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INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. TEMPO ESPECIAL. COISA JULGADA. AGENTE NOCIVO DIVERSO. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. REQUISITOS. AUSÊNCIA. INADM...

Data da publicação: 10/11/2022, 07:00:59

EMENTA: INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. TEMPO ESPECIAL. COISA JULGADA. AGENTE NOCIVO DIVERSO. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. REQUISITOS. AUSÊNCIA. INADMISSIBILIDADE DO INCIDENTE. 1. A instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas reclama a presença, concomitante, dos seguintes requisitos: a) efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; b) risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica e c) inexistência de afetação de recurso repetitivo nos Tribunais Superiores, no âmbito de suas respectivas competências, para definição de tese sobre a mesma questão de direito material ou processual, que seja objeto do incidente. 2. Além disso, a doutrina aponta que o processamento do incidente de resolução de demandas repetitivas reclama a existência de causa pendente no Tribunal. 3. Para fins de admissibilidade do IRDR, não basta a multiplicidade de decisões judiciais sobre a mesma questão controvertida, exigindo-se, também, a existência de efetivo risco à isonomia e à segurança jurídica, decorrente de dissenso no exame da questão por diferentes órgãos judiciários, suficiente para afetar a referência da orientação jurisprudencial sobre a matéria. 4. No caso concreto, o suscitante não logrou demonstrar a presença de todos esses requisitos. 5. Ausentes os requisitos de admissibilidade, impõe-se a rejeição do IRDR. (TRF4 5042114-45.2022.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 02/11/2022)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) Nº 5042114-45.2022.4.04.0000/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5015143-74.2019.4.04.7001/RS

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

SUSCITANTE: JOSE ROBERTO VICENTE

ADVOGADO: RICARDO OSSOVSKI RICHTER (OAB PR040704)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

RELATÓRIO

Trata-se de pedido de instauração de incidente de resolução de demandas repetitivas, suscitado por JOSE ROBERTO VICENTE, no bojo da Apelação Cível nº 50151437420194047001, em tramitação perante a 11ª Turma deste Tribunal.

O suscitante refere que o processo originário cuida-se de ação revisional de aposentadoria por tempo de contribuição, para o fim de convertê-la em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período de labor sob condições especiais em face da penosidade da atividade de motorista de caminhão.

Menciona que a ação foi extinta sem julgamento de mérito, em primeiro grau, em face do reconhecimento da coisa julgada em relação a outra ação por ele ajuizada (autos nº 5013107- 40.2011.404.7001), na qual fora postulado o reconhecimento da especialidade do mnesmo período com base na exposição ao agente nocivo ruído.

Diz que há controvérsia jurisprudencial entre Turmas deste Tribunal, no tocante à extensão dos efeitos da coisa julgada, em se tratando de pedido de reconhecimento de atividade especial balizada em agente insalubre não deduzido na primeira ação ajuizada.

Alega que o atual Código de Processo Civil adotou, em seu artigo 468, a limitação objetiva da coisa julgada ao dispositivo da sentença, de sorte que somente aquilo que foi deduzido no processo e, por conseguinte, objeto de cognição judicial, é alcançado pela autoridade da coisa julgada.

Aponta a existência de precedentes em sentido contrário à sentença recorrida nos autos originários, da 6ª Turma e da 9ª Turma deste Tribunal.

Pede seja admitido o presente incidente, com a suspensão dos processos individuais ou coletivos em tramitação, com idêntica controvérsia, para o fim de que seja, ao final, julgado procedente, fixando-se a seguinte tese jurídica: "inaplicabilidade dos efeitos da coisa julgada, quando o pedido de reconhecimento de atividade especial, não ter sido requerido especificamente pelo agente abordado em nova demanda, ou seja, não requerido em demanda anterior".

Autuado o presente incidente perante este Tribunal, a Presidência distribuiu-o sob minha Relatoria, no âmbito da 3ª Seção, por sorteio, na forma regimental.

VOTO

Inicialmente, registro que trago o presente IRDR para análise de sua admissibilidade na primeira sessão de julgamento subsequente à distribuição do incidente sob minha Relatoria.

Passa-se ao juízo de admissibilidade do IRDR.

