| D.E. Publicado em 30/07/2018 |
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006756-66.2011.4.04.9999/RS
RELATOR | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ZELLÁRIO PELLENZ |
ADVOGADO | : | Jefferson Luis Vicari |
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. INTERPRETAÇÃO DO PEDIDO E LIMITES DA DEMANDA. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL AFASTADA. AUSÊNCIA DE INÍCIO DE PROVA MATERIAL DO TEMPO DE SERVIÇO: EXTINÇÃO SEM EXAME DO MÉRITO. ATIVIDADE ESPECIAL: RUÍDO, HIDROCARBONETOS E ORGANOFOSFORADOS. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO: DIREITO INTERTEMPORAL. REAFIRMAÇÃO DA DER: POSSIBILIDADE. JUROS MORATÓRIOS E CORREÇÃO MONETÁRIA: ÍNDICES. ÔNUS SUCUMBENCIAIS: SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. TUTELA ESPECÍFICA E ANTECIPAÇÃO DE TUTELA.
1. O pedido deve ser extraído de uma interpretação lógico-sistemática da inicial e da própria conduta processual da parte autora. Assim, se, na fundamentação, a inicial se reporta a múltiplos períodos e no tópico dos pedidos aponta unicamente um grupo de períodos em que pretende ver reconhecida a especialidade do tempo de serviço -- os quais são examinados na sentença, não desafiando recurso da parte autora --, deve-se tomar esse grupo de intervalos para definir os limites objetivos da demanda.
2. Não é inepta a petição inicial quando é possível depreender, de sua interpretação sistemática, o pedido e a causa de pedir, devendo ser prestigiada a exegese que permite o exame do mérito dos pedidos.
3. A ausência do início de prova material exigida para a demonstração do tempo de serviço, indispensável à prova do direito sobre o qual se funda a ação, enseja a extinção do processo sem julgamento do mérito, nos termos do artigo 485, IV, do CPC, de modo a evitar-se que o segurado fique irremediavelmente privado da adequada proteção previdenciária, por força da coisa julgada formada a partir da improcedência da demanda. Precedente do STJ em sede de recurso representativo de controvérsia (REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 16/12/2015).
4. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador.
5. O limite de tolerância para ruído é de 80 dB(A) até 05/03/1997; 90 dB(A) de 06/03/1997 a 18/11/2003; e 85 dB(A) a partir de 19/11/2003 (STJ, REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014, julgamento proferido de acordo com a sistemática dos recursos representativos de controvérsia - art. 543-C, CPC/1973).
6. Os hidrocarbonetos constituem agente químico nocivo (Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e o Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 -- códigos 1.2.11, 1.2.10 e 1.0.7, respectivamente).
7. Os defensivos agrícolas organofosforados constituem agentes químicos nocivos, enquadrando-se nos Códigos 1.2.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e 1.0.12 do Anexo IV do Decreto 3.048/99
8. Deve ser reconhecida a especialidade da atividade exercida sob exposição habitual e permanente, certificada no laudo pericial, a ruído superior aos limites de tolerância, a óleos e graxas (hidrocarbonetos) e a defensivos agrícolas organofosforados.
9. Se o segurado se filiou à Previdência Social antes da vigência da EC nº 20/98 e conta tempo de serviço posterior àquela data, deve-se examinar se preenchia os requisitos para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, à luz das regras anteriores à EC nº 20/1998, de aposentadoria por tempo de contribuição pelas regras permanentes previstas nessa Emenda Constitucional e de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral pelas regras de transição, devendo-lhe ser concedido o benefício mais vantajoso.
10. É possível a reafirmação da DER, em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, admitindo-se o cômputo do tempo de contribuição anterior e posterior ao ajuizamento da ação, desde que observado o contraditório.
11. Em consonância com o entendimento fixado pelo Plenário do STF no Tema 810, oriundo do RE 870947, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam: a) INPC (de 04-2006 a 29-06-2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91); b) IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme RE 870.947, j. 20-09-2017). Já os juros de mora serão de 1% (um por cento) ao mês, aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29-06-2009; a partir de então, os juros observarão os índices oficiais aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
12. Configurada a sucumbência recíproca em diferentes proporções, os ônus sucumbenciais devem ser proporcionalmente repartidos entre as partes.
13. Confirmada a sentença quanto à concessão do benefício, mostra-se inócuo deliberar acerca da revogação da antecipação de tutela concedida na sentença, uma vez que a implementação do benefício deve ser mantida por força da tutela específica da obrigação (art. 497, CPC).
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Turma Regional Suplementar do Paraná do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à apelação, a fim de reconhecer a especialidade do tempo de serviço prestado de 01/12/1976 a 12/11/1977, 01/06/1984 a 28/12/1984, 04/03/1985 a 27/09/1985, de 09/10/1985 a 17/12/1985 e de 01/04/1992 a 12/08/1992 e de julgar o processo extinto sem resolução de mérito em relação aos demais períodos indicados na petição inicial (artigo 485, IV, do CPC/2015 e artigo 267, IV, do CPC/1973), bem como de conceder à parte autora o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, a contar de 19/01/2011, nos termos do relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 17 de julho de 2018.
Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO
Relator
| Documento eletrônico assinado por Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 9427513v6 e, se solicitado, do código CRC E8BD40ED. | |
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RELATÓRIO
Trata-se de recurso de apelação interposto contra sentença que, em ação ordinária, julgou parcialmente procedentes os pedidos, a fim de reconhecer a especialidade do trabalho prestado pelo autor nos períodos de 14/01/1970 a 22/01/1971, de 23/01/1974 a 31/01/1974, de 01/12/1976 a 12/11/1977, de 26/04/1984 a 17/03/1986 de 20/03/1992 a 12/08/1992, convertendo-os em tempo comum com o acréscimo de 40% e determinando que o réu implemente o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, de forma proporcional, correspondente a 94% do salário de benefício, desde 30/10/2010. Afirmou que os valores atrasados devem ser acrescidos de juros de mora e de correção monetária pelos índices oficiais da caderneta de poupança. Diante da sucumbência recíproca, condenou o autor ao pagamento de 40% das custas processuais e de honorários advocatícios arbitrados em R$ 600,00, ressalvando que a exigibilidade do débito fica suspensa em razão da Assistência Judiciária Gratuita; condenou o réu, por outra banda, ao pagamento de 60% das custas processuais, reconhecendo a sua isenção legal, e de honorários advocatícios, os quais fixou em 10% sobre o valor devido ao requerente até a data da sentença.
Em apelação, a parte ré alega, inicialmente, a inépcia da petição inicial, sob o fundamento de que a parte autora: a) teria formulado pedido genérico, sem especificar o tempo de contribuição que reputava contar e sem sequer precisar os períodos cuja especialidade pretendia reconhecer, em flagrante prejuízo à demarcação dos limites da demanda e ao exercício da ampla defesa; b) deixado de indicar a causa de pedir, pois não teria declinado as razões jurídicas por que pretende seja reconhecida a especialidade da atividade exercida. Menciona que, em decorrência da inépcia da inicial, o juízo a quo foi induzido em erro, pois fundamentou o reconhecimento da atividade especial em documentos que dizem respeito a períodos diversos. Argui, noutro giro, a carência de ação, apontando que o autor não possui interesse processual, já que não apresentou, em sede administrativa, qualquer documento capaz de comprovar o exercício da atividade especial nos intervalos discutidos judicialmente. No mérito, sustenta que a sentença contém equívocos no cômputo do tempo de contribuição do autor. Destaca, nesse sentido, que o INSS reconheceu administrativamente o tempo de 28 anos, 1 mês e 18 dias, ao qual se somariam menos de 2 anos decorrentes da conversão do tempo especial, de modo que o tempo total não alcançaria 33 anos, 9 meses e 10 dias, mínimo necessário, considerando-se o pedágio exigido pela Emenda Constitucional nº 20/98, para o autor preencher os requisitos para a aposentadoria. Além disso, refere que, por ocasião do requerimento administrativo, o autor possuía apenas 49 anos, não totalizando, assim, a idade mínima imposta pela EC nº 20/98 (53 anos). Insurge-se, igualmente, em face da antecipação de tutela concedida ao autor, argumentando inexistir urgência, já que o autor viveu até o presente momento sem receber os valores reclamados. Requer, assim, a reforma da sentença.
