EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5031248-28.2016.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
EMBARGANTE: DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT (RÉU)
RELATÓRIO
Trata-se de embargos de declaração, opostos por DNIT contra acórdão desta Terceira Turma, cuja ementa foi redigida nos seguintes termos:
DIREITO ADMINISTRATIVO. ACIDENTE DE TRÂNSITO EM RODOVIA FEDERAL. NEXO DE CAUSALIDADE. CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. DANOS MORAIS. DANOS MATERIAIS. PENSÃO MENSAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS.
1. O exame do conjunto das provas dos autos leva à conclusão de que a defesa recursal feita pelo DNIT no sentido de que não estaria presente o nexo de causalidade e que se estaria diante de caso envolvendo apenas culpa exclusiva de terceiro não pode prosperar.
2. Os documentos juntados aos autos são suficientes - tendo, assim, valor probante evidentemente - para comprovar os danos materiais e a necessidade de sua reparação.
3. O autor não possui pensão previdenciária, razão pela qual, levando-se em conta os termos empregados pelo DNIT no recurso de apelação, deve ser rejeitado o apelo da autarquia no ponto. De todo modo, a cumulação com benefício previdenciário - se era isso a que o DNIT pretendia se referir - é possível sim.
4. O marco final do pensionamento também não deve ser alterado, considerando dados aproximados do IBGE.
5. Tendo em conta as circunstâncias do evento danoso, considera-se adequada para fazer frente aos danos extrapatrimoniais a importância de R$ 60.000,00 (sessenta mil reais), na esteira dos precedentes.
6. Ainda que queira o autor receber de uma só vez, tendo em vista as considerações feitas na sentença e o que se encontra em decisão do STJ indicada, deve ser rejeitado o seu pleito de recebimento de indenização de uma vez só de acordo com o art. 950, § único, do CPC.
7. Considerando a prova dos autos e o fato de que o autor recebe benefício de aposentadoria por invalidez, rejeita-se o pedido de majoração do valor mensal da pensão civil fixada em decorrência do acidente.
8. É descabida a aplicação da TR como índice de correção monetária das condenações judiciais impostas à Fazenda Pública. Em seu lugar, deve-se adotar o IPCA-E, índice que melhor reflete a inflação acumulada do período.
9. O montante a título de honorários que será formado com o que foi fixado na sentença já será bem expressivo. Assim, considerando os parâmetros do art. 85, §2º, do CPC, entendo que o que já foi fixado na sentença é justo para os procuradores do autor.
O DNIT aduz em suas razões de embargos, em síntese, (a) a omissão do acórdão embargado, porquanto (a.1) a responsabilidade primária pela manutenção da rodovia é da empresa contratada, razão pela qual deve responder apenas subsidiariamente pelos danos sofridos pelo autor da demanda; (a.2) a responsabilidade por ato omissivo é subjetiva ao passo que a sentença o responsabilizou de forma objetiva; (b) a contradição no tocante à afirmativa no acórdão embargado acerca da pensão previdenciária e aposentadoria por invalidez; (c) a configuração de bis in idem pelo duplo pagamento de pensão ao autor da demanda; (d) a fixação do termo inicial dos consectários legais na data do arbitramento. Postula a reforma do acórdão embargado.
É o relatório.
VOTO
Os embargos de declaração constituem recurso interposto perante o magistrado ou colegiado prolator da decisão, com vistas à supressão de omissão, contradição, obscuridade ou erro material no texto que possa dificultar a exata compreensão da manifestação judicial, conforme artigo 1.022 do CPC de 2015. Com efeito, não se revelam meio hábil ao reexame da causa ou modificação do julgado no seu mérito, pois opostos quando já encerrado o ofício jurisdicional naquela instância.
