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Apelação Cível Nº 5008763-91.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: JORGE LUIZ DOS SANTOS
ADVOGADO: THIAGO CASARIL VIAN (OAB RS076460)
ADVOGADO: THAIS CASARIL VIAN (OAB RS089320)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
RELATÓRIO
JORGE LUIZ DOS SANTOS ajuizou ação de procedimento comum contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS postulando a concessão do benefício de aposentadoria especial ou por tempo de contribuição a contar da DER (12/09/2014), mediante o reconhecimento de períodos laborados sob condições especiais.
Processado o feito, sobreveio sentença com o seguinte dispositivo:
ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedente o pedido, com base no inciso I do art. 487 do CPC/2015, para:
a) reconhecer o tempo de serviço especial laborado pelo autor, entre 01/08/1987 a 01/11/1991, 30/04/1987 a 01/08/1987, 01/11/1991 a 29/11/2016, 21/06/2010 a 24/07/2011 e 26/12/2012 a 31/01/2013 e convertêlos para comum, utilizando o fator 1,4, o que resulta em 04 anos, 03 meses e 23 dias;
b) determinar ao INSS a averbação do reconhecimento de tempo de serviço referidos.
Das custas processuais e honorários advocatícios.
Ante a sucumbência mínima do INSS, condeno as partes, na proporção de 80% a parte autora e 20% o INSS, ao pagamento das custas processuais, despesas e emolumentos e honorários advocatícios, os quais fixo em R$1.000,00 (R$ 800,00 aos procuradoresda parte ré e R$ 200,00 aos procuradores da parte autora, forte no art. 85, §8º, do CPC/2015, considerando os critérios dos incisos do §2º, vedada a compensação, nos termos do § 14, ambos do mesmo artigo.
Entretanto, inexigíveis os ônus sucumbenciais da parte autora, diante da AJG deferida, bem como que a Fazenda Pública, está isenta do pagamento das custas processuais, com exceção das despesas judiciais, conforme disposto na Lei Estadual nº 13.471/10, que deu nova redação ao art. 11 da Lei n.° 8.121/85.
Sentença não sujeita ao reexame necessário (art. 496, §3º, inciso I, do CPC/2015).
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Havendo a interposição de recurso pelas partes, intime-se a parte recorrida para, querendo, contra-arrazoar no prazo legal, e após, subam os autos ao egrégio Tribunal Regional Federal da 4ª Região.
Foram opostos embargos de declaração, que foram acolhidos nos seguintes termos:
(...)
O erro material é evidente e deve ser sanado, inclusive de ofício. Assim, retifico a sentença a fim de fazer constar o seguinte:
ANTE O EXPOSTO, julgo parcialmente procedente o pedido, com base no inciso I do art. 487 do CPC/2015, para:
a) reconhecer o tempo de serviço especial laborado pelo autor, entre 01/08/1987 a 01/11/1991, 30/04/1987 a 01/08/1987, 01/11/1991 a 29/11/1996, 21/06/2010 a 24/07/2011 e 26/12/2012 a 31/01/2013 e convertêlos para comum, utilizando o fator 1,4, o que resulta em 04 anos, 03 meses e 23 dias;
b) determinar ao INSS a averbação do reconhecimento de tempo de serviço referidos.
Os demais trechos e conclusões da sentença permanecem inalterados. O cálculo realizado considerou o período correto.
Dessa forma, acolho os embargos declaratórios interpostos por JORGE LUIZ DOS SANTOS, nos termos da fundamentação retro, sem efeitos infringentes.
Apela a parte autora.
Alega que restou devidamente comprovado o exercício de atividade especial nos períodos de 13/03/1980 a 26/05/1980, 24/05/1982 a 16/11/1985, 13/02/1986 a 27/10/1986 e de 01/04/1992 a 29/11/1996 em razão da exposição a álcalis cáusticos, bem como de 27/07/2009 a 22/10/2009, em virtude da exposição à umidade. Postula a reafirmação da DER e a majoração dos honorários advocatícios, fixando-os em 15% sobre o valor da condenação.
