APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005849-40.2011.4.04.7110/RS
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | MAEVI BALBINOTTI |
: | WILSON RODOLFO BALBINOTTI | |
ADVOGADO | : | ASSIS MORAES SOARES |
APELADO | : | CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF |
EMENTA
EMBARGOS À EXECUÇÃO. BEM IMÓVEL. EXTENSA ÁREA DE TERRAS. NULIDADE DO TÍTULO EXTRAJUDICIAL NÃO RECONHECIDA. PROVA TESTEMUNHAL DESNECESSIDADE. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA REVOGADA.
1. Todas as provas, inclusive a testemunhal, são destinadas ao juiz para seu convencimento, nos termos dos artigos 130 e 131 do Código de Processo Civil. Se o magistrado entendeu pela desnecessidade da referida prova para julgar a causa, considerando os demais elementos constantes nos autos, não há nulidade alguma a ser reconhecida.
2. De uma breve consulta aos autos, conclui-se que as questões postas na demanda não requerem a oitiva de testemunhas, pois se referem eminentemente a documentos, sendo desnecessária a produção de prova em audiência.
3. Afora isso, os apelantes alegam genericamente a nulidade da sentença, sem apontar o que poderia ser efetivamente comprovado pelas testemunhas. Não tendo os embargantes sequer apontado qualquer informação que poderia advir da realização de audiência, conclui-se que a prova testemunhal é, de fato, desnecessária.
4. Quanto à gratuidade da justiça, mesmo intimadas as partes, em mais de uma oportunidade, para efetivamente comprovar a necessidade do benefício, somente a executada atendeu a determinação de juntada de declarações de imposto de renda, nas quais, saliente-se, foi ocultado o imóvel discutido nos autos. O valor da propriedade, já em 1994, era de vultosos R$1.100.000,00 (um milhão e cem mil reais). A executada ainda possuía, segundo seus informes ao Fisco, diversos bens e dinheiro em espécie, em quantias consideráveis.
5. O executado, por sua vez, além de também possuir a extensa área de terras objeto da demanda, o que por si só já enfraqueceria a alegada condição de pobreza, sofreu ações trabalhista e fiscal, denotando atividade empresarial e, consequentemente, capacidade econômica.
6. Correta, portanto, a revogação da AJG.
7. Sentença de improcedência mantida. Apelação desprovida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia 4a. Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 13 de abril de 2016.
Salise Monteiro Sanchotene
Relatora
| Documento eletrônico assinado por Salise Monteiro Sanchotene, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 8163945v3 e, se solicitado, do código CRC 19CB4F0E. | |
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RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | MAEVI BALBINOTTI |
: | WILSON RODOLFO BALBINOTTI | |
ADVOGADO | : | ASSIS MORAES SOARES |
APELADO | : | CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF |
RELATÓRIO
Trata-se de embargos à execução de título extrajudicial movida pela Caixa Econômica Federal em que os embargantes alegaram, em síntese que: não foram previamente notificados do débito; o título exequendo é nulo, em razão de vício de consentimento consistente em erro essencial e escusável, resultante de incorreção do edital de licitação pertinente ao negócio entabulado pelas partes; segundo dados e informes seguros, silvícolas caçam, pescam e colhem frutos em parte da gleba objeto do titulo exequendo; por força do inciso XI do art. 20 da Constituição Federal e da Lei 6.001/73, tal parcela de terras é indígena, pertence à União e, portanto, inalienável; há outro vício no negócio, resultante da incorreta descrição do imóvel no edital e nos elementos informativos complementares ao contrato, uma vez que sobre a gleba há limitação de exploração de madeiras pertencentes à floresta amazônica; há divergências entre os elementos constantes no contrato exequendo e no diagnóstico técnico que juntam com a exordial, do qual tiveram conhecimento após a feitura do negócio, as quais demonstram os erros e vícios supracitados; a taxa de juros pactuada é abusiva, acima dos patamares legalmente permitidos e foi ilegalmente capitalizada, constituindo anatocismo; o contrato prevê cumulação ilegal de multas, aos parágrafos 7º e 8º da segunda cláusula. Pleitearam a anulação do título exequendo e a gratuidade judicial
A sentença julgou improcedentes os pedidos e revogou a assistência judiciária gratuita.
Irresignados, os embargantes apelaram, alegando que houve cerceamento de defesa, por não ter sido produzida prova testemunhal. Afirmam que a sentença é nula em decorrência de não ter se pronunciado acerca da questão. Juntam diversos acórdãos para embasar a alegação. Sustentam, também, que não estão na posse do imóvel. Requerem, por fim, a gratuidade da justiça.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos.
É o relatório.
Salise Monteiro Sanchotene
Relatora
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005849-40.2011.4.04.7110/RS
RELATOR | : | SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
APELANTE | : | MAEVI BALBINOTTI |
: | WILSON RODOLFO BALBINOTTI | |
ADVOGADO | : | ASSIS MORAES SOARES |
APELADO | : | CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF |
VOTO
O recurso não merece provimento.
