Apelação/Remessa Necessária Nº 5001639-29.2019.4.04.7121/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: ALESSANDRA MENDES DE BRITO GARCIA (IMPETRANTE)
RELATÓRIO
Alessandra Mendes de Brito Garcia impetrou mandado de segurança contra o Gerente Executivo do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), com pedido para que se determine a imediata análise do requerimento de revisão de benefício, protocolizado em 21.8.2018, ainda sem resposta, até o momento da impetração (23.4.2019). Pediu a concessão de liminar.
O pedido de liminar foi deferido, nos seguintes termos:
Ante o exposto, DEFIRO o pedido liminar, para que a autoridade coatora conclua o exame do pedido de revisão do benefício da impetrante, no prazo de 10 (dez) dias a contar da intimação da presente decisão, anexando aos autos cópia da decisão.
Desde já, fixo multa diária no valor de R$ 100,00 (cem reais) para o caso de descumprimento.
Prestadas as informações e oferecido o parecer pelo Ministério Público Federal, foi entregue sentença ratificando a liminar e concedendo a segurança. Com relação à multa por descumprimento de ordem judicial, constou o seguinte:
Tendo em vista os reiterados descumprimentos dos prazos estabelecidos por este Juízo, com deferimento da liminar em 24/04/2019, intimação aos 25/04/2019 e cumprimento, após diversas reiterações, somente em 26/09/2019, mantenho a multa fixada nos autos, as quais, contudo, para evitar desproporção, deverá ser calculada em dias úteis e limitada a 05 (cinco) benefícios de auxílio-doença, com base no último valor integral recebido pela parte autora.
O Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) apelou. Em suma, pede a exclusão da multa imposta.
Processado o recurso, vieram os autos ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, também em razão da remessa oficial.
A Procuradoria Regional da República apresentou parecer pelo desprovimento da apelação.
VOTO
Demora na análise do pedido administrativo
Inexiste, na legislação, o estabelecimento de um prazo peremptório para a prolação de decisão em processos administrativos a contar da protocolização do requerimento. Ao invés, o que a legislação define é o tempo para que seja proferida decisão, após a finalização da instrução, em processo administrativo federal. Atente-se para o que está disposto na Lei nº 9.784/99:
Art. 49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual período expressamente motivada.
Também o art. 41-A, §5º, da Lei n.° 8.213/91 e o art. 174 do Decreto n° 3.048/99 não dispõem acerca do prazo para a conclusão do processo administrativo, pois apenas disciplinam que o primeiro pagamento do benefício será efetuado até quarenta e cinco dias após a data de apresentação, pelo segurado, da documentação necessária à sua concessão.
Verifica-se, pois, que, na legislação, há apenas a definição de prazos para a prolação de decisão, bem como para início de pagamento do benefício, em ambos os casos apenas quando já encerrada a instrução.
Por sua vez, a autarquia previdenciária informa que, em razão do acúmulo de serviço a que são submetidos os servidores do instituto previdenciário, vem adotando um série de ações gerenciais com o intuito de dispensar celeridade ao andamento dos processos administrativos. E, com isso, vem estipulando, administrativamente, o prazo de 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data do protocolo, para análise dos requerimentos administrativos (vide deliberação do Fórum Interinstitucional Previdenciário, ocorrida no final de novembro de 2018).
O prazo de 180 (cento e oitenta) dias parece, pois, estar de acordo com os princípios da eficiência e da razoabilidade, previstos, respectivamente, no art. 37, caput, da Constituição Federal e no art. 2º, caput, da Lei do Processo Administrativo Federal (Lei n.° 9.784/99), bem como corresponder à expectativa do direito à razoável duração do processo, estatuído como direito fundamental pela Emenda Constitucional n.º 45/2004:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
É necessário referir, porém, que houve alteração desse prazo, segundo o que foi deliberado na 6ª Reunião do Fórum Interinstitucional Previdenciário Regional , em 29/11/2019:
DELIBERAÇÃO 32: O Fórum delibera, por maioria, vencidos os representantes da Ordem dos Advogados do Brasil e do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, alterar a deliberação n. 26, aprovada na 5ª Reunião do Fórum Regional, no sentido de reduzir o prazo, anteriormente fixado de 180 dias, para 120 dias para análise de requerimentos administrativos, como forma de reconhecer e incentivar as ações de melhorias de gestão adotadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social, a partir da implantação de novos sistemas de trabalho e o aprimoramento dos recursos tecnológicos (negritei)
O requerimento que se pretende impulsionar foi protocolizado em 23.4.2019.
