Apelação/Remessa Necessária Nº 5004966-33.2015.4.04.7117/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
APELANTE: GILBERTO JOSE MARINI (AUTOR)
ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL (OAB RS075297)
ADVOGADO: ELISANGELA LEITE AGUIAR (OAB RS080438)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
O relatório da sentença proferida pelo Juiz JOEL LUIS BORSUK confere a exata noção da controvérsia:
Trata-se de Ação Previdenciária proposta por GILBERTO JOSÉ MARINI, qualificado nos autos, contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL- INSS, também qualificado, por meio da qual busca: (a) reconhecer como exercido em condições especiais os interregnos de 01/07/1986 a 22/01/1987 e de 01/04/1987 a 12/10/1987 (Laurindo Tozatti), de 01/11/1987 a 13/09/1988 (Antônio e Arthur Rigo), de 01/10/1988 a 30/04/1989 (Paulo e Idemar Tozatti), de 01/06/1989 a 01/02/1990 e de 01/02/1990 a 31/01/1992 (Cláudio Vacaro), de 10/06/1992 a 09/07/1992 (Transportadora Garça Ltda.), de 20/07/1992 a 07/06/1994 (Transportadora Trevisan Ltda.), de 01/02/1995 a 21/11/1996 e de 01/09/1997 a 12/05/1999 (Transporte Regla Ltda.), de 01/10/1999 a 18/10/2000 (Irmãos Zin Ltda.) e de 17/10/2000 a 04/11/2014 (Reunidas S/A Transportes Coletivos); e (b) a inclusão de tais períodos em seu processo administrativo com a consequente concessão de aposentadoria especial a contar da DER (04/11/2014), inclusive mediante conversão do tempo comum anterior à Lei 9.032/95. Alternativamente, em não implementando os requisitos necessários para inativação especial, requer a averbação dos períodos reconhecidos no feito para fins de futura aposentadoria. Juntou documentos (evento 1).
Em despacho inicial, deferiu-se em favor do autor o benefício da gratuidade judiciária (evento 4).
Citado, o INSS contestou o feito no prazo legal (evento 7). Sustentou a improcedência do pleito veiculado pelo autor, por ausente comprovação de sujeição a fatores de risco.
Houve réplica (evento 11), ocasião em que o autor requereu a realização de perícia técnica. Também postulou o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela quando da prolação da sentença, em face do caráter alimentar do benefício.
Deferido o pedido de perícia técnica apenas em relação às ex-empregadoras Irmãos Zin Ltda. e Transportes Regla (evento 13).
Acostada ao feito perícia técnica judicial produzida no processo nº 5004352-62.2014.4.04.7117, referente à empresa REUNIDAS S/A TRANSPORTES, em cumprimento à determinação judicial (evento 14).
Intimadas às partes, o INSS nada requereu, renunciando ao prazo (evento 31). Ao passo que o autor impugnou o teor da prova juntada, repisando a necessidade de perícia técnica junto à empresa REUNIDAS, assim como requereu a oitiva de testemunhas em relação ao vínculo empregatício estabelecido com Antônio e Arthur Rigo e Transportadora Trevisan Ltda. (eventos 32 e 34).
A seguir, foi acostado o laudo pericial produzido no presente processo (evento 39).
À vista do feito, o autor apresentou manifestação (evento 45), enquanto o INSS nada requereu (evento 43).
Indeferido o pedido de complementação de perícia formulado pelo autor (evento 47).
Expedida requisição dos honorários do perito (evento 48).
Considerações do autor no evento 54, com a juntada de laudos similares.
Intimado, o INSS deixou de se manifestar (evento 59).
Vieram os autos conclusos para sentença.
A demanda foi resolvida conforme o seguinte dispositivo:
ANTE O EXPOSTO, julgo procedentes em parte os pedidos formulados na inicial para (ex vi art. 269, inciso I, do CPC):
(a) reconhecer a especialidade do trabalho desenvolvido pelo autor nos períodos de 01/07/1986 a 22/01/1987 e de 01/04/1987 a 12/10/1987 (Laurindo Tozatti), de 01/11/1987 a 13/09/1988 (Antônio e Arthur Rigo), de 01/10/1988 a 30/04/1989 (Paulo e Idemar Tozatti), de 01/06/1989 a 01/02/1990 e de 01/02/1990 a 31/01/1992 (Cláudio Vacaro), de 10/06/1992 a 09/07/1992 (Transportadora Garça Ltda.), de 20/07/1992 a 07/06/1994 (Transportadora Trevisan Ltda.) e de 01/02/1995 a 21/11/1996 e de 01/09/1997 a 12/05/1999 (Transporte Regla Ltda.);
(b) indeferir o pedido de conversão de tempo comum em especial, anterior à Lei 9.032/95; e
(c) indeferir o pleito de aposentadoria especial, por não implementado tempo necessário para inativação.