A respeito dos pressupostos de admissibilidade do incidente de resolução de demandas repetitivas, cumpre transcrever o disposto no Código de Processo Civil:

Art. 976. É cabível a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas quando houver, simultaneamente:

I - efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito;

II - risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica.

§ 1º A desistência ou o abandono do processo não impede o exame de mérito do incidente.

§ 2º Se não for o requerente, o Ministério Público intervirá obrigatoriamente no incidente e deverá assumir sua titularidade em caso de desistência ou de abandono.

§ 3º A inadmissão do incidente de resolução de demandas repetitivas por ausência de qualquer de seus pressupostos de admissibilidade não impede que, uma vez satisfeito o requisito, seja o incidente novamente suscitado.

§ 4º É incabível o incidente de resolução de demandas repetitivas quando um dos tribunais superiores, no âmbito de sua respectiva competência, já tiver afetado recurso para definição de tese sobre questão de direito material ou processual repetitiva.

§ 5º Não serão exigidas custas processuais no incidente de resolução de demandas repetitivas.

Verifica-se, portanto, os seguintes requisitos para a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas:

a) efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito;

b) risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica e

c) inexistência de afetação de recurso repetitivo nos Tribunais Superiores, no âmbito de suas respectivas competências, para definição de tese sobre a mesma questão de direito material ou processual, que seja objeto do incidente (pressuposto negativo).

Além disso, o processamento do incidente de resolução de demandas repetitivas reclama a existência de causa pendente, como revela a doutrina:

O IRDR somente é cabível, se (a) houver efetiva repetição de processos e risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica, (b) a questão for unicamente de direito e (c) houver causa pendente no tribunal

(...)

Ainda, é preciso que haja causa pendente no Tribunal. O IRDR é instaurado a partir de um caso que esteja no tribunal, seja um processo originário, seja um recurso (inclusive a remessa necessária). Somente cabe o IRDR enquanto pendente causa de competência do tribunal. A causa de competência do tribunal pode ser recursal ou originária. Caberá o IRDR, se estiver pendente de julgamento no tribunal uma apelação, um agravo de instrumento, uma ação rescisória, um mandado de segurança, enfim, uma causa recursal ou originária. Se já encerrado o julgamento, não cabe mais o IRDR. Os interessados poderão suscitar o IRDR em outra causa pendente, mas não naquela que já foi julgada. (DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Processo Civil: o processo civil nos tribunais, recursos, ações de competência originária de tribunal e querela nullitatis, incidentes de competência originária do tribunal. 13ª ed. Salvador: Ed. Jus Podivm, 2016, p. 626-628 - grifado.)

Essa conclusão, inclusive, restou aprovada pelo Fórum Permanente de Processualistas Civis no Enunciado nº 344, que assim preceitua:

A instauração do incidente pressupõe a existência de processo pendente no respectivo tribunal. (DIDIER Jr., Fredie; TALAMINI, Eduardo; NUNES, Dierle; CREMASCO, Suzana; FRANÇA, Marina; JAYME, Fernando. Carta de Belo Horizonte –Enunciados do Fórum Permanente de Processualistas Civis. Salvador: Editora Jus Podivm, 2015 - grifado.)

Outrossim, cabe mencionar que o incidente de resolução de demandas repetitivas possui natureza de processo objetivo, que visa à formação concentrada de precedente de aplicação obrigatória (artigo 927, inciso III, do Código de Processo Civil), não se admitindo sua utilização como via recursal substitutiva para o reexame de mérito de questões já decididas.