Apresentadas as contrarrazões, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Juízo de admissibilidade
Recebo o apelo da parte autora, pois cabível, tempestivo e isento de preparo por força da AJG concedida.
Mérito
Pontos controvertidos
Nesta instância, são controvertidos os seguintes pontos:
- comprovação do exercício de atividade especial nos períodos de 13/03/1980 a 26/05/1980, 24/05/1982 a 26/11/1985, 13/02/1986 a 27/10/1986, e 01/04/1992 a 29/11/996 e de 27/07/2009 a 22/10/2009;
- possibilidade de reafirmação da DER;
- fixação dos honorários advocatícios.
Das atividades especiais
Considerações gerais
O reconhecimento da especialidade da atividade é disciplinado pela lei em vigor à época em que efetivamente exercida, passando a integrar, como direito adquirido, o patrimônio jurídico do trabalhador. Desse modo, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente uma lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
Nesse sentido, é a orientação consolidada do Superior Tribunal de Justiça (AgInt no REsp 1603743/RS, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2019, DJe 28/05/2019; REsp 1151363/MG, Rel. Ministro JORGE MUSSI, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 23/03/2011, DJe 05/04/2011) e desta Corte (TRF4, AC 5002503-16.2018.4.04.7117, QUINTA TURMA, Relator OSNI CARDOSO FILHO, juntado aos autos em 25/06/2021; TRF4, AC 5042509-86.2017.4.04.9999, SEXTA TURMA, Relatora TAÍS SCHILLING FERRAZ, juntado aos autos em 17/06/2021; TRF4, ARS 5042818-97.2018.4.04.0000, TERCEIRA SEÇÃO, Relator CELSO KIPPER, juntado aos autos em 06/04/2020).
Dessa forma, considerando a diversidade de diplomas legais que se sucederam na disciplina da matéria, necessário definir qual a legislação aplicável ao caso concreto, ou seja, qual a legislação vigente quando da prestação da atividade pela parte autora.
Tem-se, então, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema sub judice:
a) No período de trabalho até 28/04/1995, quando vigente a Lei n.º 3.807/60 (Lei Orgânica da Previdência Social) e suas alterações e, posteriormente, a Lei n.º 8.213/91 (Lei de Benefícios), em sua redação original (arts. 57 e 58), possível o reconhecimento da especialidade do trabalho quando houver a comprovação do exercício de atividade enquadrável como especial nos decretos regulamentadores e/ou na legislação especial, ou quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor (STJ, AgRg no REsp n. 941885/SP, Quinta Turma, Rel. Ministro Jorge Mussi, DJe de 04-08-2008; e STJ, REsp n. 639066/RJ, Quinta Turma, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, DJ de 07-11-2005), em que necessária a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, carreada aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a nocividade ou não desses agentes;
b) A partir de 29/04/1995, inclusive, foi definitivamente extinto o enquadramento por categoria profissional - à exceção daquelas a que se refere a Lei n.º 5.527/68, cujo enquadramento por categoria deve ser feito até 13/10/1996, dia anterior à publicação da Medida Provisória n.º 1.523, de 14/10/1996, que revogou expressamente a Lei em questão - de modo que, no interregno compreendido entre 29/04/1995 (ou 14/10/1996) e 05/03/1997, em que vigentes as alterações introduzidas pela Lei n.º 9.032/95 no art. 57 da Lei de Benefícios, necessária a demonstração efetiva de exposição, de forma permanente, não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física, por qualquer meio de prova, considerando-se suficiente, para tanto, a apresentação de formulário-padrão preenchido pela empresa, sem a exigência de embasamento em laudo técnico, ressalvados os agentes nocivos ruído e calor, em relação aos quais é imprescindível a realização de perícia técnica, conforme visto acima;
c) A partir de 06/03/1997, data da entrada em vigor do Decreto n.º 2.172/97, que regulamentou as disposições introduzidas no art. 58 da Lei de Benefícios pela Medida Provisória n.º 1.523/96 (convertida na Lei n.º 9.528/97), passou-se a exigir, para fins de reconhecimento de tempo de serviço especial, a comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes agressivos por meio da apresentação de formulário-padrão, embasado em laudo técnico, ou por meio de perícia técnica.