Tendo em vista a sucumbência recíproca, cada parte deverá arcar com as custas judiciais de modo proporcional. Em relação ao INSS, no entanto, há isenção legal (art. 4º, I, da Lei 9.289/1996), pelo que não há condenação. Já em relação à parte autora, condeno-a a pagar 65% das custas judiciais devidas à Seção Judiciária do Rio Grande do Sul, percentual este que reputo proporcional à sua sucumbência.
No que concerne aos honorários advocatícios, não há possibilidade de compensação (art. 85, §14, parte final, do CPC). Assim, condeno a parte autora a pagar, em favor dos advogados públicos, honorários advocatícios, os quais deverão observar o percentual de 10% sobre 65% do valor da causa, base de cálculo que reflete, de modo aproximado, a sua sucumbência (ex vi, art. 85, §2º, do CPC). Ainda, deverá arcar com 65% dos honorários periciais.
No que tange ao INSS, condeno-o também a pagar honorários advocatícios, os quais deverão observar o percentual de 10%, tomando-se como base de cálculo 35% do valor atribuído à causa, porquanto o título judicial veicula apenas obrigação de fazer (averbação de tempo especial), impossibilitando que se mensure o proveito econômico obtido, já que não preenchido tempo necessário para inativação especial (ex vi art. 85, §§ 2º e 3º, I, do CPC). Ressalto que tal verba deverá ser atualizada pelo IPCA-E desde a data desta sentença até o efetivo pagamento. Por fim, deverá o INSS arcar com 35% dos honorários periciais.
Finalmente, observo que o pagamento de tais valores, em relação à parte autora, resta sob condição suspensiva de exigibilidade, e somente poderá ser executado se, nos 5 (cinco) anos subsequentes ao trânsito em julgado desta decisão, o credor demonstrar que deixou de existir a situação de insuficiência de recursos que justificou a concessão de gratuidade.
O autor apelou, argumentando, em âmbito preliminar, cerceamento de defesa por ausência de perícia para a avaliação do agente nocivo penosidade nos períodos de 1-10-1999 a 18-10-2000 (Irmãos Zin Ltda.) e 17-10-2000 a 4-11-2014 (Reunidas S/A Transportes Coletivos). Quanto ao mérito, pediu o reconhecimento da especialidade dos referidos períodos, a conversão dos períodos de atividade comum em especial, bem como a concessão da aposentadoria especial.
Houve apresentação de contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
Em julgamento proferido no IAC nº 5033888-90.2018.404.0000, da relatoria do Desembargador-Federal João Batista Pinto Silveira, a Terceira Seção desta Corte, por maioria, decidiu por fixar a seguinte tese jurídica:
Tese fixada nos seguintes termos: deve ser admitida a possibilidade de reconhecimento do caráter especial das atividades de motorista, ou de cobrador de ônibus, em virtude da penosidade, ainda que a atividade tenha sido prestada após a extinção da previsão legal de enquadramento por categoria profissional pela Lei 9.032/95, desde que tal circunstância seja comprovada por meio de perícia judicial individualizada, possuindo o interessado direito de produzir tal prova.
No voto condutor, da lavra do Exmo. Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, estabeleceram-se os parâmetros para a aferição da penosidade por meio de prova pericial:
2 - Dos critérios de reconhecimento da penosidade
Restringindo-me às atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, que foi a delimitação estabelecida pela Terceira Seção desta Corte na proposição do presente incidente, e tendo como parâmetro a conceituação anteriormente exposta, em que se associa a penosidade à necessidade de realização de esforço fatigante, à necessidade de concentração permanente, e/ou à necessidade de manutenção de postura prejudicial à saúde, submeto à apreciação da Seção os seguintes parâmetros a serem observados pelos peritos judiciais na aferição da existência de eventual penosidade na prestação dessa atividade.
1. Análise do(s) veículo(s) efetivamente conduzido(s) pelo trabalhador. O perito deverá diligenciar junto à(s) empresa(s) empregadora(s) para descobrir a marca, o modelo e o ano de fabricação do(s) veículo(s) conduzido(s) e, de posse dessas informações, poderá analisar se existia ou não penosidade na atividade em razão da necessidade de realização de esforço fatigante, como, por exemplo, na condução do volante, na realização da troca das marchas, ou em outro procedimento objetivamente verificável. No caso dos motoristas de ônibus deverá ser averiguado se a posição do motor ficava junto à direção, ocasionando desconfortos ao trabalhador, como, por exemplo, vibrações, ruído e calor constantes (ainda que inferiores aos patamares exigidos para reconhecimento da insalubridade da atividade, mas elevados o suficiente para qualificar a atividade como penosa em virtude da constância da exposição), ou outro fator objetivamente verificável.