Com contrarrazões, subiram os autos a este Tribunal. Recebidos os autos, coube ao relator, Des. Fed. Rogério Favreto, converter o julgamento em diligência, a fim de que fosse produzida prova pericial relativamente à exposição a agentes nocivos nos períodos reconhecidos na sentença. Em razão do não comparecimento do autor à perícia, o juízo a quo houve por julgar extinto o processo, sem exame de mérito, com base no art. 267, § 1º, do CPC. Seguiu-se apelação da parte autora, sobrevindo decisão, novamente da lavra do relator, no sentido de que a "sentença" de extinção do processo sem resolução do mérito não possuiria o condão de produzir efeitos jurídicos, devendo, os autos, retornar à origem para que fosse cumprida a diligência pendente. Realizada a prova pericial e oportunizada a manifestação das partes, os autos regressaram a esta Corte.
É o relatório.
Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO
Relator
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VOTO
Limites da demanda
Em 22/11/2006, o autor requereu, administrativamente, a concessão de aposentadoria por tempo de serviço (fl. 13), ocasião em que juntou documentos (Informações Sobre Atividades Exercidas em Condições Especiais e Perfil Profissiográfico Previdenciário) com o fim de demonstrar a especialidade da atividade exercida de 13/03/1978 a 01/04/1984, de 01/06/1984 a 28/12/1984, de 01/04/1982 a 14/10/1998 e de 02/08/1999 em diante (sem especificar o termo final -- fls. 17/22). Não obstante, o INSS reconheceu apenas o tempo de serviço comum prestado nesses intervalos, concluindo que o autor não faria jus ao benefício requerido por não totalizar o tempo mínimo de contribuição exigido (fls. 25/34).
Diante do indeferimento administrativo, o autor ajuizou a presente ação. Na petição inicial, o autor narra que, embora o tempo de serviço urbano tenha sido reconhecido como comum pela autarquia previdenciária, o "autor trabalhou exclusivamente em atividade especial, como nivelador e topógrafo, em permanente contato com agentes nocivos à sua saúde e integridade física" no período de 01/12/1976 a 08/03/1978, 13/03/1978 a 01/04/1984, 01/06/1984 a 28/12/1984, 04/03/1985 a 27/09/1985, 09/10/1985 a 17/12/1985, 10/04/1986 a 17/05/19886, 01/06/1986 a 30/08/1991, 01/04/1992 a 14/10/1998, 23/03/1999 a 28/06/1999, 02/08/1999 a 16/05/2005 (item 1.2 - fl. 03). Todavia, em seguida, o autor, ao defender a caracterização da atividade especial e a sua conversão em tempo comum, reporta-se a períodos distintos, senão vejamos (item 1.2. - fl. 03):
In casu, o tempo de serviço especial trabalhado entre 14/01/1970 à (sic) 22/01/1971, 23/01/1974 à 31/01/1974, 01/12/1976 à 12/11/1977, 26/04/1984 à 17/03/1986 e 20/03/1992 à 12/08/1992 alcança 04 (quatro) anos e 04 (quatro) meses. Que ao ser aplicado o coeficiente de 40% (quarenta por cento) teremos um plus, que totalizará 06 (seis) anos de tempo de serviço/contribuição. Acrescendo-se o período trabalhado em condições normais, o requerente possui o tempo de 33 (trinta e três) anos, tempo esse necessário para aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, devendo ser considerado que o Autor possui os laudos, ainda que não exigidos.
Posteriormente, do tópico relativo aos pedidos, o autor reitera a indicação da especialidade apenas desse segundo grupo de períodos. De fato, "requer a conversão do tempo de serviço trabalhado sob condições especiais, entre 14/01/1970 à (sic) 22/01/1971, 23/01/1974 à 31/01/1974, 01/12/1976 à 12/11/1977, 26/04/1984 à 17/03/1986 e 20/03/1992 à 12/08/1992" (item 2 - fl. 05).
Desse modo, ainda que o autor tenha inicialmente feito menção aos períodos cuja especialidade fora apontada na esfera administrativa, postula, ao fim e ao cabo, o reconhecimento da especialidade de atividade exercida em hiatos distintos. Decerto que, como já pontuou o STJ, "o pedido deve ser extraído levando-se em conta a interpretação lógico-sistemática de todo o conteúdo da peça inicial, e não apenas do tópico específico referente aos pedidos" (AgRg no REsp 1276751/SP, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira Turma, julgado em 11/11/2014, DJe 19/11/2014). Na hipótese, contudo, mesmo a interpretação lógico-sistemática da inicial não permite extrair conclusão diversa, pois os períodos indicados no tópico dos pedidos também foram mencionados na fundamentação -- de modo mais detalhado, aliás, do que aqueles referidos no início da fundamentação, pois acompanhados da conversão em tempo comum e da soma com o tempo de serviço reconhecido administrativamente. É possível compreender, portanto, a delimitação do pedido feita na petição inicial.
Tanto é assim, aliás, que o juízo de primeiro grau se manifestou unicamente em relação à especialidade dos tempos de serviço apontados no pedido do autor e este deixou de recorrer indicando tratar-se de sentença extra ou citra petita. Ou seja, a conformidade da parte autora corrobora a interpretação de que o pedido deduzido na petição inicial abarca unicamente os períodos por último referidos -- e não aqueles cuja especialidade fora indicada na esfera administrativa.
Inépcia da petição inicial
Como visto, a petição inicial possui um pedido, qual seja, o de reconhecimento da especialidade exercida em determinados períodos, seguindo-se a conversão do tempo especial em comum e, consequentemente, a concessão de aposentadoria proporcional por tempo de serviço. Não se trata, pois, de pedido inexistente ou genérico, consoante alega o recorrente.
Por outra banda, é possível depreender da exordial que a causa de pedir remota do pedido de reconhecimento da especialidade diz respeito à exposição a agentes nocivos e à integridade física do autor. A causa de pedir próxima, a seu turno, vem indicada na referência a diversos dispositivos normativos que versam sobre a atividade especial e sobre a sua conversão em tempo comum. Tampouco se cuida, portanto, da falta de causa de pedir, conforme sustenta o apelante.
É se reconhecer a existência de contradição na petição inicial, tendo em vista a referência a períodos distintos, destacada acima. Contudo, é possível superar a discrepância e compreender a causa de pedir e o pedido nela contidos. A hipótese não se amolda, assim, àquelas situações de inépcia da inicial previstas na lei processual civil (art. 295, parágrafo único, I, CPC/1973; art. 330, § 1º, CPC/2015).
