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Apelação Cível Nº 5022787-27.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: LORECI MATTJE DA ROCHA DE FREITAS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JARDEL TRINDADE MARTINHO
RELATÓRIO
LORECI MATTJE DA ROCHA DE FREITAS ajuizou ação anulatória, cumulada com indenizatória, em face de JARDEL TRINDADE MARTINHO e INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, postulando (a) a anulação do acordo celebrado e homologado nos autos dos processos n.º 035/1.12.0003912-5 e 035/1.15.0002776-9; (b) a condenação do primeiro réu ao pagamento de indenização por danos morais no valor mínimo de R$ 15.000,00 e, sucessivamente, no caso de não anulação do acordo, a condenação do mesmo réu ao pagamento de indenização por perda de uma chance, no valor mínimo de R$ 900.000,00; (c) a condenação do primeiro réu ao pagamento de lucros cessantes.
Processado o feito, sobreveio sentença julgando improcedentes os pedidos (ev. 3, 16) e condenando a parte autora ao pagamento das custas judiciais e de honorários advocatícios, fixados em R$ 1.000,00, para o advogado de cada réu.
Opostos embargos de declaração, foram parcialmente acolhidos, para suspender a exigibilidade do pagamento de custas e honorários, em razão da gratuidade concedida (ev. 3, 18).
Inconformada, apela a parte autora (ev. 3, 19). Relata, em síntese, que contratou o primeiro réu para mover ação previdenciária em face do segundo réu, tendo sido informada acerca do julgamento de improcedência daquela demanda em face do laudo médico pericial desfavorável. Posteriormente, historia que procurou novo advogado, descobrindo, então, que na realidade fora homologado acordo no primeiro processo. Diante disso, contatou o réu Jardel, o qual lhe informou que havia dinheiro a pagar e lhe alcançou um cheque no valor de R$ 19.149,58. Afirma que o réu Jardel celebrou acordo sem o seu consentimento e que o laudo médico pericial, em verdade, fora-lhe favorável, concluindo por sua incapacidade total e permanente, razão pela qual já poderia estar em gozo de aposentadoria por invalidez. Sustenta que o réu, mais de um ano antes de lhe entregar o dinheiro relativo ao acordo, já havia sacado e tomado para si o montante. Assevera que houve negligência e má-fé do mencionado profissional, que prestou serviço ineficiente. Defende a necessidade de anulação do acordo, por vício de consentimento, e do pagamento da indenização pleiteada.
Com contrarrazões por ambos os réus (ev. 3, 20). O réu Jardel, em preliminar, arguiu o não conhecimento do apelo, por não atacar os fundamentos da sentença.
Vieram os autos a Esta Corte.
As partes foram instadas a se manifestar sobre a (in)viabilidade de cumulação de ações (a) em face do INSS, para anulação de acordo homologado judicialmente, e (b) em face do antigo advogado, para responsabilização civil, e a consequente (in)competência da jurisdição delegada - e desta Corte - para processar e julgar o pedido relativo ao item "b" (ev. 15).
O prazo decorreu sem manifestação das partes.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Recebo o apelo da parte autora, pois cabível, tempestivo e isento de preparo por força da AJG concedida.
Preliminar - Recurso que não ataca os fundamentos da sentença
Rejeito a preliminar, pois, ainda que de forma sucinta e reproduzindo parcialmente a petição inicial, a parte autora ataca os fundamentos da sentença, defendendo a necessidade de anulação do acordo.
Preliminar - Inviabilidade de cumulação de pedidos. Incompetência absoluta da Justiça Federal
A parte autora, como relatado, pretende a anulação de acordo homologado judicialmente em demanda movida em face do INSS e a condenação do seu antigo advogado ao pagamento de indenização.
O acordo em questão foi homologado pelo Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Sapucaia do Sul/RS, de modo que, efetivamente, a ação que pretende anular o acordo, ajuizada em face do INSS, deve tramitar no mesmo juízo, no caso, com competência federal delegada, razão pela qual a esta Corte compete o julgamento do presente apelo.
