Apelação/Remessa Necessária Nº 5030521-97.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: CELIO RIBEIRO DE FARIAS
APELADO: OS MESMOS
RELATÓRIO
Cuida-se de apelações e remessa necessária contra sentença, publicada em 27-08-2019, na qual o magistrado a quo julgou procedente o pedido para restabelecer à parte autora o benefício de auxílio-doença, desde o cancelamento na esfera administrativa (24-01-2018), devido até a conclusão do processo de reabilitação do segurado. Condenou o Instituto Previdenciário ao pagamento das parcelas vencidas e dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da sentença.
Em suas razões, a Autarquia Previdenciária alega, preliminarmente, que a patologia ortopédica suportada pela parte autora não foi objeto de análise na esfera administrativa, razão pela qual entende que a eventual concessão pautada nessa causa de pedir configuraria também ausência de interesse de agir.
Eventualmente, requer seja fixada a data de cessação do benefício em 13-02-2019, visto que esta foi a data estipulada pelo perito judicial (60 dias) para a recuperação da parte autora quanto ao problema ortopédico.
Por fim, postula a aplicação da Lei nº 11.960/09, especialmente quanto ao índice de correção monetária.
A parte autora, por sua vez, requer, preliminarmente, anulação da sentença, determinando o retorno dos autos a origem, oportunizando a realização de nova perícia a cargo de médicos especialistas em oftalmologia e em ortopedia.
No mérito, postula a conversão do benefício em aposentadoria por invalidez.
Apresentadas as contrarrazões pela parte autora, e por força da remessa necessária, vieram os autos a esta Corte para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Remessa necessária
Tendo sido o presente feito sentenciado na vigência do atual Diploma Processual Civil, não há falar em remessa oficial, porquanto foi interposto recurso voluntário pelo INSS, o que vai de encontro ao disposto no art. 496, § 1º, do vigente CPC. Com efeito, a redação do mencionado dispositivo é clara e inequívoca, não admitindo o seu texto outra interpretação, que seria ampliativa do condicionamento do trânsito em julgado da sentença ao reexame necessário. Trata-se de instituto excepcional e, sendo assim, há de ser restritivamente interpretado.
A propósito, Humberto Theodoro Júnior percucientemente observa que a novidade do CPC de 2015 é a supressão da superposição de remessa necessária e apelação. Se o recurso cabível já foi voluntariamente manifestado, o duplo grau já estará assegurado, não havendo necessidade de o juiz proceder à formalização da remessa oficial. (in Curso de direito processual civil: teoria geral do direito processual civil, processo de conhecimento e procedimento comum. 57. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2016, p. 1101).
Nesta exata linha de conta, colaciona-se o seguinte aresto do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul:
REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. ACIDENTE DE TRABALHO. DESCABIMENTO DO DUPLO GRAU OBRIGATÓRIO DE JURISDIÇÃO. INCOMPATIBILIDADE LÓGICA ENTRE REMESSA OFICIAL E APELAÇÃO FAZENDÁRIA NA SISTEMÁTICA PROCESSUAL NOVA (ART. 496, § 1º, DO CPC VIGENTE). REMESSA NÃO CONHECIDA. AUXÍLIO-ACIDENTE. POSSIBILIDADE DE CONCESSÃO NA ESPÉCIE. REDUÇÃO FUNCIONAL SUFICIENTEMENTE EVIDENCIADA. 1. Reexame necessário. De acordo com o artigo 496 ,§ 1º, do novo Código de Processo Civil, é descabida a coexistência de remessa necessária e recurso voluntariamente interposto pela Fazenda Pública. Com efeito, a nova codificação processual instituiu uma lógica clara de mútua exclusão dos institutos em referência, resumida pela sistemática segundo a qual só caberá remessa obrigatória se não houver apelação no prazo legal; em contrapartida, sobrevindo apelo fazendário, não haverá lugar para a remessa oficial. Precedentes doutrinários. Caso em que a apelação interposta pelo ente público dispensa o reexame oficioso da causa. Remessa necessária não conhecida. [...]. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELAÇÃO CONHECIDA EM PARTE E, NESTA, DESPROVIDA. (TJ/RS, 9ª Câmara Cível, Apelação e Reexame Necessário nº 70076942127, Rel. Des. Carlos Eduardo Richinitti, julg. 30-05-2018)
No mesmo sentido, inclusive, recentemente pronunciou-se esta Turma Julgadora:
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME (DES)NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO EM CASO DE RECURSO DA FAZENDA PÚBLICA. CONCESSÃO DE AUXÍLIO-DOENÇA. REQUISITOS COMPROVADOS E NÃO QUESTIONADOS PELO APELANTE. ANULAÇÃO DA PERÍCIA. DESCABIMENTO. IMPUGNAÇÃO À PESSOA DO PERITO EM MOMENTO INOPORTUNO. PRECLUSÃO.