Cumpre observar, ademais, que em momento algum foi oportunizado à parte autora que efetuasse a emenda da petição inicial, o que implicaria -- caso constatada irregularidade na exordial -- afronta ao art. 284 do CPC/1973 e ao art. 321 do CPC/2015. Note-se, outrossim, que o feito tramita desde 27/11/2008, de modo que violaria a primazia conferida à decisão de mérito (art. 6º, CPC/2015) e mesmo a cooperação e a boa-fé processuais (arts. 5º e 6º, CPC/2015) a extinção do processo sem resolução de mérito, com base na inépcia da inicial, após decorridos quase dez anos de marcha processual sem que a parte haja sido intimada a sanar um vício que já existiria desde o início.
Deve ser prestigiada, nesse quadro, a interpretação que aproveita os atos processuais praticados e resolve o mérito do pedido, nos limites em que isso for possível, conforme se detalhará adiante.
Documentos indispensáveis à propositura da demanda
Parte dos períodos indicados pelo autor na petição inicial abarca intervalos referidos no processo administrativo e já reconhecidos como tempo de serviço comum pelo INSS; outra parte, todavia, diz respeito a hiatos não levados a conhecimento da autarquia previdenciária. Confira-se:
Em relação aos intervalos que não foram apreciados no processo administrativo, o autor não junta qualquer documento capaz de comprovar o tempo de serviço alegado, sequer indicando onde trabalhou e qual função exerceu. Ocorre que a comprovação do tempo de serviço depende de início de prova material, consoante determina o art. 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91.
Em matéria previdenciária, a inexistência de provas do direito alegado não enseja um juízo de improcedência do pedido, mas a extinção do processo sem exame do mérito, com fulcro no art. 485, IV, do CPC (art. 267, IV, do CPC/1973). Com efeito, diante do precedente firmado pelo STJ no julgamento do Recurso Repetitivo de Controvérsia nº 1.352.721, "a ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo a sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa" (Corte Especial, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 28/04/2016).
Embora o caso examinado pelo STJ envolvesse pedido de aposentadoria por idade rural, a sua ratio decidendi é aplicável a todas as hipóteses em que não são apresentadas provas suficientes para a concessão do benefício previdenciário. Nesse sentido, inclusive, tem decidido esta Corte, senão vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITOS PREENCHIDOS. A ausência de documentos legalmente exigidos para a demonstração de tempo de serviço especial, indispensáveis à prova do direito sobre o qual se funda a ação, tais como os formulários preenchidos pela empresa empregadora e/ou laudos periciais, na forma preconizada no art. 58, § 1º, da Lei nº 8.213/91, com a consequente recusa do direito à aposentadoria, enseja a extinção do processo sem julgamento de mérito, nos termos do artigo 485, IV, do NCPC, de modo a evitar-se que o segurado fique irremediavelmente privado da adequada proteção previdenciária, por força da coisa julgada formada a partir da improcedência da demanda. Precedente do STJ em sede de recurso representativo de controvérsia (REsp 1.352.721/SP, Corte Especial, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, j. 16-12-2015). Uma vez exercida atividade enquadrável como especial, sob a égide da legislação que a ampara, o segurado adquire o direito ao reconhecimento como tal e ao acréscimo decorrente da sua conversão em tempo de serviço comum no âmbito do Regime Geral de Previdência Social. Até 28/04/1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, aceitando-se qualquer meio de prova (exceto para ruído); a partir de 29/04/1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, devendo existir comprovação da sujeição a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05/03/1997 e, a partir de então, por meio de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Comprovado o exercício de atividade especial por mais de 25 anos, a parte autora faz jus à concessão da aposentadoria especial. As anotações na CTPS da parte autora constituem-se em prova idônea dos contratos de trabalho nela indicados e goza de presunção juris tantum a veracidade de seus registros, devendo ser reconhecido o tempo de serviço urbano prestado nos períodos a que se referem. A atividade de dentista, exercida até 28/04/1995, deve ser reconhecida como especial, por presunção, em decorrência do enquadramento por categoria profissional. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes para descaracterizar a especialidade da atividade exercida, porquanto não comprovada a sua real efetividade por meio de perícia técnica especializada e não demonstrado o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. A permanência a que se refere o art. 57, § 3º, da Lei nº 8.213/91 para fins de concessão da aposentadoria especial não requer que a exposição às condições insalubres ocorra durante todos os momentos da prática laboral. Basta que o empregado, no desempenho das suas atividades, diuturna e continuamente, sujeite-se ao agente nocivo, em período razoável da sua prestação laboral. (TRF4, AC 5014739-66.2014.4.04.7205, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator PAULO AFONSO BRUM VAZ, juntado aos autos em 14/11/2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. REQUISITOS LEGAIS NÃO CUMPRIDOS. TEMPO DE SERVIÇO RURAL EM REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. COMPROVAÇÃO. TEMPO DE SERVIÇO URBANO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO. INSTRUÇÃO DEFICIENTE. . É possível o aproveitamento do tempo de serviço rural até 31-10-1991 independentemente do recolhimento das contribuições previdenciárias, exceto para efeito de carência. . Considera-se provada a atividade rural do segurado especial havendo início de prova material complementado por idônea prova testemunhal. . Em demandas previdenciárias, nos casos em que houver ausência ou insuficiência de provas do direito reclamado, o processo deve ser extinto sem julgamento de mérito. Precedente da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia (CPC, art. 543-C), lavrado no REsp n.º 1.352.721/SP (Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, julgado em 16/12/2015), ressalvado ponto de vista pessoal. . Não cumprindo com todos os requisitos para a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, ou seja, tempo mínimo de contribuição e carência, remanesce o direito da parte autora à averbação do período ora reconhecido, para fins de obtenção de futura aposentadoria (TRF4, APELREEX 0016521-85.2016.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 19/06/2017)
O autor pretende o reconhecimento da especialidade da atividade exercida nesses intervalos. Não obstante, antes de ser examinada a alegada exposição a agentes nocivos, é preciso verificar se está demonstrado o exercício de atividade laborativa. E, em relação a esses períodos, não há início de prova material a autorizar o reconhecimento do tempo de serviço, o que impõe, como destacado acima, a extinção do processo sem resolução do mérito, por ausência de pressuposto processual. Fica prejudicado, então, o exame da especialidade do tempo de serviço.
Em relação aos períodos que foram apontados na esfera administrativa, há anotação na Carteira de Trabalho e Previdência Social e registro no CNIS, tanto que o tempo de serviço comum foi reconhecido pelo INSS. A controvérsia se resume, nesse particular, à especialidade da atividade exercida. Trata-se dos seguintes intervalos: 01/12/1976 a 12/11/1977, 01/06/1984 a 28/12/1984, 04/03/1985 a 27/09/1985 e 09/10/1985 a 17/12/1985, 01/04/1992 a 12/08/1992. Desse modo, apenas em relação a esses períodos é possível a apreciação do mérito.
Interesse de agir
Como visto, foi realizado requerimento administrativo, o qual restou indeferido, de modo que está presente o interesse de agir. Em relação aos períodos não discutidos na esfera administrativa, o processo já foi extinto sem resolução do mérito pela falta de pressuposto processual, tornando prejudicada a alegação da inexistência de interesse processual.