A embargante alega existir vícios no acórdão proferido por esta Corte. Não lhe assiste razão todavia, porquanto, no caso dos autos, não ocorreu qualquer omissão. O que a embargante pretende é rediscutir o mérito a fim modificar o conteúdo do julgado, o qual não se conforma. O acórdão foi claro ao discorrer acerca do nexo de causalidade do acidente. Transcrevo:
Mérito - recurso do DNIT
Nexo de causalidade e culpa exclusiva de terceiro
O exame do conjunto das provas dos autos leva à conclusão de que a defesa recursal feita pelo DNIT no sentido de que não estaria presente o nexo de causalidade e que se estaria diante de caso envolvendo apenas culpa exclusiva de terceiro não pode prosperar. Nesse sentido, veja-se parte das razões de decidir da sentença (ev. 186 dos autos originários) - que são adotadas como fundamentos - que bem examinaram a situação litigiosa e que levaram à formação da conclusão de que está, sim, presente o nexo de causalidade e de que não há se falar em culpa exclusiva de terceiro:
"Da situação fática
No caso concreto, conforme Boletim de Acidente de Trânsito nº 83201198, na data de 30/05/14, às 23h30min, na BR 290, Km 123,5, no município de Eldorado do Sul/RS, o Autor sofreu acidente de trânsito quando conduzia a motocicleta Honda CBX-250 Twister, placas IOZ8539, colidindo na traseira do caminhão Mercedes-Benz, placas MBM 5944, que estava estacionado no acostamento da rodovia, sentido capital/interior, inexistindo sinalização horizontal devido a obras de recapeamento (evento 41, OUT5, p. 1):
(...)
No croqui elaborado pela Polícia Rodoviária Federal, com base na avaliação do local do acidente, o caminhão conduzido por Altemir dos Santos aparece na área destinada ao acostamento (evento 41, OUT5, p.2):
(...)
Acerca das condições da rodovia no local do acidente, consta do registro de ocorrência: sinalização luminosa inexistente; sinalização horizontal inexistente; acostamento em desnível e em estado de conservação ruim; pista de rolamento em estado de conservação regular (evento 41, OUT5, p. 1).
Segue, no Boletim, que o Autor foi removido, com lesões graves e inconsciente, para o Hospital Cristo Redentor de Porto Alegre (OUT5, p. 4).
Em depoimento pessoal, o demandante declarou, em resumo, que o trecho onde ocorreu o acidente estava em obras e não havia sinalização horizontal ou placas indicando a recuperação da via. Relatou que chovia no momento do acidente, que não saiu da pista de rolamento e que estava a 70 km/h, em uma reta, quando ocorreu a colisão, asseverando que o caminhão conduzido por Altemir dos Santos estava parado, uma parte do veículo no acostamento e a outra na faixa, as luzes apagadas e sem qualquer sinalização de emergência, o que impossibilitou que desviasse a tempo (evento 142, AUDIO2).
O Réu Altemir dos Santos, condutor do caminhão envolvido no acidente, salientou que não havia sinalização horizontal que delimitasse a faixa de rolamento do acostamento, mas apenas um desnível na pista. Declarou, também, que o recapeamento havia sido concluído há 15 dias, situação que constatou por fazer o mesmo trajeto duas vezes por semana à época. No mais, referiu que o caminhão que conduzia sofreu um 'apagão' (pane elétrica, atingindo farol e motor), fazendo com que manobrasse o veículo imediatamente para o acostamento. Em seguida, sentiu a colisão traseira sem que houvesse tempo de colocar o triângulo para sinalizar o problema. Afirmou que o veículo estava no acostamento, fato posteriormente confirmado pela Polícia Rodoviária, já que o caminhão não ligou novamente por conta da pane. Ponderou que, não havendo sinalização horizontal, o condutor da moto se guiou pela faixa reflexiva do caminhão, supondo que estava na pista de rolamento e, quando chegou perto e percebeu que o veículo estava parado no acostamento, não teve tempo nem condições de desviar (evento 142, AUDIO3).
A testemunha Arquimedes Saraiva dos Santos afirmou que chegou ao local após o acidente e o caminhão conduzido pelo Réu Altemir estava parado no acostamento. Aduziu que trafegava quase todos os dias no trecho e naquela noite estava muito escuro e na iminência de chover. Afirmou que a estrada estava horrível e havia obras de recuperação no local, contudo, não havia pintura na pista (no meio e nos cantos), tampouco sinalização indicativa das obras. Referiu que o acostamento é estreito, não chegando a 2m de largura, no máximo, com um barranco ao lado, de forma que o caminhão não poderia sair além do acostamento (evento 142, AUDIO4).