Em relação à suposta nulidade da sentença por não ter sido apreciado o pedido de produção de prova testemunhal, esclareço que, de uma breve consulta aos autos, conclui-se que as questões postas na demanda não requerem a oitiva de testemunhas, pois se referem eminentemente a documentos, sendo desnecessária a produção de prova em audiência.
Ademais, todas as provas, inclusive a testemunhal, são destinadas ao juiz para seu convencimento, nos termos dos artigos 130 e 131 do Código de Processo Civil. Se o magistrado entendeu pela desnecessidade da referida prova para julgar a causa, considerando os demais elementos constantes nos autos, não há nulidade alguma a ser reconhecida.
Afora isso, os apelantes alegam genericamente a nulidade da sentença, sem apontar o que poderia ser efetivamente comprovado pelas testemunhas. Não tendo os embargantes sequer apontado qualquer informação que poderia advir da realização de audiência, conclui-se que a prova testemunhal é, de fato, desnecessária, razão pela qual rejeito a preliminar.
No mérito, os apelantes se limitaram a afirmar que não estão na posse do imóvel desde 1995, ao contrário do que constou da sentença. Ainda que lhes assistisse razão, o que não é o caso, diante da vagueza da alegação, o fato é que isso não obstaria a execução promovida pela CEF, já que todos os demais argumentos dos embargantes, a exemplo da utilização das terras por índios ou impossibilidade de exploração da madeira, foram devidamente rechaçados na sentença. Constata-se, também, que os apelantes foram nomeados depositários do bem, afastando-se, assim, por completo, o argumento de que não estariam na posse do imóvel.
Por fim, quanto à gratuidade da justiça, bem decidiu a juíza a quo ao revogá-la, pois, mesmo intimadas as partes, em mais de uma oportunidade, para efetivamente comprovar a necessidade do benefício, somente a executada Maevi atendeu a determinação de juntada de declarações de imposto de renda, nas quais, saliente-se, foi ocultado o imóvel discutido nos presentes autos. O valor da propriedade, já em 1994, era de vultosos R$1.100.000,00 (um milhão e cem mil reais). A executada ainda possuía, segundo seus informes ao Fisco, diversos bens e dinheiro em espécie, em quantias consideráveis.
O executado Wilson, por sua vez, além de também possuir a extensa área de terras objeto desta demanda, o que por si só já enfraqueceria a alegada condição de pobreza, sofreu ações trabalhista e fiscal, denotando o exercício de atividade empresarial e, consequentemente, a existência de capacidade econômica.
Nada havendo a acrescentar na bem lançada sentença de primeiro grau, mantenho-na integralmente, nos seguintes termos (ev. 02 - SENT90):
Aduzem os embargante que o título exequendo padece por nulidade resultante de erro essencial escusável, no qual incorreram por terem dado crédito a informações incorretas do edital de licitação pertinente ao negócio. Afirmam que, em razão destes erros, há vícios de consentimento que justificam a declaração de nulidade do contrato e, por consequência, da execução embargada.
Primeiramente, para compreensão das questões trazidas pelas partes, é de bom alvitre pormenorizar os institutos invocados.
À época em que firmado o título exequendo, vigiam as seguintes determinações do Código Civil de 1917, que tratavam do erro e da ignorância acerca dos atos jurídicos (grifei):
Art. 86 - São anuláveis os atos jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial.
Art. 87 - Considera-se erro substancial o que interessa à natureza do ato, o objeto principal da declaração, ou alguma das qualidades a ele essenciais.
(...)
Art. 90 - Só vicia o ato a falsa causa, quando expressa como razão determinante ou sob forma de condição.
A essência de tais disposições foi integralmente mantida pelo hodierno estatuto cível, porém com maior detalhamento. Abaixo, colaciono os correlatos dispositivos (grifei):
Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio.
Art. 139. O erro é substancial quando:
I - interessa à natureza do negócio, ao objeto principal da declaração, ou a alguma das qualidades a ele essenciais;
II - concerne à identidade ou à qualidade essencial da pessoa a quem se refira a declaração de vontade, desde que tenha influído nesta de modo relevante;
III - sendo de direito e não implicando recusa à aplicação da lei, for o motivo único ou principal do negócio jurídico.
Art. 140. O falso motivo só vicia a declaração de vontade quando expresso como razão determinante.
Tratando da definição de erro substancial e da argüição de nulidade por falso motivo, assim leciona Ricardo Fiuza (in Novo Código Civil Comentado - 5ª ed., pgs. 81/82, 2006, Ed. Saraiva):
Erro substancial: O erro é uma noção inexata sobre um objeto, que influência a formação da vontade do declarante, que a emitirá de maneira diversa da que a manifestaria se dele tivesse conhecimento exato. Para viciar a vontade e anular o ato negocial, deste deverá ser substancial, escusável e real. Escusável, no sentido de que há de ter por fundamento uma razão plausível ou ser de tal monta que qualquer pessoa de atenção ordinária seja capaz de cometê-lo em face da circunstância do negócio. Real, por importar efetivo dano para o interessado. O erro substancial é erro de fato por recair sobre circunstância de fato, ou seja, sobre as qualidades essenciais da pessoa ou da coisa. Poderá abranger o erro de direito (CC, art. 139, III), relativo à existência de uma norma jurídica dispositiva, desde que afete a manifestação da vontade, caso em que viciará o consentimento.