Observo, ainda, quanto ao enquadramento das categorias profissionais, que devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 2ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro II do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo II) até 28/04/1995, data da extinção do reconhecimento da atividade especial por presunção legal, ressalvadas as exceções acima mencionadas. Já para o enquadramento dos agentes nocivos, devem ser considerados os Decretos n.º 53.831/64 (Quadro Anexo - 1ª parte), n.º 72.771/73 (Quadro I do Anexo) e n.º 83.080/79 (Anexo I) até 05/03/1997, e os Decretos n.º 2.172/97 (Anexo IV) e n.º 3.048/99 a partir de 06/03/1997, ressalvado o agente nocivo ruído, ao qual se aplica também o Decreto n.º 4.882/03. Além dessas hipóteses de enquadramento, sempre possível também a verificação da especialidade da atividade no caso concreto, por meio de perícia técnica, nos termos da Súmula n.º 198 do extinto Tribunal Federal de Recursos (STJ, AGRESP n. 228832/SC, Relator Ministro Hamilton Carvalhido, Sexta Turma, DJU de 30-06-2003).
Dos agentes nocivos frio e umidade
Quanto aos agentes nocivos frio e umidade, cumpre destacar o caráter meramente exemplificativo dos fatores e situações de risco previstas nos anexos dos Decretos nº 53.831/64, nº 83.080/79, nº 2.172/97 e nº 3.048/99, como reiteradamente vem afirmando a jurisprudência desta Corte e dos Tribunais Superiores.
Assim, mesmo que tais agentes não estejam previstos nos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.048/99, demonstrada a exposição prejudicial à saúde ou integridade física do segurado, é possível o reconhecimento da especialidade da atividade, na forma da Súmula 198 do extinto TFR.
Cabe registrar, ademais, que a própria NR15, em seus Anexos 9 e 10, prevê a insalubridade das atividades ou operações executadas no interior de câmaras frigoríficas ou em locais que apresentem condições similares, que exponham os trabalhadores ao frio, sem a proteção adequada, bem como das atividades ou operações executadas em locais alagados ou encharcados, com umidade excessiva, capazes de produzir danos à saúde dos trabalhadores, serão consideradas insalubres em decorrência de laudo de inspeção realizada no local de trabalho.
Prova técnica por similaridade
A prova pericial é meio adequado para atestar a sujeição do trabalhador a agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial.
Cumpre consignar que, diante do caráter social da Previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção da prova técnica em decorrência de fatores para os quais não tenha contribuído. A propósito, a orientação do Superior Tribunal de Justiça é pela possibilidade de o trabalhador lançar mão de perícia produzida de modo indireto, em empresa similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas do local onde efetivamente exerceu atividades especiais. Veja-se o julgado daquela E. Corte:
PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO. PERÍCIA INDIRETA EM EMPRESA SIMILAR. LOCAL DE TRABALHO ORIGINÁRIO INEXISTENTE. POSSIBILIDADE. 1. "Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que, diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica". (REsp 1.397.415/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20.11.2013). 2. Agravo Regimental não provido.(AgRg no REsp 1422399/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 18/03/2014, DJe 27/03/2014)
Do caso concreto
Na hipótese vertente, os períodos controversos de atividade laboral exercidos em condições especiais estão assim detalhados:
Períodos: | 13/03/1980 a 26/05/1980 |
Empresa: | FAROL Indústria Gaúcha de Farelos e Óleos Ltda. - Indústria Oleoginosa |
Função/Atividades: | Operador Tratamento D'água |
Setor: | - |