A testemunha Renan Schaffer da Silva, um dos sócios da empresa Conterra Construções e Terraplanagens Ltda., contratada pelo DNIT, declarou que, em maio de 2014, as obras de recuperação da BR-290 estavam em execução. Quanto à sinalização, não sabia informar se, no momento do acidente, havia pintura horizontal no trecho, pois esta é realizada depois de 4 a 5 dias do recapeamento (evento 149, AUDIO1).
Verifica-se, pelo conjunto probatório, que o trecho onde ocorreu o acidente estava passando por obras de recuperação, havendo indicativos de que inexistia sinalização horizontal na pista no momento da colisão, tampouco placas/cones alertando sobre as obras. Esta informação pode ser colhida, tanto dos depoimentos prestados, quanto do Boletim de Acidente de Trânsito. Logo, para qualquer motorista que lá trafegasse, a rodovia se apresentava como uma só pista; não havia limites pintados entre a faixa de rolamento e o acostamento.
Diante desse cenário probatório, devem ser prestigiados os dados constantes no Boletim de Acidente de Trânsito, lavrado pela Polícia Rodoviária Federal, sobre as condições do local no momento da colisão. Tal documento, além de partir de agente público desvinculado de qualquer das partes envolvidas neste feito, possuindo, pois, presunção de legitimidade, foi elaborado imediatamente após o acidente, o que resulta um relato mais completo e fidedigno do quadro fático.
Com essa leitura, é possível concluir que o DNIT não executou um plano preventivo de acidente no trecho da colisão. Sendo uma rodovia com grande fluxo, é de se esperar que à noite também houvesse circulação de veículos no local. Se para um cidadão comum (depoimentos) era previsível que um acidente poderia ocorrer devido à ausência de sinalização para o tráfego, para os técnicos da autarquia deveria ser um raciocínio lógico.
Por outro lado, em que pese o Réu Altemir tenha participado do acidente, há a seu favor o fato de que não havia nenhuma sinalização no local delimitando as pistas, os acostamentos e as permissões/proibições de ultrapassagem. Assim, entendo que não restou demostrada a culpa do motorista no evento danoso, pressuposto cujo ônus da prova cabe ao Autor. Ademais, não há elementos que comprovem que o veículo por ele conduzido estivesse parado com uma parte na pista de rolamento.
À toda evidência, ainda que o condutor do caminhão tivesse tempo hábil para colocar o triângulo de emergência, não se pode ignorar que as precárias condições de sinalização contribuíram decisivamente para a ocorrência dos danos. Se houvesse sinalização adequada, o acidente poderia ter sido evitado, eis que o Autor, diante dos sinais luminosos, poderia ter ultrapassado livremente o caminhão ou ter desviado a tempo de evitar a colisão.
Não se descuida do fato de que o motorista deve dirigir com redobrada atenção em face das condições da pista e do tempo (buracos, trecho sinuoso, falta de sinalização, chuva, neblina etc.). Entretanto, no presente caso, não há que falar em culpa exclusiva ou concorrente, já que, à míngua de prova a respeito, não é possível afirmar que o acidente tem origem na imperícia, imprudência ou negligência.
Diante disso, tenho que o Boletim de Acidente de Trânsito, associado à prova testemunhal, conferem respaldo à tese do autor, porquanto atestam a completa ausência de sinalização na via. A sinalização incontestavelmente precária da pista preenche o nexo de causalidade necessário entre a omissão do DNIT e o evento danoso, ensejando a responsabilidade civil da autarquia pelos danos decorrentes do acidente."
Diante do exposto, rejeito o recurso do DNIT no ponto.
Danos morais - valor da indenização - recurso do DNIT e do autor
Sobre o tema atinente aos danos morais, destaco que o autor era jovem ao tempo do grave acidente (2014), tinha apenas 22 anos de idade, e em consequência das lesões na cabeça e na perna foi inicialmente interditado e posteriormente aposentado por invalidez, com adicional de 25% sobre o benefício por necessitar de assistência permanente de terceiros para os atos da vida diária (evento 1, TCURATELA4, PRONT7 e FORM8). O laudo pericial elaborado no processo de interdição em 2016 atestou que o autor permanece com sequelas motoras e necessita de andador para caminhar, embora não apresente alienação mental (evento 89, OUT3). A função que desempenhava, de instrutor de autoescola, provavelmente nunca mais poderá realizar, e, como bem declinou a juíza de primeiro grau, "há incapacidade definitiva para diversas funções, o que limita suas chances de emprego e ascensão na carreira".