Diferente é a conclusão quanto aos pedidos indenizatórios dirigidos ao anterior advogado. Trata-se de demanda entre particulares, fundada em responsabilidade civil, que escapa à competência da Justiça Federal prevista no art. 109 da Constituição, inclusive delegada. Não se cuida, igualmente, de litisconsórcio passivo necessário, pois a demanda indenizatória não depende necessariamente da conclusão da ação anulatória, a qual, quando muito, pode configurar questão meramente prejudicial. A parte autora, se assim desejar, deve ajuizar ação indenizatória contra o réu particular perante a Justiça Comum Estadual (sem competência delegada), com eventuais recursos dirigidos ao Tribunal de Justiça.
Assim, verifica-se a inviabilidade de cumulação de ações no caso concreto, nos termos do art. 327 do CPC, de modo que cabe, de ofício, a extinção do processo, sem exame do mérito, quanto aos pedidos dirigidos ao réu JARDEL TRINDADE MARTINHO, por incompetência absoluta do juízo.
Fica mantida a condenação da parte autora ao pagamento de honorários ao mencionado réu, na forma da sentença, e majorados agora em 20%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, suspensa a exigibilidade em razão da AJG concedida.
Mérito - anulação do acordo
Quanto ao ponto, entendo que a sentença deu adequada solução à lide, devendo ser mantida por seus próprios fundamentos, verbis:
"Considerando o desinteresse das partes e a desnecessidade de produção de outras provas, cabível o julgamento do feito no estado em que se encontra, na forma do artigo 355, I, do Código de Processo Civil.
Quanto a preliminar suscitada, tenho que se confunde com o mérito e com este será examinado.
Em apertada síntese, o autor almeja a invalidade do acordo firmado entre os réus, INSS e o procurador que constituiu em ação previdenciária, alegando que não anuiu com o pactuado, tendo sofrido danos materiais e morais.
Inicialmente, é de assentar que o caso vertente deve ser julgado à luz dos princípios e normas do Código Civil e do Código de Processo Civil já que se trata de relação contratual, sendo que, partindo dessa premissa, e consoante regramento da distribuição do ônus da prova, compete àquele que propõe a demanda o encargo de produzir
prova mínima do fato constitutivo do seu alegado direito, à luz do que dispõe o art. 373, I do CPC:
“Art. 373. O ônus da prova incumbe: I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; (...)”
Sobre o tema, vale destacar a lição de Ovídio A. Baptista da Silva:
“Como todo o direito sustenta-se em fatos, aquele que alega possuir um direito deve, antes de mais nada, demonstrar a existência dos fatos em que tal direito se alicerça. Pode-se, portanto, estabelecer, como regra geral dominante de nosso sistema probatório, o princípio segundo o qual à parte que alega a existência de determinado fato para dele derivar a existência de algum direito, incumbe o ônus de demonstrar sua existência. Em resumo, cabe-lhe o ônus de produzir a prova dos fatos por si mesmo alegados como existentes.” (Curso de Processo Civil, vol. 1, Processo de Conhecimento, 4ª edição, Editora Revista dos Tribunais, p. 344)
Ora, o Código Civil, ao tratar da invalidade do negócio jurídico assim dispõe nos artigos 166 e 171, in verbis:
“Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:
I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;
II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;
III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;
IV - não revestir a forma prescrita em lei;
V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade; VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;
VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção. (...)
Art. 171. Além dos casos expressamente declarados na lei, é anulável o negócio jurídico:
I - por incapacidade relativa do agente;
II - por vício resultante de erro, dolo, coação, estado de perigo, lesão ou fraude contra credores.”
Com efeito, para o reconhecimento da invalidade do negócio jurídico, necessária a caracterização de uma das hipóteses previstas nos artigos em destaque.
No caso dos autos, não restou comprovado qualquer dos vícios previstos, até porque, conforme se vê da cópia da procuração (fl. 57v), o autor outorgou ao réu Jardel Trindade, expressamente, poderes específicos “acordar”, “transigir”, “receber e dar quitação”, “retirar e sacar alvarás”, dentre outros.
Assim, plenamente válido o acordo celebrado nos autos da ação nº 035/1.12.0003912-5, que restou devidamente homologado pelo Juízo (fl. 86/v).
Quanto ao saque dos valores pelo réu Jardel, como se viu, detinha poderes para tanto e, apesar do tempo transcorrido até o repasse dos valores ao autor, não houve demonstração efetiva de má-fé, até porque o repasse efetivamente ocorreu (fl. 16), inexistindo provas de prejuízo.