Atividade especial -- requisitos
De início, ressalto que o reconhecimento da especialidade obedece à disciplina legal vigente à época em que a atividade foi exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a vigência de certa legislação, o segurado adquire o direito à contagem na forma estabelecida, bem como à comprovação das condições de trabalho como então exigido, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, aliás, é a orientação adotada pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (AR 3320/PR, Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/9/2008; EREsp 345554/PB, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, DJ 8/3/2004; AGREsp 493.458/RS, Quinta Turma, Relator Ministro Gilson Dipp, DJU 23/6/2003; e REsp 491.338/RS, Sexta Turma, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, DJU 23/6/2003) e pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (EINF 2005.71.00.031824-5/RS, Terceira Seção, Luís Alberto D'Azevedo Aurvalle, D.E. 18/11/2009; APELREEX 0000867-68.2010.404.9999/RS, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal Celso Kipper, D.E. 30/3/2010; APELREEX 0001126-86.2008.404.7201/SC, Sexta Turma, Relator Desembargador Federal João Batista Pinto Silveira, D.E. 17/3/2010; APELREEX 2007.71.00.033522-7/RS; Quinta Turma, Relator Desembargador Federal Fernando Quadros da Silva, D.E. 25/1/2010).
Feitas estas observações e tendo em vista a sucessão de leis que trataram a matéria diversamente, é necessário inicialmente definir qual deve ser aplicada ao caso concreto, ou seja, qual a que se encontrava em vigor no momento em que a atividade foi prestada pelo segurado.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:
a) até 28 de abril de 1995, quando esteve vigente a Lei 3.807/1960 (LOPS) e suas alterações e, posteriormente, a Lei 8.213/1991 (LBPS), em sua redação original (artigos 57 e 58), era possível o reconhecimento da especialidade do trabalho mediante a comprovação do exercício de atividade prevista como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial ou, ainda, quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp 941885/SP, Quinta Turma, Relator Ministro Jorge Mussi, DJe 4/8/2008; e STJ, REsp 639066/RJ, Quinta Turma, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ 7/11/2005), quando então se fazia indispensável a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, documentada nos autos ou informada em formulário emitido pela empresa, a fim de verificar a nocividade dos agentes envolvidos;
b) a partir de 29 de abril de 1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção das atividades a que se refere a Lei 5.527/1968, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, data imediatamente anterior à publicação da Medida Provisória 1.523, de 14/10/1996, que a revogou expressamente - de modo que, para o intervalo compreendido entre 29/4/1995 (ou 14/10/1996) e 5/3/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei 9.032/1995 no artigo 57 da LBPS, torna-se necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) a partir de 6 de março de 1997, data da entrada em vigor do Decreto 2.172/1997, que regulamentou as disposições introduzidas no artigo 58 da LBPS pela Medida Provisória 1.523/1996 (convertida na Lei 9.528/1997), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
É com fulcro nessas balizas, portanto, que se deve aferir a especialidade da atividade desempenhada pela parte autora.
Ruído
Como visto, em se tratando do agente nocivo ruído, o reconhecimento da especialidade do labor exige, em qualquer período, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. Ou seja, não basta, aqui, mesmo no período anterior a 28/04/1995, o enquadramento por categoria profissional, sendo exigida prova da exposição ao agente nocivo.
É de se atentar, outrossim, às sucessivas alterações da legislação, que modificaram o limite mínimo de pressão sonora apta a configurar a insalubridade do ruído. Em resumo, tem-se o seguinte quadro: a) até 05/03/1997, é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n. 53.831/64, tendo em vista que, até aquela data, são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos nº 53.831/64, nº 72.771/73 e nº 83.080/79; b) de 06/03/1997 a 18/11/2003, exige-se a exposição a ruídos superiores a 90 decibéis (Anexo IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99, este na redação original); c) a partir de 19/11/2003, basta a exposição a ruídos superiores a 85 decibéis, conforme a alteração trazida pelo Decreto nº 4.882, de 18/11/2003, ao Decreto nº 3.048/99. Trata-se de entendimento pacificado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento de recurso especial repetitivo (REsp 1398260/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Cumpre perquirir, também, sobre a possibilidade de o uso de equipamento de proteção individual (EPI) eficaz afastar a nocividade provocada pelo ruído, descaracterizando, assim, a especialidade desse tempo de serviço.
Primeiramente, note-se que a utilização de equipamentos de proteção individual só passou a ter relevância, para fins de reconhecimento das atividades exercidas em condições especiais, a partir da MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/98, que alterou o § 2º do artigo 58 da Lei 8.213/91, determinando que o laudo técnico contenha informação sobre a existência de tecnologia de proteção individual que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo. Trata-se, aliás, de entendimento sedimentado pelo próprio INSS na esfera administrativa (IN nº 45/2010, art. 238, § 6º).
No período posterior à MP nº 1.729/98, embora esteja assentada a relevância do uso do EPI para reconhecimento da especialidade do labor, cumpre observar que, em relação ao agente nocivo ruído, o uso de EPI se revela, de per si, ineficaz para neutralizar os danos causados ao organismo humano. Com efeito, consoante já identificado pela medicina do trabalho, a exposição a níveis elevados de ruído não causa danos apenas à audição, de sorte que protetores auriculares não são capazes de neutralizar os riscos à saúde do trabalhador. Os ruídos ambientais não são absorvidos apenas pelos ouvidos e suas estruturas condutivas, mas também pela estrutura óssea da cabeça, sendo que o protetor auricular reduz apenas a transmissão aérea e não a óssea, daí que a exposição, durante grande parte do tempo de serviço do segurado produz efeitos nocivos a longo prazo, como zumbidos e distúrbios do sono.
Por essa razão, o STF, no julgamento do ARE nº 664335 (tema reconhecido com repercussão geral sob o número 555), assentou a tese segundo a qual, "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria."
Não destoa desse entendimento a jurisprudência sedimentada por esta Corte Regional, senão vejamos:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE URBANA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. EQUIPAMENTOS DE PROTEÇÃO INDIVIDUAL. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. TUTELA ESPECÍFICA. 1. Comprovado o tempo de serviço urbano, por meio de prova material idônea, devem os períodos urbanos ser averbados previdenciariamente. 2. O registro constante na CTPS goza da presunção de veracidade juris tantum, devendo a prova em contrário ser inequívoca, constituindo, desse modo, prova plena do serviço prestado nos períodos ali anotados. 3. Apresentada a prova necessária a demonstrar o exercício de atividade sujeita a condições especiais, conforme a legislação vigente na data da prestação do trabalho deve ser reconhecido o respectivo tempo de serviço. 4. A exposição habitual e permanente a níveis de ruído acima dos limites de tolerância estabelecidos na legislação pertinente à matéria sempre caracteriza a atividade como especial, independentemente da utilização ou não de EPI ou de menção, em laudo pericial, à neutralização de seus efeitos nocivos. 5. Os equipamentos de proteção individual não são suficientes, por si só, para descaracterizar a especialidade da atividade desempenhada pelo segurado, devendo cada caso ser apreciado em suas particularidades. Possível afastar o enquadramento da atividade especial somente quando comprovada a efetiva utilização de equipamentos de proteção individual que elidam a insalubridade. 6. Se o segurado implementar os requisitos para a obtenção de aposentadoria pelas regras anteriores à Emenda Constitucional n.º 20/98, pelas Regras de Transição e/ou pelas Regras Permanentes, poderá inativar-se pela opção que lhe for mais vantajosa. 7. Determina-se o cumprimento imediato do acórdão naquilo que se refere à obrigação de implementar o benefício, por se tratar de decisão de eficácia mandamental que deverá ser efetivada mediante as atividades de cumprimento da sentença stricto sensu previstas no art. 497 do CPC/15, sem a necessidade de um processo executivo autônomo (sine intervallo). (TRF4, AC 5007203-21.2016.404.7209, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DE SC, Relator JORGE ANTONIO MAURIQUE, juntado aos autos em 20/09/2017)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. CATEGORIA PROFISSIONAL. PINTORES DE PISTOLA. AGENTES NOCIVOS. RUÍDO. HIDROCARBONETOS AROMÁTICOS. AGENTES QUÍMICOS - QUANTIDADE DE EXPOSIÇÃO. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA NA EXPOSIÇÃO AOS AGENTES NOCIVOS. PERÍCIA EM DATA POSTERIOR AO LABOR. EPI. FONTE DE CUSTEIO. REQUISITOS IMPLEMENTADOS - DIREITO À CONCESSÃO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. TERMO INICIAL. EXIGÊNCIA DE AFASTAMENTO DA ATIVIDADE. ART. 57, §8º, DA LEI N. 8.213/91. INCONSTITUCIONALIDADE.CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA. FASE DE CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. DIFERIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.CUSTAS. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. (...) 10. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. Em se tratando de ruído nem mesmo a comprovação de que a utilização de protetores reduzia a intensidade do som a níveis inferiores aos máximos deve afastar o reconhecimento da especialidade da atividade, pois já comprovado que a exposição por períodos prolongados produz danos em decorrência das vibrações transmitidas, que não são eliminadas pelo uso do equipamento de proteção. 11. (...) (TRF4, AC 0015614-47.2015.404.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 22/09/2017)
Sob essas premissas, portanto, é que deve ser avaliada a especialidade decorrente da exposição a ruído.