(...)
Argüição de nulidade relativa do ato por falso motivo: O erro quanto ao fim colimado (falso motivo), em regra, não vicia o negócio jurídico, a não ser quando nele figurar expressamente, integrando-o, como sua razão determinante ou sob forma de condição de que venha a depender sua eficácia. Por exemplo, se alguém vier a doar ou legar um prédio a outrem, declarando que o faz porque o donatário ou legatário lhe salvou a vida, se isso não corresponder à realidade, provando-se que o donatário nem mesmo havia participado do referido salvamento, o negócio estará viciado, sendo, portanto, anulável. Isto é assim porque a causa é uma razão de ser intrínseca da doação. Se o declarante expressamente fizer entender que só constituirá a relação jurídica por determinada causa ou se se verificar certo acontecimento a que ela se refere, havendo erro ter-se-á a anulação do negócio efetivado, por ser manifesto que a parte fez depender da causa a realização do ato.
Vejamos, então, se há erros essenciais ou falsas causas à feitura da avença, capazes de maculá-la com absoluta nulidade, nos termos advogados pelos devedores.
Do teor da peça vestibular, infere-se que os embargantes aduzem que foram induzidos a dois erros essenciais, decorrentes da omissão de dados ou de errôneas informações nos instrumentos pertinentes ao ato negocial que gerou o título exequendo, a saber, não tinham a informação de que parte das terras cuja venda foi prometida está ocupada por índios e de que há grande limitação à exploração madeireira na gleba.
Quanto à alegação pertinente aos silvícolas, afirmam os devedores que "segundo dados e informes seguros transmitidos aos Embargantes, boa parte da fração de terras objeto da promessa de compra e venda mencionada, situada na sua parte setentrional, constitui TERRAS INDIGENAS, porque tradicionalmente ocupadas por índios da tribo CINTAS LARGAS, cuja taba se situa fora da área de terras objeto do contrato, o que não impede que PERMANENTEMENTE os silvícolas penetrem em parte da área negociada, tolhendo o ingresso de estranhos, para obterem recursos para sua subsistência, através da CAÇA, colheita de FRUTAS SILVESTRES, bem como PESCA" (fl. 05). Asseveraram, ainda, que a "ocupação imemorial desses primitivos habitantes deste País, assegura-lhes o USUFRUTO exclusivo de tais riquezas naturais, nos termos do art. 231, § 2°, da Const. Federal, além de identificar a fração assim usufruída como BEM DA UNIÃO, segundo o art. 20, XI, da Const. Federal, como já antes dispunha a Lei n° 6001/73, cujo art. 2°, V, lhes garante a permanência voluntária no seu HABITAT", bem como que conforme o "teor do art. 23 dessa lei, basta mesmo, para tanto, que a atividade lhes seja ECONOMICAMENTE UTIL e não apenas aquela indispensável à sua subsistência".
Para averiguar a veracidade das cogitações, ainda que em tese, vejamos o que diz o Estatuto Indígena (Lei 6.001/73, a qual grifo):
Art. 2° Cumpre à União, aos Estados e aos Municípios, bem como aos órgãos das respectivas administrações indiretas, nos limites de sua competência, para a proteção das comunidades indígenas e a preservação dos seus direitos:
(...)
V - garantir aos índios a permanência voluntária no seu habitat, proporcionando-lhes ali recursos para seu desenvolvimento e progresso;
(...)
Art. 23. Considera-se posse do índio ou silvícola a ocupação efetiva da terra que, de acordo com os usos, costumes e tradições tribais, detém e onde habita ou exerce atividade indispensável à sua subsistência ou economicamente útil.
(...)
Art. 25. O reconhecimento do direito dos índios e grupos tribais à posse permanente das terras por eles habitadas, nos termos do artigo 198, da Constituição Federal, independerá de sua demarcação, e será assegurado pelo órgão federal de assistência aos silvícolas, atendendo à situação atual e ao consenso histórico sobre a antigüidade da ocupação, sem prejuízo das medidas cabíveis que, na omissão ou erro do referido órgão, tomar qualquer dos Poderes da República.
Dos trechos grifados do texto legal, percebe-se que, embora atividades economicamente úteis dos silvícolas lhes garanta o usufruto de terras, assim como as atividades de subsistência, o reconhecimento do gravame legal depende de prévio estudo do histórico da ocupação, não sendo engendrado unicamente em razão de índios pescarem, caçarem ou colherem frutas nas terras negociadas. Fosse doutra forma, restaria seriamente afetada a segurança jurídica quanto aos direitos imanentes da propriedade em glebas próximas a terras indígenas, pois a propensão natural e o desconhecimento das mais comezinhas regras do Estado de Direito normalmente faz com que os silvícolas desbordem limites territoriais, sobretudo em terras não urbanizadas e sem limites claros, em busca de melhor caça e pesca, sem, contudo, alargar a dimensão de suas terras. Frisa-se que mesmo com homens urbanizados ocorrem situações símiles, tanto que são comuns nesta Justiça Federal processos versando sobre caça e pesca em locais de preservação ou em períodos defesos em lei.
