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PREVIDENCIÁRIO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SEGURADO. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. ...

Data da publicação: 06/05/2023, 07:03:20

EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SEGURADO. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. TEMA 979 IMPOSSIBILIDADE. 1. O pagamento realizado pelo INSS com erro material ou operacional é suscetível de repetição, mas, para os fatos anteriores à publicação da tese jurídica fixada pelo STJ, deverá a autarquia demonstrar a ausência de boa-fé do segurado (Tema 979/STJ). 2. Hipótese na qual tratando-se de verba de natureza alimentar, recebida de boa-fé, não se pode falar em restituição dos valores recebidos. Incabível a cobrança, pelo INSS, dos valores pagos a título de benefício previdenciário, ainda que indevidamente. (TRF4, AC 5015186-10.2016.4.04.7100, QUINTA TURMA, Relator ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, juntado aos autos em 28/04/2023)

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015186-10.2016.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ROSICLER DAVILA DE ARAUJO (Sucessão) (AUTOR)

APELADO: GEOVANI DAVILA DE ARAUJO (Sucessor)

RELATÓRIO

Trata-se de ação declaratória de inexistência de débito c/c com pedido de antecipação de tutela, ajuizada pela autora ROSICLER DAVILA DE ARAUJO, neste ato representada por sua curadora/genitora Florinda D'Ávila de Araújo, em razão do cancelamento da percepção do benefício de prestação continuada (NB 87/103.518.946-9), inacumulável com a pensão por morte de genitor, que a autora passou a receber (21/075.862.947-8), cujo benefício foi cancelado e apurado o débito de R$ 61.326,15 reais. Requer, ainda, a devolução das quantias já descontadas dos benefícios de sua genitora Florinda D'Ávila de Araújo (NB 41/111.249.907-2 e 21/075.862.930-3).

Foi comunicado a substituição de nova curadora Salete Pereira da Silva Martins, em substituição à Florinda Dávila de Araújo, mãe da autora, com o requerimento de retificação do polo ativo (evento 5, PET1).

Foi deferida a AJG e antecipada a tutela​​​, para o fim de determinar ao INSS que se abstenha de qualquer desconto nos benefícios de pensão por morte NB 21/075.862.947-8 e 21/075.862.930-3 e de aposentadoria por idade NB 41/111.249.907-2, a título de valor indevidamente recebido pela autora a título de benefício assistencial (evento 7, DESPADEC1).

A sentença proferida em 13/03/2017, julgou procedente o pedido, nos seguintes termos (evento 39, SENT1):

ANTE O EXPOSTO, ratificando a antecipação da tutela anteriormente deferida, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS deduzidos na presente Ação, para o fim de determinar ao INSS que cesse definitivamente qualquer desconto efetuado nos benefícios de pensão por morte titularizados pela requerente (NB 21/075.862.947-8) e de aposentadoria por idade e pensão por morte recebidas pela Sra. Florinda D'Ávila de Araújo (NB 41/111.249.907-2 e 21/075.862.930-3), efetuado a título de valores indevidos do benefício assistencial devido ao deficiente físico e ao idoso NB 87/103.518.946-9.

Fixação dos honorários: Inexistindo a condenação ao pagamento de valores e sendo o INSS considerado "Fazenda Pública", aplicáveis os §§ 3º e 4º, III, do artigo 85 do CPC/2015, incidindo o percentual dos honorários sobre o valor da causa atualizado até o momento. Sendo o valor atribuído de R$ 71.403,52 no ajuizamento, certamente não ultrapassa atualmente os 200 salários mínimos, razão pela qual aplicáveis os limites do inciso I do § 3º. Assim, tendo em conta os critérios do § 2º e os limites do § 3º, I, fixo os honorários advocatícios a serem pagos pelo INSS em 10% do valor da causa, devidamente atualizado pela variação do INPC.

Demanda isenta de custas.

