente complementar.
A propósito, confira-se recente julgado da Terceira Seção desta Corte:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE RURAL. REQUISITOS. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. DESCARACTERIZAÇÃO. ELEVADOS RENDIMENTOS PERCEBIDOS PELO CÔNJUGE. 1. O tempo de serviço rural pode ser comprovado mediante a produção de prova material suficiente, ainda que inicial, complementada por prova testemunhal idônea. 2. Indicando o conjunto probatório a descaracterização do regime de economia familiar em que exercido o labor rural da requerente, por remuneração incompatível com a condição de segurado especial, nos termos do art. 11, § 1º, da Lei n. 8.213/91, não é devida a concessão da aposentadoria por idade rural. (TRF4, EMBARGOS INFRINGENTES Nº 0018188-14.2013.404.9999, 3ª SEÇÃO, Des. Federal CELSO KIPPER, POR MAIORIA, D.E. 17/03/2015, PUBLICAÇÃO EM 18/03/2015)
Ademais, quanto ao ponto, sequer há impugnação específica em apelação, tendo a recorrente se limitado a sustentar a comprovação da realização de atividade rural por parte da demandante.
Dessa forma, impõe-se a manutenção da sentença.
Honorários advocatícios
Negado provimento ao recurso, deve ser observada, em cumprimento de sentença, a majoração de 50% da verba honorária fixada na origem, pela incidência do §11 do artigo 85 do CPC, suspensa a exigibilidade em virtude da gratuidade da justiça.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002614338v14 e do código CRC 266cc8ed.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 12/7/2021, às 12:23:48
Conferência de autenticidade emitida em 20/07/2021 04:01:21.
Apelação Cível Nº 5021224-66.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: IRIS MARIA DE OLIVEIRA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA MATERIAL. OCORRÊNCIA PARCIAL. APOSENTADORIA RURAL POR IDADE. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR DESCARACTERIZADO. RENDA URBANA DO ESPOSO. REQUISITOS NÃO IMPLEMENTADOS.
1. Já existindo provimento judicial a respeito da matéria dos autos e não tendo sido apresentados novos elementos que informassem a alteração da situação fática anterior, resta impossibilitada nova apreciação da questão, em razão da coisa julgada material.
2. A percepção, por parte de um dos membros da família, durante o período de carência, de renda mensal substancial, decorrente de atividade urbana, suficiente para a manutenção do núcleo familiar, afasta a essencialidade da atividade rural para a sua subsistência, descaracterizando o regime de economia familiar.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de julho de 2021.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002614339v4 e do código CRC 9bab2eac.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): TAIS SCHILLING FERRAZ
Data e Hora: 12/7/2021, às 12:23:49
Conferência de autenticidade emitida em 20/07/2021 04:01:21.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 07/07/2021
Apelação Cível Nº 5021224-66.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): MARCUS VINICIUS AGUIAR MACEDO
APELANTE: IRIS MARIA DE OLIVEIRA
ADVOGADO: CLAUDIO CASARIN (OAB RS010794)
ADVOGADO: GLAUBER CASARIN (OAB RS063881)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/07/2021, na sequência 644, disponibilizada no DE de 28/06/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
Conferência de autenticidade emitida em 20/07/2021 04:01:21.