Apelação Cível Nº 5002081-91.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: ZENAIR FAGGION
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente pedido de auxílio-doença, por não comprovada incapacidade, condenando a parte autora em custas e honorários de R$300,00, suspensa a exigibilidade em virtude da gratuidade da justiça.
A parte autora apelou alegando cerceamento de defesa e necessidade de realização de nova perícia, com profissional diverso. No mérito, defendeu seja reformada a sentença para que seja concedida a aposentadoria por invalidez desde a cessação administrativa, ou, ao menos, auxílio-doença enquanto perdurar sua moléstia.
Com contrarrazões remissivas, subiram os autos ao Tribunal para julgamento.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
O apelo preenche os requisitos de admissibilidade.
Benefício por incapacidade
Conforme o disposto no art. 59 da Lei n.º 8.213/91, o auxílio-doença é devido ao segurado que, havendo cumprido o período de carência, salvo as exceções legalmente previstas, ficar incapacitado para o seu trabalho ou para a sua atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias consecutivos.
A aposentadoria por invalidez, por sua vez, será concedida ao segurado que, uma vez cumprida, quando for o caso, a carência exigida, for considerado incapaz e insuscetível de reabilitação para o exercício de atividade que lhe garanta a subsistência, sendo-lhe paga enquanto permanecer nessa condição, nos termos do art. 42 da Lei de Benefícios da Previdência Social.
A lei de regência estabelece que a carência exigida para a obtenção desses benefícios é de 12 (doze) contribuições mensais (art. 25, I), salvo nos casos legalmente previstos.
Em sendo a incapacidade anterior à filiação ao RGPS, ou à recuperação da condição de segurado, resulta afastada a cobertura previdenciária (art. 42, §2º e art. 59, §1º).
Caso concreto
A autora, agricultora, nascida em 14/02/64, ajuizou ação em 20/06/18, objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença desde o requerimento administrativo, ocorrido dia 28/03/2018 (NB6225223260), indeferido por não constatada incapacidade.
Do extrato CNIS da autora, consta:
1 | 1.235.570.336-3 | 95.195.186/0014-02 | MASSA FALIDA INDUSTRIAS BERGER SA COUROS E CALCADOS | Empregado | 13/06/1989 | 14/06/1989 | 06/1989 | |||
2 | 1.235.570.336-3 | PERÍODO DE ATIVIDADE DE SEGURADO ESPECIAL | Segurado Especial | 01/01/1998 | 20/02/2019 | ASE_DEF | ||||
3 | 1.235.570.336-3 | 5388082055 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | 10/12/2009 | 10/01/2010 | ||||
4 | 1.235.570.336-3 | 5457353377 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | 14/04/2011 | 29/04/2011 | ||||
5 | 1.235.570.336-3 | 5511536772 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | 18/04/2012 | 08/05/2012 | ||||
6 | 1.235.570.336-3 | 6184930730 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | 10/02/2014 | 04/09/2017 | ||||
7 | 1.235.570.336-3 | 1912759826 | 41 - APOSENTADORIA POR IDADE | Não Informado | 20/02/2019 | |||||
8 | 1.235.570.336-3 | 6067316335 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | ||||||
9 | 1.235.570.336-3 | 6225223260 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado | ||||||
10 | 1.235.570.336-3 | 6159151359 | 31 - AUXILIO DOENCA PREVIDENCIARIO | Não Informado |
- Incapacidade
A prova pericial é fundamental nos casos de benefício por incapacidade e tem como função elucidar os fatos trazidos ao processo. Submete-se ao princípio do contraditório, oportunizando-se, como no caso dos autos, a participação das partes na sua produção e a manifestação sobre os dados e conclusões técnicas apresentadas. Não importa, por outro lado, que seu resultado não atenda à expectativa de um dos demandantes ou mesmo de ambos, porque se destina a colher elementos necessários à formação do convencimento do juízo, ao qual incumbe decidir sobre a sua realização e eventual complementação e, posteriormente, apreciar seu poder de esclarecimento dos fatos, cotejando a perícia com os demais elementos carreados ao processo.