Convém assinalar que o Superior Tribunal de Justiça, em ações de acidentes de trânsito, tem fixado indenizações na faixa dos R$ 100.000,00 ou 100 salários mínimos quando houver morte de entes queridos, citando-se, exemplificativamente: a) indenização de R$ 100.000,00 por morte da genitora em acidente de trânsito (AgRg no AREsp 170555/DF, 3ª Turma, relator Ministro Sidnei Beneti, DJe 16-8-2012); b) indenização equivalente a 100 salários mínimos para cada autor por morte de genitor e companheiro em acidente de trânsito (REsp 933937/PR, 4ª Turma, rel. Ministro Luis Felipe Salomão, DJe 16-8-2012).
Os montantes variam de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto, e há, evidentemente, casos em que a Corte superior arbitrou valores bastante superiores aos antes referenciados.
Na espécie, felizmente, as consequências do acidente foram menos drásticas em relação àqueles precedentes.
Danos materiais
Entendo que, diversamente do que defendeu a recorrente, os documentos juntados aos autos são suficientes - tendo, assim, valor probante evidentemente - para comprovar os danos materiais e a necessidade de sua reparação. Nesse sentido, veja-se o que constou na sentença quanto ao ponto - adota-se as razões da sentença também como fundamentos:
"In casu, o Autor pretende o ressarcimento de R$ 2.483,20, pelo conserto das avarias na motocicleta, anexando aos autos Ordem de Serviço com a discriminação das despesas (evento 184, OUT2).
Destaco que os danos, segundo relatório de avarias, foram classificados como de 'média monta' (evento 41, OUT5), envolvendo guidão, suas fixações e comandos nele instalados, sistema de freio dianteiro, pedais de apoio do condutor e passageiro, assento, tanque de combustível, roda dianteira, coluna de direção e mesas e amortecedor dianteiro. As fotos acostadas aos autos (OUT5), que revelam o estado da motocicleta após o choque, já seriam suficientes para informar a quantia almejada.
O valor pleiteado não é elevado e não há obrigatoriedade da apresentação de três orçamentos, mormente porque a despesa já foi paga pelo Autor e se propõe a recompor os prejuízos que obteve com o evento danoso. Além disso, as despesas não foram impugnadas de forma específica pelo DNIT."
Rejeito o recurso do DNIT no ponto.
Pensionamento mensal - marco final e cumulação com pensão previdenciária
O autor não possui pensão previdenciária, razão pela qual, levando-se em conta os termos empregados pelo DNIT no recurso de apelação, deve ser rejeitado o apelo da autarquia no ponto. De todo modo, a cumulação com benefício previdenciário é possível, conforme precedentes deste Tribunal:
ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DNIT. ACIDENTE EM RODOVIA FEDERAL. CULPA CONCORRENTE. DANOS MORAIS. ARBITRAMENTO. PENSÃO MENSAL. A jurisprudência pátria tem assentado a possibilidade jurídica do pagamento de indenização decorrente de acidente de trânsito ocorrido em rodovia federal quando demonstrada a ação ou omissão imputável ao ente público no tocante à conservação e sinalização da rodovia, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa (nos termos do art. 37, §6º, CF/88). É de se reconhecer a responsabilidade do DNIT, que falhou no seu dever de manutenção das condições de segurança da via, e a responsabilidade do condutor do veículo, que não adotou as cautelas de uma direção defensiva. E, reconhecida a culpa concorrente, cada parte arcará com 50% das despesas do acidente. No arbitramento da indenização advinda de danos morais, o julgador deve se valer do bom senso e razoabilidade, atendendo às peculiaridades do caso, não podendo ser fixado quantum que torne irrisória a condenação, tampouco valor vultoso que traduza enriquecimento ilícito. Indenização por danos morais mantida. Não é incompatível o recebimento de benefício previdenciário com a fixação de pensão de natureza civil. (TRF4 5041380-13.2017.4.04.7100, QUARTA TURMA, Relatora VIVIAN JOSETE PANTALEÃO CAMINHA, juntado aos autos em 04/04/2019)
Quanto ao marco final do pensionamento (o que implicaria na redução do montante total a ser alcançado ao autor), entendo que também não merece acolhimento o recurso do DNIT. Consultando as tabelas de expectativa de vida do IBGE constata-se que, em 2016 (a tabela anual mais próxima de 2014 é essa), a expectativa de vida para homens era bem maior do que os 65 anos defendido pelo DNIT e bem mais próxima dos 75 anos fixado na sentença. Assim, mesmo que se considere um pouco de redução em relação à tabela do ano de 2016 (o acidente ocorreu em 2014), não é possível acolher o pleito da autarquia considerando os seus termos, devendo ser mantida a sentença no ponto.