1. O reexame necessário é instituto de utilidade superada no processo civil diante da estruturação atual da Advocacia Pública, que inclusive percebe honorários advocatícios de sucumbência. Nada obstante, persiste positivado com aplicabilidade muito restrita. Considerada a redação do art. 496, § 1º, do NCPC, somente tem cabimento quando não houver apelação da Fazenda Pública. São incompatíveis e não convivem o apelo da Fazenda Pública e o reexame necessário, mera desconfiança em relação ao trabalho dos procuradores públicos, que compromete o tempo da Justiça, sobretudo da Federal.
2. Quatro são os requisitos para a concessão do benefício em tela: (a) qualidade de segurado do requerente; (b) cumprimento da carência de 12 contribuições mensais; (c) superveniência de moléstia incapacitante para o desenvolvimento de qualquer atividade que garanta a subsistência; e (d) caráter temporário da incapacidade.
3. In casu, pretendendo o INSS impugnar a nomeação do perito designado pelo juiz, deveria tê-lo feito, sob pena de preclusão, na primeira oportunidade em que tomou conhecimento de que a perícia seria realizada por aquele profissional. A impugnação do perito realizada após a perícia - a qual foi desfavorável ao Instituto - não tem o condão de afastar a preclusão.
4. Embora de acordo com o novo CPC não seja cabível agravo de instrumento da decisão interlocutória que rejeitou a impugnação do INSS ao perito, o que, em tese, poderia ensejar a aplicação do disposto no § 1º do art. 1.009, de modo a permitir que a matéria fosse reiterada em apelação, no caso, a referida impugnação ocorreu depois da realização da perícia, e não assim que o Instituto teve conhecimento de que a perícia seria realizada pelo profissional contestado, o que afasta a possibilidade de aplicação daquela regra. (TRF4, TRS/SC, Rel. Des. Federal Paulo Afonso Brum Vaz, unânime, julg. 12-12-2018).
Logo, conforme a regra da singularidade estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil, tendo sido, no caso, interposta apelação pela Autarquia Previdenciária, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária.
Preliminares
Termo inicial
Inicialmente, verifico a existência de erro material na sentença quando faz referência à data de 24-01-2018 como do cancelamento administrativo, uma vez que este ocorreu em 13-06-2018 (evento 2 - OUT47 - fl. 08).
Dessa forma, corrijo, de ofício, o erro material da sentença, para que conste "Ante o exposto, JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, com fundamento no art. 487, I, do Código de Processo Civil, para: a) condenar o réu a conceder ao autor o benefício de auxílio-doença a partir do requerimento administrativo formulado em 13/06/2018, nos termos da fundamentação, bem como ao pagamento das parcelas vencidas, acrescidas de juros e atualização monetária, até a data do efetivo pagamento, observada a prescrição quinquenal;" (grifei).
Perícia médica
Sem razão a parte autora em relação ao pedido de reabertura da instrução processual para realização de nova perícias judiciais por especialistas em ortopedia e em oftalmologia. Cabe ressaltar que a simples discordância com as conclusões periciais, sem haver específica razão para tanto, não é suficiente para justificar a realização de nova perícia técnica.
Ademais, as respostas do perito judicial foram claras e fundamentadas. Além disso, cumpre ressaltar que a perícia médica foi realizada por especialista em medicina do trabalho, possuindo o expert aptidão para avaliar os quadros ortopédico e oftalmológico da parte autora.
Outrossim, destaco que não há necessidade de complementação do laudo pericial, uma vez que os esclarecimentos trazidos pelo perito do juízo e os demais elementos probatórios presentes nos autos são suficientes para a análise da situação fática.