No caso, a conclusão da análise do requerimento administrativo somente ocorreu após o esgotamento do prazo de 120 dias (evento 63), objeto de deliberação no Fórum Interinstitucional Regional Previdenciário, de 29/11/2019.
Além disso, o princípio do direito à razoável duração do processo e à celeridade em sua tramitação, tanto na esfera administrativa quanto na judicial, foi positivado como direito fundamental pela Emenda Constitucional n. 45/2004:
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
LXXVIII - a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.
Portanto, deve ser mantida a sentença quanto ao mérito.
Multa diária
A fixação de multa diária materializa o poder de coercibilidade do juiz, responsável pela efetividade do processo. A providência objetiva, certamente, desencorajar atitude refratária à prestação jurisdicional e é plenamente aceita no ordenamento jurídico, eventualmente defronte a alguma renitência no cumprimento de obrigação de fazer.
Por esse motivo, embora estivesse, até o presente momento, exigindo a intimação pessoal do agente público para o fim de considerar lícita a exigência da sanção imposta, partindo-se do pressuposto de não caber a imposição prévia da multa antes de materializar-se o descumprimento, revejo a posição para considerar exigível a multa desde o escoamento do prazo para cumprimento da obrigação a contar da intimação do representante judicial da autarquia previdenciária, sendo desnecessária a intimação prévia da gerência executiva.
Nesse sentido, seguem os seguintes julgados do Tribunal Regional Federal da 4ª Região:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSO CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA DIÁRIA. PRAZO. INTIMAÇÃO PESSOAL DA GERÊNCIA EXECUTIVA DO INSS. DESNECESSIDADE. É desnecessária é a intimação da gerência executiva do INSS para implantar benefício previdenciário deferido judicialmente, bastando a intimação do procurador federal que representa a autarquia em juízo. Precedentes do STJ e desta Corte. (TRF4, AG 5021484-36.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 18/09/2020)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PREVIDENCIÁRIO. IMPLANTAÇÃO DE BENEFÍCIO. DETERMINAÇÃO JUDICIAL. CONTAGEM DO PRAZO. INTIMAÇÃO PESSOAL DO GERENTE EXECUTIVO. PRESCINDIBILIDADE. DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. ASTREINTE. APLICAÇÃO. FIXAÇÃO EXCESSIVA. REDUÇÃO DE OFÍCIO. 1. Desnecessária é a intimação da gerência executiva do INSS para implantar benefício previdenciário deferido judicialmente, sendo bastante a do procurador federal que representa a autarquia em juízo. Precedentes do TRF4. 2. A multa diária por desrespeito ao comando judicial deve ser estipulada em observância aos princípios da razoabilidade e a proporcionalidade e atentando-se ao caráter pedagógico que apresenta, cabendo, inclusive, a redução, ex officio, de seu valor. Em se tratando de ordem de implantação de benefício previdenciário, entende-se satisfatória à salvaguarda do bem jurídico tutelado a quantia de R$ 100,00 por dia de atraso no cumprimento da obrigação. (TRF4, AG 5032407-24.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator para Acórdão CELSO KIPPER, juntado aos autos em 30/09/2020)
AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. ASTREINTES. MULTA. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO. INTIMAÇÃO DA GERÊNCIA EXECUTIVA. DESNECESSIDADE. Considerando que a Autarquia está representada nos autos por seu procurador, a quem cabe desincumbir-se das determinações judiciais, a multa é devida a contar de sua intimação, não havendo falar em necessidade de efetiva intimação da Gerência Executiva do INSS. Precedentes. A fixação de astreintes em face do Poder Público é legal e jurisprudencialmente admitida, enquanto mecanismo de efetividade do processo civil, prestígio e autoridade das decisões judiciais, não encontrando justificativa razoável na precariedade estrutural daquele que tem o dever de cumpri-las. Na medida em que consiste em sanção processual imposta como meio de coação para que o obrigado cumpra a decisão judicial, o montante das astreintes deve ser razoável e proporcional à obrigação principal descumprida e levar em conta a natureza e a gravidade da conduta do recalcitrante. (TRF4, AG 5022834-59.2020.4.04.0000, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 22/08/2020)
Demais, registre-se que a multa por descumprimento de ordem judicial não tem caráter indenizatório, mas, sim, coercitivo. Não tem fins arrecadatórios e tampouco aprioristicamente punitivos. Estabelecida, o que se objetiva é compelir o obrigado a cumprir o mandamento, segundo lhe corresponde, a modo de conferir-se efetividade às decisões do Poder Judiciário e prestigiando a satisfação da tutela específica. Bem por isso, é suficiente a intimação do representante judicial do INSS.