Correção monetária
A validade jurídico-constitucional da correção monetária e dos juros moratórios incidentes sobre as condenações impostas à Fazenda Pública, nos termos previstos pelo art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/2009, foi objeto de debate no STF, em sede de repercussão geral, suscitada no RE 870.947. Na sessão de 20/09/2017, o Plenário do STF proferiu julgamento aprovando a tese de repercussão geral de nº 810, nos seguintes termos:
Juros de mora:
O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09.
Correção monetária:
O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina.
Cabe salientar que o STF rejeitou os embargos de declaração opostos contra a decisão que aprovou a tese acima, não modulando os efeitos da decisão anteriormente proferida e consignando que o IPCA-E deve ser aplicado a partir de junho de 2009 (Plenário do STF, julgamento ocorrido em 03-10-2019).
Portanto, é descabida a aplicação da TR como índice de correção monetária das condenações judiciais impostas à Fazenda Pública. Em seu lugar, deve-se adotar o IPCA-E, índice que melhor reflete a inflação acumulada do período.
Desse modo, deve ser rejeitado o recurso do DNIT no ponto, estando correta a sentença.
Mérito - recurso do autor
Pensionamento mensal - parcela única
Quanto ao ponto, veja-se o que constou na sentença:
"Por fim, esclareço que a regra do parágrafo único do art. 950 do CC, que autoriza o pagamento de indenização em parcela única, é interpretada pelo STJ não como um direito absoluto do credor, mas está sujeito à avaliação do Juízo quanto à necessidade e à conveniência no caso concreto (REsp 1531096/PR, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, 3ª TURMA, julgado em 17/05/16, DJe 23/05/16).
A medida não se afigura necessária neste caso, pois o DNIT é autarquia vinculada à administração pública federal, com capacidade de pagamento. Dada a solvência do DNIT, não há necessidade de constituição de capital, sendo improcedente o pedido neste ponto."
Além de se considerar o que foi consignado na sentença, veja-se a seguinte decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ):
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS, MORAIS E ESTÉTICOS. ACIDENTE DE TRÂNSITO QUE DEIXOU O AUTOR PARAPLÉGICO. EMPRESA DE TRANSPORTE CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. OMISSÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. INEXISTÊNCIA. MAJORAÇÃO DO VALOR DAS INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS E ESTÉTICOS. CABIMENTO. PENSIONAMENTO MENSAL. PAGAMENTO EM PARCELA ÚNICA. ART. 950, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CC. DESCABIMENTO, NO CASO. NECESSIDADE DA CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. SÚMULA 313/STJ. JUROS DE MORA. TERMO INICIAL. DATA DA CITAÇÃO. PROVIMENTO PARCIAL APENAS DO RECURSO DO AUTOR.
1. Consoante dispõe o art. 535 do CPC destinam-se os embargos de declaração a expungir do julgado eventuais omissão, obscuridade ou contradição, não se caracterizando via própria ao rejulgamento da causa.
2. O dano moral decorrente da perda de parente, em regra, traduz-se em abrandamento da dor emocional sofrida pela parte, mas que tende a se diluir com o passar do tempo. Já nas hipóteses de amputação de membros, paraplegias ou tetraplegias, a própria vítima é quem sofre pessoalmente com as agruras decorrentes do ato ilícito praticado, cujas consequências se estenderão por todos os dias da sua vida. No presente caso, entre outras circunstâncias, o fato de o autor ter ficado paraplégico quando tinha apenas 20 (vinte) anos de idade, no auge de sua juventude, recomenda a majoração do valor da indenização por danos morais para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) e dos danos estéticos para R$ 200.000,00 (duzentos mil reais).