Nesse sentido, reproduz-se o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS - IRDR. REQUISITO. EXISTÊNCIA DE PROCESSO EM TRÂMITE. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE DO INCIDENTE. INVIABILIDADE. VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. INEXISTÊNCIA.
I - Na origem, o Fisco ajuizou execução fiscal contra contribuinte, tendo sido determinada a suspensão do processo pelo Juízo de primeira instância, sob o fundamento, em suma, de que o débito tributário estava garantido por seguro-garantia. O Fisco Estadual interpôs agravo de instrumento, tendo o Tribunal de origem deferido a tutela provisória recursal, decidindo que a suspensão do registro no CADIN Estadual depende da suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Opostos os declaratórios, a contribuinte requereu a instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas - IRDR para fazer prevalecer a tese jurídica de que a suspensão do registro no CADIN Estadual não requer a suspensão da exigibilidade do crédito tributário quando o débito estiver garantido por garantia idônea. II - No caso, o Tribunal de origem inadmitiu a instauração do IRDR, sob o fundamento de que o caso (agravo de instrumento) não poderia ser mais considerado como apto à instauração do IRDR, considerando que não havia mais pendência do agravo para fins de admissibilidade do incidente. Isso porque o que pendia era apenas o julgamento dos embargos declaratórios, que possuem caráter meramente integrativo e cuja oposição nem sequer fora noticiada antes da realização do juízo de admissibilidade do IRDR.
III - No recurso especial, a contribuinte sustenta que o caso estava apto à fixação da tese jurídica no IRDR, considerando que, além de preenchidos os demais requisitos de admissibilidade, o agravo ainda estava pendente de julgamento, em razão da oposição dos declaratórios, antes do juízo de admissibilidade do IRDR.
IV - Impõe-se o afastamento da alegada violação do art. 1.022 do CPC/2015, quando a questão apontada como omitida pela recorrente - acerca da pendência de julgamento da causa em razão dos declaratórios distribuídos - foi examinada no acórdão recorrido, caracterizando o intuito revisional dos embargos de declaração.
V - O cerne da controvérsia consiste em decidir se seria admissível a instauração do IRDR pela escolha de um caso que já tenha sido objeto de julgamento, mas cujos embargos de declaração ainda não foram julgados. Ocorre que, após o julgamento do mérito do recurso do qual se extrairia a tese jurídica, não há que se falar em pendência do caso para fins de instauração do IRDR, diante do obstáculo à formação concentrada do precedente obrigatório. VI - O cabimento do IRDR, condiciona-se à pendência de julgamento, no tribunal, de uma causa recursal ou originária. Se já encerrado o julgamento, não caberá mais a instauração do IRDR, senão em outra causa pendente; mas não naquela que já foi julgada. Nesse sentido, o Enunciado n. 344 do Fórum Permanente de Processualistas Civis.
VII - Inserido no microssistema de formação concentrada de precedente obrigatório (arts. 489, § 1º, 984, § 2°, e 1.038, § 3°, CPC/2015), o IRDR extrai sua legitimidade jurídica não apenas de simples previsão legal. Afastando-se de um mero processo de partes (destinado à decisão de um conflito singular), ostenta natureza de processo objetivo, em que legitimados adequados previstos em lei requerem a instauração de incidente cuja função precípua é permitir um ambiente de pluralização do debate, em que sejam isonomicamente enfrentados todos os argumentos contrários e favoráveis à tese jurídica discutida; bem como seja ampliado e qualificado o contraditório, com possibilidade de audiências públicas e participação de amicus curiae (arts. 138, 927, § 2º, 983, 1.038, I e II, todos do CPC/2015). VIII - Tendo em vista a concepção dinâmica do contraditório como efetiva oportunidade de influenciar a decisão no procedimento (arts. 10 e 489, § 1º, do CPC/2015), o diferimento da análise da seleção da causa e admissibilidade do IRDR para o momento dos embargos de declaração importaria prejuízo à paridade argumentativa processual, considerando que esse desequilíbrio inicial certamente arriscaria a isonômica distribuição do ônus argumentativo a ser desenvolvido, mesmo que os argumentos fossem pretensamente esgotados durante o curso do incidente.
IX - Verifica-se que, de qualquer forma, o pedido de instauração do IRDR parece ter sido utilizado como via substitutiva - em uma causa multimilionária - para fins de reexame do mérito, quando já esgotadas todas as possibilidades recursais. Contudo, o IRDR não pode ser utilizado como sucedâneo recursal.
X - Agravo conhecido para conhecer parcialmente do recurso e, nessa parte, negar-lhe provimento.
(AREsp 1470017/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/10/2019, DJe 18/10/2019 - grifado.)

Outrossim, para que seja possível a instauração do IRDR, é necessário que a questão de direito que ele objetiva solucionar seja rigorosamente pertinente ao feito no qual se pretende que ele seja instaurado.

E isto porque de nada adiantaria sua instauração se não houvesse correlação efetiva e direta entre o entendimento que se pretende uniformizar e a questão concreta a ser analisada nos autos do processo respectivo.

Pois bem.