Da ausência de interesse processual
A Autarquia Previdenciária sustenta que não houve postulação administrativa no tocante à moléstia ortopédica, requerendo a extinção do feito por ausência de interesse de agir.
Inicialmente, ressalta-se que, tendo em vista o princípio da economia processual, não seria razoável extinguir este feito, sem julgamento de mérito, por conta de ausência de interesse de agir - como requer a Autarquia Previdenciária -, a fim de que o autor ajuizasse nova ação, na qual seriam repetidos todos os atos processuais já realizados no curso do presente processo. Ademais, o ponto central no tocante à concessão dos benefícios previdenciários por incapacidade é a existência de impedimento laboral, em seus diversos graus, independentemente da moléstia que o resultou, mesmo que não suscitada na perícia administrativa.
Mister salientar que a constatação de patologia diversa em ocasião posterior ao ajuizamento da demanda não obsta a concessão do benefício, porque "se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão", nos termos do art. 493 do NCPC (correspondência legislativa, CPC/1973, art. 462).
Esse entendimento encontra ressonância nos julgados desta Corte:
Assim, ainda que a patologia causadora da incapacidade não tenha sido alegada na perícia administrativa, cumpre destacar que o pressuposto para a concessão dos benefícios postulados não é a existência de uma moléstia em si, mas sim de um quadro incapacitante. Em outras palavras, é necessário levar em conta a existência de impedimento laboral, independentemente da moléstia que o faz eclodir.(TRF4, AC nº 0001272-60.2017.4.04.9999, 5ª TURMA, Des. Federal Roger Raupp Rios, por unanimidade, D.E. 09/03/2017)
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INTERESSE PROCESSUAL. CONSECTÁRIOS.
1. Apresentada contestação onde se afirma não estar presente o requisito da incapacidade, está caracterizada a pretensão resistida e, consequentemente, o interesse processual.
2. Hipótese em que, atendidos os requisitos de qualidade de segurado e incapacidade total e definitiva para o trabalho, é devida aposentadoria por invalidez.
3. Correção monetária e juros nos termos do artigo 1º-F da Lei 9.494/1991, com a redação da Lei 11.960/2009, quanto ao período após junho de 2009, como estabelecido em sentença, por não haver recurso da parte pretendente do benefício contra essa decisão. Aplicação da Súmula 45 do Superior Tribunal de Justiça. (TRF4, A.C nº 5013768-70.2016.404.9999, 6ª TURMA, Juiz Federal Marcelo De Nardi, por unanimidade, D.E. 02-05-2017)
O fato gerador das prestações previdenciárias por incapacidade não é a existência de uma moléstia em si, mas sim de um quadro de impedimento ao trabalho, que deve ser verificado através de exame médico-pericial. Nesse ínterim, a constatação de impedimento laboral decorrente de patologia diversa da alegada na inicial não obsta a concessão do benefício. (TRF4, APELRE nº 0022260-44.2013.404.9999, 5ª TURMA, Juiz Federal Luiz Antonio Bonat, por unanimidade, D.E. 29/02/2016)
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. INCAPACIDADE LABORAL.
1. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
2. A constatação de patologia diversa em ocasião posterior ao ajuizamento da demanda não obsta a concessão do benefício - porque possível o acolhimento, de ofício, do fato superveniente à propositura da ação, nos termos do art. 462 do CPC.
3. Considerando as conclusões do perito judicial de que a parte autora está total e temporariamente incapacitada para o exercício de atividades laborativas, é devido o benefício de auxílio-doença, desde março/2011. (TRF4, AC 0021843-28.2012.404.9999, 6ª TURMA, Relator Celso Kipper, D.E. 01-08-2013).
Outrossim, cabe ressaltar que, na perícia judicial, foi constatada a existência de incapacidade parcial e definitiva em razão de patologia oftalmológica, sendo este o mesmo quadro clínico que deu origem a concessão do benefício de auxílio-doença, o qual, nestes autos, a parte autora pretende restabelecer.
Por tais razões, não há se falar em ausência de interesse processual.
Mérito
Qualidade de segurado e carência mínima
A qualidade de segurado e a carência mínima exigidas para a concessão do benefício não foram questionadas nos autos. Além disso, no âmbito administrativo, o Instituto Nacional do Seguro Social reconheceu o preenchimento de tais requisitos ao conceder à parte autora o benefício de auxílio-doença, no período de 31-07-2017 a 13-06-2018 (evento 2 - OUT47 - fl. 08). Tenho-os, assim, por incontroversos.