3. A regra prevista no art. 950, parágrafo único, do CC, que permite o pagamento da pensão mensal de uma só vez, não deve ser interpretada como direito absoluto da parte, podendo o magistrado avaliar, em cada caso concreto, sobre a conveniência de sua aplicação, a fim de evitar, de um lado, que a satisfação do crédito do beneficiário fique ameaçada e, de outro, que haja risco de o devedor ser levado à ruína. Na espécie, a fim de assegurar o efetivo pagamento das prestações mensais estipuladas, faz-se necessária a constituição de capital ou caução fidejussória para esse fim, nos termos da Súmula 313 deste Tribunal.
4. Nos casos de responsabilidade contratual, o termo inicial para a incidência dos juros de mora é a data da citação.
5. Recurso especial do autor provido parcialmente e desprovido o recurso da ré.
(REsp 1349968/DF, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 14/04/2015, DJe 04/05/2015) (destaquei)
Assim, entendo que, ainda que queira o autor receber de uma só vez, tendo em vista as considerações feitas na sentença (antes colacionadas) e o que se encontra na decisão do STJ acima indicada, deve ser rejeitado o seu pleito no ponto.
Pensionamento mensal - majoração
Diversamente do que sustenta o autor, o documento apontado como prova de que receberia 2 salários mínimos por ocasião da ocorrência do acidente não é prova disso na verdade. Trata-se um extrato bancário (ev. 01, OUT3, dos autos originários) que contém, aparentemente, a indicação de valores esparsos que estariam relacionados, possivelmente, ao recebimento de salários. Mas não é possível uma conclusão certa sobre quanto efetivamente recebia o autor mensalmente, parecendo que, pelo contrário, não recebia o autor o montante alegado equivalente a 2 salários mínimos. Em suma: a prova juntada aos autos, quanto ao ponto, é precária. Não bastasse isso, o autor receberá um salário mínimo por mês a título de pensão civil em decorrência do acidente, o que não significa que será só isso que receberá, já que está aposentado por invalidez, benefício esse que substitui, em parte, também o que recebia antes do acidente.
Assim, rejeito o pedido de majoração do valor mensal da pensão civil fixada em decorrência do acidente.
Como se vê, o acórdão embargado não padece de qualquer vício. Ainda assim, convém esclarecer que a responsabilização do DNIT ocorreu não de forma objetiva, mas subjetivamente pela omissão do Estado consubstanciada na teoria da falta do serviço (faute du service), que prevê responsabilização estatal somente quando o serviço público não funciona, funciona mal ou funciona tardiamente. No caso, a precariedade das condições de sinalização da pista (não havia nenhuma sinalização no local delimitando as pistas, os acostamentos e as permissões/proibições de ultrapassagem) não deixa dúvidas acerca da omissão da autarquia federal em seu dever de bem sinalizar a rodovia.
Cito trecho do acórdão embargado elucidativo no ponto:
Verifica-se, pelo conjunto probatório, que o trecho onde ocorreu o acidente estava passando por obras de recuperação, havendo indicativos de que inexistia sinalização horizontal na pista no momento da colisão, tampouco placas/cones alertando sobre as obras
Da mesma forma, o acórdão embargado não incorre em contradição tampouco configura bis in idem o pagamento de pensão mensal civil e o benefício previdenciário, porquanto possuem naturezas distintas e são cumuláveis (artigo 950 do Código Civil) (TRF4, AC 5007532-34.2014.4.04.7005, 4ª Turma, Rel. Des. Federal Vivian Josete Pantaleão Caminha, DJe 28/04/2021).
Por fim, quanto ao termo inicial para os consectários legais relativos ao dano moral, verifico não ter sido objeto de apelo, no qual o apelante se limitou a postular "a reforma da sentença recorrida eis que o correto, em razão do disposto na Lei 11960/2009, é a aplicação da variação da TR a partir de 07/2009".
Como se vê, as razões postas nos declaratórios buscam, claramente, a rediscussão da matéria de mérito, sendo de se consignar que a atribuição de efeito infringente, não obstante admissível, só se admite em casos excepcionalíssimos e após o devido contraditório (artigo 1.023, § 2º, do CPC), situação inocorrente na hipótese dos autos.