De qualquer sorte, a caça, a pesca e a colheita de frutos silvestres não constituem atividades economicamente úteis, pois são extrativistas e se prestam, no máximo, à subsistência da família de quem os exerce.
Demais disso, os próprios embargantes afirmam que os indigitados indígenas não habitam suas terras, tanto que se deram ao trabalho de frisar que a taba da tribo Cintas Largas se situa fora da área de terras objeto do contrato (fl. 05), fato que afasta a incidência das disposições previstas no art. 231 da Carta Política, que assim rezam (grifei):
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º - São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º - As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
Como a taba está fora da gleba negociada, decerto não é nesta que os supostos invasores habitam ou buscam recursos ambientais imprescindíveis ao bem estar da tribo, tampouco exercem atividades produtivas, até porque os embargantes em nenhum momento citaram o exercício desta última espécie de atividades, a exemplo do cultivo de vegetais ou da criação de animais nas terras que possuem por parte dos malsinados silvícolas.
Diante destas considerações e com base na inteligência do art. 130 do Código de Processo Civil, revejo o despacho-ofício da fl. 244 e julgo despicienda a diligência inicialmente deferida à decisão da fl. 183, exarada por Juíza de Direito, a qual não pôde ser cumprida mesmo após inúmeras tentativas frustradas e reiterações do pedido (fls. 196, 201, 204, 209, 219, 220 e 225) que se propagaram inutilmente por mais de seis anos.
Pelas mesmas razões, seria inútil a produção de "perícias de engenharia agronômica, botânica e de cálculo" (fl. 11), merecendo ainda o qualificativo de protelatória, notadamente pelo vulto do imóvel e distância em que se localizada.
Doutra banda, é preciso atentar que os próprios embargantes alegam que as supostas caças, pescas e colheitas de frutos germinados sem cultivo humano dar-se-iam em parte setentrional da gleba que se encontra em sua posse, as quais totalizam a imensa área de vinte e seis mil e seiscentos vinte hectares, sendo pouco crível que as aludidas atividades silvícolas alastrem-se por parcela significativa da porção de terra que, repete-se, é imensa, quanto mais a ponto de inviabilizar sua exploração. Aliás, os embargantes deduziram tais alegações sem nem ao menos especificar, ainda que por alto, quantos hectares da grande gleba estaria em vias de, segundo suas lucubrações, ser gravada por usufruto indígena ou de passar à propriedade da União.
Logo, nem mesmo em tese há como dar guarida à alegação relativa aos aborígines, eis que as supostas e improváveis atividades não interferem nos direitos negociados.
Quanto à alegação pertinente à suposta limitação de exploração do potencial madeireiro da gleba, afirmam os embargantes que disposições do Código Florestal "restringem acentuadamente as DERRUBADAS FLORESTAIS" (fl. 07).
Vejamos o teor dos pertinentes dispositivos legais nas redações vigentes à época em que opostos os embargos:
Art. 3º Consideram-se, ainda, de preservação permanentes, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas:
a) a atenuar a erosão das terras;
b) a fixar as dunas;
c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares;
e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;
f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;
g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;
h) a assegurar condições de bem-estar público.
§ 1° A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social.
Conforme o grifo assentado ao caput do artigo legal, as áreas que se amoldarem às hipóteses das alíneas do colacionado dispositivo legal somente serão consideradas de preservação permanente através de ato público, razão pela qual bastaria aos embargantes ter trazido aos autos a atinente declaração estatal, mister não cumprido e nem mesmo cogitado durante os mais de treze anos de tramitação dos presentes embargos.
No que toca à alegada limitação decorrente das disposições do art. 16 da Lei 4.771/65, conjugadas à localização geográfica do imóvel (fl. 07), melhor sorte não assiste aos embargantes, uma vez que as terras em testilha se localizam na parte norte do estado do Mato Grosso, conforme facilmente se verifica das figuras/mapas constantes no Diagnóstico de Potencial Madeireiro retirado dos autos do processo de licitação que culminou com o contrato exequendo (fl. 26). Para elucidar, colaciono a teor do dispositivo legal em comento, grifando-lhe na parte mais interessante à causa:
Art. 16. As florestas de domínio privado, não sujeitas ao regime de utilização limitada e ressalvadas as de preservação permanente, previstas nos artigos 2° e 3° desta lei, são suscetíveis de exploração, obedecidas as seguintes restrições:
a) nas regiões Leste Meridional, Sul e Centro-Oeste, esta na parte sul, as derrubadas de florestas nativas, primitivas ou regeneradas, só serão permitidas, desde que seja, em qualquer caso, respeitado o limite mínimo de 20% da área de cada propriedade com cobertura arbórea localizada, a critério da autoridade competente;
(...)