Incapacidade laboral
Resta, pois, averiguar a existência de incapacidade laboral que justifique a concessão dos benefícios postulados.
Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
No caso concreto, o autor possui 62 anos, e desempenha a atividade profissional de técnico agropecuário. Foi realizada perícia médica judicial, por especialista em medicina do trabalho, em 13-12-2018 (evento 2 LAUDOPERIC38).
Respondendo aos quesitos formulados, assim se manifestou o perito:
História Médica
O Autor relata história de toxoplasmose a qual evolui com descolamento de retina do olho direito em janeiro de 2017, quando iniciou tratamento oftalmológico em Canoinhas e cirurgia em 28.07.2017, em Florianópolis, contudo sem melhora, com perda visual (amaurose) do olho direito, não vê vultos, há apenas discreta percepção luminosa, com perda total da visão de profundidade – “convém ser afastado definitivamente de suas atividades laborais a contar de 06.12.2018, sem prognóstico ou tratamento que possa conferir melhora do quadro atual. Apresenta acuidade visual preservada com correção visual em olho esquerdo. Em suas atividades habituais prestava curso de embutidos, carneiro hidráulico (água) e construção de abrigo para construção de hortaliças, deslocando-se de automóvel da empresa. Afirma que não possui condições de dirigir, atividade que não realiza desde o afastamento do serviço. Tem atestado médico de 21.11.2018 CID10 M54.4 e M7.1, requerendo afastamento por 60 dias (“duas hérnias de disco”).
Exame Físico
Peso: 89kgs Altura: 1,69m
Apresenta marcha claudicante, com dor à mobilização lombar, com redução do arco de movimento dorso-lombar e com sinal das pontas e Lasègue positivo à esquerda Apresenta amaurose total de olho direito, com acuidade visual preservada em olho esquerdo, com correção visual.
Diagnóstico Nosológico
M54.4 - Lumbago com ciática
H54.4 - Cegueira em um olho
H40.4 - Glaucoma secundário a inflamação ocular
H40.5 - Glaucoma secundário a outros transtornos do olho
H21.8 - Outros transtornos especificados da íris e do corpo ciliar
H21.1 - Outros transtornos vasculares da íris e do corpo ciliar
Justificativa/Conclusão
A Perícia Médica revela que, consequente a patologia infectológica, sem relação com o trabalho, o Autor desenvolveu descolamento de retina do olho direito, produzindo cegueira no mesmo, além de apresentar hérnia de disco lombar degenerativa, que produz conflito disco-radicular, com pinçamento ciático, relacionada a incapacidade laborativa total e temporária por 60 dias para o tratamento de lumbago com ciática, conforme atestado de seu médico assistente, mas restando ainda incapacidade laborativa parcial e definitiva, com restrição a atividade profissional com direção, devido a cegueira em um olho com redução da visão de profundidade, mas podendo seguir a prestar seus cursos.
(...)
Quesitos do Juízo
a) apresenta o(a) autor(a) doença ou moléstia que o(a) incapacita para o exercício de sua atividade laborativa? Em caso positivo qual o estado mórbido incapacitante?; R: Sim, o Autor apresenta Lumbago com ciática em tratamento, com previsão para recuperação clínica em 60 dias, com base no atestado médico de seu médico assistente, com isso, neste período há incapacidade laborativa total e temporária. Contudo, o Autor apresenta ainda cegueira em um olho, que restringe sua atividade laborativa como motorista, necessária para ir aos assentamentos onde ministra cursos. Com isso não há condições clínicas definitivas para dirigir necessitando outras formas de deslocamento (motorista, por exemplo), mas podendo seguir ministrando seus cursos. Desta forma, com base na tabela SUSEP, após a cessação da incapacidade total, prevista para cessar em 60 dias, restará incapacidade parcial e definitiva em 50%, secundário a glaucoma, toxoplasmose e lesões vasculares da íris, todas sem relação etiológica com o trabalho.
b) quais as características da(s) doença(s) a que está acometido(a) o(a) autor(a)?; R: Crônico degenerativas.