Verifica-se que há causa pendente neste Tribunal, uma vez que a Apelação Cível nº 5015143-74.2019.4.04.7001 ainda não foi julgada pela 11ª Turma.

Além disso, não há notícia de que a questão que constitui objeto do presente IRDR também constitua objeto de recurso afetado na sistemática dos recursos repetitivos perante os Tribunais Superiores.

No que diz respeito aos demais requisitos, tecem-se as seguintes considerações.

A efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito exige a demonstração da existência de dissídio judicial em uma quantidade expressiva de ações versando sobre a matéria litigiosa, capaz de justificar a instauração do IRDR como instrumento efetivo para a racionalidade do sistema judiciário.

Não basta, porém, a multiplicidade de decisões judiciais sobre a mesma questão controvertida.

Exige-se, cumulativamente, a existência de efetivo risco à isonomia e à segurança jurídica, decorrente de dissenso no exame da questão por diferentes órgãos judiciários, suficiente para afetar a referência da orientação jurisprudencial sobre a matéria.

No caso concreto, o suscitante limitou-se a colacionar dois precedentes de órgãos fracionários deste Tribunal, ambos favoráveis à tese por ele defendida (e, portanto, contrários ao entendimento firmado na sentença proferida nos autos originários a este incidente).

Tais precedentes são os seguintes:

PREVIDENCIÁRIO. EFICÁCIA PRECLUSIVA DA COISA JULGADA. COISA JULGADA FICTA OU PRESUMIDA. INCOMPATIBILIDADE NO PROCESSO PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. AGENTE NOCIVO DIVERSO DA PRIMEIRA AÇÃO. NOVA CAUSA DE PEDIR. JULGAMENTO REALIZADO NA FORMA DO ART. 942 DO NCPC. 1. Hipótese em que na primeira ação buscava-se o reconhecimento da especialidade em razão da exposição ao agente nocivo ruído e na segunda ação em face da exposição a agentes químicos. 2. Quinada jurisprudencial que recomenda cautela no exame do alcance da coisa julgada. 3. Se a causa de pedir é diferente, não há falar em identidade de ações, pressuposto material da coisa julgada. 4. Para a melhor leitura das regras dos artigos 474 do CPC/73 e 508 do CPC/15, consoante a doutrina majoritária, capitaneada por Barbosa Moreira, a preclusão alcança apenas as questões relativas à mesma causa de pedir. 5. Em face do princípio da primazia da proteção social, que norteia o direito e o processo previdenciário, não há espaço para a coisa julgada ficta ou presumida. 6. Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em tempo de serviço comum no âmbito do Regime Geral de Previdência Social. 7. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 8. Quanto aos agentes químicos descritos no anexo 13 da NR 15 do MTE, é suficiente a avaliação qualitativa de risco, sem que se cogite de limite de tolerância, independentemente da época da prestação do serviço, se anterior ou posterior a 02/12/1998, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial. 9. Embora a umidade não esteja contemplada no elenco dos Decretos nºs 2.172/97 e 3.048/99 como agente nocivo a ensejar a concessão de aposentadoria especial, o enquadramento da atividade dar-se-á pela verificação da especialidade no caso concreto, através de perícia técnica confirmatória da condição insalutífera, por força da Súmula nº 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos. 10. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, a parte autora faz jus à concessão da aposentadoria especial. (TRF4, AC 5003095-30.2017.4.04.7203, NONA TURMA, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 26/03/2019 - grifado.)

PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. COISA JULGADA. EFICÁCIA PRECLUSIVA. CAUSA DE PEDIR NÃO EXAMINADA EM DECISÃO ANTERIOR. PRINCÍPIOS DA SUBSTANCIAÇÃO DA DEMANDA E DA FUNDAMENTAÇÃO QUALIFICADA DAS DECISÕES. Questões de fato que não foram deduzidas na ação anterior, mas que guardam autonomia relativamente às que foram alegadas, não ficam cobertas pela preclusão, porque seu exame, para fins de procedência ou improcedência do pedido no novo processo, não significará tornar sem efeito ou mesmo rever a justiça da decisão dada na primeira demanda sobre as alegações que lá foram lançadas e resolvidas. Outros fatos serão examinados, ainda que com vistas a um mesmo pedido. Estender-se a eficácia preclusiva da coisa julgada para além da questão de fato suscitada na demanda anterior, de forma a alcançar outras questões de fato que, individualmente, poderiam levar ao reconhecimento do mesmo direito, é violar o princípio da substanciação da demanda, o princípio da demanda e a própria garantia de acesso ao Poder Judiciário em caso de lesão a direito. Entendimento que vem reforçado no novo Código de Processo Civil, ao estabelecer como princípios a fundamentação qualificada e o contraditório efetivo. Incidência do art. 503 do Código de Processo Civil que limita o alcance da coisa julgada às questões decididas no processo anterior. Se, na demanda anterior, houve pronunciamento quanto à exposição do autor a ruído, a alegação, em nova ação, de que foi exposto no mesmo período a agentes químicos, ainda que com vistas ao mesmo pedido - reconhecimento da especialidade do tempo de serviço - não implica em violação da coisa julgada ou na sua eficácia preclusiva. Ao decidir sobre o fato ora sob apreciação, não haverá incursão sobre as questões de fato objeto da ação anterior e sobre as conclusões delas decorrentes. (TRF4, AC 5017094-37.2014.4.04.7112, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 05/07/2018 - grifado.)

Ora, diante desse contexto, o suscitante não logrou demonstrar a efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito, que impliquem risco à isonomia e à segurança jurídica.

Nesse sentido, já decidiu a Corte Especial deste Tribunal que "a mera amostragem de precedentes sobre a questão suscitada é insuficiente para atender ao requisito da multiplicidade de processos, estabelecido pelo art. 976, I, do CPC" (IRDR nº 5047388-58.2020.4.04.0000, Rel.ª Des.ª Federal Luciane Amaral Corrêa Münch, disponibilizado em 17/12/2020).

Ademais, em relação à questão de fundo suscitada neste IRDR, recentemente a Corte Especial deste Tribunal já teve oportunidade de se manifestar sobre controvérsia similar, em sede de ação rescisória julgada na forma do artigo 942 do Código de Processo Civil e da qual fui Relator para o acórdão.

O julgado em questão traz a seguinte ementa:

AÇÃO RESCISÓRIA. APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO ESPECIAL. NÃO ACOLHIMENTO EM AÇÃO JUDICIAL ANTERIOR. ARTIGO 508 DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO À COISA JULGADA. OCORRÊNCIA. PROCEDÊNCIA DA AÇÃO RESCISÓRIA. NOVO JULGAMENTO DA LIDE ORIGINÁRIA. EXTINÇÃO SEM MÉRITO. 1. A coisa julgada consiste em pressuposto processual negativo, cujo reconhecimento independe de provocação da parte contrária, não estando sujeita à preclusão temporal mas, apenas, à preclusão consumativa. 2. Caso em que o segurado ajuizou nova ação, perante o juízo comum, visando ao reconhecimento da especialidade de determinado período de labor pela exposição a poeiras de algodão e à concessão de aposentadoria especial, quando, já na primeira ação, ajuizada perante o juizado especial federal, poderia ter deduzido o pedido de reconhecimento da especialidade pelo mesmo agente nocivo, operando-se a previsão do artigo 508 do Código de Processo Civil. 3. A circunstância de ter sido ajuizada a segunda ação com base em novo elemento probatório não é suficiente para autorizar a relativização da coisa julgada formada na primeira ação. 4. Ademais, não se pode admitir a renovação, perante o juízo comum, de determinado pedido anteriormente rejeitado no âmbito dos juizados especiais Federais, sob pena de transformar aquele em espécie de instância revisora desse. 5. Ação rescisória julgada procedente para, em em juízo rescindente, extinguir o processo sem julgamento de mérito, na forma do artigo 485, inciso V, do Código de Processo Civil. (TRF4, AÇÃO RESCISÓRIA (SEÇÃO) Nº 5043892-55.2019.4.04.0000, Corte Especial, Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, POR MAIORIA, VENCIDOS O RELATOR, JUNTADO AOS AUTOS EM 05/09/2022)

Embora esse julgado não tenha sido proferido na sistemática das demandas repetitivas, ele sinaliza o entendimento majoritário do Colegiado Ampliado, sendo recomendável sua adoção pelos demais órgãos fracionários deste Tribunal visando à estabilização jurisprudencial.

