Apelação/Remessa Necessária Nº 5000673-13.2016.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: JUCEMAR MENDONCA ANDRE (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
RELATÓRIO
Cuida-se de apelação e reexame necessário de sentença, publicada em 14-08-2017, parcialmente modificada por embargos de declaração, na qual o magistrado a quo julgou procedente em parte o pedido para: a) reconhecer a especialidade das atividades exercidas pelo autor nos períodos de 06/08/1990 a 30/04/1991, 01/05/1991 a 06/10/1993 e 21/05/2005 a 20/12/2010; b) condenar o INSS a averbar os tempos de serviço especiais ora reconhecidos bem como a proceder a conversão para tempo comum dos tempos especiais, mediante aplicação do fator 1,4; c) condenar o INSS a conceder Aposentadoria por Tempo de Contribuição à parte autora a partir da data de entrada do requerimento administrativo em 12/03/2015 (evento 1, PROCADM11), com observância do art. 122 da Lei 8.214/91.
Apela a parte autora requerendo a nulidade da r. Sentença, determinando o retorno dos autos para realização de Prova Pericial; ou, assim não sendo entendido, postula sejam reconhecidos os períodos de 21/10/1996 a 20/05/2005 e de 21/12/2010 a 12/12/2014 como atividade especial, determinando a concessão do benefício de Aposentadoria por Tempo de Contribuição ao Apelante.
Apresentadas as contrarrazões, e por força do reexame necessário, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Reexame necessário
Tendo sido o presente feito sentenciado na vigência do atual Diploma Processual Civil, não há falar em remessa oficial, porquanto foi interposto recurso voluntário pelo INSS, o que vai de encontro ao disposto no art. 496, § 1º, do vigente CPC. Com efeito, a redação do mencionado dispositivo é clara e inequívoca, não admitindo o seu texto outra interpretação, que seria ampliativa do condicionamento do trânsito em julgado da sentença ao reexame necessário. Trata-se de instituto excepcional e, sendo assim, há de ser restritivamente interpretado.
A propósito, Humberto Theodoro Júnior percucientemente observa que a novidade do CPC de 2015 é a supressão da superposição de remessa necessária e apelação. Se o recurso cabível já foi voluntariamente manifestado, o duplo grau já estará assegurado, não havendo necessidade de o juiz proceder à formalização da remessa oficial. (in Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum. 57. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 1101).
Nesta exata linha de conta, colaciona-se o seguinte aresto do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO DO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO DE JURISDIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE LÓGICA ENTRE REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO FAZENDÁRIA NA SISTEMÁTICA PROCESSUAL NOVA (ART. 496, § 1º, DO CPC VIGENTE). REMESSA NÃO CONHECIDA. AUXÍLIO-ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO NA ESPÉCIE. REDUÇÃO FUNCIONAL SUFICIENTEMENTE EVIDENCIADA. 1. Reexame necessário. De acordo com o artigo 496 ,§ 1º, do novo Código de Processo Civil, é descabida a coexistência de remessa necessária e recurso voluntariamente interposto pela Fazenda Pública. Com efeito, a nova codificação processual instituiu uma lógica clara de mútua exclusão dos institutos em referência, resumida pela sistemática segundo a qual só caberá remessa obrigatória se não houver apelação no prazo legal; em contrapartida, sobrevindo apelo fazendário, não haverá lugar para a remessa oficial. Precedentes doutrinários. Caso em que a apelação interposta pelo ente público dispensa o reexame oficioso da causa. Remessa necessária não conhecida. [...]. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDA. (TJ/RS, 9ª Câmara Cível, Apelação e Reexame Necessário nº 70076942127, Rel. Des. Carlos Eduardo Richinitti, julg. 30-05-2018)
No mesmo sentido, inclusive, recentemente pronunciou-se esta Turma Julgadora:
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME (DES)NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO EM CASO DE RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS COMPROVADOS E NÃO QUESTIONADOS PELO APELANTE. ANULAÇÃO DA PERÍCIA. DESCABIMENTO. IMPUGNAÇÃO À PESSOA DO PERITO EM MOMENTO INOPORTUNO. PRECLUSÃO.
1. O reexame necessário é instituto de utilidade superada no processo civil diante da estruturação atual da Advocacia Pública, que inclusive percebe honorários advocatícios de sucumbência. Nada obstante, persiste positivado com aplicabilidade muito restrita. Considerada a redação do art. 496, § 1º, do NCPC, somente tem cabimento quando não houver apelação da Fazenda Pública. São incompatíveis e não convivem o apelo da Fazenda Pública e o reexame necessário, mera desconfiança em relação ao trabalho dos procuradores públicos, que compromete o tempo da Justiça, sobretudo da Federal.
2. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter temporário da incapacidade.
3. In casu, pretendendo o INSS impugnar a nomeação do perito designado pelo juiz, deveria tê-lo feito, sob pena de preclusão, na primeira oportunidade em que tomou conhecimento de que a perícia seria realizada por aquele profissional. A impugnação do perito realizada após a perícia - a qual foi desfavorável ao Instituto - não tem o condão de afastar a preclusão.
4. Embora de acordo com o novo CPC não seja cabível agravo de instrumento da decisão interlocutória que rejeitou a impugnação do INSS ao perito, o que, em tese, poderia ensejar a aplicação do disposto no § 1º do art. 1.009, de modo a permitir que a matéria fosse reiterada em apelação, no caso, a referida impugnação ocorreu depois da realização da perícia, e não assim que o Instituto teve conhecimento de que a perícia seria realizada pelo profissional contestado, o que afasta a possibilidade de aplicação daquela regra. (TRF4, TRS/SC, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, unânime, julg. 12-12-2018).
Logo, conforme a regra da singularidade estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil, tendo sido, no caso, interposta apelação pela Autarquia Previdenciária, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária.
Como relatado, cuida-se de apelação em que a parte autora alega a existência de cerceamento de defesa, na medida em que o magistrado a quo deixou de reconhecer a especialidade dos interregnos de 21-10-1996 a 20-05-2005 e 21-12-2010 a 12-12-2014, sem que tenha sido realizada a prova pericial requerida.
Em relação aos períodos em questão, a parte autora, já na petição inicial (evento 1, INIC1, p. 04-07 e 12), requereu a realização de perícia técnica, referindo estar exposta a agentes químicos e a ruído excessivo.
Na petição inicial, impugnou os laudos técnicos da empresa, os quais embasaram o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP emitido pela Sul Fabril S/A (evento 1, PROCADM11, p. 34-36), local onde laborou em ambos os intervalos, ao fundamento de que nos laudos não há indicação dos produtos químicos que manuseava, e não consta a concentração destes agentes químicos, sem olvidar-se o fato de que o manuseio de tais produtos era inerente à atividade profissional desempenhada. Ademais, a dose de ruído ali indicada não espelha o efetivo nível de pressão sonora a que estava o demandante efetivamente exposto, tendo em vista que, a título de exemplo, em uma das atividades, o laudo aponta a presença de ruído de 68 dB(A) em pequena parte da jornada de trabalho (20%), nível este lançado no PPP, quando, em verdade, havia exposição a ruído bastante superior em 80% da jornada.
De fato, quanto ao intervalo de 21-10-1996 a 20-05-2005, em que laborou como laboratorista industrial, veja-se o teor do LTCAT de 2003 da empresa:
Como se verifica, não há indicação dos agentes químicos a que o segurado estava exposto.
Já quanto ao período de 21-12-2010 a 12-12-2014, em que laborou como técnico de produção beneficiamento, segue excerto do LTCAT da empresa do ano de 2003:
Também consta informação de agentes químicos, mas sem indicação destes, sendo certo que referido laudo deixa dúvida acerca do nível de pressão sonora a que o autor estava efetivamente exposto.
Pois bem. Como referido alhures, na petição inicial a parte autora requereu a realização de perícia técnica, pedido este que se repetiu em todas as suas manifestações posteriores, como se verifica pelas petições constantes dos eventos 21 (impugnação à contestação) e 31 (manifestação sobre as provas que pretendia produzir), indicando, inclusive, local similar para a realização da perícia, em face de a empresa empregadora ter encerrado suas atividades (evento 42).
O pedido de realização de perícia restou indeferido, e foi proferida sentença em que não foi reconhecida a especialidade dos períodos em questão.
Assim delineados os contornos da lide, parece-me que a não realização da prova pericial expressamente requerida, nas condições apontadas acima, configura cerceamento de defesa, haja vista que a instrução processual não poderia ter sido encerrada e proferida sentença sem que tivesse sido determinada a realização da perícia técnica, a qual é necessária ao julgamento dos pedidos constantes da petição inicial.
