Apelação/Remessa Necessária Nº 5022631-89.2010.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: LEALCINDO DA SILVA
ADVOGADO: ISABEL CRISTINA TRAPP FERREIRA (OAB RS022998)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Na forma do art. 1.030, II, do CPC, vieram os autos da Vice-Presidência desta Corte para eventual juízo de retratação, em razão da afetação da matéria ao Superior Tribunal de Justiça, (Tema STJ 534. 313), no qual o Egrégio STJ supostamente empresta divergente solução à questão da necessidade de submissão a agentes nocivos de forma habitual e permanente para caracterização da especialidade.
É o sucinto relatório.
VOTO
Esta Corte, ao decidir os recurso do INSS e da parte autora, deu-lhes parcial provimento, em julgado assim ementado:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. RUIDO. CONVERSÃO POSTERIOR A 28/05/1998. AVERBAÇÃO. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA. COMPENSAÇÃO DA VERBA HONORÁRIA. POSSIBILIDADE.
1. A exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. 2. Considerando que o § 5.º do art. 57 da Lei n. 8.213/91 não foi revogado pela Lei n. 9.711/98, e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional n. 20, de 15-12-1998), permanecem em vigor os arts. 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1.º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998. Precedentes do STJ. 3. Não cumpridos os requisitos para a concessão do benefício, a parte autora tem direito à averbação do período especial reconhecido, para fins de obtenção de futura aposentadoria. 4. Em se tratando de beneficiário da assistência judiciária gratuita, havendo sucumbência, ainda que parcial, há a condenação, embora não haja pagamento, ou seja, desembolso, enquanto se mantiverem as condições ensejadoras do deferimento daquela benesse, sendo a AJG, pois, compatível com a compensação dos honorários sucumbenciais.
A decisão, contudo, não contrasta com a tese firmada pelo STJ no julgamento do Tema 534.
Este o teor da tese firmada:
Tema STJ 534 - As normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991).
Na análise do voto-condutor da decisão ora vergastada, temos o seguinte exame acerca da especialidade do labor:
Da atividade especial no caso concreto
Ressalto que a sentença deve ser mantida com relação ao período reconhecido, pelos mesmos fundamentos:
De outra parte, o período trabalhado de 22-12-94 a 05-03-96 perante a empresa Calçados Azaléia S/A na função de auxiliar de serviços gerais do setor de montagem submeteu o autor ao agente nocivo ruído hidrocarbonetos, conforme conclusão do laudo pericial judicial anexado ao evento 19. Sendo assim, tenho por efetivamente comprovado que o trabalho exercido pelo autor o expunha a agentes nocivos a sua saúde, conforme as exigências existentes à época da prestação dos serviços, autorizando, embora não expressamente previsto, o enquadramento pelo item 1.2.11 do Quadro Anexo ao Decreto n° 53.831/64; pelo item 1.2.10 do Anexo I ao Decreto n.º 83.080/79.
As alegações do INSS não merecem prosperar.
Em relação à exposição a agentes químicos, especialmente hidrocarbonetos, passo a adotar o entendimento já consolidado neste Tribunal de que os riscos ocupacionais gerados por esses agentes não requerem a análise quantitativa de sua concentração ou intensidade máxima e mínima no ambiente de trabalho, dado que são caracterizados pela avaliação qualitativa.
Neste ponto, ocorre que em relação à atividade profissional sujeita aos efeitos dos hidrocarbonetos, a sua manipulação já é suficiente para o reconhecimento da atividade especial. Não somente a fabricação desses produtos, mas também o manuseio rotineiro e habitual deve ser considerado para fins de enquadramento no item 1.2.10 do Anexo I do Decreto nº 83.080/79.