Apela o INSS alegando, em síntese (evento 46, APELAÇÃO1), a possibilidade de restituição de valores recebidos pela parte autora por erro administrativo, nos termos do art. 115, da Lei 8.213/91, independentemente da boa ou má-fé do recebedor. Por fim, requer seja aplicado integralmente a Lei 11.960/2009, no tocante os consectários legais.

Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte (evento 51, CONTRAZ1).

O MPF opinou pela nulidade parcial da sentença, bem como pelo desprovimento da apelação (evento 5, PARECER1).

Tendo em conta a notícia do falecimento da autora ROSICLER DAVILA DE ARAUJO, em 06/06/2020, foi determinada a habilitação dos herdeiros (evento 20, DESPADEC1).

Homologado o pedido de habilitação, para constar Geovani D'Ávila de Araújo no pólo passivo da ação (evento 47, DESPADEC1).

É o relatório.

VOTO

Admissibilidade

Recurso adequado e tempestivo. INSS isento de custas, nos termos do art. 4º, I, da Lei 9.289/1996.

Da repetição de valores

A controvérsia recursal restringe-se à restituição de valores recebidos pelo segurado, em razão da percepção indevida de benefícios inacumuláveis.

A devolução de valores referentes a benefícios previdenciários indevidamente recebidos tem previsão no inciso II, do art. 115 da Lei 8213/91:

Art. 115: Podem ser descontados dos benefícios:

(...)

II - pagamento de benefícios além do devido.

(...)

§ 1º Na hipótese do inciso II, o desconto será feito em parcelas, conforme dispuser o regulamento, salvo má-fé.

Contudo, consolidou-se na jurisprudência o entendimento de que, quando o recebimento dá-se de boa-fé, não se pode autorizar descontos no benefício previdenciário a título de restituição de valores pagos ao segurado por erro administrativo, isso em razão do princípio da irrepetibilidade ou da não devolução dos alimentos.

Nesse sentido, este Tribunal Regional Federal da 4ª Região já decidiu:

PROCESSO CIVL E PREVIDENCIÁRIO. DEVOLUÇÃO.DOS VALORES PAGOS EM RAZÃO DE ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ DO SEGURADO. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES. IRREPETIBILIDADE. 1. É indevida a devolução de valores recebidos em decorrência de erro da Administração Pública no pagamento do benefício previdenciário, tanto em razão da boa-fé do segurado e da sua condição de hipossuficiente, como também em virtude do caráter alimentar das parcelas e da irrepetibilidade dos alimentos. (TRF4 5014634-88.2015.404.7000, SEXTA TURMA, Relator JOÃO BATISTA PINTO SILVEIRA, juntado aos autos em 21/10/2016).

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. CARÁTER ALIMENTAR. BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE. 1. É indevida a devolução de valores recebidos em decorrência de erro da Administração Pública no pagamento do benefício previdenciário, tanto em razão da boa-fé do segurado e da sua condição de hipossuficiente, como também em virtude do caráter alimentar das parcelas. Precedentes do STJ e desta Corte. 2. No caso em tela, a autora, beneficiária de pensão por morte desde 1969, contraiu novo matrimônio em 1971, ato que levaria à perda da qualidade de dependente pela legislação da época (Decreto 60.501/67, art. 15, VI). Quando requereu a pensão por morte em decorrência do falecimento do novo cônjuge, em 2011, foi informada de que houve pagamento indevido da pensão por morte no período de 40 anos, havendo lançamento do débito. irrepetibilidade dos valores recebidos de boa-fé. (TRF4, APELREEX 0014099-11.2014.404.9999, QUINTA TURMA, Relator ROGER RAUPP RIOS, D.E. 08/11/2016).

