Apelação Cível Nº 5002452-30.2012.4.04.7112/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: JAQUES ROBERTO ENGEL (AUTOR)
ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL (OAB RS075297)
ADVOGADO: ELISANGELA LEITE AGUIAR (OAB RS080438)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
O relatório da sentença proferida pelo Juiz STEFAN ESPIRITO SANTO HARTMANN confere a exata noção da controvérsia:
O autor, JAQUES ROBERTO ENGEL, ajuizou a presente ação ordinária contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS visando, em síntese, a declaração do direito a aposentadoria especial mediante o reconhecimento de períodos alegadamente exercidos em atividade especial e a conversão em especial do tempo comum já computado administrativamente. Requereu ainda a declaração do direito a aposentadoria por tempo de contribuição. Pediu, por fim, a procedência dos pedidos e a concessão de AJG.
Concedido o beneficio da AJG.
Citado, o INSS apresentou contestação. No mérito, afirma que não foram apresentados documentos suficientes a fim de comprovar o alegado tempo rural, bem como a suposta especialidade do labor. Defendeu que a parte autora não teria comprovado a exposição a agentes insalubres em patamar e forma consideradas nocivas que justificassem o reconhecimento da especialidade. Refuta os termos da inicial, aduzindo que a utilização dos EPIs neutraliza os efeitos nocivos do trabalho. Defende a impossibilidade de conversão de tempo especial em comum após 1998. Ao final, requer a improcedência dos pedidos.
Em réplica, a parte autora postulou pela produção de provas e requereu a antecipação dos efeitos da tutela quando da prolação da sentença.
Determinada a expedição de oficio.
Acostados documentos.
Do indeferimento da prova testemunhal e pericial o demandante interpôs agravo de instrumento que, por sua vez, restou convertido em agravo retido.
Deferida a produção de prova pericial em relação a empresa CATTALINI, sobreveio o respectivo laudo técnico.
Requisitado os honorários periciais.
Ofertado prazo para memoriais.
Nada sendo requerido, retornaram os autos conclusos para sentença.
A demanda foi resolvida conforme o seguinte dispositivo:
Diante do exposto,JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos veiculados nesta demanda, resolvendo o mérito da causa, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil, para:
(a) Declarar o direito da parte autora ao reconhecimento da especialidade nos termos DO QUADRO ANALÍTICO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL, com a respectiva possibilidade de conversão em comum;
(b) Condenar o INSS a efetuar a averbação dos interstícios ora reconhecidos, somando-os ao tempo de serviço/contribuição já admitido administrativamente.
Em que pese a sucumbência recíproca, mas em maior parte do autor, condeno-o a pagar as custas judiciais e a reembolsar os honorários periciais antecipados pela Justiça Federal. Condeno-o ainda a pagar, em favor dos advogados públicos, honorários advocatícios, os quais restam fixados em 10% do valor da causa considerando-se os critérios do art. 85, §2º, do CPC. A verba deverá ser atualizada pelo IPCA-E desde a data desta sentença até o efetivo pagamento.
Esclareço, no entanto, que o pagamento de tais valores resta sob condição suspensiva de exigibilidade, e somente poderá ser executado se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade.
Não é caso de remessa necessária, pois a causa não ostenta proveito econômico superior a R$ 880.000,00 (valor correspondente a 1.000 salários mínimos). Ademais, a sentença está fundada precedentes obrigatórios das Cortes Superiores (art. 485, §4º, I a IV).
O autor apelou, argumentando, em âmbito preliminar, cerceamento de defesa por ausência de perícia quanto aos períodos laborais de 13-8-1985 a 24-2-1986 (Socibel Soc. Abastecedora de Bebidas Ltda.), 6-3-1997 a 12-6-1998 (Ottmar B Schultz S/A), 15-6-1998 a 11-11-1999 (Cattalini Transportes Ltda.), 1-11-1999 a 17-9-2002 (Rodo Mar Veículos e Máquinas Ltda.), 13-9-2002 a 1-8-2006 (Transultra Armazenamento e Transporte Especializado Ltda.), 26-7-2006 a 21-9-2009 (Espresso Nepumoceno S/A), 22-9-2009 a 14-8-2010 (Transtassi Ltda.), matéria também devolvida por força de agravo retido. Quanto ao mérito, pediu o reconhecimento da especialidade dos referidos períodos, a conversão dos períodos de atividade comum em especial, bem como a concessão da aposentadoria especial.
Houve apresentação de contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Em julgamento proferido no IAC nº 5033888-90.2018.404.0000, da relatoria do Desembargador-Federal João Batista Pinto Silveira, a Terceira Seção desta Corte, por maioria, decidiu por fixar a seguinte tese jurídica:
Tese fixada nos seguintes termos: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista, ou de cobrador de ônibus, em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/95, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.
No voto condutor, da lavra do Exmo. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, estabeleceram-se os parâmetros para a aferição da penosidade por meio de prova pericial:
2 - Dos critérios de reconhecimento da penosidade
Restringindo-me às atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, que foi a delimitação estabelecida pela Terceira Seção desta Corte na proposição do presente incidente, e tendo como parâmetro a conceituação anteriormente exposta, em que se associa a penosidade à necessidade de realização de esforço fatigante, à necessidade de concentração permanente, e/ou à necessidade de manutenção de postura prejudicial à saúde, submeto à apreciação da Seção os seguintes parâmetros a serem observados pelos peritos judiciais na aferição da existência de eventual penosidade na prestação dessa atividade.