Hidrocarbonetos
Os hidrocarbonetos constituem agente químico nocivo (Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/1964, o Anexo I do Decreto nº 83.080/1979, o Anexo IV do Decreto nº 2.172/1997 e o Anexo IV do Decreto nº 3.048/99 -- códigos 1.2.11, 1.2.10 e 1.0.7, respectivamente), de modo que a atividade exercida sob a sua exposição habitual e permanente goza de especialidade.
Com efeito, "o contato com esses agentes (graxas, óleos minerais, hidrocarbonetos aromáticos, combustíveis, solventes, inseticidas, etc.) é responsável por frequentes dermatoses profissionais, com potencialidade de ocasionar afecções inflamatórias e até câncer cutâneo em número significativo de pessoas expostas, em razão da ação irritante da pele, com atuação paulatina e cumulativa, bem como irritação e dano nas vias respiratórias quando inalados e até efeitos neurológicos, quando absorvidos e distribuídos através da circulação do sangue no organismo. Isto para não mencionar problemas hepáticos, pulmonares e renais" (TRF4, APELREEX 0002033-15.2009.404.7108, Sexta Turma, Relator Celso Kipper, D.E. 12/07/2011). Justifica-se, portanto, a especialidade da atividade.
Agentes químicos organofosforados
Os defensivos agrícolas organofosforados constituem agente químico nocivo, enquadrando-se nos Códigos 1.2.6 do Quadro Anexo do Decreto 53.831/64 e 1.0.12 do Anexo IV do Decreto 3.048/99. Nesse sentido:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS. AGENTES QUÍMICOS. EPI. APOSENTADORIA ESPECIAL. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. 1. A exposição a agentes químicos defensivos agrícolas organofosforados é prejudicial à saúde, ensejando o reconhecimento do tempo como especial. 2. Não restando provada a neutralização os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral pelo uso de EPI, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. 3. O Supremo Tribunal Federal reconheceu no RE 870947, com repercussão geral, a inconstitucionalidade do uso da TR, determinando, no recurso paradigma, a adoção do IPCA-E para o cálculo da correção monetária. 4. Considerando que o recurso que originou o precedente do STF tratava de condenação da Fazenda Pública ao pagamento de débito de natureza administrativa, o Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1495146, em precedente também vinculante, e tendo presente a inconstitucionalidade da TR como fator de atualização monetária, distinguiu os créditos de natureza previdenciária, em relação aos quais, com base na legislação anterior, determinou a aplicação do INPC. 5. Os juros de mora, a contar da citação, devem incidir à taxa de 1% ao mês, até 29-06-2009. A partir de então, incidem uma única vez, até o efetivo pagamento do débito, segundo o índice oficial de remuneração básica aplicado à caderneta de poupança. (TRF4, AC 5042058-04.2012.4.04.7100, SEXTA TURMA, Relator ARTUR CÉSAR DE SOUZA, juntado aos autos em 15/06/2018)
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES NOCIVOS RUÍDO E ORGANOFOSFORADOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. EPIS. CONCESSÃO. 1. O reconhecimento da especialidade e o enquadramento da atividade exercida sob condições nocivas são disciplinados pela lei em vigor à época em que efetivamente exercidos, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. 2. Até 28-04-1995 é admissível o reconhecimento da especialidade por categoria profissional ou por sujeição a agentes nocivos, admitindo-se qualquer meio de prova (exceto para ruído e calor); a partir de 29-04-1995 não mais é possível o enquadramento por categoria profissional, sendo necessária a comprovação da exposição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova até 05-03-1997 e, a partir de então, através de formulário embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica. 3. A exposição a organofosforados enseja o reconhecimento do tempo de serviço como especial. 4. Tendo havido oscilação dos níveis de tolerância da exposição a ruído ocupacional, previstos nos normativos que se sucederam, devem ser considerados os parâmetros previstos pela norma vigente ao tempo da prestação do serviço, ainda que mais recentemente tenha havido redução do nível máximo de exposição segura. Precedentes do STJ (Ag.Rg. no REsp 1381224/PR) 5. Até 05-03-1997 é considerada nociva à saúde a atividade sujeita a ruídos superiores a 80 decibéis, conforme previsão mais benéfica do Decreto n. 53.831/64, tendo em vista que, até aquela data, são aplicáveis concomitantemente, para fins de enquadramento, os Decretos n. 53.831/64, n. 72.771/73 e n. 83.080/79. Em relação ao período posterior, exige-se a exposição a ruídos superiores a 90 decibéis até 18-11-2003 (Anexo IV dos Decretos n. 2.172/97 e n. 3.048/99, este na redação original) e, a partir de então, a ruídos superiores a 85 decibéis, conforme a alteração trazida pelo Decreto n. 4.882, de 18-11-2003, ao Decreto n. 3.048/99. 6. Não havendo provas consistentes de que o uso de EPIs neutralizava os efeitos dos agentes nocivos a que foi exposto o segurado durante o período laboral, deve-se enquadrar a respectiva atividade como especial. Em se tratando de ruído nem mesmo a comprovação de que a utilização de protetores reduzia a intensidade do som a níveis inferiores aos máximos deve afastar o reconhecimento da especialidade da atividade, pois já comprovado que a exposição por períodos prolongados produz danos em decorrência das vibrações transmitidas, que não são eliminadas pelo uso do equipamento de proteção. 7. A habitualidade e permanência do tempo de trabalho em condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física referidas no artigo 57, § 3º, da Lei 8.213/91 não pressupõem a submissão contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho. Não se interpreta como ocasional, eventual ou intermitente a exposição ínsita ao desenvolvimento das atividades cometidas ao trabalhador, integrada à sua rotina de trabalho. Precedentes desta Corte. 8. Comprovada a exposição do segurado a agente nocivo, na forma exigida pela legislação previdenciária aplicável à espécie, possível reconhecer-se a especialidade do tempo de labor correspondente. 9. Preenchidos os requisitos legais, tem o segurado direito à obtenção de aposentadoria por tempo de contribuição integral. (TRF4, AC 0007342-98.2014.4.04.9999, QUINTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, D.E. 21/06/2017)
Isso posto, passo ao exame da hipótese dos autos.