Na mesma linha é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:

PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. APLICABILIDADE. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. BENEFÍCIO RECEBIDO INDEVIDAMENTE POR ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. BOA-FÉ. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. I - Consoante o decidido pelo Plenário desta Corte na sessão realizada em 09.03.2016, o regime recursal será determinado pela data da publicação do provimento jurisdicional impugnado. Assim sendo, in casu, aplica-se o Código de Processo Civil de 1973. II - Por força do princípio da irrepetibilidade dos alimentos, e, sobretudo, em razão da diretriz da boa-fé objetiva do segurado, não cabe a devolução de valores recebidos, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação equivocada, má aplicação da lei ou erro da Administração. III - Recurso Especial não provido. (REsp 1550569/SC, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 03/05/2016, DJe 18/05/2016).

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. PAGAMENTO INDEVIDO. BOA-FÉ. ERRO DA ADMINISTRAÇÃO. VERBA DE CARÁTER ALIMENTAR. RESTITUIÇÃO DE VALORES. IMPOSSIBILIDADE. 1. Conforme a jurisprudência do STJ é incabível a devolução de valores percebidos por pensionista de boa-fé por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração. 2. É descabido ao caso dos autos o entendimento fixado no Recurso Especial 1.401.560/MT, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC, pois não se discute na espécie a restituição de valores recebidos em virtude de antecipação de tutela posteriormente revogada. 3. Recurso Especial não provido. (REsp 1553521/CE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/11/2015, DJe 02/02/2016).

No entanto, quando os benefícios previdenciários são obtidos, comprovadamente, mediante fraude, dolo e má-fé, há previsão legal autorizando a administração a adotar medidas administrativas para fazer cessar a ilicitude, bem como a buscar a via judicial para obter a restituição da verba indevidamente paga.

Assim, ainda que se trate de parcela com nítido caráter alimentar, acaso caracterizada a má-fé do beneficiário no recebimento dos valores, não há como se obstar a conduta da Administração de procurar reaver os valores pagos indevidamente. Nesse sentido:

PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. REMESSA EX OFFICIO. INEXISTÊNCIA. DECADÊNCIA. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. DEFICIENTE. VALORES PERCEBIDOS DE MÁ-FÉ PELO RESPONSÁVEL LEGAL. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. POSSIBILIDADE DE RESSARCIMENTO. CONSECTÁRIOS LEGAIS DA CONDENAÇÃO. PRECEDENTES DO STF E STJ. CONSECTÁRIOS DA SUCUMBÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. MAJORAÇÃO. AJG. INEXIGIBILIDADE TEMPORÁRIA. 1. Hipótese em que a sentença não está sujeita à remessa ex officio, a teor do disposto no artigo 496, § 3º, I, do Código de Processo Civil. 2. O pagamento de benefício de prestação continuada não atrai a incidência do prazo decadencial, de modo a admitir a revisão administrativa bianual expressamente prevista em lei, no que se refere à permanência dos requisitos legais. 3. A Administração possui o poder-dever de anular seus próprios atos, quando eivados de ilegalidade, assegurado o contraditório e ampla defesa. 4. A revisão administrativa é cabível quando fundada na suspeita de fraude ou erro, não se tratando de nova valoração de provas já examinadas. 5. Evidenciada a ciência do recebimento irregular de benefício assistencial pelo responsável legal do deficiente físico após o início do exercício de atividade laboral e constituição de entidade familiar própria, sem que os valores revertessem em favor do titular do benefício, está configurada a má-fé, sendo cabível o ressarcimento dos pagamentos indevidos. 6. Critérios de correção monetária e juros de mora conforme decisão do STF no RE nº 870.947, DJE de 20-11-2017 e do STJ no REsp nº 1.492.221/PR, DJe de 20-3-2018. 7. Improvido o recurso da parte autora, majora-se a verba honorária, elevando-a de 5% para 10% sobre o valor da causa atualizado, consideradas as variáveis dos incisos I a IV do § 2º e o § 11, ambos do artigo 85 do CPC, suspendendo-se a sua exigibilidade temporariamente em face do benefício da assistência judiciária gratuita. (TRF4 5007610-45.2016.4.04.7009, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator FERNANDO QUADROS DA SILVA, juntado aos autos em 12/06/2021)

PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS DE FORMA INDEVIDA. Comprovado nos autos que o segurado concorreu para a inclusão de períodos de trabalho inexistentes, em sua CTPS, o que resultou em pagamento indevido de benefício, correta a decisão que afasta a boa-fé no recebimento dos valores e determina a respectiva devolução ao INSS. (TRF4, AC 5005617-36.2017.4.04.7104, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 22/06/2021).