2. Análise dos trajetos. O profissional deverá identificar qual(is) a(s) linha(s) percorrida(s) pelo trabalhador e analisar se existia, nesse transcurso, penosidade em razão de o trajeto incluir localidades consideradas de risco em razão da alta incidência de assaltos ou outras formas de violência, ou ainda em razão de o trajeto incluir áreas de difícil acesso e/ou trânsito em razão de más condições de trafegabilidade, como, por exemplo, a ausência de pavimentação.
3. Análise das jornadas. Deverá o profissional aferir junto à empresa se, dentro da jornada laboral habitualmente desempenhada pelo trabalhador, era-lhe permitido ausentar-se do veículo, quando necessário à satisfação de suas necessidades fisiológicas.
Realizando o perito judicial a análise das atividades efetivamente desempenhadas pelo trabalhador com base nos critérios objetivos acima descritos, e detectando a existência, de forma habitual e permanente, de qualquer das circunstâncias elencadas, ou outra que, embora não aventada no presente julgamento, seja passível de expor trabalhador a desgaste considerado penoso, e desde que seja demonstrável mediante critérios objetivos, considero ser possível o reconhecimento da especialidade das atividades de motorista ou de cobrador de ônibus, independentemente da época em que prestada.
Dentre as razões de decidir do julgado, tem-se que a ausência de regulamento legislativo sobre o conceito de penosidade no âmbito previdenciário, por si só, que não pode vir em desfavor dos segurados, quando o exercício da atividade configure condição especial que prejudique a saúde ou integridade física do trabalhador.
Assim, considerando as razões de decidir, ainda que não tenha sido referida, de forma expressa, no julgamento do IAC, tenho que as atividades de motorista e ajudante de caminhão devem, por analogia, ser compreendidas para análise quanto à penosidade.
Na hipótese de estar extinta a empresa que a parte tenha laborado, deve ser admitida como prova a perícia realizada em empresa similar, com observância das mesmas atividades desempenhadas e condições de trabalho.
Ainda, tratando-se de empresa desativada e inexistindo elementos mínimos quanto às circunstâncias em que desempenhado o labor (como tipo de veículo dirigido, trajetos realizados e jornadas de trabalho), de forma a direcionar o trabalho do perito, deve a perícia por similaridade ser precedida de instrução probatória para tal fim, inclusive com a oportunização de prova testemunhal, se necessária.
Inviável, assim, a utilização dos documentos técnicos já juntados aos autos e produzidos sem considerar os critérios fixados no julgamento do Incidente de Assunção de Competência n. 5033888-90.2018.4.04.000.
Portanto, deve ser anulada a sentença para reabertura da instrução, com a produção de prova pericial para verificação da penosidade nas atividades exercidas nos períodos de 1-10-1999 a 18-10-2000 (Irmãos Zin Ltda.) e 17-10-2000 a 4-11-2014 (Reunidas S/A Transportes Coletivos).
Ante o exposto, voto por dar provimento à preliminar do apelo do segurado para anular a sentença para produção de prova pericial.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002939528v8 e do código CRC 3d94ef53.Informações adicionais da assinatura:
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ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. TEMPO ESPECIAL. MOTORISTA DE CAMINHÃO/ÔNIBUS. PROVA PERICIAL.NECESSIDADE. ANULAÇÃO DA SENTENÇA. REABERTURA DA INSTRUÇÃO.
1. Com o julgamento do IAC nº 5033888-90.2018.404.0000, pela Terceira Seção deste Tribunal, tem-se reconhecida a possibilidade do caráter especial das atividades de motorista de ônibus ou cobrador de ônibus, bem como de motorista ou ajudante de caminhão, desde que comprovada a nocividade com perícia judicial para tal finalidade.
2. Ausente prova pericial para análise da penosidade, impõe-se a anulação da sentença e reabertura da instrução para produção de prova.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à preliminar do apelo do segurado para anular a sentença para produção de prova pericial, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 07 de dezembro de 2021.
Documento eletrônico assinado por JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002939529v3 e do código CRC e627cfa2.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 07/12/2021
Apelação/Remessa Necessária Nº 5004966-33.2015.4.04.7117/RS
RELATOR: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
PRESIDENTE: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PROCURADOR(A): LUIZ CARLOS WEBER
APELANTE: GILBERTO JOSE MARINI (AUTOR)
ADVOGADO: ALEXANDRA LONGONI PFEIL (OAB RS075297)
ADVOGADO: ELISANGELA LEITE AGUIAR (OAB RS080438)
ADVOGADO: ANILDO IVO DA SILVA
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 07/12/2021, na sequência 733, disponibilizada no DE de 22/11/2021.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À PRELIMINAR DO APELO DO SEGURADO PARA ANULAR A SENTENÇA PARA PRODUÇÃO DE PROVA PERICIAL.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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