Por outro lado, é pouco verossímil a alegação de que os devedores não tinham conhecimento de tão importantes características da gleba que adquiriram, primeiro por versar o caso vertente sobre vastíssima área de terras, não sendo plausível a alegada ignorância quanto aos reais índices de exploração madeireira, pois não se pode presumir desafetação em quem realiza negócio do vulto do entabulado pelas partes, porquanto as cifras tratadas e a natureza da licitação não admitam que negociadores aventureiros ou tão incautos participem do processo de aquisição, muito antes pelo contrário; segundo, porque o estudo da empresa de consultoria LIFE, acostado pelos embargantes (fls. 20/53), foi extraído dos autos de processo administrativo que serviu de base à licitação, consoante consta aos carimbos de paginação assentados em suas folhas, o qual certamente esteve à disposição dos licitantes; terceiro, porque, ao revés do alegado pelos devedores, as conclusões do indigitado estudo foram reproduzidas no instrumento contratual, sobretudo à oitava cláusula, senão vejamos:
CLÁUSULA OITAVA: Sem prejuízo de todo o antes referido, declaram os COMPROMISSÁRIOS terem pleno conhecimento, que a caracterização da Gleba São Benedito, nos seus aspectos técnicos, pela análise geral de seus componentes ambientais, pelas estimativas e pela avaliação de seu potencial madeireiro, permite concluir que:
a) a gleba, apesar das dificuldades de acesso a sua área no trecho de 11 km, faz parte do Condomínio Lunardelli, sendo que o mesmo possui uma estrutura organizada que possibilita a manutenção das estradas como também é proprietário e responsável pela balsa de travessia do Rio Roosevelt, peça importante para o acesso à área. Esta estrutura do condomínio também possibilita as tratativas diretas com os órgãos governamentais que têm jurisdição na região.
(...)
e) o volume total de madeira estimado refere-se exclusivamente para aquelas espécies que possuem mercado na região, não levando-se em consideração as demais espécies que possam a vir ter aproveitamento no futuro de larga abundância na área, para melhor qualificação deste volume é necessário a execução de um levantamento a nível detalhado em toda a extensão da área da Gleba;
f) o potencial de madeira avaliado para o total da área, considerando-se a distribuição de frequência das espécies atingiu o montante de 160.273.696 metros cúbicos de madeira em pé, montante este relativo a volume sem casca e fustes retos;
g) as condições de explotabilidade para a área apresentaram-se como sendo Fácil em 37% da área, Regular em 48% e Difícil em 12% e Muito Difícil em 3%, resultando que a extração madeireira na área apresenta ótima condições.
Ao final do mesmo item 5.3 do parecer técnico (fl. 53), tem-se texto que reprisa as descrições da alínea "a" da cláusula em epigrafe.
O conteúdo da alínea "e" coaduna-se com a estimativa deduzida ao final do item 5.2 do diagnóstico técnico, daí a prevenção de sinalar no contrato a necessidade de melhor qualificação do volume de madeira disponível à exploração. Vejamos a estimativa em comento e a respectiva ressalva (fl. 53):
O volume total estimado das espécies diz respeito ao volume comercial sem casca, representando os melhores fustes das espécies, fustes retos quase isentos de defeitos. Sua estimativa obedeceu a frequência das espécies na área, ou seja, sua distribuição, pois as mesmas não ocorrem de uma maneira uniforme em toda a área. Assim, o volume total estimado representa a concentração das espécies por unidade de área, sendo que o mesmo atinge a 24, 760 metros cúbicos de madeira a ser explorada por hectare, sendo este valor relativo à concentração destas espécies. Este valor de madeira por hectare não quer dizer que em cada hectare da área irá ocorrer esta quantidade, mas sim que a área de concentração possui este volume.
O teor da alínea "g" da cláusula tratada repete as conclusões traçadas ao item 5.2 do diagnóstico técnico, aviadas nos seguintes termos (fl. 53, grifei):
Áreas de explotabilidade Fácil, estão representadas na área pelos seguintes tipos de relevo: planícies aluviais e terraços - localizadas ao longo das vias fluviais. A área de terraços estende-se a longas distâncias das margens, estes terrenos apresentam superfícies totalmente aplainadas e são atingidos, parcialmente, pejas cheias periódicas, são representandos em cerca de 15% da área. Relevos ondulados - distribui-se em toda extensão da área com declividades de 10 a 15%, representando 12% da área. Relevos de baixos platôs - apresentam em geral superfícies topográficas praticamente planas, encontrando nas bordas partes onduladas e ligeiramente dissecadas. O declive varia de 0 a 10%, ocorre em cerca de 10% da área.
Áreas de explotabilidade Regular, estão representadas pelos relevos dissecados, predominando declividades superior a 20%, ocorrendo na área em cerca de 48%.
Áreas de explotabilidade Difícil, representando áreas de relevo fortemente dissecados, com declives superiores a 40%, com ocorrência na área em cerca de 12%.
Áreas de explotabilidade Muito difícil, representando áreas de relevo montanhoso e altos platôs com bordas escarpadas, com declividades superiores a 45%, com ocorrência na área em cerca de 3%.
Do simples somatório das percentagens relativas às áreas de planícies aluviais e terraços, relevos ondulados e relevos de baixos platôs, todas de explotabilidade fácil, chega-se aos 37% referidos à alínea contratual. Já as demais porcentagens são idênticas às referidas ao estudo técnico.