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Tema 979, fixou a seguinte tese:

Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis, sendo legítimo o desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) de valor do benefício pago ao segurado/beneficiário, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.

O julgado (REsp n.º 1.381.734/RN) foi assim ementado:

PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. TEMA 979. ARTIGO 1.036 DO CPC/2015. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 884 E 885 DO CÓDIGO CIVIL/2002. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211 DO STJ. ART. 115, II, DA LEI N. 8.213/1991. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE INTERPRETAÇÃO ERRÔNEA E MÁ APLICAÇÃO DA LEI. NÃO DEVOLUÇÃO. ERRO MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO. POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO SOMENTE NA HIPÓTESE DE ERRO EM QUE OS ELEMENTOS DO CASO CONCRETO NÃO PERMITAM CONCLUIR PELA INEQUÍVOCA PRESENÇA DA BOA-FÉ OBJETIVA.
1. Da admissão do recurso especial: Não se conhece do recurso especial quanto à alegada ofensa aos artigos 884 e 885 do Código Civil, pois não foram prequestionados. Aplica-se à hipótese o disposto no enunciado da Súmula 211 do STJ. O apelo especial que trata do dissídio também não comporta conhecimento, pois não indicou as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os precedentes colacionados e também por ausência de cotejo analítico e similitude entre as hipóteses apresentadas. Contudo, merece conhecimento o recurso quanto à suposta ofensa ao art. 115, II, da lei n.
8.213/1991.
2. Da limitação da tese proposta: A afetação do recurso em abstrato diz respeito à seguinte tese: Devolução ou não de valores recebidos de boa-fé, a título de benefício previdenciário, por força de interpretação errônea, má aplicação da lei ou erro da Administração da Previdência Social.
3. Irrepetibilidade de valores pagos pelo INSS em razão da errônea interpretação e/ou má aplicação da lei: O beneficiário não pode ser penalizado pela interpretação errônea ou má aplicação da lei previdenciária ao receber valor além do devido. Diz-se desse modo porque também é dever-poder da Administração bem interpretar a legislação que deve por ela ser aplicada no pagamento dos benefícios. Dentro dessa perspectiva, esta Corte Superior evoluiu a sua jurisprudência passando a adotar o entendimento no sentido de que, para a não devolução dos valores recebidos indevidamente pelo beneficiário da Previdência Social, é imprescindível que, além do caráter alimentar da verba e do princípio da irrepetibilidade do benefício, a presença da boa-fé objetiva daquele que recebe parcelas tidas por indevidas pela administração. Essas situações não refletem qualquer condição para que o cidadão comum compreenda de forma inequívoca que recebeu a maior o que não lhe era devido.
4. Repetição de valores pagos pelo INSS em razão de erro material da Administração previdenciária: No erro material, é necessário que se averigue em cada caso se os elementos objetivos levam à conclusão de que houve boa-fé do segurado no recebimento da verba. Vale dizer que em situações em que o homem médio consegue constatar a existência de erro, necessário se faz a devolução dos valores ao erário.
5. Do limite mensal para desconto a ser efetuado no benefício: O artigo 154, § 3º, do Decreto n. 3.048/1999 autoriza a Administração Previdenciária a proceder o desconto daquilo que pagou indevidamente; todavia, a dedução no benefício só deverá ocorrer quando se estiver diante de erro da administração. Nesse caso, caberá à Administração Previdenciária, ao instaurar o devido processo administrativo, observar as peculiaridades de cada caso concreto, com desconto no beneficio no percentual de até 30% (trinta por cento).
6. Tese a ser submetida ao Colegiado: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.
7. Modulação dos efeitos: Tem-se de rigor a modulação dos efeitos definidos neste representativo da controvérsia, em respeito à segurança jurídica e considerando o inafastável interesse social que permeia a questão sub examine, e a repercussão do tema que se amolda a centenas de processos sobrestados no Judiciário. Desse modo somente deve atingir os processos que tenham sido distribuídos, na primeira instância, a partir da publicação deste acórdão.
8. No caso concreto: Há previsão expressa quanto ao momento em que deverá ocorrer a cessação do benefício, não havendo margem para ilações quanto à impossibilidade de se estender o benefício para além da maioridade da beneficiária. Tratou-se, em verdade, de simples erro da administração na continuidade do pagamento da pensão, o que resulta na exigibilidade de tais valores, sob forma de ressarcimento ao erário, com descontos nos benefícios, tendo em vista o princípio da indisponibilidade do patrimônio público e em razão da vedação ao princípio do enriquecimento sem causa.
Entretanto, em razão da modulação dos efeitos aqui definidos, deixa-se de efetuar o descontos dos valores recebidos indevidamente pelo segurado.
9. Dispositivo: Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, não provido.
Acórdão sujeito ao regime previsto no artigo 1.036 e seguintes do CPC/2015.
(REsp 1381734/RN, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10/03/2021, DJe 23/04/2021).