Caso
Convertido o julgamento deste recurso em diligência, foi produzida prova pericial (fls. 233/245). Ocorre que o perito, em vez de examinar a especialidade da atividade exercida nos períodos indicados no pedido do autor e na decisão que converteu o julgamento em diligência, baseou-se nos intervalos constantes na CTPS do autor e indicados no processo administrativo (em resumo, de 01/12/1976 a 16/05/2005). Daí não resulta todavia, a imprestabilidade do laudo pericial.
Em verdade, sequer haveria como o perito examinar a especialidade da atividade exercida nos demais períodos, pois não houve indicação da função exercida e do empregador. A falta de início de prova material do tempo de serviço alegado ensejou, inclusive, a extinção do processo sem resolução do mérito, como visto acima.
Compreende-se, assim, que o expert tenha examinado apenas aqueles períodos constantes na CTPS do autor, dentre os quais se encontram parte daqueles indicados na inicial. Cumpre, assim, partir da análise efetuada pelo perito para verificar se está configurada a especialidade da atividade exercida nos interregnos apontados na inicial e que não foram objeto da extinção sem exame do mérito. Cuida-se, cumpre repisar, dos períodos de 01/12/1976 a 12/11/1977, 01/06/1984 a 28/12/1984, 04/03/1985 a 27/09/1985 e 09/10/1985 a 17/12/1985 e de 01/04/1992 a 12/08/1992.
Conforme o laudo pericial, no período de 01/12/1976 a 08/03/1978, o autor esteve exposto, de forma habitual e permanente, a ruído de 89,3 decibéis; no período de 01/06/1984 a 28/12/1984, a ruído de 95,8 decibéis; no período de 04/03/1985 a 27/09/1985, a ruído de 93,1 decibéis. Como visto acima, o limite de tolerância, à época, era de 80 decibéis, de modo que está caracterizada a especialidade da atividade em todos esses períodos. O laudo refere que não foram fornecidos equipamentos de proteção individual ao autor -- os quais, de qualquer modo, não teriam a aptidão de neutralizar a nocividade do ruído, consoante pontuado alhures. É de ser reconhecida, portanto, a especialidade desse tempo de serviço.
No que concerne, a seu turno, ao intervalo de 09/10/1985 a 17/12/1985, o perito descreveu a exposição habitual e permanente a ruído, mas afirmou que a sua avaliação foi prejudicada. De qualquer sorte, foi também apontada a exposição a produtos químicos organofosforados (em razão dos herbicidas manejados, na função de serviços gerais na lavoura) e a óleos e graxas (na regulagem das máquinas). Confira-se, a esse respeito, excerto do laudo pericial (fl. 238):
Interpretação dos Agentes Químicos - Anexo 13 da NR 15
No período de 09/10/1985 a 17/12/1985 nas atividades agrícolas o autor fez a utilização de Roundap (Glifosato) para o combate a ervas daninhas o qual é um organofosforado (com formulação a base de carbono e fósforo em sua molécula). São produtos dotados de grande toxicidade, mesmo em baixas concentrações, podendo levar ao êxito letal, apenas em poucos miligramas. Para isso não utilizava equipamentos de proteção individual. A Portaria 3214/78, norma Regulamentadora 15, Anexo 13, Agentes Químicos, Fósforo, determina insalubridade de grau médio ao emprego de defensivos organofosforados, em critério qualitativo, independente de concentrações, modo de emprego, uso de EPIs. Ainda nas atividades de regulagem, manutenção, conserto e abastecimento de máquinas equipamentos da atividade agrícola, devido a não utilização de equipamentos de proteção individual, tinha contato com óleos e graxas, o qual oferece risco e danos ao organismo, pois propiciam o surgimento de patologias como dermatoses. A Portaria 3214/78, Norma Regulamentadora 15, Anexo 13, Agentes Químicos, Hidrocarbonetos e outros compostos de carbono, determina insalubridade em grau máximo, à manipulação de óleos minerais.
Também foi registrada, pelo expert, a falta de fornecimento de equipamentos de proteção individual, de sorte que não há de se cogitar da neutralização da nocividade constatada. Impõe-se, por conseguinte, o reconhecimento da especialidade da atividade exercida nesse intervalo.
Destarte, deve ser reconhecida a especialidade do tempo de serviço prestado de 01/12/1976 a 12/11/1977, 01/06/1984 a 28/12/1984, 04/03/1985 a 27/09/1985, de 09/10/1985 a 17/12/1985 e de 01/04/1992 a 12/08/1992.
Conversão do tempo especial em comum
É possível a conversão do tempo especial em comum, sendo irrelevante, nesse particular, o advento da MP nº 1.663, convertida na Lei nº 9.711/1998. Isso porque, após a última reedição dessa medida provisória, a norma se tornou definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91 - o qual autoriza a referida conversão.
Nessa linha, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do recurso especial repetitivo nº 1151363, em 23/03/2011, do qual foi Relator o Ministro Jorge Mussi, pacificou o entendimento de que é possível a conversão mesmo após 28/05/1998, nos seguintes termos:
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE ESPECIAL APÓS 1998. MP N. 1.663-14, CONVERTIDA NA LEI N. 9.711/1998 SEM REVOGAÇÃO DA REGRA DE CONVERSÃO.
1. Permanece a possibilidade de conversão do tempo de serviço exercido em atividades especiais para comum após 1998, pois a partir da última reedição da MP n. 1.663, parcialmente convertida na Lei 9.711/1998, a norma tornou-se definitiva sem a parte do texto que revogava o referido § 5º do art. 57 da Lei n. 8.213/91.
2. Precedentes do STF e do STJ.
Destarte, considerando que o parágrafo 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 não foi revogado expressa ou tacitamente pela Lei nº 9.711/98 e que, por disposição constitucional (art. 15 da Emenda Constitucional nº 20, de 15/12/1998), permanecem em vigor os artigos 57 e 58 da Lei de Benefícios até que a lei complementar a que se refere o art. 201, § 1º, da Constituição Federal, seja publicada, é possível a conversão de tempo de serviço especial em comum inclusive após 28/05/1998.
Noutro giro, o fator de conversão do tempo especial em comum a ser utilizado é aquele previsto na legislação vigente na data concessão do benefício - e não o contido na legislação vigente quando o serviço foi prestado. A propósito, a questão já foi pacificada pelo Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial Repetitivo (REsp 1310034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, julgado em 24/10/2012, DJe 19/12/2012), vindo-se a editar a seguinte tese:
A lei vigente por ocasião da aposentadoria é a aplicável ao direito à conversão entre tempos de serviço especial e comum, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço.
Desse modo, cumpre observar as normas atualmente vigentes. Friso, nessa linha, que, desde o advento do Decreto nº 357/91 (art. 64) -- sucedido por diversos atos infralegais que não modificaram a regra --, o fator de conversão a ser observado é de 1,4 para o homem e de 1,2 para a mulher (considerando, em ambos os casos, o exercício de atividade que ensejaria a aposentadoria especial em 25 anos).