Em arremate, friso que ao caput da cláusula em comento os promitentes compradores declaram que têm pleno conhecimento destes dados, bem como da caracterização da Gleba São Benedito, seja nos seus aspectos técnicos, seja pela análise geral de seus componentes ambientais, seja pelas estimativas e pela avaliação de seu potencial madeireiro, disposição que nem mesmo foi alvo de impugnação.
Logo, mostram-se inverossímeis os alegados desconhecimentos quanto às reais potencialidades do objeto do contrato e a temerosa afirmação de que o estudo supracitado "só ATUALMENTE VEIO AO CONHECIMENTO DOS EMBARGANTES" (fl. 07/08), quanto mais a ponto de constituir erros substanciais ou falsos motivos à concretização do negócio.
De qualquer sorte, mesmo que todo o exposto fosse desconsiderado, a prova de que os devedores desconheciam as reais condições da gleba é negativa e impossível de ser produzida, eis que não há meios de perscrutar suas psiques.
Ainda que os promitentes compradores comprovassem total ignorância acerca dos pontos supra referidos, conjectura traçada mais por apego à argumentação do que por necessidade de fundamentação, cumpriria manter a vigência do contrato sob a luz das lições de Ricardo Fiúza, copiadas alhures, pois os erros não seriam escusáveis por ser incomum tamanha incúria em negócios do vulto do epigrafado, nem reais, uma vez que somente parte indefinida e nem sequer estimada da gleba estaria com a exploração comprometida, fato que retiraria de todo o qualificativo de substancial aos alegados vícios, por não se reportarem às qualidades essenciais da coisa, já que o próprio contrato explicita que nem toda a terra é explotável (fl. 63, alínea "g"). Portanto, nem assim haveria vicio de consentimento.
Prosseguindo na doutrina de Fiúza, o erro quanto ao fim colimado, via de regra, não vicia o contrato, a não ser quando nele figure expressamente, constituindo sua razão determinante, o que não ocorreu na espécie, diante dos termos da cláusula contratual acima reproduzida.
Logo, por qualquer ângulo que se vislumbre o quadro desenhado pelos devedores, não há como dar o menor crédito às suas alegações relativas a vícios contratuais.
Aduzem os embargantes que a taxa de juros pactuada, de 16% a.a., é abusiva, acima dos patamares legalmente permitidos e foi ilegalmente capitalizada, constituindo anatocismo.
Após a vigência da Lei 4.595/64, deixou de incidir, para as instituições que fazem parte do Sistema Financeiro Nacional, a limitação do índice de juros imposto pela Lei de Usura. A referida lei foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988, sendo a jurisprudência pacífica neste ponto, máxime após a publicação da Súmula nº 382 do STJ, que assim dispõe:
Súmula 382 - "A estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade".
No que tange ao antigo § 3° do art. 192 de nossa Carta Política, revogado pela Emenda Constitucional nº 40, cuja eficácia operou-se a partir de junho de 2003, padecia por ausência de regulamentação, nos termos da Súmula Vinculante nº 07.
Sobre a capitalização mensal de juros, é pacífico o entendimento, com base no art. 4.º do Decreto n.º 22.626/33, de que até o advento da Medida Provisória 1.963-17/2000, reeditada sob o número 2.170-36/2001, cujo art. 5º autoriza o procedimento, desde que contratualmente previsto, era vedada a capitalização de juros nos contratos de mútuo, salvo disposição legal expressa em sentido contrário, o que, em nosso ordenamento jurídico, só ocorria em relação aos mútuos efetuados mediante cédulas de crédito rural, comercial e industrial, nos termos da Súmula 93 do STJ. Nesse sentido foi editada a Súmula 121 do Supremo Tribunal Federal.
Porém, não há qualquer cláusula contratual que resulte em capitalização de juros por período inferior a um ano, haja vista a alínea "b" da cláusula terceira indique a incidência de juros de 16% ao ano (fl. 60).
Doutra banda, a aplicação da tabela PRICE ou a utilização de taxas de juros nominal e efetiva, por si só, não ensejam capitalização de juros, conclusão auxiliada pelo seguinte precedente:
DIREITO ADMINISTRATIVO. SFH. MÚTUO HABITACIONAL. CONTRATO SUB-ROGADO AO AUTOR. NOVAÇÃO. DIREITO À REVISÃO. TABELA PRICE. ANATOCISMO. 1. A transferência do contrato de financiamento, com anuência do credor, significa a novação do contrato, inviabilizando ao novo mutuário a discussão do financiamento anterior. 2. É vedada a prática de anatocismo, todavia, nem a simples utilização da tabela Price, nem a dicotomia - taxa de juros nominal e efetiva - são suficientes a sua caracterização. Somente o aporte dos juros remanescentes decorrentes de amortizações negativas para o saldo devedor caracteriza anatocismo. No caso dos autos, o exame das planilhas de evolução do financiamento demonstram sua não ocorrência.