Todavia, seus efeitos se restringem aos processos distribuídos após o referido julgamento, segundo definido em modulação de efeitos publicada em 23/04/2021.

Caso Concreto

No caso dos autos, a questão de fundo versa sobre o cabimento ou não da devolução dos valores pagos indevidamente em face da concessão irregular do benefício assistencial em favor da autora desde 24/02/1997 (evento 1, CCON7).

A autora narra na inicial que vinha usufruindo dos dois benefícios (um salário mínimo do BPC - NB 87/103.518.946-9 que foi suspenso em 2008 - e meio salário mínimo da pensão por morte - NB 21/075.862.947-8 - que vinha dividindo com sua genitora) até que em 2013, foi noticiada de que teria de devolver R$ 61.326,15 dos valores recebidos a título de benefício assistencial. Aduz, ainda, que em 2015 lhe foi informado (evento 1, OFIC9) que o valor devido seria descontado não só da renda recebida pela demandante, mas também dos benefícios de aposentadoria por idade (NB 41/111.249.907-2 - evento 18, PROCADM1, fl. 36) e pensão recebidas por sua mãe (21/075.862.930-3). Afirma que tais descontos (33,33%) são ilegais, eis que estão recaindo sobre verba alimentar recebida de boa-fé, e, portanto, pugna pela devolução dos valores descontados em questão.

Como já referido anteriormente, a parte autora pretende a abstenção de cobrança de dívida no valor de R$ 61.326,15 por suposto recebimento irregular do benefício assistencial, desde 24/02/1997 (NB 87/103.518.946-9 - evento 1, CCON7) tendo em vista não atender o requisito de renda familiar inferior a 1/4, considerando que tanta ela como a sua mãe eram detentoras de pensão por morte do pai/esposo, respectivamente, desde o óbito do instituidor, em 16/01/1983 (NB 21/075.862.947-8 e NB 21/075.862.930-3- evento 18, PROCADM1, fl. 02/03 e 14)

Ela alega, em suma, com relação ao pedido de inexigibilidade do débito, (1) a irrepetibilidade de valores de caráter alimentar e (2) inexistência de má-fé no recebimento das valores.

O caso cinge-se, primeiramente, em analisar se a autora agiu de boa-fé ao pleitear o benefício assistencial.