O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do art. 479 do CPC, mas se entender por não acolher as conclusões do perito, à luz dos demais elementos presentes nos autos, deverá indicar os motivos que o levam a entendimento diverso.
Durante a instrução processual, em 19/07/18, foi realizada perícia médica por especialista em psiquiatria e medicina do trablaho, que atestou ser a autora portadora de hipertensão arterial sistêmica I 10 e transtorno depressivo ansioso F 41.2, que não a incapacitam para o trabalho.
Da perícia, extrai-se:
4. IDENTIFICAÇÃO: RG: 8099017901 Zenair Faggion, 54 anos, feminino, branca, solteira, agricultora, natural de São Valentim do Sul e moradora de Vespasiano Correa, estado do Rio Grande do Sul.
5.HISTÓRIA CLÍNICA: Relata a autora que há 4 anos sente dor nos braços. Procurou atendimento médico e refere a realização de ecografia (que não apresentou) que mostrou epcondilite. Há 10 anos, com a morte do pai, relata ter tido episódios de tristeza e choro. Há 5 meses refere ter sintomatologia agudizada com a perda da mãe. Faz uso de citalopram e alprazolam. Refere hipertensão arterial há 5 anos, fazendo uso de enalapril. Realizou perineoplastia há um ano.
Como referido acima, ao decidir, esta Corte não está vinculada às conclusões do laudo pericial, havendo elementos substanciais nos autos que apontam para solução diversa da aventada na perícia.
No caso, constam dos autos: atestado médico de profissional do sistema único de saúde, de 14/03/18, atestando incapacidade em decorrência de epicondilite bilateral e aguardando cirurugia para bexiga e de médico psiquiatra, de 22/03/18, informando incapacidade em decorrência de depressão.
O próprio expert afirmou que a autora faz uso de antidepressivos e ansiolíticos (citalopram e alprazolam), bem como medicamento para controle de hipertensão arterial (enalapril), estando acometida por sintomas depressivos há cerca de 10 (dez) anos.
Além disso, a autora já percebeu benefício de auxílio-doença por três anos (10/02/2014 até 04/09/2017) em razão do mesmo diagnóstico de epicondilite (CID M77) e transtorno depressivo leve (CID F33.0)
Portanto, do cotejo probatório, conclui-se que não cessou a incapacidade em 2017 e, presentes os demais requisitos, faz jus a parte autora ao benefício de auxílio-doença desde a DER (28/03/18), conforme requerido, até a data em que aposentada por idade (20/02/19).
Consectários e provimento finais
- Correção monetária
A correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme a variação dos seguintes índices:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91, na redação da Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11/08/2006, e art. 31 da Lei n.º 10.741/03, que determina a aplicação do índice de reajustamento dos benefícios do RGPS às parcelas pagas em atraso).
A utilização da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, que fora prevista na Lei 11.960/2009, que introduziu o art. 1º-F na Lei 9.494/97, foi afastada pelo STF no julgamento do tema 810, através do RE 870947, com repercussão geral, com trânsito em julgado em 03/03/2020.
No julgamento do tema 905, através do REsp 1.495146, e interpretando o julgamento do STF, transitado em julgado em 11/02/2020, o STJ definiu quais os índices que se aplicariam em substituição à TR, concluindo que aos benefícios assistenciais deveria ser utilizado IPCA-E, conforme decidiu a Suprema Corte, no recurso representativo da controvérsia e que, aos previdenciários, voltaria a ser aplicável o INPC, uma vez que a inconstitucionalidade reconhecida restabeleceu a validade e os efeitos da legislação anterior, que determinava a adoção deste último índice, nos termos acima indicados.
A conjugação dos precedentes dos tribunais superiores resulta, assim, na aplicação do INPC aos benefícios previdenciários, a partir de abril 2006, reservando-se a aplicação do IPCA-E aos benefícios de natureza assistencial.