(AC 200370000479138, MARGA INGE BARTH TESSLER, TRF4 - QUARTA TURMA, 14/06/2010)
No que tange às multas previstas nos parágrafos 7º e 8º da segunda cláusula do contrato (fl. 61), verifica-se da memória do cálculo (fl. 35 dos autos do processo de execução) que somente uma delas, de 10%, foi aplicada aos débitos. Assim sendo, não houve a alegada cumulação.
Noutro viés, no caso vertente chama a atenção o fato de se estar tratando de negócio que conferiu aos embargantes a posse de tão grande parcela de terras em fevereiro de 1995, conforme termo da fl. 13 dos autos do processo de execução, e que até o momento não foi afetada, eis que ao termo de nomeação de bens à penhora e depósito da fl. 55 dos autos em apenso lhes foi conferida a qualidade de depositários do bem, sem que nem mesmo tenham tentado, mediante os corretos meios persuasivos, rechaçar as supostas atividades indígenas ou buscar compensações pelas limitações de exploração madeireira, sendo oportuno lembrar que, embora o presente incidente admita a alegações de qualquer matéria de defesa, certamente não é o meio processual próprio a impedir a tomada da terra, por parte de quem quer se seja, sequer de buscar ressarcimento pelos valores decorrentes da anulação da avença.
Com efeito, os devedores pagaram unicamente o valor inicial do negócio, imprescindível à imissão na posse dos mais de vinte e seis mil hectares de terra, deixando em aberto as demais parcelas. Entretanto, têm a posse da terra há mais de dezesseis anos, período durante o qual não se deram ao trabalho sequer de demonstrar que tiveram dificuldades na exploração da terra, não juntando à exordial um mínimo indício de prova, nem mesmo dos argumentos acima rechaçados, o que, diga-se de passagem, seria improfícuo, tanto que este juízo afastou-os em tese, mediante mera análise das disposições legais e contratuais que lhes são atinentes.
Em resumo: os embargantes apresentaram alegações baseadas unicamente em "dados e informes seguros" (fl. 05) cuja fonte foi ocultada e em equivocado cotejo dos termos contratuais e do estudo de potencial madeireiro produzido nos autos do processo de licitação que venceram, as quais não se coadunam com quaisquer das previsões legais ou contratuais, conseguindo, com isso, postergar o julgamento dos presentes e a tramitação do executivo embargado por mais de três longos lustros. Tais fatos demonstram que, infelizmente, a tramitação destes embargos concretiza desbordo do primado insculpido no último inciso do art. 5º da Constituição Federal.
Da assistência judiciária gratuita
Vencido o mérito, cumpre tecer algumas considerações acerca da benesse deferida à fl. 180.
Conforme lembrado à decisão da fl. 254, o título exequendo trata da transmissão de propriedade de imóvel de 26.620 hectares que, à época da lavratura da avença (13/12/1994), foi avaliado em R$ 1.110.000,00. Deste valor, os embargantes pagaram o valor inicial de R$ 222.000,00 (fl. 61) e mais R$ 55.500,00 a título de taxa de leilão (fls. 57 e 257/258).
O vulto destas cifras se contrapõe às seguintes declarações das fls. 14 e 16: "(...) não tenho condições de arcar com o pagamento das custas judiciais e honorários advocatícios sem prejuízo do meu sustento", razão pela qual foi aberto o prazo do art. 8º da Lei 1.060/50, no qual os embargantes também foram intimados a comprovar documentalmente as aludidas alegações. Para tanto, juntaram a certidão de nascimento da filha menor impúbere da devedora (fl. 260), cópias de sua CTPS (fl. 261) e documentos relativos a benefício previdenciário de auxílio-doença em valor mínimo, pago ao embargante varão (fls. 263/268).
No entanto, conforme explanado à fl. 271, o fato de a embargante Maevi haver firmado contrato de trabalho, o único anotado à sua CTPS, que perdurou entre julho de 2006 e dezembro de 2008, e de o embargante Wilson haver gozado benefício de auxílio-doença no valor mínimo, não são suficientes a embasar a afirmação de que têm dificuldade de manter concomitantemente os custos desta demanda e a própria mantença, até porque a decisão da fl. 254 lastreou-se no vulto dos valores do empreendimento perpetrado pelos embargantes, do qual se infere que administram recursos incompatíveis com a alegação de pobreza. Em razão deste entendimento, reabriu-se o prazo do art. 8º da Lei 1.060/50, determinando-se aos embargantes a juntada de cópias das declarações de bens e direitos de suas declarações de imposto de renda dos últimos cinco anos, mister cumprido pela executada Maevi (fls. 276/303) e não observado pelo executado Wilson, a pretexto de seus rendimentos não alcançarem o limite estabelecido em lei (fls. 315/316).
Contudo, relembra-se que o título exequendo conferiu aos embargantes a posse de imensa parcela de terras em fevereiro de 1995, conforme termo da fl. 13 dos autos do processo de execução, e que até o momento não foi afetada, eis que ao termo de nomeação de bens à penhora e depósito da fl. 55 dos autos em apenso lhes foi conferida a qualidade de depositários do bem.