Primeiramente, no que concerne ao ressarcimento determinado pelo INSS, é de se ressaltar que os valores recebidos pela autora configuram natureza alimentar. Ademais, no caso, como não há comprovação de fraude por parte da beneficiária, os créditos são irrepetíveis, porquanto auferidos de boa-fé.

Assim, em não havendo má-fé da beneficiária, afasta-se o artigo 115, II, da Lei 8213/91, incidindo o princípio da irrepetibilidade ou não devolução de alimentos. No presente caso, tanto a autora (pessoa incapaz) como sua genitora (pessoa humilde e idosa), sem qualquer instrução, não tinham o conhecimento de que o benefício assistencial é incompatível com qualquer outro benefício da Previdência Social. Frise-se, ainda, que intenção da autora não é discutir a suspensão do benefício, mas sim a cobrança dos valores recebidos de boa-fé.

Nesse sentido, segue o aresto:

PREVIDENCIÁRIO. VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ. IRREPETIBILIDADE.

1. O STF, quando instado a decidir sobre o tema, vem entendendo pela inaplicabilidade do art. 115 da Lei 8.213/91 nas hipóteses de inexistência de má-fé do beneficiário. Não se trata de reconhecer a inconstitucionalidade do dispositivo, mas que a sua aplicação ao caso concreto não é compatível com a generalidade e a abstração de seu preceito, o que afasta a necessidade de observância da cláusula de reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal). Nesse sentido vem decidindo o STF, v.g.: AI 820.685-AgR, Rel. Min. Ellen Gracie; AI 746.442-AgR, Rel. Min. Cármen Lúcia.

2. No julgamento do Tema 979, o Superior Tribunal de Justiça fixou a seguinte tese: Com relação aos pagamentos indevidos aos segurados decorrentes de erro administrativo (material ou operacional), não embasado em interpretação errônea ou equivocada da lei pela Administração, são repetíveis os valores, sendo legítimo o seu desconto no percentual de até 30% (trinta por cento) do valor do benefício mensal, ressalvada a hipótese em que o segurado, diante do caso concreto, comprova sua boa-fé objetiva, sobretudo com demonstração de que não lhe era possível constatar o pagamento indevido.

3. A modulação de efeitos determina a aplicação da tese firmada apenas aos processos distribuídos após a publicação do acórdão paradigma.

(Apelação Cível º 5002730-80.2016.4.04.7115/RS. Des. Federal Tais Schilling Ferraz, acórdão de 24/03/2023).

Assim, tratando-se de verba de natureza alimentar, recebida de boa-fé pela parte autora, que desconhecia a impossibilidade de cumulação dos benefícios, não se pode falar em restituição dos valores recebidos.

Logo, o ato administrativo que determinou o desconto do montante pago é ilegal. Portanto, indevida a cobrança do valor de R$ 61.326,15, informado no ofício do INSS (evento 1, OFIC9).

Por fim, inexiste interesse processual quanto à pretensão do INSS de que seja aplicada a Lei 11.960/2009 na sua integralidade, na medida em que a sentença não condenou a Fazenda no pagamento de valores.

Diante do fundamentado, merece ser mantida a sentença de procedência da ação, ainda que por fundamento diverso.

Honorários Recursais

Vencida a parte recorrente tanto em primeira como em segunda instância, sujeita-se ao acréscimo de honorários de advogado de sucumbência recursais de que trata o § 11 do art. 85 do CPC. Majora-se o saldo final de honorários de advogado de sucumbência que se apurar aplicando os critérios fixados pelo Juízo de origem, para a ele acrescer vinte por cento.

Caso o valor da condenação/atualizado da causa apurado em liquidação do julgado venha a superar o valor de 200 salários mínimos previsto no § 3º, inciso I, do artigo 85 do CPC/2015, o excedente deverá observar o percentual mínimo da faixa subsequente, assim sucessivamente, na forma do §§ 4º, inciso III e 5º do referido dispositivo legal.