Agentes nocivos: | Agentes químicos |
Enquadramento legal: | Código 1.2.9 do Anexo III do Decreto 53.831/64 |
Provas: | CTPS (Evento 5, INIC1, Página 23) laudo por similaridade (evento 5, RÉPLICA3, p. 12-17) comprovante de baixa da empresa (Evento 5, RÉPLIC4, p. 41) perícia judicial (evento 5, RÉPLICA 4, p. 98-108) |
Conclusão: | COMPROVADA A ESPECIALIDADE Considerando-se a inatividade da empresa, possível a utilização de perícia por similaridade, em que avaliada idêntica atividade e constatada exposição a agentes químicos (cloro, sulfato de alumínio e álcalis cáusticos) Além disso, o perito judicial também concluiu pela exposição a agentes químicos no referido intervalo. |
Períodos: | 24/05/1982 a 26/11/1985 |
Empresa: | Central de Cooperativas de Produtores Rurais do Rio Grande do Sul - CENTRALSUL (Indústria processamento de soja) |
Função/Atividades: | Auxiliar laboratório |
Setor: | - |
Agentes nocivos: | Álcalis cáusticos |
Enquadramento legal: | Código 1.2.9 do Anexo III do Decreto 53.831/64 |
Provas: | CTPS (Evento 5, INIC1, Página 23) comprovante de baixa da empresa (evento 5, RÉPLICA4, p. 42) perícia judicial (evento 5, RÉPLICA 4, p. 98-108) |
Conclusão: | COMPROVADA A ESPECIALIDADE O perito judicial concluiu pela exposição a agentes químicos no referido intervalo. |
Períodos: | 13/02/1986 a 27/10/1986 |
Empresa: | DIVANI S/A Embalagens |
Função/Atividades: | Laboratorista |
Setor: | - |
Agentes nocivos: | Álcalis cáusticos |
Enquadramento legal: | Código 1.2.9 do Anexo III do Decreto 53.831/64 |
Provas: | CTPS (Evento 5, INIC1, Página 24) comprovante de baixa da empresa (evento 5, RÉPLICA4, p. 43) perícia judicial (evento 5, RÉPLICA 4, p. 98-108) |
Conclusão: | COMPROVADA A ESPECIALIDADE O perito judicial concluiu pela exposição a agentes químicos no referido intervalo. |
Períodos: | 01/04/1992 a 29/11/1996 |
Empresa: | Helmut Tessmann Ind. Com. Óleos Vegetais Ltda. |
Função/Atividades: | Laboratorista/Auxiliar Extração |
Setor: | Extração |
Agentes nocivos: | Álcalis cáustico |
Enquadramento legal: | Código 1.2.9 do Anexo III do Decreto 53.831/64 |
Provas: | CTPS (Evento 5, INIC1, Página 25) PPP (Evento 5, INIC1, Página 53-54) Programa de Prevenção e Riscos Ambientais da empresa de 2001 (, Evento 5, INIC1, Página 55-59) comprovante de baixa em 2004 por incorporação (evento 5, RÉPLICA4, p. 44) perícia judicial (evento 5, RÉPLICA 4, p. 98-108) |
Conclusão: | COMPROVADA A ESPECIALIDADE Embora no PPP fornecido pelo empregador conste apenas a exposição a ruído entre 68,1 e 82 dB, o perito judicial concluiu pela exposição a agentes químicos (álcalis cáusticos), sendo possível o reconhecimento da especialidade. |
Períodos: | 27/07/2009 a 22/10/2009 |
Empresa: | Cooperativa de Suinocultores de Encantado (Indústria de produção de suínos e fábrica de rações) |
Função/Atividades: | Auxiliar de salsicharia Jr. |
Setor: | Embutimento |
Agentes nocivos: | Umidade |
Enquadramento legal: | Súmula 198 do TFR |
Provas: | CTPS (Evento 5, INIC1, Página 40) PPP (Evento 5, INIC1, p. 59) laudo técnico da empresa Oderich (evento5, RÉPLICA3, p. 22-32) perícia judicial relativa a outro segurado realizada na empresa Laticínios Ivoti Ltda. (evento 5, RÉPLICA 3, p. 33-41) perícia judicial (evento 5, RÉPLICA 4, p. 98-108) |
Conclusão: | COMPROVADA A ESPECIALIDADE Embora o PPP aponte apenas a exposição a ruído de 84,4 dB(A), abaixo dos limites de tolerância, o perito judicial concluiu pela exposição do autor à umidade excessiva em suas atividades rotineiras. |
Assim, resta comprovado o exercício de atividade especial também nos intervalos de 13/03/1980 a 26/05/1980, 24/05/1982 a 26/11/1985, 13/02/1986 a 27/10/1986, e 01/04/1992 a 29/11/996 e de 27/07/2009 a 22/10/2009.