1. Análise do(s) veículo(s) efetivamente conduzido(s) pelo trabalhador. O perito deverá diligenciar junto à(s) empresa(s) empregadora(s) para descobrir a marca, o modelo e o ano de fabricação do(s) veículo(s) conduzido(s) e, de posse dessas informações, poderá analisar se existia ou não penosidade na atividade em razão da necessidade de realização de esforço fatigante, como, por exemplo, na condução do volante, na realização da troca das marchas, ou em outro procedimento objetivamente verificável. No caso dos motoristas de ônibus deverá ser averiguado se a posição do motor ficava junto à direção, ocasionando desconfortos ao trabalhador, como, por exemplo, vibrações, ruído e calor constantes (ainda que inferiores aos patamares exigidos para reconhecimento da insalubridade da atividade, mas elevados o suficiente para qualificar a atividade como penosa em virtude da constância da exposição), ou outro fator objetivamente verificável.
2. Análise dos trajetos. O profissional deverá identificar qual(is) a(s) linha(s) percorrida(s) pelo trabalhador e analisar se existia, nesse transcurso, penosidade em razão de o trajeto incluir localidades consideradas de risco em razão da alta incidência de assaltos ou outras formas de violência, ou ainda em razão de o trajeto incluir áreas de difícil acesso e/ou trânsito em razão de más condições de trafegabilidade, como, por exemplo, a ausência de pavimentação.
3. Análise das jornadas. Deverá o profissional aferir junto à empresa se, dentro da jornada laboral habitualmente desempenhada pelo trabalhador, era-lhe permitido ausentar-se do veículo, quando necessário à satisfação de suas necessidades fisiológicas.
Realizando o perito judicial a análise das atividades efetivamente desempenhadas pelo trabalhador com base nos critérios objetivos acima descritos, e detectando a existência, de forma habitual e permanente, de qualquer das circunstâncias elencadas, ou outra que, embora não aventada no presente julgamento, seja passível de expor trabalhador a desgaste considerado penoso, e desde que seja demonstrável mediante critérios objetivos, considero ser possível o reconhecimento da especialidade das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, independentemente da época em que prestada.
Dentre as razões de decidir do julgado, tem-se que a ausência de regulamento legislativo sobre o conceito de penosidade no âmbito previdenciário, por si só, que não pode vir em desfavor dos segurados, quando o exercício da atividade configure condição especial que prejudique a saúde ou integridade física do trabalhador.
Assim, considerando as razões de decidir, ainda que não tenha sido referida, de forma expressa, no julgamento do IAC, tenho que as atividades de motorista e ajudante de caminhão devem, por analogia, ser compreendidas para análise quanto à penosidade.
Na hipótese de estar extinta a empresa que a parte tenha laborado, deve ser admitida como prova a perícia realizada em empresa similar, com observância das mesmas atividades desempenhadas e condições de trabalho.
Ainda, tratando-se de empresa desativada e inexistindo elementos mínimos quanto às circunstâncias em que desempenhado o labor (como tipo de veículo dirigido, trajetos realizados e jornadas de trabalho), de forma a direcionar o trabalho do perito, deve a perícia por similaridade ser precedida de instrução probatória para tal fim, inclusive com a oportunização de prova testemunhal, se necessária.
Inviável, assim, a utilização dos documentos técnicos já juntados aos autos e produzidos sem considerar os critérios fixados no julgamento do Incidente de Assunção de Competência n. 5033888-90.2018.4.04.000.
Portanto, deve ser anulada a sentença para reabertura da instrução, com a produção de prova pericial para verificação da penosidade nas atividades exercidas nos períodos de 13-8-1985 a 24-2-1986 (Socibel Soc. Abastecedora de Bebidas Ltda.), 6-3-1997 a 12-6-1998 (Ottmar B Schultz S/A), 15-6-1998 a 11-11-1999 (Cattalini Transportes Ltda.), 1-11-1999 a 17-9-2002 (Rodo Mar Veículos e Máquinas Ltda.), 13-9-2002 a 1-8-2006 (Transultra Armazenamento e Transporte Especializado Ltda.), 26-7-2006 a 21-9-2009 (Espresso Nepumoceno S/A), 22-9-2009 a 14-8-2010 (Transtassi Ltda.).
Ante o exposto, voto por dar provimento à preliminar do apelo do segurado e ao agravo retido para anular a sentença para produção de prova pericial.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002932127v8 e do código CRC 99b776c2.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5002452-30.2012.4.04.7112/RS
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ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TEMPO ESPECIAL. MOTORISTA DE CAMINHÃO/ÔNIBUS. PROVA PERICIAL.NECESSIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO.
1. Com o julgamento do IAC nº 5033888-90.2018.404.0000, pela Terceira Seção deste Tribunal, tem-se reconhecida a possibilidade do caráter especial das atividades de motorista de ônibus ou cobrador de ônibus, bem como de motorista ou ajudante de caminhão, desde que comprovada a nocividade com perícia judicial para tal finalidade.
2. Ausente prova pericial para análise da penosidade, impõe-se a anulação da sentença e reabertura da instrução para produção de prova.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à preliminar do apelo do segurado e ao agravo retido para anular a sentença para produção de prova pericial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de dezembro de 2021.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002932128v3 e do código CRC ad7c47aa.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 07/12/2021
Apelação Cível Nº 5002452-30.2012.4.04.7112/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): LUIZ CARLOS WEBER
APELANTE: JAQUES ROBERTO ENGEL (AUTOR)
ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL (OAB RS075297)
ADVOGADO: ELISANGELA LEITE AGUIAR (OAB RS080438)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/12/2021, na sequência 754, disponibilizada no DE de 22/11/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À PRELIMINAR DO APELO DO SEGURADO E AO AGRAVO RETIDO PARA ANULAR A SENTENÇA PARA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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