Impõe-se, assim, a manutenção da sentença nesse particular, procedendo-se à conversão pelo fator multiplicador 1,4.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição
Primeiramente, saliento que, por força da promulgação da Emenda Constitucional nº 20/98, em 16/12/1998, foram alteradas as regras inicialmente consagradas na Constituição Federal e na Lei nº 8.213/91 para a concessão de aposentadoria por tempo de serviço. Assim, a aposentadoria por tempo de serviço foi extinta, sendo instituídas novas regras para a concessão da agora chamada aposentadoria por tempo de contribuição.
Assinale-se, entretanto, que a referida emenda constitucional, em seu art. 3º, ressalvou o direito adquirido dos segurados que até a data de sua publicação haviam preenchidos os requisitos legais para a concessão de benefício previdenciário. Além disso, introduziu uma regra de transição (art. 9º), a qual assegura a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional ou integral ao segurado filiado ao RGPS até a data de publicação dessa emenda.
Note-se que, para valer-se do tempo de serviço/contribuição ulterior, é necessária a submissão do segurado à nova legislação (regras de transição, no caso de aposentadoria proporcional; regras permanentes, no caso da aposentadoria integral, já que as regras de transição não são aplicáveis em relação a ela, como se verá alhures).
Em síntese, se o segurado se filiou à Previdência Social antes da vigência da EC nº 20/98 e conta tempo de serviço posterior àquela data, poderá trazer ao caso examinado a incidência de três hipóteses:
A) Das Regras Antigas, com limitação do tempo de serviço e carência em 16-12-98, para verificar o preenchimento das condições legais para a Aposentadoria por Tempo de Serviço, seja proporcional ou integral, cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n. 8.213/91: exige-se o implemento da carência e do tempo de serviço mínimo de 25 anos para a segurada e 30 anos para o segurado, que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 6% (seis por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que dará ensejo à inativação integral (conforme previsto nos arts. 142, 52 e 53, I e II, todos da Lei n.º 8213/91);
B) Das Regras Permanentes (EC nº 20/98), sem qualquer restrição temporal pela legislação previdenciária, apenas com limitação na DER. A Aposentadoria por Tempo de Contribuição é devida ao segurado que, cumprindo a carência exigida, prevista no art. 142 da Lei nº 8.213/91, completar 35 anos de contribuição, se homem, e 30 anos de contribuição, se mulher;
C) Das Regras de Transição - Aposentadoria por Tempo de Contribuição proporcional ou integral, com o cômputo do tempo trabalhado até 28/11/1999, dia anterior à edição da lei do fator previdenciário (Lei nº 9876/99), cujo salário de benefício deverá ser calculado nos termos da redação original do art. 29 da Lei n.º 8.213/91. Para a inativação proporcional, é preciso o implemento da carência (art. 142 da Lei n.º 8213/91) e do tempo de contribuição mínimo de 25 anos, se mulher e 30 anos, se homem e, respectivamente, a idade mínima de 48 anos e 53 anos e, se for o caso, do pedágio de 20% para a aposentadoria integral ou 40% para a proporcional que, em 16/12/1998, faltava para atingir aquele mínimo necessário à outorga da inativação (art. 9.º, § 1.º, I, "a" e "b", da EC n.º 20/98), que corresponderá a 70% do salário de benefício, acrescido de 5% (cinco por cento) para cada ano de trabalho que superar aquela soma, até o máximo de 100%, que corresponderá à inativação integral (inciso II da norma legal antes citada). Ressalte-se, porém, que não se aplica a exigência da idade e do pedágio para a aposentadoria integral, porquanto mais gravosa ao segurado, entendimento, inclusive, do próprio INSS (Instrução Normativa INSS/DC n.º 57/2001), mantido nos regramentos subsequentes.
Importante lembrar que, independentemente do tempo encontrado, impõe-se a realização das simulações possíveis, uma vez que os salários de contribuição poderão variar nos períodos apurados e não necessariamente de um tempo de serviço mais reduzido advirá uma RMI menor.
Reconhece-se, portanto, o direito do segurado ao cálculo da RMI que lhe for mais vantajosa. Assim, caso o segurado preencha os requisitos para a concessão do benefício à luz das regras antigas, das regras permanentes e das regras de transição, a RMI do benefício deve ser calculada conforme as regras que lhe forem mais vantajosas. Não obstante, só há de se falar em direito adquirido ao melhor benefício se o segurado efetivamente preencher os requisitos para a aposentadoria em mais de um momento.
No caso em tela, considerando-se os períodos reconhecidos nesta demanda e aqueles já averbados pelo INSS, percebe-se que o autor computava:
A contagem de tempo de serviço efetuada na sentença está a ser modificada, portanto, por duas razões. A primeira, em virtude da exclusão de determinados períodos que foram reconhecidos como especiais na sentença e cuja especialidade aqui sequer foi examinada, tendo em vista a falta de início de prova material do tempo de serviço. A segunda, pela adequação da contagem, pois a sentença acresceu o lapso temporal decorrente da conversão do tempo especial em comum como se o período não tivesse sido reconhecido como comum pelo INSS (isto é, no lugar de somar 40% do período, somou 140%, contando duas vezes o tempo comum).
Conclui-se, nessas condições, que a parte autora, em 16/12/1998, não tinha direito à aposentadoria por tempo de serviço, ainda que proporcional (regras anteriores à EC 20/98), porque não preenchia o tempo mínimo de serviço (30 anos).
Posteriormente, em 28/11/1999, não tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição (30 anos), a idade (53 anos) e o pedágio (3 anos, 4 meses e 7 dias).
Por fim, em 23/11/2006 (DER), não tinha direito à aposentadoria por tempo de contribuição porque não preenchia o tempo mínimo de contribuição (30 anos), a idade (53 anos) e o pedágio (3 anos, 4 meses e 7 dias).
Não obstante, cumpre considerar, como já consignado na sentença, que, conforme o CNIS, a parte autora exerceu atividade laborativa, na condição de empregada, após a realização do requerimento administrativo. De fato, o autor laborou até 28/02/2011. Resta, assim, analisar a possibilidade de cômputo de tempo de serviço posterior ao requerimento administrativo, para fins de inativação, ainda que ausente pedido específico do autor neste sentido.
Em data recente, a Terceira Seção desta Corte, no julgamento realizado nos autos do processo nº 5007975-25.2013.4.04.7003, levado a cabo na forma do artigo 947, § 3º, do NCPC - Incidente de Assunção de Competência -, concluiu pela possibilidade de reafirmação da DER, prevista pela IN nº 77/2015 do INSS (redação mantida pela subsequente IN nº 85, de 18/02/2016), também em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, inclusive quanto ao labor prestado pela parte autora após o ajuizamento da ação, para fins de concessão de benefício previdenciário, desde que observado o contraditório, e tendo como limite a data do julgamento da apelação ou remessa necessária no segundo grau de jurisdição:
PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE ATIVIDADE COMUM. CONVERSÃO EM ESPECIAL. IMPOSSIBILIDADE. JUÍZO DE RETRATAÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL. 1. Recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, no RESP nº 1.310.034-PR, representativo de controvérsia, consagrou que após a Lei nº 9.032/95 somente se admite aposentadoria especial para quem exerceu todo o tempo de serviço em condições especiais. Inviável, assim, diante dessa nova orientação jurisprudencial, a conversão do tempo de serviço comum em especial. 2. Afasta-se, nos termos da decisão do STJ, a conversão dos períodos de atividade comum em especial anteriores a 29/04/1995. 3. A 3ª Seção desta Corte tem admitido a reafirmação da DER, prevista pela Instrução Normativa nº 77/2015 do INSS e ratificada pela IN nº 85, de 18/02/2016, também em sede judicial, nas hipóteses em que o segurado implementa todas as condições para a concessão do benefício após a conclusão do processo administrativo, admitindo-se cômputo do tempo de contribuição inclusive quanto ao período posterior ao ajuizamento da ação. Precedente desta Turma. (TRF4, APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 5007975-25.2013.404.7003, 3ª SEÇÃO, Des. Federal PAULO AFONSO BRUM VAZ, POR UNANIMIDADE, j. 06-04-2017).