Nesse sentido:
Classe: APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO
Processo: 2005.72.10.001038-0
UF: SC Data da Decisão: 09/12/2008 Orgão Julgador: QUINTA TURMA Fonte D.E. 31/08/2009 Relator RÔMULO PIZZOLATTI Relator p/ Acórdão
CELSO KIPPER DecisãoVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por maioria, vencido parcialmente o relator, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e determinar o cumprimento imediato do acórdão, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Ementa
'PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. HIDROCARBONETOS.(...)3. Havendo previsão legal para o reconhecimento da especialidade de atividade que envolva o manuseio de hidrocarbonetos, e não apenas sua fabricação, deve ser confirmada, no caso concreto, a sentença no tocante ao reconhecimento da especialidade do período de 01-05-1984 a 31-10-1989, em que trabalhou como mecânico de manutenção dos equipamentos da empresa, nos quais o autor esteve exposto de modo habitual e permanente a hidrocarbonetos, em especial graxas e óleos minerais, fazendo jus o autor a aposentadoria por tempo de serviço proporcional com base em 30 anos, 05 meses e 23 dias, à razão de 70% do salário-de-benefício.'
Ressalte-se, ainda, que é perfeitamente possível o reconhecimento da especialidade da atividade, mesmo que não se saiba a quantidade exata de tempo de exposição ao agente insalubre. Necessário, apenas, restar demonstrado que o segurado estava sujeito, diuturnamente, a condições prejudiciais à sua saúde. A propósito, a jurisprudência desta Corte, ipsis litteris:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. ATIVIDADE RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. INTERMITÊNCIA. (...) 3. Os requisitos da habitualidade e da permanência devem ser entendidos como não-eventualidade e efetividade da função insalutífera, continuidade e não-interrupção da exposição ao agente nocivo. A intermitência refere-se ao exercício da atividade em local insalubre de modo descontínuo, ou seja, somente em determinadas ocasiões. 4. Se o trabalhador desempenha diuturnamente suas funções em locais insalubres, mesmo que apenas em metade de sua jornada de trabalho, tem direito ao cômputo do tempo de serviço especial, porque estava exposto ao agente agressivo de modo constante, efetivo, habitual e permanente.
(AC nº 2000.04.01.073799-6/PR,TRF-4ª Região, 6ª Turma, Rel. Des. Federal Luiz Carlos de Castro Lugon , DJU 9-5-2001).
Quanto à eventual tese de afastamento da especialidade por uso de equipamento de proteção, é pacífico o entendimento deste Tribunal e também do Colendo Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 462.858/RS, Relator Ministro Paulo Medina, Sexta Turma, DJU de 08-05-2003) no sentido de que esses dispositivos não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade, a não ser que comprovados, por meio de perícia técnica especializada, o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho e a sua real efetividade, o que não se verificou no presente caso.
Passo à análise dos períodos de atividade especial postulados não reconhecidos na sentença, assim detalhados:
Alega o autor que laudo pericial considerou os períodos de 15.08.1983 a 16.09.1993, de 05.08.1996 a 05.03.1997, de 22.02.1999 a 22.02.2001, de 21.01.2002 a 31.12.2004, e de 01.01.2005 a 18.10.2007 insalubres.
De fato, o laudo conclui desta maneira. No entanto, o parecer adota equivocadamente, no período entre 06.03.1997 e 18.11.2003, o limite de 85 dB.
Revisando a jurisprudência desta Corte, providência do colegiado para a segurança jurídica da final decisão esperada, passa-se a adotar o entendimento pacífico do egrégio Superior Tribunal de Justiça, no sentido que devem limitar o reconhecimento da atividade especial os estritos parâmetros legais vigentes em cada época (RESP 1333511 - CASTRO MEIRA, e RESP 1381498 - MAURO CAMPBELL), de modo que é tida por especial a atividade exercida com exposição a ruídos superiores a 80 decibéis até a edição do Decreto 2.172/1997. Após essa data, o nível de ruído considerado prejudicial é o superior a 90 decibéis. Com a entrada em vigor do Decreto 4.882, em 18.11.2003, o limite de tolerância ao agente físico ruído foi reduzido para 85 decibéis (AgRg no REsp 1367806, Relator Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, vu 28/05/2013), desde que aferidos esses níveis de pressão sonora por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada no preenchimento de formulário expedido pelo empregador.