Nesse sentido, aliás, dispõe o Código de Processo Civil:

Art. 927. Os juízes e os tribunais observarão:

(...)

V - a orientação do plenário ou do órgão especial aos quais estiverem vinculados.

Nessas condições, não se verifica presente a multiplicidade de decisões em sentidos opostos, que implique risco à isonomia e à segurança jurídica.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por inadmitir o incidente de resolução de demandas repetitivas.



Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003550223v7 e do código CRC b9a3f1b4.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 2/11/2022, às 15:43:50


5042114-45.2022.4.04.0000
40003550223.V7


Conferência de autenticidade emitida em 10/11/2022 04:00:58.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) Nº 5042114-45.2022.4.04.0000/RS

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 5015143-74.2019.4.04.7001/RS

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

SUSCITANTE: JOSE ROBERTO VICENTE

ADVOGADO: RICARDO OSSOVSKI RICHTER (OAB PR040704)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

INTERESSADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

EMENTA

INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS. TEMPO ESPECIAL. COISA JULGADA. AGENTE NOCIVO DIVERSO. JUÍZO DE ADMISSIBILIDADE. REQUISITOS. AUSÊNCIA. INADMISSIBILIDADE DO INCIDENTE.

1. A instauração do incidente de resolução de demandas repetitivas reclama a presença, concomitante, dos seguintes requisitos: a) efetiva repetição de processos que contenham controvérsia sobre a mesma questão unicamente de direito; b) risco de ofensa à isonomia e à segurança jurídica e c) inexistência de afetação de recurso repetitivo nos Tribunais Superiores, no âmbito de suas respectivas competências, para definição de tese sobre a mesma questão de direito material ou processual, que seja objeto do incidente.

2. Além disso, a doutrina aponta que o processamento do incidente de resolução de demandas repetitivas reclama a existência de causa pendente no Tribunal.

3. Para fins de admissibilidade do IRDR, não basta a multiplicidade de decisões judiciais sobre a mesma questão controvertida, exigindo-se, também, a existência de efetivo risco à isonomia e à segurança jurídica, decorrente de dissenso no exame da questão por diferentes órgãos judiciários, suficiente para afetar a referência da orientação jurisprudencial sobre a matéria.

4. No caso concreto, o suscitante não logrou demonstrar a presença de todos esses requisitos.

5. Ausentes os requisitos de admissibilidade, impõe-se a rejeição do IRDR.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 3ª Seção do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, inadmitir o incidente de resolução de demandas repetitivas, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 26 de outubro de 2022.



Documento eletrônico assinado por SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003550224v3 e do código CRC 4ee93fdb.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ
Data e Hora: 2/11/2022, às 15:43:50


5042114-45.2022.4.04.0000
40003550224 .V3


Conferência de autenticidade emitida em 10/11/2022 04:00:58.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO TELEPRESENCIAL DE 26/10/2022

Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (Seção) Nº 5042114-45.2022.4.04.0000/RS

RELATOR: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

PRESIDENTE: Desembargador Federal FERNANDO QUADROS DA SILVA

PROCURADOR(A): FLÁVIO AUGUSTO DE ANDRADE STRAPASON

SUSCITANTE: JOSE ROBERTO VICENTE

ADVOGADO: RICARDO OSSOVSKI RICHTER (OAB PR040704)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Telepresencial do dia 26/10/2022, na sequência 204, disponibilizada no DE de 14/10/2022.

Certifico que a 3ª Seção, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª SEÇÃO DECIDIU, POR UNANIMIDADE, INADMITIR O INCIDENTE DE RESOLUÇÃO DE DEMANDAS REPETITIVAS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ

Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

Votante: Desembargadora Federal TAIS SCHILLING FERRAZ

Votante: Juiz Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO

Votante: Juiz Federal JOÃO BATISTA LAZZARI

Votante: Desembargador Federal LUIZ FERNANDO WOWK PENTEADO

Votante: Desembargador Federal JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA

Votante: Juiz Federal JAIRO GILBERTO SCHAFER

Votante: Desembargador Federal MÁRCIO ANTONIO ROCHA

Votante: Juíza Federal FLÁVIA DA SILVA XAVIER

MÁRCIA CRISTINA ABBUD

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 10/11/2022 04:00:58.

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