c) qual a data de início da doença do(a) autor(a)?; R: janeiro de 2017
d) qual a data de início da incapacidade laborativa do(a) autor(a)?; R: 26.06.2017
e) que tipo de atividade profissional o(a) autor(a) pode exercer?; R: Pode ministrar os seus cursos, mas com outra forma de deslocamento, após cessar o período atual de incapacidade total.
f) qual o grau de redução da capacidade laborativa do(a) autor(a)?; R: Total no presente, prevista para cessar em 60 dias, quando então restará com incapacidade parcial em 50%, permanentemente.
g) a redução da capacidade do paciente torna mais dificultosa a sua profissão?; R: Sim.
h) atualmente pode o(a) autor(a) trabalhar e executar tarefas atinentes a sua profissão? Em caso negativo, pode ele(a) realizar outra atividade? Em caso positivo, especifique; R: Não, atualmente apresenta incapacidade total, mas temporária.
(...)
Como se vê, o autor é portador de lumbago com ciática (CID M54.4), cegueira em um olho (CID H54.4), glaucoma secundário a inflamação ocular (CID H40.4), glaucoma secundário a outros transtornos do olho (CID H40.5), outros transtornos especificados da íris e do corpo ciliar (CID H21.8) e outros transtornos vasculares da íris e do corpo ciliar (CID H21.1).
Com relação à patologia ortopédica, o perito judicial concluiu que o quadro incapacitante é total e temporário, sugerindo o prazo de 60 (sessenta) dias de afastamento do labor.
Quanto ao quadro oftalmológico, o perito do juízo afirmou que o autor apresenta ainda cegueira em um olho, que restringe sua atividade laborativa como motorista, necessária para ir aos assentamentos onde ministra cursos. Com isso não há condições clínicas definitivas para dirigir necessitando outras formas de deslocamento (motorista, por exemplo), mas podendo seguir ministrando seus cursos. Desta forma, com base na tabela SUSEP, após a cessação da incapacidade total, prevista para cessar em 60 dias, restará incapacidade parcial e definitiva em 50%, secundário a glaucoma, toxoplasmose e lesões vasculares da íris, todas sem relação etiológica com o trabalho.
No ponto, não obstante as conclusões do expert no sentido de que a incapacidade é parcial e definitiva, analisando o conjunto probatório, parece-me improvável que o demandante reúna condições para retornar a exercer sua atividade habitual.
Nessa linha, cabe ressaltar que a parte autora está incapacitada definitivamente para atividades que exijam visão binocular, uma vez que apresenta cegueira em um olho (CID H54.4).
Além disso, conforme referido pelo próprio expert, o labor habitual do demandante exige que este realize deslocamentos de automóvel para os locais, na zona rural, onde ministra cursos, sendo que, atualmente, não há condições clínicas definitivas para dirigir necessitando outras formas de deslocamento (motorista, por exemplo).
Em que pese a sugestão do perito do juízo, não se mostra razoável, a meu ver, exigir que a parte autora tenha à sua disposição motorista particular para continuar a exercer seu labor habitual.
Diante de tal cenário, entendo que as restrições apresentadas por conta do quadro de visão monocular impossibilitam, na prática, a realização da atividade laborativa que o requerente possui experiência.
Considerando, pois, as conclusões extraídas da análise do conjunto probatório no sentido de que o autor está definitivamente incapacitado para o exercício de suas atividades laborativas como técnico agropecuário, e ponderando, também, acerca de suas condições pessoais (conta 62 anos de idade e qualificação profissional restrita), entendo inviável a sua reabilitação, devendo, em consequência, ser-lhe concedido o benefício de aposentadoria por invalidez.
Tendo o conjunto probatório apontado a existência de incapacidade laboral desde a época do cancelamento administrativo (13-06-2018), o benefício de auxílio-doença é devido desde então, convertido em aposentadoria por invalidez a partir da perícia médica judicial (13-12-2018), devendo o INSS pagar ao autor as respectivas parcelas.
Assim sendo, dou provimento ao apelo da parte autora e nego provimento ao apelo do INSS.
Correção monetária e juros moratórios
A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp nº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, em 03-10-2019, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
Quanto aos juros de mora, até 29-06-2009 devem ser fixados à taxa de 1% ao mês, a contar da citação, com base no art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/1987, aplicável, analogicamente, aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte. A partir de 30-06-2009, por força da Lei n. 11.960, de 29-06-2009, que alterou o art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, para fins de apuração dos juros de mora haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice oficial aplicado à caderneta de poupança, conforme decidido pelo Pretório Excelso no RE n. 870.947 (Tema STF 810).