A utilização de equipamentos de proteção individual (EPI) é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 02 de junho de 1998, conforme reconhecido pelo próprio INSS por meio da Ordem de Serviço INSS/DSS nº 564/97, em vigor até a mencionada data.
Em período posterior a junho de 1998, a desconfiguração da natureza especial da atividade em decorrência de EPI's é admissível desde que haja laudo técnico afirmando inequivocamente que a sua utilização pelo trabalhador reduziu efetivamente os efeitos nocivos do agente agressivo a níveis toleráveis, ou os neutralizou (STJ, REsp 720.082/MG, Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima, Quinta Turma, DJ 10/04/2006, p. 279; TRF4, EINF 2001.72.06.002406-8, Terceira Seção, Relator Fernando Quadros da Silva, D.E. 08/01/2010).
No caso dos autos, conquanto os documentos façam referência ao uso de EPI, não restou comprovado nos autos o efetivo fornecimento, pela empresa, do equipamento de proteção individual tampouco demonstrado o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho.
Em todo caso, tratando-se de ruído, nem mesmo a comprovação de redução aos limites legais de tolerância pelo uso de EPI é capaz de eliminar a nocividade à saúde, persistindo a condição especial do labor já que a proteção não neutraliza as vibrações transmitidas para o esqueleto craniano e, através dele, para o ouvido interno. (Irineu Antônio Pedrotti, Doenças Profissionais ou do Trabalho, LEUD, 2ª ed., São Paulo, 1998, p. 538).
Diante dessas considerações, dou parcial provimento ao recurso do autor para reconhecer os períodos de 15.08.1983 a 16.09.1993, de 05.08.1996 a 05.03.1997, de 19.11.2003 a 31.12.2004, e de 01.01.2005 a 18.10.2007 como especiais.
(...)"
Conforme se verifica, o acórdão proferido reconheceu que a exposição da parte autora a agentes nocivos, especificamente a hidrocarbonetos e a ruído, ocorria de forma habitual e permanente, uma vez que se dava diuturnamente e de maneira ínsita ao desempenho das atividades laborais da parte autora.
Por conseguinte, o acórdão proferido por esta Sexta Turma encontra-se em perfeita consonância com a resolução dada ao tema pelo STJ em julgamento submetido à sistemática dos repetitivos, devendo, portanto, ser integralmente mantido.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, não havendo juízo de retratação, voto por encaminhar os autos à Vice-Presidência para juízo de admissibilidade do recurso extraordinário interposto.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002300732v2 e do código CRC eb88f691.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5022631-89.2010.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: LEALCINDO DA SILVA
ADVOGADO: ISABEL CRISTINA TRAPP FERREIRA (OAB RS022998)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. TEMA STJ 534. sistemática de recursos repetitivos. NÃO CABIMENTO NA ESPÉCIE. JULGAMENTO EM CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO DO STJ.
1. Hipótese em que o julgamento da Turma acerca da habitualidade e permanência da exposição do segurado à condição periculosa caracterizadora da especialidade está em consonância com a resolução dada ao caso pelo STJ no julgamento Tema 534, submetido à sistemática dos repetitivos.
2. Descabido, portanto o juízo de retratação no caso.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, encaminhar os autos à Vice-Presidência para juízo de admissibilidade do recurso extraordinário interposto, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 24 de fevereiro de 2021.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002300733v3 e do código CRC 699473b9.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 17/02/2021 A 24/02/2021
Apelação/Remessa Necessária Nº 5022631-89.2010.4.04.7100/RS
INCIDENTE: JUÍZO DE RETRATAÇÃO
RELATORA: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): VITOR HUGO GOMES DA CUNHA
APELANTE: LEALCINDO DA SILVA
ADVOGADO: ISABEL CRISTINA TRAPP FERREIRA (OAB RS022998)
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 17/02/2021, às 00:00, a 24/02/2021, às 14:00, na sequência 138, disponibilizada no DE de 04/02/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, ENCAMINHAR OS AUTOS À VICE-PRESIDÊNCIA PARA JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO INTERPOSTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 04/03/2021 04:01:10.