Importante ter presente, para a adequada compreensão do eventual impacto sobre os créditos dos segurados, que os índices em referência - INPC e IPCA-E tiveram variação muito próxima no período de julho de 2009 (data em que começou a vigorar a TR) e até setembro de 2019, quando julgados os embargos de declaração no RE 870947 pelo STF (IPCA-E: 76,77%; INPC 75,11), de forma que a adoção de um ou outro índice nas decisões judiciais já proferidas não produzirá diferenças significativas sobre o valor da condenação.
Juros de mora
Os juros de mora devem incidir a partir da citação.
Até 29-06-2009, já tendo havido citação, deve-se adotar a taxa de 1% ao mês a título de juros de mora, conforme o art. 3º do Decreto-Lei n. 2.322/87, aplicável analogicamente aos benefícios pagos com atraso, tendo em vista o seu caráter eminentemente alimentar, consoante firme entendimento consagrado na jurisprudência do STJ e na Súmula 75 desta Corte.
A partir de então, deve haver incidência dos juros, uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo percentual aplicado à caderneta de poupança, nos termos estabelecidos no art. 1º-F, da Lei 9.494/97, na redação da Lei 11.960/2009, considerado, no ponto, constitucional pelo STF no RE 870947, decisão com repercussão geral.
Os juros de mora devem ser calculados sem capitalização, tendo em vista que o dispositivo legal em referência determina que os índices devem ser aplicados "uma única vez" e porque a capitalização, no direito brasileiro, pressupõe expressa autorização legal (STJ, AgRgno AgRg no Ag 1211604/SP).
Honorários Advocatícios
Tendo em vista que a sentença foi publicada sob a égide do novo CPC, é aplicável quanto à sucumbência aquele regramento.
Considerando a natureza previdenciária da causa, bem como a existência de parcelas vencidas, e tendo presente que o valor da condenação não excederá de 200 salários mínimos, os honorários de sucumbência devem ser fixados originariamente em 10% sobre as parcelas vencidas, nos termos do artigo 85, §3º, inciso I, do CPC. Conforme a Súmula n.º 111 do Superior Tribunal de Justiça, a verba honorária deve incidir sobre as prestações vencidas até a data da decisão de procedência (acórdão).
Custas
O INSS é isento de custas quando demandado no Foro Federal (art. 4, I, Lei 9.289/96).
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar provimento à apelação.
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Apelação Cível Nº 5002081-91.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
APELANTE: ZENAIR FAGGION
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. INCAPACIDADE COMPROVADA. AUXÍLIO-DOENÇA. DIREITO AO BENEFÍCIO.
1. Ao decidir, esta Corte não está vinculada às conclusões do laudo pericial, havendo elementos substanciais nos autos que apontam para solução diversa da aventada na perícia.
2. Comprovada, do cotejo probatório, que não cessou a incapacidade desde o último benefício recebido, é devido o auxílio-doença até, no caso, a data em que a parte autora foi aposentada por idade.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar provimento à apelação, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 19 de agosto de 2020.
Documento eletrônico assinado por TAIS SCHILLING FERRAZ, Juíza Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40001961775v3 e do código CRC 9bac2023.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO Telepresencial DE 19/08/2020
Apelação Cível Nº 5002081-91.2019.4.04.9999/RS
RELATORA: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
PRESIDENTE: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PROCURADOR(A): CLAUDIO DUTRA FONTELLA
APELANTE: ZENAIR FAGGION
ADVOGADO: DANIEL NATAL BRUNETTO (OAB RS063345)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 19/08/2020, na sequência 696, disponibilizada no DE de 06/08/2020.
Certifico que a 6ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 6ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO À APELAÇÃO.
RELATORA DO ACÓRDÃO: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juíza Federal TAIS SCHILLING FERRAZ
Votante: Juiz Federal JULIO GUILHERME BEREZOSKI SCHATTSCHNEIDER
Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA
PAULO ROBERTO DO AMARAL NUNES
Secretário
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