Prequestionamento

O enfrentamento das questões suscitadas em grau recursal, assim como a análise da legislação aplicável, são suficientes para prequestionar, junto às instâncias superiores, os dispositivos que as fundamentam. Desse modo, evita-se a necessidade de oposição de embargos de declaração, para esse exclusivo fim, o que evidenciaria finalidade de procrastinação do recurso, passível, inclusive, de cominação de multa, nos termos do art. 1.026, § 2º, do CPC.

Conclusão

A sentença de procedência da ação merecer ser mantida.

Confirmada a tutela antecipada deferida na sentença.

Dispositivo

Ante o exposto, voto por negar provimento à apelação do INSS.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003818998v215 e do código CRC 8a32f3aa.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Data e Hora: 28/4/2023, às 18:27:45


5015186-10.2016.4.04.7100
40003818998.V215


Conferência de autenticidade emitida em 06/05/2023 04:03:20.

Poder Judiciário
TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 4ª REGIÃO

Apelação Cível Nº 5015186-10.2016.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ROSICLER DAVILA DE ARAUJO (Sucessão) (AUTOR)

APELADO: GEOVANI DAVILA DE ARAUJO (Sucessor)

EMENTA

PREVIDENCIÁRIO. IRREPETIBILIDADE DOS VALORES RECEBIDOS DE BOA-FÉ PELO SEGURADO. CARÁTER ALIMENTAR DAS PRESTAÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. TEMA 979 IMPOSSIBILIDADE.

1. O pagamento realizado pelo INSS com erro material ou operacional é suscetível de repetição, mas, para os fatos anteriores à publicação da tese jurídica fixada pelo STJ, deverá a autarquia demonstrar a ausência de boa-fé do segurado (Tema 979/STJ).

2. Hipótese na qual tratando-se de verba de natureza alimentar, recebida de boa-fé, não se pode falar em restituição dos valores recebidos. Incabível a cobrança, pelo INSS, dos valores pagos a título de benefício previdenciário, ainda que indevidamente.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Porto Alegre, 27 de abril de 2023.



Documento eletrônico assinado por ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40003818999v6 e do código CRC 2e5acb93.Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL
Data e Hora: 28/4/2023, às 18:27:45


5015186-10.2016.4.04.7100
40003818999 .V6


Conferência de autenticidade emitida em 06/05/2023 04:03:20.

Poder Judiciário
Tribunal Regional Federal da 4ª Região

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 19/04/2023 A 27/04/2023

Apelação Cível Nº 5015186-10.2016.4.04.7100/RS

RELATOR: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PRESIDENTE: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

PROCURADOR(A): JOÃO GUALBERTO GARCEZ RAMOS

APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (RÉU)

APELADO: ROSICLER DAVILA DE ARAUJO (Sucessão) (AUTOR)

ADVOGADO(A): ANELISE CRIPPA SILVA (OAB RS076824)

ADVOGADO(A): LEONARDO GONÇALVES MURARO (OAB RS046022)

ADVOGADO(A): DANIEL FELIPE TOMAZI MOREIRA CAUMO (OAB RS126658)

APELADO: GEOVANI DAVILA DE ARAUJO (Sucessor)

ADVOGADO(A): ANELISE CRIPPA SILVA (OAB RS076824)

ADVOGADO(A): LEONARDO GONÇALVES MURARO (OAB RS046022)

ADVOGADO(A): DANIEL FELIPE TOMAZI MOREIRA CAUMO (OAB RS126658)

MPF: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (MPF)

Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 19/04/2023, às 00:00, a 27/04/2023, às 16:00, na sequência 139, disponibilizada no DE de 10/04/2023.

Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, NEGAR PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal ALEXANDRE GONÇALVES LIPPEL

Votante: Desembargador Federal HERMES SIEDLER DA CONCEIÇÃO JÚNIOR

Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO

LIDICE PEÑA THOMAZ

Secretária



Conferência de autenticidade emitida em 06/05/2023 04:03:20.

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