No ponto, nego provimento ao apelo do INSS.
Honorários advocatícios
Considerando que a sentença foi publicada após 18-03-2016, data definida pelo Plenário do STJ para início da vigência do NCPC (Enunciado Administrativo nº 1-STJ), bem como o Enunciado Administrativo n. 7 - STJ (Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016, será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, § 11, do novo CPC), aplica-se ao caso a sistemática de honorários advocatícios ora vigente.
Desse modo, tendo em conta os parâmetros dos §§ 2º, I a IV, e 3º, do artigo 85 do NCPC, bem como a probabilidade de o valor da condenação não ultrapassar o valor de 200 salários mínimos, mantenho os honorários advocatícios em 10% sobre as parcelas vencidas até a data da sentença (Súmulas 111 do STJ e 76 desta Corte), consoante as disposições do art. 85, § 3º, I, do NCPC, ficando ressalvado que, caso o montante da condenação venha a superar o limite mencionado, sobre o valor excedente deverão incidir os percentuais mínimos estipulados nos incisos II a V do § 3º do art. 85, de forma sucessiva, na forma do § 5º do mesmo artigo.
Doutra parte, considerando o disposto no § 11 do art. 85 do NCPC, bem assim recentes julgados do STF e do STJ acerca da matéria (v.g. ARE971774 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. EDSON FACHIN, PrimeiraTurma, DJe 19-10-2016; ARE 964330 AgR, Relator p/ Acórdão: Min. ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, DJe 25-10-2016; AgIntno AREsp 829.107/RJ, Relator p/ Acórdão Ministro MARCO BUZZI, Quarta Turma, DJe 06-02-2017 e AgInt nos EDcl no REsp1357561/MG, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, Terceira Turma, DJe de 19-04-2017), majoro a verba honorária para 12%, devendo ser observada a mesma proporção de majoração sobre eventual valor que exceder o limite de 200 salários-mínimos.
Tutela específica
Na vigência do Código de Processo Civil de 1973, a Terceira Seção desta Corte, buscando dar efetividade ao disposto no art. 461, que dispunha acerca da tutela específica, firmou o entendimento de que o acórdão que concedesse benefício previdenciário e sujeito apenas a recurso especial e/ou extraordinário, em princípio, sem efeito suspensivo, ensejava o cumprimento imediato da determinação de implantar o benefício, independentemente do trânsito em julgado ou de requerimento específico da parte, em virtude da eficácia mandamental dos provimentos fundados no referido artigo (TRF4, 3ª Seção, Questão de Ordem na AC n. 2002.71.00.050349-7/RS, de minha Relatoria, julgado em 09-08-2007).
Nesses termos, entendeu o Órgão Julgador que a parte correspondente à obrigação de fazer ensejava o cumprimento desde logo, enquanto a obrigação de pagar ficaria postergada para a fase executória.
O art. 497 do novo CPC, buscando dar efetividade ao processo, dispôs de forma similar à prevista no Código de 1973, razão pela qual o entendimento firmado pela Terceira Seção deste Tribunal, no julgamento da Questão de Ordem acima referida, mantém-se íntegro e atual.
Portanto, com fulcro no art. 497 do CPC, determino o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício de aposentadoria por invalidez da parte autora (CPF 381.758.009-68), a ser efetivada em 45 dias. Na hipótese de a parte autora já se encontrar em gozo de benefício previdenciário, deve o INSS implantar o benefício deferido judicialmente apenas se o valor de sua renda mensal atual for superior ao daquele.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação do INSS, dar provimento à apelação da parte autora, determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora e, de ofício, corrigir a sentença em relação ao termo inicial do benefício.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001986995v17 e do código CRC f3cccf39.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
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Conferência de autenticidade emitida em 26/09/2020 04:02:12.