Do direito à aposentadoria especial no caso concreto
No presente caso, não há dúvidas quanto ao preenchimento da carência, nos termos do art. 25, caput e inciso II, da Lei nº 8.213/1991 e alterações.
Somando-se os períodos de atividade especial reconhecidos na sentença e no acórdão, a parte autora computa na DER (12/09/2014) 18 anos, 5 meses e 7 dias de atividade especial, insuficientes à concessão do benefício de aposentadoria especial.
Reafirmação da DER
A possibilidade da reafirmação da DER foi objeto do REsp 1.727.063/SP, REsp 1.727.064/SP e REsp 1.727.069/SP, representativos da controvérsia repetitiva descrita no Tema 995 - STJ, com julgamento em 22/10/2019, cuja tese firmada foi no sentido de que é possível a reafirmação da DER (Data de Entrada do Requerimento) para o momento em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, mesmo que isso se dê no interstício entre o ajuizamento da ação e a entrega da prestação jurisdicional nas instâncias ordinárias, nos termos dos arts. 493 e 933 do CPC/2015, observada a causa de pedir.
Ou seja, é cabível a reafirmação da DER para qualquer momento entre o requerimento e a entrega da prestação jurisdicional (inclusive em segundo grau de jurisdição) em que implementados os requisitos para a concessão do benefício, sem qualquer ressalva relativa ao interregno entre a DER e o ajuizamento da ação.
Quanto à eventual alegação de ausência de interesse de agir, o próprio STJ esclareceu, no julgamento dos EDs opostos pelo STJ no REsp 1.727.063/SP, que a despeito da necessidade de prévio requerimento administrativo para posterior ajuizamento da ação, estabelecida pelo STF no julgamento do RE 641.240/MG, a possibilidade de reafirmação da DER não implica burla do que foi assentado.
Portanto, ainda que na DER (12/09/2014) a parte autora não preenchesse os requisitos legais para concessão do benefício de aposentadoria especial, é possível considerar o tempo de contribuição superveniente à DER até a data em que implementado o tempo mínimo necessários.
Conforme se extrai da sentença, com relação ao último intervalo de labor do autor (26/12/2012 a 12/09/2014), foi reconhecida a especialidade no período de 26/12/2012 a 31/01/2013, pela exposição a ruído acima dos níveis de tolerância, conforme se extrai do seguinte trecho:
f) de 26/12/2012 a 31/01/2013 o PPP (anexo 01, evento 05, fl. 60) demonstra que o autor laborou exposto ao agente físico ruído de 99,7 dB(A); de 01/02/2013 a 22/10/2012 ao agente físico ruído de 75,8 dB(A).
Nesse passo, de acordo com os documentos acostados nos autos (Evento 44, PPP2), observo que, após a DER, o autor continuou trabalhando na Cooperativa Dalia Alimentos Ltda., na função de Auxiliar de Tratamento de Efluentes Latícinio Jr., até 31/12/2015, função com relação a qual não houve o reconhecimento da especialidade na sentença e a parte autora não recorreu no ponto. A partir de 01/01/2016, o autor passou a exercer o cargo de Operador ETA/ETE JR.