No que se refere ao seu valor, atente-se que não há de se reputar excessiva a multa arbitrada no presente caso, porque, além de o montante ser razoável (fixada em R$ 100,00 por dia, posteriormente limitada na sentença ao cômputo de dias úteis e limitada a 5 benefícios de auxílio-doença), a cominação evidentemente resultará inócua em razão do objetivo cumprimento da ordem judicial a que se atrela, como incumbe esperar que aconteça, não se desejando que a autarquia previdenciária a ela oponha renitência impertinente.
Não fosse isso bastante, o arbitramento feito pelo MM. Juiz está de acordo com o que vem sendo fixado nos julgados do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, que, salvo em situações excepcionais, arbitram a astreinte ordinariamente em R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento.
Nesse sentido: AC 5004913-10.2018.4.04.7000, Turma Regional Suplementar do Paraná, rel. Des. Luiz Fernando Wowk Penteado, julgado em 25/06/2019; AG 5007537-46.2019.4.04.0000, 5ª Turma, rel. Juiz Federal Altair Antonio Gregorio, julgado em 21/05/2019; AG 5035877-34.2018.4.04.0000, rel. Des. João Batista Pinto Silveira, 6ª Turma, julgado em 12/12/2018.
Dispositivo
Em face do que foi dito, voto por negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial.
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Apelação/Remessa Necessária Nº 5001639-29.2019.4.04.7121/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: ALESSANDRA MENDES DE BRITO GARCIA (IMPETRANTE)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. REQUERIMENTO DE REVISÃO DE BENEFÍCIO NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO. DEMORA NA APRECIAÇÃO. ILEGALIDADE CONFIGURADA. MULTA. CRITÉRIOS DE FIXAÇÃO. INTIMAÇÃO DA GERÊNCIA EXECUTIVA. DESNECESSIDADE. VALOR DA MULTA.
1. A ausência de justo motivo para o descumprimento de norma procedimental torna reconhecida a omissão da Administração Pública, que contraria direito líquido e certo do interessado, a quem a Constituição Federal assegura a razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII).
2. Considera-se exigível a multa desde o escoamento do prazo para cumprimento da obrigação a contar da intimação do representante judicial da autarquia previdenciária, sendo desnecessária a intimação prévia da gerência executiva. Precedentes.
3. O Tribunal Regional Federal da 4ª Região mantém o entendimento de que, ressalvadas excepcionais situações, o arbitramento de astreintes deve ser limitado ordinariamente a R$ 100,00 (cem reais) por dia de descumprimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS e à remessa oficial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de dezembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por OSNI CARDOSO FILHO, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002258654v6 e do código CRC ef283a1a.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 10/12/2020 A 17/12/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5001639-29.2019.4.04.7121/RS
RELATOR: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): EDUARDO KURTZ LORENZONI
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (INTERESSADO)
APELADO: ALESSANDRA MENDES DE BRITO GARCIA (IMPETRANTE)
ADVOGADO: DOUGLAS DOS REIS PEREIRA (OAB RS116190)
ADVOGADO: VINICIUS SELAU WEBBER COLOMBO (OAB RS113981)
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 10/12/2020, às 00:00, a 17/12/2020, às 14:00, na sequência 408, disponibilizada no DE de 30/11/2020.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS E À REMESSA OFICIAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO
Votante: Juíza Federal GISELE LEMKE
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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