Saliento que o julgador não está obrigado a se manifestar sobre todas as teses levantadas pelas partes, bastando que os fundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.
Por fim, acrescento que os fundamentos utilizados foram suficientes para embasar a decisão, bem como possibilitam a impugnação recursal aos Tribunais Superiores, uma vez que o "prequestionamento" se refere à emissão de juízo sobre a matéria posta em discussão, e não a expressa referência a dispositivos legais. Mesmo que assim não fosse, o artigo 1.025 do CPC de 2015 dispõe que "consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante suscitou, para fins de prequestionamento, ainda que os embargos de declaração sejam inadmitidos ou rejeitados".
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento aos embargos de declaração, apenas para fins de esclarecimento e prequestionamento, sem ensejar alteração no resultado do julgamento.
Documento eletrônico assinado por MARGA INGE BARTH TESSLER, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003046401v43 e do código CRC 1bc1f8e7.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARGA INGE BARTH TESSLER
Data e Hora: 9/3/2022, às 15:57:21
Conferência de autenticidade emitida em 17/03/2022 16:01:12.
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Cível Nº 5031248-28.2016.4.04.7100/RS
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
EMBARGANTE: DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT (RÉU)
EMENTA
EMBARGOS DECLARATÓRIOS. OMISSÃO. CONTRADIÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. PAGAMENTO DE PENSÃO MENSAL CIVIL. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REDISCUSSÃO.ESCLARECIMENTO. PREQUESTIONAMENTO
1. Acréscimo à fundamentação para fins de esclarecimento, sem qualquer efeito modificativo, de que a responsabilização do DNIT ocorreu não de forma objetiva, mas subjetivamente pela omissão do Estado consubstanciada na teoria da falta do serviço (faute du service), que prevê responsabilização estatal somente quando o serviço público não funciona, funciona mal ou funciona tardiamente.
2. O acórdão embargado não incorre em contradição tampouco configura bis in idem o pagamento de pensão mensal civil e o benefício previdenciário, porquanto possuem naturezas distintas e são cumuláveis Precedente TRF4.
3. Quanto ao pedido de prequestionamento, cabe ressaltar que, a teor do artigo 1.025 do Novo Código de Processo Civil, é suficiente a mera suscitação da matéria para se obter tal desiderato.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento aos embargos de declaração, apenas para fins de esclarecimento e prequestionamento, sem ensejar alteração no resultado do julgamento, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 08 de março de 2022.
Documento eletrônico assinado por MARGA INGE BARTH TESSLER, Desembargadora Federal, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003046402v6 e do código CRC 67218953.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): MARGA INGE BARTH TESSLER
Data e Hora: 9/3/2022, às 15:57:21
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 24/02/2022 A 08/03/2022
Apelação Cível Nº 5031248-28.2016.4.04.7100/RS
INCIDENTE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
RELATORA: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
PRESIDENTE: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
PROCURADOR(A): FÁBIO BENTO ALVES
APELANTE: PAULO MISAEL TAVARES MACHADO (Absolutamente Incapaz (Art. 3º CC)) (AUTOR)
ADVOGADO: GABRIELA PEREIRA LOUZADA (OAB RS072689)
APELANTE: DEPARTAMENTO NACIONAL DE INFRA-ESTRUTURA DE TRANSPORTES - DNIT (RÉU)
APELADO: ALTEMIR DOS SANTOS (RÉU)
ADVOGADO: LAIS DA ROSA INACIO (OAB SC037415)
APELADO: OS MESMOS
MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 24/02/2022, às 00:00, a 08/03/2022, às 14:00, na sequência 10, disponibilizada no DE de 15/02/2022.
Certifico que a 3ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 3ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, APENAS PARA FINS DE ESCLARECIMENTO E PREQUESTIONAMENTO, SEM ENSEJAR ALTERAÇÃO NO RESULTADO DO JULGAMENTO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargadora Federal MARGA INGE BARTH TESSLER
Votante: Desembargador Federal ROGERIO FAVRETO
Votante: Desembargadora Federal VÂNIA HACK DE ALMEIDA
GILBERTO FLORES DO NASCIMENTO
Secretário
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