De acordo com o referido PPP, esteve exposto a ruído acima dos níveis de tolerância (85,3 dB) apenas no intervalo de 01/02/2015 a 31/01/2016, não sendo suficiente para implementar os 25 anos necessários à concessão do benefício de aposentadoria especial.
Assim, incabível a reafirmação da DER para concessão do benefício de aposentadoria especial.
Do direito à aposentadoria por tempo de contribuição
Com o acréscimo decorrente dos períodos de atividade especial ora reconhecidos, tem-se o seguinte tempo de contribuição da parte autora:
CONTAGEM DE TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO
TEMPO DE SERVIÇO COMUM
Data de Nascimento | 10/09/1958 |
Sexo | Masculino |
DER | 12/09/2014 |
- Tempo já reconhecido pelo INSS:
Marco Temporal | Tempo | Carência |
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) | 18 anos, 4 meses e 18 dias | 227 carências |
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) | 0 anos, 0 meses e 0 dias | 0 carências |
Até a DER (12/09/2014) | 29 anos, 8 meses e 1 dias | 366 carências |
- Períodos acrescidos:
Nº | Nome / Anotações | Início | Fim | Fator | Tempo | Carência |
1 | - | 13/03/1980 | 26/05/1980 | 1.00 | 0 anos, 2 meses e 14 dias | 3 |
2 | - | 24/05/1982 | 26/11/1985 | 1.00 | 3 anos, 6 meses e 3 dias | 43 |
3 | - | 13/02/1986 | 27/10/1986 | 1.00 | 0 anos, 8 meses e 15 dias | 9 |
4 | - | 30/04/1987 | 01/08/1987 | 1.00 | 0 anos, 3 meses e 2 dias | 5 |
5 | - | 01/08/1987 | 01/11/1991 | 1.00 | 4 anos, 3 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 51 |
6 | - | 01/11/1991 | 29/11/2016 | 1.00 | 25 anos, 0 meses e 28 dias (Ajustada concomitância) | 300 |
7 | - | 01/04/1992 | 29/11/1999 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
8 | - | 27/07/2009 | 22/10/2009 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
9 | - | 21/06/2010 | 24/07/2011 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
10 | - | 26/12/2012 | 31/01/2013 | 1.00 | 0 anos, 0 meses e 0 dias (Ajustada concomitância) | 0 |
Marco Temporal | Tempo de contribuição | Carência | Idade | Pontos (Lei 13.183/2015) |
Até a data da EC nº 20/98 (16/12/1998) | 34 anos, 5 meses e 7 dias | 423 | 40 anos, 3 meses e 6 dias | inaplicável |
Pedágio (EC 20/98) | 0 anos, 0 meses e 0 dias | |||
Até a data da Lei 9.876/99 (28/11/1999) | 17 anos, 0 meses e 1 dias | 207 | 41 anos, 2 meses e 18 dias | inaplicável |
Até a DER (12/09/2014) | 61 anos, 5 meses e 16 dias | 751 | 56 anos, 0 meses e 2 dias | inaplicável |
Até a data da Reforma - EC nº 103/19 (13/11/2019) | 63 anos, 8 meses e 3 dias | 777 | 61 anos, 2 meses e 3 dias | 124.8500 |
Até 31/12/2019 | 63 anos, 8 meses e 3 dias | 777 | 61 anos, 3 meses e 20 dias | 124.9806 |
Até 31/12/2020 | 63 anos, 8 meses e 3 dias | 777 | 62 anos, 3 meses e 20 dias | 125.9806 |
Até 31/12/2021 | 63 anos, 8 meses e 3 dias | 777 | 63 anos, 3 meses e 20 dias | 126.9806 |
Até a data de hoje (08/03/2022) | 63 anos, 8 meses e 3 dias | 777 | 63 anos, 5 meses e 28 dias | 127.1694 |
- Aposentadoria por tempo de serviço / contribuição
Nessas condições, em 16/12/1998, a parte autora tem direito adquirido à aposentadoria proporcional por tempo de serviço (regras anteriores à EC 20/98), com o cálculo de acordo com a redação original do art. 29 da Lei 8.213/91 e com coeficiente de 94% (art. 53, inc. I da Lei 8.213/91).