Merece provimento, pois, o apelo do autor para anular a sentença, em decorrência do encerramento da instrução processual sem a produção da prova pericial por ele expressamente requerida, a qual é imprescindível para o deslinde da controvérsia, tendo em vista que o PPP e os laudos da empresa restaram impugnados pelo autor, uma vez que as informações contidas em tais documentos indicam a presença de agentes nocivos, mas não são suficientes, por si sós, para o reconhecimento pretendido.
Portanto, em relação aos períodos de 21-10-1996 a 20-05-2005 e 21-12-2010 a 12-12-2014, em face da impossibilidade de realização de perícia in loco, uma vez que a empresa encerrou suas atividades, deve ser realizada prova pericial em empresa similar, do mesmo ramo de atividade, e que possua funcionários exercendo funções tais quais aquelas prestadas pelo autor, com o intuito de verificar a sujeição deste, no exercício de cada uma das suas funções, a agentes químicos e a ruído, sem deixar de verificar, o perito, a existência ou não de outros agentes nocivos que eventualmente possam existir no ambiente de trabalho do requerente. Observo que deverá ser averiguada a concentração dos agentes químicos eventualmente existentes no ambiente de trabalho, e a medição do nível de pressão sonora.
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, e dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem com o fim de que seja reaberta a fase instrutória para a realização da prova pericial requerida, restando prejudicada sua apelação no restante.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001811027v13 e do código CRC 9524701b.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 2/7/2020, às 16:29:17
Conferência de autenticidade emitida em 08/07/2020 22:33:00.
Apelação/Remessa Necessária Nº 5000673-13.2016.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: JUCEMAR MENDONCA ANDRE (AUTOR)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO e processual civil. tempo especial. perícia técnica. necessidade. cerceamento de defesa configurado. nulidade da sentença.
1. Há cerceamento de defesa em face do encerramento da instrução processual sem a produção da prova expressamente requerida pela parte autora, a qual é imprescindível para o deslinde da controvérsia, tendo em vista que o PPP e os laudos técnicos da empresa restaram impugnados pelo demandante, tendo em vista que estes apontam a existência de agentes nocivos, mas não são suficientes, por si sós, para o reconhecimento pretendido.
2. Hipótese em que, em relação aos períodos de 21-10-1996 a 20-05-2005 e 21-12-2010 a 12-12-2014, em face da impossibilidade de realização de perícia in loco, uma vez que a empresa encerrou suas atividades, deve ser realizada prova pericial em empresa similar, do mesmo ramo de atividade, e que possua funcionários exercendo funções tais quais aquelas prestadas pelo autor, com o intuito de verificar a sujeição deste, no exercício de cada uma das suas funções, a agentes químicos e a ruído, sem deixar de verificar, o perito, a existência ou não de outros agentes nocivos que eventualmente possam existir no ambiente de trabalho do requerente. Observo que deverá ser averiguada a concentração dos agentes químicos eventualmente existentes no ambiente de trabalho, e a medição do nível de pressão sonora.
3. Sentença anulada para que, reaberta a instrução processual, seja produzida a prova acima referida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, e dar provimento à apelação da parte autora para anular a sentença, determinando o retorno dos autos à origem com o fim de que seja reaberta a fase instrutória para a realização da prova pericial requerida, restando prejudicada sua apelação no restante, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 30 de junho de 2020.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Desembargador Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001811028v3 e do código CRC 6d7e3de4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 2/7/2020, às 16:29:17
Conferência de autenticidade emitida em 08/07/2020 22:33:00.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 22/06/2020 A 30/06/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5000673-13.2016.4.04.7205/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PROCURADOR(A): WALDIR ALVES
APELANTE: JUCEMAR MENDONCA ANDRE (AUTOR)
ADVOGADO: ERNESTO ZULMIR MORESTONI (OAB SC011666)
ADVOGADO: ERNESTO ZULMIR MORESTONI
ADVOGADO: CARLOS OSCAR KRUEGER
ADVOGADO: SILVIO JOSE MORESTONI
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 22/06/2020, às 00:00, a 30/06/2020, às 16:00, na sequência 641, disponibilizada no DE de 10/06/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, E DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARA ANULAR A SENTENÇA, DETERMINANDO O RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM COM O FIM DE QUE SEJA REABERTA A FASE INSTRUTÓRIA PARA A REALIZAÇÃO DA PROVA PERICIAL REQUERIDA, RESTANDO PREJUDICADA SUA APELAÇÃO NO RESTANTE.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 08/07/2020 22:33:00.