No caso em apreço, a sentença efetuou a reafirmação da DER até 30/10/2010. Porém, efetuando-se os ajustes no cômputo do tempo de contribuição, conclui-se que, nesse marco temporal, o autor totalizava 33 anos, 1 mês e 18 dias, insuficiente para o gozo da aposentadoria proporcional por tempo de contribuição (regra de transição da EC nº 20/98), pois o tempo mínimo exigido, considerado o pedágio, é de 33 anos, 4 meses e 7 dias. Esse requisito só veio a ser cumprido em 19/01/2011, data em que, por conseguinte, deve ser reafirmada a DER.
Reitere-se que a sentença recorrida já efetuou a reafirmação da DER, de modo que o INSS teve a oportunidade de se manifestar, no recurso de apelação, acerca do tempo de contribuição posterior à DER -- deixando, contudo, de impugnar as informações registradas no CNIS. Tendo em vista que o período adicional considerado no julgamento deste recurso para postergar a reafirmação da DER diz respeito ao mesmo vínculo utilizado pelo juízo de origem, vê-se que restou plenamente atendido o contraditório.
Impõe-se, desse modo, a reforma da sentença, a fim de reconhecer que o autor faz jus à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição apenas a contar de 19/02/2011.
Consectários - juros moratórios e correção monetária
O Plenário do STF concluiu o julgamento do Tema 810, fixando as seguintes teses sobre a questão, consoante acompanhamento processual do RE 870.947 no Portal do STF:
Ao final, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio, fixou as seguintes teses, nos termos do voto do Relator:
1) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina os juros moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública, é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de relação jurídico-tributária, aos quais devem ser aplicados os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo hígido, nesta extensão, o disposto no art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09; e
2) O art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, na parte em que disciplina a atualização monetária das condenações impostas à Fazenda Pública segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança, revela-se inconstitucional ao impor restrição desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º, XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a promover os fins a que se destina. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 20.9.2017.
Como se pode observar, o Pretório Excelso não efetuou qualquer modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade do art. 1ºF- da Lei 9.494/97, dada pela Lei nº 11.960/09 em relação à correção monetária.
Assim, a correção monetária incidirá a contar do vencimento de cada prestação e será calculada pelos índices oficiais e aceitos na jurisprudência, quais sejam:
- INPC (de 04-2006 a 29-06-2009, conforme o art. 31 da Lei n.º 10.741/03, combinado com a Lei n.º 11.430/06, precedida da MP n.º 316, de 11-08-2006, que acrescentou o art. 41-A à Lei n.º 8.213/91).
- IPCA-E (a partir de 30-06-2009, conforme RE 870.947, j. 20-09-2017).
Os juros de mora, de 1% (um por cento) ao mês, serão aplicados a contar da citação (Súmula 204 do STJ), até 29-06-2009. A partir de 30-06-2009, segundo os índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, conforme art. 5º da Lei 11.960/09, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97.
Ônus sucumbenciais
A reforma da sentença não implica uma modificação significativa na proporção da sucumbência da cada parte, de modo que deve ser mantida a repartição dos ônus sucumbenciais feita na sentença.
Note-se que, como a sentença foi publicada sob a vigência do CPC/1973, os ônus sucumbenciais devem ser distribuídos conforme as normas aí previstas. Descabe, consequentemente, cogitar-se da fixação de honorários advocatícios recursais (art. 85, § 11, CPC/2015).
Antecipação de tutela e tutela específica
Confirmada a sentença quanto à concessão do benefício, alterando-se apenas o seu termo inicial, mostra-se inócuo deliberar acerca da revogação da antecipação de tutela concedida na sentença. Isso porque, com o julgamento do feito em segundo grau, deve ser determinada a tutela específica do direito reclamado. Com efeito, considerando os termos do art. 497 do CPC/2015, que repete dispositivo constante do art. 461 do Código de Processo Civil/1973, e o fato de que, em princípio, a presente decisão não está sujeita a recurso com efeito suspensivo (Questão de Ordem na AC nº 2002.71.00.050349-7/RS - Rel. p/ acórdão Desemb. Federal Celso Kipper, julgado em 09/08/2007 - 3ª Seção), o acórdão deveria ser imediatamente cumprido quanto à implementação do benefício postulado. Logo, a revogação da antecipação de tutela não possuiria o condão de fazer cessar o benefício, cuja implementação seria mantida, invariavelmente, por força da tutela específica.
Ante o exposto, voto no sentido de dar parcial provimento à apelação, a fim de reconhecer a especialidade do tempo de serviço prestado de 01/12/1976 a 12/11/1977, 01/06/1984 a 28/12/1984, 04/03/1985 a 27/09/1985, de 09/10/1985 a 17/12/1985 e de 01/04/1992 a 12/08/1992 e de julgar o processo extinto sem resolução de mérito em relação aos demais períodos indicados na petição inicial (artigo 485, IV, do CPC/2015 e artigo 267, IV, do CPC/1973), bem como de conceder à parte autora o benefício de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, a contar de 19/01/2011.
Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO
Relator
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO DE 17/07/2018
APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006756-66.2011.4.04.9999/RS
ORIGEM: RS 00190410320088210069
RELATOR | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
PRESIDENTE | : | Osni Cardoso Filho |
PROCURADOR | : | Dr. Jorge Luiz Gasparini da Silva |
APELANTE | : | INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS |
ADVOGADO | : | Procuradoria Regional da PFE-INSS |
APELADO | : | ZELLÁRIO PELLENZ |
ADVOGADO | : | Jefferson Luis Vicari |
Certifico que este processo foi incluído na Pauta do dia 17/07/2018, na seqüência 16, disponibilizada no DE de 29/06/2018, da qual foi intimado(a) INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, o MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e as demais PROCURADORIAS FEDERAIS.
Certifico que o(a) 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, em sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A TURMA, POR UNANIMIDADE, DECIDIU DAR PARCIAL PROVIMENTO À APELAÇÃO, A FIM DE RECONHECER A ESPECIALIDADE DO TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO DE 01/12/1976 A 12/11/1977, 01/06/1984 A 28/12/1984, 04/03/1985 A 27/09/1985, DE 09/10/1985 A 17/12/1985 E DE 01/04/1992 A 12/08/1992 E DE JULGAR O PROCESSO EXTINTO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO EM RELAÇÃO AOS DEMAIS PERÍODOS INDICADOS NA PETIÇÃO INICIAL (ARTIGO 485, IV, DO CPC/2015 E ARTIGO 267, IV, DO CPC/1973), BEM COMO DE CONCEDER À PARTE AUTORA O BENEFÍCIO DE APOSENTADORIA PROPORCIONAL POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, A CONTAR DE 19/01/2011.
RELATOR ACÓRDÃO | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
VOTANTE(S) | : | Des. Federal OSNI CARDOSO FILHO |
: | Juiz Federal ALTAIR ANTONIO GREGORIO | |
: | Juíza Federal LUCIANE MERLIN CLEVE KRAVETZ |
Lídice Peña Thomaz
Secretária de Turma
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