Em 28/11/1999, a parte autora não tem direito à aposentadoria por tempo de contribuição, ainda que proporcional (regras de transição da EC 20/98), porque não preenche o tempo mínimo de contribuição de 30 anos, o pedágio de 0 anos, 0 meses e 0 dias (EC 20/98, art. 9°, § 1°, inc. I) e nem a idade mínima de 53 anos.
Em 12/09/2014 (DER), a parte autora tem direito à aposentadoria integral por tempo de contribuição (CF/88, art. 201, § 7º, inc. I, com redação dada pela EC 20/98). O cálculo do benefício deve ser feito de acordo com a Lei 9.876/99, com a incidência do fator previdenciário, porque a DER é anterior a 18/06/2015, dia do início da vigência da MP 676/2015, que incluiu o art. 29-C na Lei 8.213/91.
Consectários legais. Correção monetária e juros de mora.
Segundo decidiu o Superior Tribunal de Justiça no Tema 905 (REsp n.º 1.495.146), interpretando o julgamento do Supremo Tribunal Federal no Tema 810 (RE 870.947), as condenações judiciais previdenciárias sujeitam-se à atualização monetária pelo INPC:
As condenações impostas à Fazenda Pública de natureza previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de correção monetária, no que se refere ao período posterior à vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei 8.213/91.
Dessa forma, a correção monetária das parcelas vencidas dos benefícios previdenciários será calculada conforme os seguintes índices e respectivos períodos:
- IGP-DI de 05/96 a 03/2006 (art. 10 da Lei n.º 9.711/98, combinado com o art. 20, §§5º e 6º, da Lei n.º 8.880/94);
- INPC a partir de 04/2006 (art. 41-A da lei 8.213/91).
Por outro lado, quanto às parcelas vencidas de benefícios assistenciais, deve ser aplicado o IPCA-E.
Os juros de mora incidem a contar da citação, conforme Súmula 204 do STJ, da seguinte forma:
- 1% ao mês até 29/06/2009;
- a partir de então, incidem segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
Registre-se que, quanto aos juros de mora, não houve declaração de inconstitucionalidade no julgamento do RE 870.947 pelo STF. Ainda, cabe referir que devem ser calculados sem capitalização.
Por fim, a partir de 09/12/2021, para fins de atualização monetária e juros de mora, deve incidir o art. 3º da Emenda Constitucional n.º 113/2021, segundo o qual, nas discussões e nas condenações que envolvam a Fazenda Pública, independentemente de sua natureza e para fins de atualização monetária, de remuneração do capital e de compensação da mora, inclusive do precatório, haverá a incidência, uma única vez, até o efetivo pagamento, do índice da taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (SELIC), acumulado mensalmente. As eventuais alterações legislativas supervenientes devem ser igualmente observadas.
Custas e despesas judiciais
O INSS é isento de custas na Justiça Federal, o que não o exime de reembolsar as eventuais despesas judiciais feitas pela parte vencedora, nos termos do art. 4º, I, e parágrafo único, da Lei n.º 9.289/1996.
Honorários advocatícios
Tendo em vista a sucumbência mínima da parte autora, deve o INSS arcar exclusivamente com o pagamento dos honorários advocatícios fixados nos percentuais mínimos previstos no artigo 85, § 3º, do CPC, incidentes sobre as parcelas vencidas até a data do acórdão, nos termos das Súmulas 76 desta Corte e 111 do STJ.
Honorários recursais
Incabível a majoração da verba honorária prevista no art. 85, § 11 do CPC, uma vez que tendo havido a redistribuição da sucumbência nesta instância, não subsiste a condenação originalmente fixada pela sentença, que constitui um dos requisitos estabelecidos pela Segunda Seção do STJ no julgamento do AgInt nos EREsp 1.539.725 – DF (DJe: 19.10.2017).