Apelação/Remessa Necessária Nº 5030521-97.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: CELIO RIBEIRO DE FARIAS
APELADO: OS MESMOS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL. REEXAME NECESSÁRIO. NÃO CABIMENTO EM CASO DE RECURSO DA FAZENDA. AUSÊNCIA DE INTERESSE PROCESSUAL. PATOLOGIA DIVERSA. NÃO CONFIGURADO. AUXÍLIO-DOENÇA/APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INCAPACIDADE LABORAL. TERMO INICIAL. ERRO MATERIAL. CORREÇÃO DE OFÍCIO. CORREÇÃO MONETÁRIA. TUTELA ESPECÍFICA.
1. Conforme a regra da singularidade recursal estabelecida pela nova Lei Adjetiva Civil (art. 496, § 1º), tendo sido interposta apelação pela Autarquia Previdenciária, a hipótese que se apresenta é de não cabimento da remessa necessária.
2. A constatação de patologia diversa em ocasião posterior ao ajuizamento da demanda não obsta a concessão do benefício, porque "se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão", nos termos do art. 493 do NCPC (correspondência legislativa, CPC/1973, art. 462).
3. Tratando-se de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, o Julgador firma sua convicção, via de regra, por meio da prova pericial.
4. Considerando as conclusões extraídas da análise do conjunto probatório no sentido de que a parte autora está definitivamente incapacitada para o exercício de suas atividades laborativas habituais e ponderando, também, acerca de suas condições pessoais - especialmente tendo em vista conta 62 anos de idade e qualificação profissional restrita -, mostra-se inviável a sua reabilitação, razão pela qual é devido o benefício de aposentadoria por invalidez.
5. Tendo o conjunto probatório apontado a existência da incapacidade laboral desde a época do cancelamento administrativo (13-06-2018), o benefício é devido desde então.
6. Hipótese em que é cabível a correção, de ofício, da sentença, tendo em conta o erro material em relação ao termo inicial de concessão do benefício.
7. A atualização monetária das parcelas vencidas deve observar o INPC no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91, conforme deliberação do STJ no julgamento do Tema 905 (REsp nº 1.495.146 - MG, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DE 02-03-2018), o qual resta inalterado após a conclusão do julgamento, pelo Plenário do STF, em 03-10-2019, de todos os EDs opostos ao RE 870.947 (Tema 810 da repercussão geral), pois rejeitada a modulação dos efeitos da decisão de mérito.
8. Considerando a eficácia mandamental dos provimentos fundados no art. 497, caput, do CPC/2015, e tendo em vista que a presente decisão não está sujeita, em princípio, a recurso com efeito suspensivo, determina-se o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício, a ser efetivada em 45 dias.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia Turma Regional Suplementar de Santa Catarina do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, não conhecer da remessa oficial, negar provimento à apelação do INSS, dar provimento à apelação da parte autora, determinar o cumprimento imediato do acórdão no tocante à implantação do benefício da parte autora e, de ofício, corrigir a sentença em relação ao termo inicial do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 11 de setembro de 2020.
Documento eletrônico assinado por CELSO KIPPER, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001986996v8 e do código CRC 5ca874fc.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): CELSO KIPPER
Data e Hora: 18/9/2020, às 17:25:40
Conferência de autenticidade emitida em 26/09/2020 04:02:12.
EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Virtual DE 03/09/2020 A 11/09/2020
Apelação/Remessa Necessária Nº 5030521-97.2019.4.04.9999/SC
RELATOR: Desembargador Federal CELSO KIPPER
PRESIDENTE: Desembargador Federal CELSO KIPPER
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELANTE: CELIO RIBEIRO DE FARIAS
ADVOGADO: AGLAIR TERESINHA KNOREK SCOPEL (OAB SC009639)
APELADO: OS MESMOS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 03/09/2020, às 00:00, a 11/09/2020, às 16:00, na sequência 477, disponibilizada no DE de 25/08/2020.
Certifico que a Turma Regional suplementar de Santa Catarina, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SANTA CATARINA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NÃO CONHECER DA REMESSA OFICIAL, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DA PARTE AUTORA, DETERMINAR O CUMPRIMENTO IMEDIATO DO ACÓRDÃO NO TOCANTE À IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO DA PARTE AUTORA E, DE OFÍCIO, CORRIGIR A SENTENÇA EM RELAÇÃO AO TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal CELSO KIPPER
Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Votante: Desembargador Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ
ANA CAROLINA GAMBA BERNARDES
Secretária
Conferência de autenticidade emitida em 26/09/2020 04:02:12.