Saliento que a simples expectativa da possibilidade de ganho de um benefício mais favorável, caso não fosse celebrado o acordo, por si só, não materializa a perda de uma chance, cabendo à parte ora demandante a prova efetiva de que o acordo não lhe aproveitou, ônus do qual não se desincumbiu, nos termos do artigo 373, inciso I, do CPC.
Feitas essas considerações, não há falar em indenização por danos materiais ou morais, restando inarredável a improcedência da ação.
DIANTE DO EXPOSTO, JULGO IMPROCEDENTE a ação ajuizada por LORECI MATTJE DA ROCHA DE FREITAS em face de FRUTUOSO E TRINDADE ADVOGADOS ASSOCIADOS, JARDEL TRINDADE MARTINHO e INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS.
Condeno o autor ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que fixo em R$ 1.000,00, para cada procurador dos réus, devidamente atualizados pelo IGP-M, com juros moratórios de 1% ao mês, a partir da data do trânsito em julgado da decisão, forte no que dispõe o artigo 85, § 8º, do NCPC."
De fato, não há razões para a anulação do acordo, pois celebrado por profissional legalmente habilitado e com poderes especiais conferidos pela parte autora. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE ACORDO EM PROCESSO DISTINTO. VÍCIO NÃO CONFIGURADO. A sentença de improcedência merece ser confirmada, pois não ocorreu hipótese de vício de consentimento alegado pela autora passível de nulidade da sentença homologatória em ação anteriormente ajuizada. (TRF4, AC 0001848-24.2015.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relator HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR, D.E. 29/10/2015)
Registre-se que, na forma da anterior preliminar, os prejuízos causados à parte autora pela atuação, negligente ou dolosa, do seu advogado devem ser buscados em ação própria, de competência da Justiça Estadual.
Honorários recursais
Diante do desprovimento do recurso, os honorários fixados em favor do INSS devem ser majorados em 20%, nos termos do art. 85, § 11, do CPC, observada a suspensão da exigibilidade por força da AJG concedida.
Conclusão
Reconhecida, de ofício, a incompetência absoluta da Justiça Federal quanto aos pedidos dirigidos ao réu Jardel.
Quanto ao mais, apelo desprovido.
Honorários advocatícios majorados.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por, de ofício, julgar parcialmente extinto o processo sem exame do mérito, e, no mérito, negar provimento ao apelo.
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Apelação Cível Nº 5022787-27.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: LORECI MATTJE DA ROCHA DE FREITAS
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JARDEL TRINDADE MARTINHO
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. CUMULAÇÃO DE AÇÕES. ANULATÓRIA DE ACORDO JUDICIAL E INDENIZATÓRIA EM FACE DE ADVOGADO PARTICULAR. INVIABILIDADE. INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA DA JUSTIÇA FEDERAL. VÍCIO DE CONSENTIMENTO. INEXISTÊNCIA. PROCURAÇÃO COM PODERES ESPECIAIS.
1. Não é possível cumular, por incompetência absoluta do Juízo Federal, ação anulatória de acordo judicial homologado judicialmente em demanda previdenciária com ação indenizatória, fundada em responsabilidade civil, em face do antigo advogado particular. Processo parcialmente extinto sem exame do mérito.
2. Havendo regular habilitação do advogado e procuração com poderes especiais, afigura-se improcedente o pedido de anulação de acordo homologado judicialmente.
3. Apelo desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, de ofício, julgar parcialmente extinto o processo sem exame do mérito, e, no mérito, negar provimento ao apelo, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 21 de junho de 2022.
Documento eletrônico assinado por ROGER RAUPP RIOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003262533v3 e do código CRC d318ae69.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 13/06/2022 A 21/06/2022
Apelação Cível Nº 5022787-27.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES
APELANTE: LORECI MATTJE DA ROCHA DE FREITAS
ADVOGADO: GIULIA MATOS PEREIRA (OAB RS092268)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JARDEL TRINDADE MARTINHO
ADVOGADO: JARDEL TRINDADE MARTINHO (OAB RS071239)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 13/06/2022, às 00:00, a 21/06/2022, às 16:00, na sequência 60, disponibilizada no DE de 02/06/2022.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DE OFÍCIO, JULGAR PARCIALMENTE EXTINTO O PROCESSO SEM EXAME DO MÉRITO, E, NO MÉRITO, NEGAR PROVIMENTO AO APELO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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