Tutela específica - implantação do benefício
Tendo em vista o disposto no art. 497 do CPC/2015, correspondente ao art. 461 do CPC/1973, e a circunstância de que os recursos excepcionais, em regra, não possuem efeito suspensivo, o julgado deve ser cumprido imediatamente (QUOAC 2002.71.00.050349-7, Relator p/ Acórdão Celso Kipper, D.E. 01/10/2007), no prazo máximo de trinta dias úteis.
Conclusão
Apelo da parte autora provido em parte para reconhecer o exercício de atividades especiais nos intervalos de 13/03/1980 a 26/05/1980, 24/05/1982 a 26/11/1985, 13/02/1986 a 27/10/1986, e 01/04/1992 a 29/11/996 e de 27/07/2009 a 22/10/2009, com o direito à aposentadoria por tempo de contribuição a contar da DER (12/09/2014).
Determinada a implantação do benefício.
Dispositivo
Ante o exposto, voto por dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a implantação do benefício.
Documento eletrônico assinado por ROGER RAUPP RIOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002933018v34 e do código CRC 2913df11.Informações adicionais da assinatura:
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Apelação Cível Nº 5008763-91.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
APELANTE: JORGE LUIZ DOS SANTOS
ADVOGADO: THIAGO CASARIL VIAN (OAB RS076460)
ADVOGADO: THAIS CASARIL VIAN (OAB RS089320)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
EMENTA
PREVIDENCIÁRIO. LABOR EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS. DIREITO ADQUIRIDO. umidade. implantação.
1. Comprovado o exercício de atividade especial, conforme os critérios estabelecidos na lei vigente à época do exercício, o segurado tem direito adquirido ao cômputo do tempo de serviço como tal.
2. Até 28/04/1995, é admissível o reconhecimento da especialidade do trabalho por categoria profissional; a partir de 29/04/1995, necessária a demonstração da efetiva exposição, de forma não ocasional nem intermitente, a agentes prejudiciais à saúde, por qualquer meio de prova; e, a contar de 06/05/1997 a comprovação deve ser feita por formulário-padrão embasado em laudo técnico ou por perícia técnica.
3. Destacado o caráter meramente exemplificativo das listas de fatores e situações de risco constantes dos Decretos regulamentadores, bem como a possibilidade de se reconhecer a natureza especial de atividade uma vez comprovada, através de perícia técnica, a exposição habitual e permanente a agente nocivos à saúde ou integridade física.
4. Determinada a imediata implantação do benefício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região decidiu, por unanimidade, dar parcial provimento ao apelo da parte autora e determinar a implantação do benefício, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Porto Alegre, 05 de abril de 2022.
Documento eletrônico assinado por ROGER RAUPP RIOS, Desembargador Federal Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Resolução TRF 4ª Região nº 17, de 26 de março de 2010. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.trf4.jus.br/trf4/processos/verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 40002933019v8 e do código CRC df519041.Informações adicionais da assinatura:
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL DE 29/03/2022 A 05/04/2022
Apelação Cível Nº 5008763-91.2021.4.04.9999/RS
RELATOR: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
PRESIDENTE: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
PROCURADOR(A): CARLOS EDUARDO COPETTI LEITE
APELANTE: JORGE LUIZ DOS SANTOS
ADVOGADO: THIAGO CASARIL VIAN (OAB RS076460)
ADVOGADO: THAIS CASARIL VIAN (OAB RS089320)
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Virtual, realizada no período de 29/03/2022, às 00:00, a 05/04/2022, às 16:00, na sequência 273, disponibilizada no DE de 18/03/2022.
Certifico que a 5ª Turma, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 5ª TURMA DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DA PARTE AUTORA E DETERMINAR A IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Desembargador Federal ROGER RAUPP RIOS
Votante: Juiz Federal FRANCISCO DONIZETE GOMES
Votante: Desembargador Federal OSNI CARDOSO FILHO
LIDICE PEÑA THOMAZ
Secretária
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