Ademais, é forçoso concluir que os devedores estão na posse de imóvel que, já em 1994, era avaliado em R$ 1.100.000,00, valor muito acima do limite determinado à legislação pertinente ao imposto de renda pessoa física, que impõe a feitura de declaração anual de ajuste a todo contribuinte que detiver a posse de bem imóvel avaliado em mais de R$ 300.000,00, nos termos do inciso V do art. 2º da Instrução Normativa RFB nº. 1.095, de 10 de dezembro de 2010, que reproduz disposições das IN RFBs nºs. 1.007/10, relativa ao exercício de 2009, todas editadas sob os auspícios do § 1º do art. 11 da Lei 8.981/95. Por sua vez, a IN RFB nº 918/09 determinava a obrigatoriedade de declaração para quem teve a posse ou a propriedade, em 31 de dezembro de 2008 de bens ou direitos, inclusive terra nua, de valor total superior a R$ 80.000,00 (inciso VI de seu art. 1º), repetindo disposição da IN RFB nº. 820/08, relativa ao ano calendário 2007.
Destarte, por deterem a posse de extensa e valiosa gleba, a legislação de regência impõe aos embargantes, há larga data, o dever de apresentarem declarações anuais de ajuste de imposto de renda pessoa física, misteres não cumpridos, seja pela devedora Maevi, já que não indicou a posse da terra às declarações das fls. 276/303, seja pelo devedor varão, que sequer apresentou declarações nos último oito anos (fls. 315/316). Tal irregularidade que não pode ser levantada em favor dos devedores, servindo de fulcro à manutenção da benesse da assistência judiciária gratuita, como pretendido às petições retro. Mas há mais a considerar.
Em épocas em que se declarava pobre, a devedora Maevi era proprietária dos seguintes bens, devidamente declarados ao Fisco: (a) de terras no 4º distrito de Rio Grande/RS, adquiridas em 1995 e vendidas em 2007, cuja avaliação em dezembro de 2004 era de R$ 119.900,84 (fls. 290, 295 e 300); (b) R$ 75.000,00 em espécie, entre os anos de 2004 e 2006 (fls. 295 e 300) e R$ 150.000,00 em espécie em 2007 (fls. 285 e 290); (c) uma caminhonete Toyota Hilux, adquirida em 2002 e vendida em agosto de 2005, cuja avaliação em dezembro de 2004 era de R$ 45.000,00 (fl. 300); (d) uma caminhonete Toyota Hilux, adquirida em 2006 por R$ 50.000,00 (fls. 290 e 295) e vendida em 2008 por R$ 55.000,00 (fl. 285) e; (e) um automóvel Golf, adquirido em 1996 e vendido em 2005 por R$ 12.500,00 (fl. 300).
Por sua vez, a devedor Wilson, também em época que se declarava pobre, foi alvo de execuções trabalhista (fl. 185 dos autos do processo de execução) e fiscal (fls. 191/192 dos autos em apenso) em litisconsórcio com a empresa Ferrari & Bohmer Ltda., fatos que indiciam que também exerceu atividade empresarial.
Por fim, é pouquíssimo provável que a posse dos mais de vinte e seis mil hectares não tenha proporcionado qualquer renda aos embargantes nos dezesseis anos que intermedeiam o início da posse e a presente decisão, servindo unicamente à contemplação dos fiéis depositários.
Portanto, após haver sido aberto duas vezes o prazo do art. 8º da Lei 1.060/50 e afastada a presunção de veracidade das declarações de pobreza acostadas aos autos pelos próprios documentos que o integram, é imprescindível revogar a benesse deferida pela Justiça Estadual à fl. 180. Ressalto que tal revogação não impede o julgamento do feito, eis que o presente incidente é legalmente isento de custas judicial.
III)
Ante o exposto, rejeito os presentes embargos e revogo o benefício da assistência judiciária gratuita, com base no art. 8º da Lei 1.060/50 e nos termos da fundamentação.
Ante o exposto, voto por negar provimento ao recurso.
Salise Monteiro Sanchotene
Relatora
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 13/04/2016
APELAÇÃO CÍVEL Nº 5005849-40.2011.4.04.7110/RS
ORIGEM: RS 50058494020114047110
RELATOR | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
PRESIDENTE | : | VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA |
PROCURADOR | : | Dr. Marcus Vinicius Aguiar Macedo |
SUSTENTAÇÃO ORAL | : | Dr. Assis Moraes Soares p/ Maevi Balbinotti e Wilson Rodolfo Balbinotti- videoconferência- Pelotas |
APELANTE | : | MAEVI BALBINOTTI |
: | WILSON RODOLFO BALBINOTTI | |
ADVOGADO | : | ASSIS MORAES SOARES |
APELADO | : | CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 13/04/2016, na seqüência 349, disponibilizada no DE de 21/03/2016, da qual foi intimado(a) o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, a DEFENSORIA PÚBLICA e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 4ª TURMA, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
VOTANTE(S) | : | Juíza Federal SALISE MONTEIRO SANCHOTENE |
: | Des. Federal VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA | |
: | Des. Federal CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JÚNIOR |
Luiz Felipe Oliveira dos Santos
Diretor de Secretaria
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